A antagonista - Capítulo 20



No grande salão que tinha sido escolhido para a noite que seria anunciado o noivado havia inúmeros convidados presentes. Branca tinha sido chamada para o evento, estava ao lado do marido e com Clarice. Recebera o convite de Lorena, pensara em não ir, mas como fora dito que era o noivado de Gabriele, decidira ir até lá. Luna estava com a mãe de Ana Valéria. Percebia que a presença de Antônio parecia inquietar a mulher, por isso, sentou-se longe, na parte do jardim. Rogério brincava com a pequena ruiva que parecia sonolenta.

O céu estava sem estrelas, talvez chovesse mais tarde. Havia previsões para aquela área. Um vento fresco soprava, deixando o ambiente acolhedor.

Havia empresários presentes e uma gama de jornalista cobria o evento que se tornara algo grandioso. Conhecia bem a Bamberg e duvidava que ela apreciasse aquele tipo de cerimônia. Não imaginava que ela aceitaria a união, pois tinha certeza de que não gostava do advogado, não de forma que uma mulher deveria gostar de um homem.

Comeu um morango que enfeitava o arranjo da mesa.

Não cumprimentara o pai da baronesa, tampouco Lorena, não suportava ambos, conhecia bem os jogos que faziam, tentando o tempo todo conseguir o poder das empresas que eram da Del La Cruz.

              – Achei estranho a Gabriele não ter chegado ainda. – A Wasten comentava. – Estive com ela hoje, acho que até para ela é uma surpresa esse noivado. – Fez um gesto negativo com a cabeça. – Espero que não aceite. – Completou baixinho de forma que apenas ela ouviria.

                  Havia uma banda tocando no palco que fora montado no jardim. Paloma chegava acompanhada do noivo, fez um gesto de cabeça para a administradora que retribuiu. Sabia que ela só estava ali pela união que tinha com Otávio, porém era de conhecimento de todos sua insatisfação com a neta de Bernard, ainda mais depois que descobrira sobre o casamento. Coitada da modelo. Era óbvio que seu caso com Ana Valéria não teria futuro, era apenas sexo que buscava a Di Pace. Não acreditava que haveria progresso naquele caso.

            Bebeu um pouco do rico champanhe, enquanto analisava o casal.

            Otávio parecia um pavão orgulhoso tendo a modelos pendurada em seus braços. Não parecia se importar com o escândalo de ter flagrado as duas na cama.

              – Aquela não é a tal moça que você me falou que tinha algo com a Ana? – Clarice questionou curiosa.

                – Ela mesma…acho que vai se casar com o noivinho, depois de todo o escândalo…

            -- Que bom que ele a perdoou... – Dizia pensativa.

              Rogério levantou-se com a criança que já reclamava, estava sonolenta.

            Luna estava linda. Usava um macacão jeans branco, sapatos rosas. Seus cabelos ruivos e finos estavam presos em cada lado da cabeça. Chamava pela mãe o tempo todo, parecia ansiosa para vê-la.

                – Hellen acabou de chegar. – Fez um gesto para chamar a moça.

                A jovem aproximou-se. Branca quem a chamara até ali, pois não a viu na lista dos convidados. Sabia que Miguel não simpatizava com a moça, pois acreditava que ela era culpada pela Bamberg continuar trabalhando no restaurante.

              – Olá, boa noite! – Disse com um sorriso. – Então hoje teremos um noivado? – A chef questionou sentando-se à mesa. – E onde está a princesinha Luna? – Perguntava, enquanto olhava tudo ao redor, porém sua busca era pela própria amiga.

                A sócia de Gabriele tinha ido até ali, com a esperança de que a jovem também estivesse, porém olhava tudo ao redor e não a via por perto. Sabia que ela tinha ido até a boate, pois conseguira falar com Tatiana que confirmara o fato, porém não sabia de mais detalhes e chegara a pensar que já estaria no evento. Em parte, sentia-se culpada por ter falado sobre o leilão, caso não tivesse comentado, ela não teria ido até a casa de show.

               – Está com o Rogério. – Clarice apontou-lhes. – Está com sono, por isso estamos tentando distrai-la antes que adormeça e não veja a mamãe se tornando noiva.

            Hellen fez um gesto afirmativo com a cabeça, pensando em como seria aquele noivado. A Bamberg não sabia de nada, comentara sobre um encontro de negócios, decerto ela teria uma bela surpresa. Viu Miguel, não gostava muito do rapaz, pois sabia que ele insistia sobre a relação, mesmo sabendo que a jovem não o queria. Não acreditava que ele fosse tão tolo que não percebesse aquilo.

                 – Tia Hellen…

                A voz da herdeira dos Bambergs chamou-lhe a atenção, levantou-se, pegando a menina nos braços.

                 – Que garotinha linda e fofa! – Beijou-lhe os cabelos que estavam soltos.  – Que ruivinha mais maravilhosa.

              A pequena gargalhou com as cócegas. 

                 Levantou-a para vê-la.

               – Quem te arrumou tão linda assim?

               – A vovó… – A voz infantil respondeu.



                 Miguel recebia o cumprimento dos amigos, enquanto olhava para Lorena preocupado. Vez e outra falava com um dos responsáveis pela entrada dos veículos, questionava sobre a neta de Bernard, mas até agora só recebia respostas negativas. Não acreditava que faria papel de besta diante de toda alta sociedade. Não perdoaria Gabriele se isso acontecesse.

            Conversava com alguns amigos, mas quando viu a loira, pediu licença e foi até ela:

             – Onde ela está? – Questionou em um sussurro. – Pediu para o Trevan para ligar para ela?

                 – Ele está tentando falar, já lingou várias vezes, mas o telefone está desligado. – Dizia baixinho. – Ele vai até o restaurante.

                – Acha que está lá? – Indagou irritado. – A Hellen está lá com a Branca e não falou nada. – Arrumava a gravata borboleta. – Espero não ter que fazer papel de besta na frente de todo mundo, não vou aceitar esse tipo de comportamento.

                A noiva de Antônio parecia intrigada com tudo aquilo. Conhecia bem a Gabriele, sabia que ela não era irresponsável, mesmo que nos últimos dias parecessem muito estranha. Já tinha pedido ao irmão para sondá-la, buscar informações do comportamento cada vez mais aéreo, introspectivo, porém nada fora descoberto. Ainda se recordava do dia que estivera no escritório conversando com a jovem, percebera-a nervosa quando falava no telefone. Ficara muito curiosa sobre quem era seu interlocutor.

            Passava a mão pelos cabelos, buscando arrumar o elegante penteado.

                Se o noivado acontecesse, seria um passo para o casamento, então poderia tomar posse da herança da Bamberg de uma vez por todas.

                – Acalme-se, nada vai conhecer, ela chegará, então apenas sorria para todos e espere o momento do seu noivado. – Aconselhava-o. – Deve ter acontecido algo e o celular pode ter descarregado, sabe muito bem como a sua noiva não presta muita atenção aos detalhes.

               O advogado fez um gesto afirmativo com a cabeça.



            O quarto estava mergulha na penumbra, tendo apenas as velhas iluminando o ambiente. Os sons dos gemidos e das respirações aceleradas podiam ser ouvidos como a sinfonia de uma serenata dos apaixonados.

          Gabriele estava sentada sobre o quadril da dançarina. Seu corpo não parecia saciar a fome que tinha por aquela mulher de olhos azuis. Movia-se, como se ansiasse encaixar-se para sempre naquele sexo. Nada lhe preparara para o intenso prazer que fazia seu sangue correr mais rápido em suas veias.

         Rubi acaricava-lhe os seios, permitindo que continuasse com a deliciosa dança que a chef de cozinha se propunha. Via os cabelos cacheados cair sobre a face, como uma deusa em busca de todo o prazer que desejava. Segurou-lhe pela cintura, forçando-a a continuar a esfregar-se, ouvindo o atrito que os corpos molhados provocavam.

             A Bamberg parecia incansável em sua cavalgada até que parecia ter voltado a atingir o auge do prazer, gritando em êxtase. A artista a obrigou a continuar o balançado até que desabou sobre a amante, sabendo que ela também fora tomada pelo delicioso e implacável prazer.

               As respirações aceleradas faziam som naquele quarto mergulhado na penumbra, os corações de ambas pareciam tambores a bater descompassados.

               Rubi acariciava os cachos da neta do barão, sentia o cheiro do corpo suado, observou os olhos a lhe encararem.

            Havia algo naquela jovem, algo que a fazia sentir que não havia mais nada em todo aquele mundo que lhe interessasse, apenas tê-la em seus braços. Sabia que não deveria ter se entregado, porém não tivera escolha. Só o anseio de a tomar em seus braços e unir-se a ela como se fossem apenas uma.

            Observava o lábio superior, acariciava-o com o dedo, curiosa sobre a pequena cicatriz que ali repousava.

                – Deus, eu preciso ir embora. – Passou o indicador pelo lábio superior da dançarina. – Não pode pelo menos tirar essa máscara? Quero te ver…

                – Não está no contrato…

                – Também não estava o sexo…e você o fez…– Mordiscou a lateral do lábio inferior. – E fez muito bem...—Exibiu um sorriso. – Superou todas as minhas expectativas.

                 Rubi mordiscou-lhe o dedo, depois o chupou, passando a língua por todo ele.

                 Gabriele sentia o corpo reagir ao toque. Não podia acreditar que já podia tocá-la novamente.

               – Preciso ir…infelizmente, tenho que ir…– Disse em tristeza. – Mas eu volto, hoje volto aqui…me espera?

               – Que horas? – Tocou-lhe o lábio superior. -- Por que não fica?

               Gabriele beijou-lhe os lábios, depois se levantou.

                – Tenho um encontro com uns empresários, mas assim que concluir, volto. – Olhava tudo ao redor, pegando o vestido e a minúscula calcinha. – Vai me esperar?

                  Rubi a olhava em admiração. Via-a em poucos minutos estar pronta para partir.

                 A Bamberg foi até a mulher que continuava no leito, beijou-lhe os lábios.

                  – Eu volto…

                 A dançarina apenas fez um gesto afirmativo com a cabeça. Não queria que ela fosse, desejava tê-la ao seu lado durante toda a noite. 

               Por que tinha a impressão de que já tinha beijado aquela mulher? Era como se seu corpo a reconhecesse, como se já tivessem se amado em outros momentos. Ouviu o som da porta sendo fechada e se sentiu solitária, como se necessitasse da moça de olhos escuros em sua vida.

            Sua mente estava muito confusa, parecia que as imagens apareciam e não havia conexões. Cenas isoladas. Não conseguia reconhecer nenhuma das pessoas que pareciam presentes em suas visões pretéritas, porém havia a sensação que não lhe abandonava, principalmente em relação à Gabriele.

            Virou-se de bruços, apoiando a cabeça nos braços, enquanto olhava para a mesa que ainda estava posta. Pensou em ir comer algo, então ouviu batidas à porta. Puxou o lençol, cobrindo o torso.

            Viu Tatiana aproximar-se com olhar perscrutador.

            -- Imagino que não esteja mais brava... – Comentou, sentando-se à mesa, enquanto examinava tudo ao redor. – Vejo que nem tempo tiveram para o jantar. – Encheu a taça com o vinho. – E como foi?

            Rubi soltou um longo suspiro, depois se levantou, não parecia preocupada em mostrar-se em toda sua nudez. Caminhou até o banheiro e depois de alguns segundos retornou sem a máscara e vestindo um roupão atoalhado azul. Sentou-se, servindo-se.

            Provava da comida, parecendo ter apreciado o delicioso prato de frutos do mar.

            -- Além de uma boa amante, uma ótima cozinheira... – A dançarina comentou. – Essa garota que me deixa sem controle.

            -- Será que realmente é a pessoa que ela falou? – Mastigava devagar. – Por que não tira a máscara diante dela e lhe conta toda a história? – bebericou mais um pouco. – Ainda tem medo?

            Rubi ficou em silêncio, enquanto tinha seu olhar preso na chama da vela. Parecia ponderar sobre os últimos acontecimentos, sobre os temores que lhe perseguiam como se fosse uma defesa que tinha em seu interior.

            -- Eu não sei o que pensar, estou confusa, há imagens desconexas na minha cabeça, como fosse um quebra-cabeça. – Mordiscou a lateral do lábio inferior. – Por que eu devo confiar nessa mulher?

            Tatiana colocou os talheres ao lado do prato.

            -- Eu acho que você está mais que atraída pela senhorita Bamberg...acho que está apaixonada... – Afirmou com relutância.

            Os olhos azuis estreitaram-se, porém não falara nada, parecia novamente pensativa diante do que ouvia da produtora. Talvez, ela estivesse certa, entretanto esse não era o momento para se deixar levar por emoções, afinal, a chef de cozinha podia apenas ser uma garota mimada e voluntariosa que parecia ter encontrado um brinquedinho novo para sua diversão. Não podia esquecer que ela tinha um namorado, alguém com quem mantinha um compromisso. Já tinha visto inúmeras vezes em jornais, sempre ostentando a riqueza que ambos tinham.

            Olhava para a comida, estava absorta em seus pensamentos, analisando o que deveria fazer, ainda mais agora que permitira que a moça a tocasse. Não era como Tatiana que achava que tudo era paixão, pois poderia se tratar apenas de sexo e se assim o fosse...

            -- Não vai comer? – A voz insistente da amiga questionava a lhe fitar.

            -- Não estou mais com fome. – Levantou-se. – Preciso de um banho e depois vou te ajudar a fechar a boate e arrumar as coisas.

            -- Não precisa, já fez sua parte hoje, então não vou te cobrar mais nada.

            Os olhos azuis estreitaram-se.

            -- O que fiz não fazia parte do plano, fiz porque tive vontade, um bônus para o meu próprio corpo.

            Tatiana não respondeu, apenas dando de ombros. Sabia que ela sentia muito mais que sexo pela Gabriele, estava claro isso e mais claro que essa relação não era atual, era antiga, não havia dúvidas que se conheciam, só não sabia o que significava aquela relação.

 

 

 

            Três horas e meia de atraso e todos pareciam desacreditados de que a Bamberg apareceria. Lorena e Miguel já tinham inventado inúmeras desculpas e já se preparavam para justificar a ausência da herdeira do barão, quando uma Gabriele com olhar ansioso apareceu no jardim.

            Branca, Clarice, Rogério e Hellen já se preparavam para ir embora, pois Luna já dormia nos braços da avó. A pequena perguntara inúmeras vezes pela mãe e só naquele momento a chef de cozinha chegava.

            A Wasten foi a primeira a vê-la e seu olhar buscou o da jovem que parecia temeroso, preocupado.

            Gabriele olhava tudo ao redor, não imaginara que um simples jantar seria tão pomposo, nem por que Clarice e a filha também estavam presentes. Recebeu alguns cumprimentos e apenas esboçou um gentil sorriso. Sentia que todos que lhe olhassem perceberiam o que tinha acontecido, como se em sua testa estivesse escrito sobre o que acontecera na boate.

            Antes de sair do carro tinha retocado a maquiagem que fora desfeita, principalmente o batom que fora todo retirado, enquanto usava a boca de todas as formas possíveis.

            Já seguia para falar com a família quando ouviu a voz do noivo no microfone. Levantou a cabeça e ele estava sobre o palco ao lado de Lorena e Trevan. Não compreendia nada e já se preparava para questionar quando sentiu o toque de Antônio em seu cotovelo.

            -- Quero, aqui, diante de todos, oficializar o noivado com Gabriele Bamberg, a mulher que escolhi para ser minha esposa, para ser minha companheira para todo o sempre. – O advogado iniciava. – Houve alguns empecilhos, mas ela já está aqui...o amor da minha vida, a mulher que escolhi para ser a mãe dos meus filhos...

            Os olhos escuros arregalaram-se diante do que estava ouvindo naquele momento.

            Não!

            Não podia aceitar ficar noiva do advogado, ainda mais agora depois do que tinha acontecido na boate. Deixara a casa de show pronta para encerrar sua relação, afinal, não havia lógica em continuar aquele relacionamento quando não estava apaixonada pelo namorado.

            Ouvia os aplausos e sentia o homem mais velho conduzi-la pelo carpete vermelho. Abriu a boca para protestar, mas ouviu a voz do pai de Ana Valéria.

            -- Quero que aceite o Miguel, ele será o pai perfeito para a minha neta... – Fitou-a. – Sei que não pensaria em outro e confesso que não aceitaria outro... – Completou a ameaça de forma sutil. – Veja como ele convidou todos os amigos, a família está presente para esse momento...é um bom homem, o melhor que já conheci...

            A Bamberg sentia a cabeça doer diante de tudo aquilo. Queria desaparecer daquele lugar, sumir do olhar cheio de expectativas daquelas pessoas. Pensou em Rubi, em como ansiava retornar para os seus braços. Voltou a fitar Luna. A pequena dormia tranquilamente. Começava se sentir culpada por suas ações naquela noite, por ter permitido que seu desejo controlasse suas escolhas.

            Trevan aproximou-se sorridente.

            -- Deixe que te acompanhe até lá, minha filha...

            A jovem viu Branca aproximar-se, viu Hellen e observou o olhar de preocupação que a amiga lhe enviava.

            Ouvia os aplausos aumentando em incentivo, meneou a cabeça, porém acabou caminhando ao lado do fotógrafo.

            Ao chegar ao palco, sentiu o beijo de Miguel em seus lábios e apenas permaneceu quieta, enquanto via o rapaz ajoelhar-se diante de si.

            Engoliu em seco.

            Branca observava tudo com crescente preocupação. Conseguia ver nos olhos negros que a neta de Bernard não desejava o noivado, porém sabia que ela não seria capaz de envergonhar o advogado diante de todos. Eles foram muito espertos em criar todo aquele show, pois encurralaram a Bamberg. Conhecia-a o suficiente para saber que cederia, mesmo que não quisesse.

            Ouvia as palavras do futuro noivo, as lágrimas que não poderiam faltar naquele espetáculo. Observou-o segurar a mão da jovem, beijando-a e colocando o caríssimo anel de compromisso, assim selava o plano para conseguir todos os bens da baronesa.

 

 

 

            Passava do meio-dia, quando Tatiana e Rubi chegaram ao hospital. Demoraram porque fora necessário descontar o cheque que fora pago.

            Foram recebidas por um dos médicos responsáveis pelo tratamento do idoso. O homem era alto e magro. Tinha por volta dos cinquenta anos. Os cabelos já exibiam o grisalho persistente. Seu olhar sempre se demorava mais sobre a jovem de olhos azuis, parecia fascinado pela beleza da dançarina.

            -- Fico muito tranquilo por terem conseguido pagar os medicamentos. – Ele dizia com um sorriso. – Fiquei muito preocupado, pois não teríamos como prosseguir com o tratamento e seria muito arriscado interrompermos nesse momento.

            -- Posso vê-lo? – Rubi questionou sem parecer se importar com o olhar de cobiça do médico.

            -- Claro, claro! – Apontou-lhe o corredor. – Tem a permissão, porém tente não o deixar muito emocionado.

            A artista seguiu, ansiosa para encontrar o homem que lhe salvara a vida. Não se importava em ter que trabalhar incansavelmente se essa era a única forma de cuidar do idoso que fora responsável por todos os cuidados depois que sofrera o terrível atentado.

            Encontrou a enfermeira a sua espera, entregando-lhe o traje para acessar o quarto, higienizando-a, assim evitaria qualquer tipo de contaminação para a saúde já debilitada do homem.

            Rubi adentrou a sala. Observava os aparelhos presos no corpo do Índio, a máscara de oxigênio que o ajudava a respirar.

            Aproximou-se, sentando-se ao lado do leito, tocando os cabelos longos, lisos e totalmente brancos do senhor.

            Viu os olhos negros abrirem-se e sorrirem diante da sua presença. Tocou-lhe a mão, sentindo-a calejada.

            -- Eu estou bem... – Ela disse baixinho.

            Ele apertou-a mais forte, parecia não acreditar no que era dito. Não podia falar, mesmo assim era possível ver a preocupação em seu olhar.

            -- Estou um pouco confusa...imagens desconexas...mas sei que vou conseguir superar tudo isso...

 

 

            Naquele dia mais cedo, Branca estava na empresa quando recebeu a ligação do gerente do banco.

            -- Vinte mil? – Indagou preocupada. – E quem é a mulher? É a mesma?

            -- Sim.

            A administradora parecia ponderar, enquanto ouvia a respiração do bancário no aparelho. Era estranho aqueles pagamentos e quando questionara sobre, tinha percebido que a Bamberg ficara muito nervosa.

            -- Peça o endereço...diga que é necessário para liberar a quantia, apenas para conferência...depois me envie.

            -- Certo, senhora Wasten, farei como pede.

            Encerrou a chamada, ansiosa para saber quem era aquela mulher que sempre era paga com cheques da empresa.

 

 

            Lia estava na cozinha quando viu Gabriele aparecer ainda vestindo o roupão e com a filha segurando sua mão. Observava a expressão de desânimo e as olheiras que denunciavam a noite mal dormida. Viu-a sentar a criança em uma das cadeiras, depois se acomodar em outra.

            Partiu um bolo que tinha acabado de fazer, colocando no prato para as duas.

            -- Provem esse suco... – Colocou nos copos. – Fiz com as laranjas que colhi no jardim.

            Luna parecia feliz com sua guloseima, mas a chef de cozinha nem tocara na comida.

            -- Não entendo por que continua aqui na cozinha, é a governanta... – A Bamberg comentou.

            -- Eu gosto...e já aceitei que colocasse algumas ajudantes, não preciso mais de nada...—Acomodou-se de frente para a jovem. – Pensei que estaria mais feliz, soube que ontem teve seu noivado.

            Gabriele nem queria pensar naquilo, só abrira a boca naquele evento para se negar a ir para o apartamento com o noivo. Não se imaginava sendo tocada por Miguel depois de ter transado com a dançarina.

            Olhava com desgosto para o caríssimo anel que repousava em seu anelar.

            Ainda não sabia como fora permitir que tudo aquilo se realizasse, ainda mais depois de ter se entregado a Rubi. Não conseguira dormir, apenas cochilando já pela manhã. Quando fechava os olhos se recordava das carícias que trocaram e de como fora delicioso se entregar àquela mulher misteriosa. Prometera que retornaria, porém não conseguira retornar, como faria isso depois de aceitar ser noiva do advogado?

            -- Como se sente? – Questionou preocupada. – Se não queria o noivado por que aceitou?

            A Bamberg não respondeu de imediato, olhava para a filha comer o bolo, apertando-os em suas minúsculas mãos.

            Não queria pensar em toda aquela confusão que agora estava metida. Em um compromisso que não desejava de forma nenhuma, porém não tivera coragem para negar-se e agora não sabia o que fazer.

            Lia levantou-se, depois trouxe o jornal e lá era possível ver seu rosto e o de Miguel estampando a capa de mais um periódico. Naquele momento, toda a cidade, o estado e quem sabe o país já sabia do seu compromisso com o advogado.

            -- O que eu poderia fazer? – Gabriele perguntou cobrindo a face com as mãos. – Ia dizer na frente de todos que não aceitava? Imagina a vergonha para o Miguel?

            -- Mas ele merecia, afinal, fez tudo sem te consultar...Menina, você não devia ter aceitado, que se negasse, simples assim, agora está aí noiva desse homem que nem gosta.

            -- E como sabe que não gosto?

            -- Se gostasse tinha passado a noite com ele, comemorando e não passando a noite rolando em sua cama, sem conseguir dormir.

            -- Você não entende... – Pegou o suco, bebericando devagar. – Há mais coisas que não posso contar...mas eu queria poder te contar...

            A mais velha puxou a cadeira e se sentou próximo da moça, segurou-lhe as mãos.

            -- Sabe que estou sempre aqui para qualquer coisa que precise, não me importa o que seja...

            -- Sempre esteve ao meu lado... – Disse com um sorriso triste. – Até quando a baronesa me castigava...Ana Valéria... – Pronunciou o nome em um sussurro como se fosse um sacrilégio.

            -- Apaixonou-se pela ruiva...e sei que ainda sofre por ela...

            Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça, pareceu ponderar durante alguns segundos, mordiscou a lateral do lábio inferior, depois falou:

            -- Lia, tem uma mulher...eu a conheci...linda...e eu tenho a impressão de que é a Del La Cruz...

            Os olhos da empregada arregalaram-se.

            -- Mas como?

            -- Eu não sei...Ela usa uma máscara...sotaque francês...e os olhos são tão azuis como o próprio mar...Eu sinto aqui... – Apontou para o peito. – Sinto que é ela, porém ela nega...

            Era possível ver a confusão na expressão da empregada.

            -- Outro dia, ouvi a senhora Branca conversando com a dona Clarice, falavam sobre a baronesa...

            A moça fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            -- Ela insiste que a Ana está viva...

            -- E então? É essa mulher que você falou?

            Gabriele tamborilava os dedos contra o tampo da mesa.

            -- Eu não sei...ela se nega, diz que não é...mas não tira a máscara...

            -- E como a conheceu? – Questionava mais curiosa. – Uma dançarina? – Perguntava pensativa.

            A face da jovem ficou corada.

            Nem sabia o motivo de estar falando sobre aquele assunto. Precisava encerrar aquilo, não era certo continuar com aquele caso, não podia ser tão sem caráter com o noivo.

            Bebeu todo o conteúdo do copo.

            -- Não quero falar mais sobre isso, estou ficando louca!

            Lia ainda abria a boca para falar algo, mas diante do olhar que recebera ficou em silêncio.

 

 

            Era noite, Rubi tinha acabado sua apresentação, seguindo até o bar, sentou-se, enquanto lhe era entregue uma garrafa de água. Um cliente aproximou-se, mas ela o dispensou com um gesto e logo o segurança aproximava-se. Não estava com paciência. Desde que retornara do hospital não parecia estar com seu melhor humor. Tinha visto a foto de Gabriele com o namorado, agora noivo. Não conseguia acreditar como a jovem tivera a cara de pau de aceitar o compromisso depois de transarem. Como fora tão estúpida a ponto de cair nas graças daquela garota?

            Bebeu todo o conteúdo da garrafa.

            Ainda pensara em ligar para a chef de cozinha, porém não o fizera, não se rebaixaria daquela forma. Mesmo assim, tinha proibido que a tal moça entrasse na boate. Sua passagem estava totalmente vedada. Não deseja vê-la mais, nem mesmo saber nada sobre si. No fundo, temia não conseguir controlar seu desejo e ceder aos apelos do corpo como acontecera na noite anterior.

            Fechava os olhos e via a imagem da Bamberg sobre si, cavalgando-a como uma amazona selvagem que não se importava em tomar para si tudo que ansiava.

            Ouviu seu nome ser gritado pelos clientes, sabia que queriam que voltasse para o palco, porém ela não desejava. Queria apenas ficar sozinha naquele momento.

            -- Já coloquei outros para se apresentarem no seu lugar. – A Voz de Tatiana comentava.

            Rubi fitava a produtora, mas não falou nada de imediato. Sabia que ela estava preocupada consigo e odiava que isso acontecesse.

            Fez um gesto para o barman e logo ele lhe servia um copo de martini.

            -- Não se preocupe, eu mesma voltarei para o placo. – Bebeu tudo de uma vez. – Eles me querem lá, então lá ficarei.

            Tatiana ainda ia protestar, mas ficou calada diante do olhar forte e arrogante.

           

 

            Gabriele estacionou diante da casa de show.

            Não devia ter ido até ali, porém sabia que teria que ver Rubi. Precisava lhe contar tudo o que aconteceu, mesmo que acreditasse que ela já ficara sabendo. Tentara ligar, porém o telefone não chamava. Ficou algum tempo parada dentro do veículo. Olhava o movimento na frente e os seguranças lá parados. Não tinha seguido até a empresa naquele dia e pouco falara, mantendo-se dentro do quarto com a Luna. Não queria ter que responder as perguntas sobre onde estava na noite anterior, nem mesmo atendera as inúmeras chamadas do noivo.

            Recordou-se da amiga Hellen.

            Não lhe contara sobre o que tinha acontecido, mas sabia que ela desconfiava de algo, por conseguinte sabia que ela estivera na boate.

            Discou no painel do veículo o número da dançarina.

            Não desejava entrar, queria encontrá-la em outro lugar, porém ela não atendia, na verdade, nem mesmo chamava.

            Suspirando, deixou o automóvel e foi caminhando até a portaria. Seguia para entrar, porém os seguranças lhe barraram a entrada.

            -- O que se passa? – Indagou furiosa. – Saiam da frente.

            -- Sinto muito, senhorita, porém temos ordens para não permitir sua entrada.

            Os olhos negros estreitaram-se, enquanto flexionava o maxilar.

            -- Isso é um absurdo, não podem me barrar a entrada. – Cruzou os braços sobre os seios. – Quem me proibiu?

            Os seguranças trocaram olhares, depois um deles respondeu:

            -- A senhorita Rubi.

            A Bamberg suspirou. Provável que já sabia sobre seu noivado ou apenas tinha enjoado da sua presença. Fosse o que fosse, já era humilhante suficiente ficar ali parada, enquanto outros clientes olhavam a cena.

            -- Diga a sua Rubi que não voltarei mais aqui. – Falou exasperada. – Que não precisa perder seu tempo colocando dois brutamontes aqui fora para barrarem o meu caminho.

 

 

            Apenas cinco dias depois, Branca tivera tempo de ir até o endereço que o gerente do banco lhe passara. Passava das três da tarde. Pensara em ir mais cedo, porém houve uma reunião na empresa e para sua surpresa, Lorena tinha antecipado os trâmites para a fusão das corporações. Tentara falar com Gabriele, mas ela parecia isolada em seu mundo, apenas aceitava tudo o que era dito, como se não tivesse vontade própria. Não quisera discutir, pois tinha a impressão de que nada adiantaria.

            Sentia-se frustrada, pois nem mesmo conseguira encontrar a mulher e o homem que podiam ter uma pista sobre a baronesa.

            Estacionou o veículo em frente ao local do endereço.

            Uma boate?

            Decerto, era apenas a pessoa que fornecia bebidas para o restaurante.

            Ligou o veículo para ir embora e foi quando viu o outdoor que estava sendo colocado. A mulher de cabelos pretos usava uma máscara, mas havia algo na dançarina que lhe chamava a atenção.

            Desceu do carro e foi até a entrada da boate. A porta estava aberta. Ouvia a música alta no interior, então entrou e foi quando encontrou uma mulher quase da sua altura, cabelos castanhos claros. Viu o olhar surpreso para si.

            -- Boa tarde! – Cumprimentou, enquanto olhava tudo ao redor. – Sou Branca Wasten. – Estendeu a mão.

            Tatiana olhava para a mulher, parecia surpresa com a sua presença.

            -- Perdoe-me entrar aqui desse jeito, mas preciso falar com uma mulher chamada Tatiana...

            Nem terminou de falar, pois Rubi aparecia sem máscara. Tinha dado uma pausa nos ensaios e agora retornava para finalizar.

            Os olhos da administradora arregalaram-se diante da outra a lhe olhar.

            Sentiu um aperto no peito, pronunciando baixinho o nome:

            -- Ana Valéria...

            Os olhos azuis focaram na figura bem-vestida que a olhava e de repente, memórias desconexas vieram à sua mente, porém daquela vez com maior velocidade, como se tivesse aumentado a velocidade das cenas.

            Antes que pudesse falar algo, sentiu a vista escurecer e logo desmaiava.   


 

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