A antagonista - Capítulo 12



Antônio estava em seu escritório, reunia-se com Lorena, Trevan e Otávio.

            – Acho que agora vamos ter a opinião pública caindo em cima da Ana Valéria. – O advogado dizia. – Teremos a chance de tirar a sua neta dela e a Gabriele vai perceber quão perigosa é a esposa do avô. – Arrumava a gravata. – A papelada para o casamento no civil já está pronta.

            – Precisamos marcar uma entrevista, Antônio, acho que deve falar à imprensa sobre o que aconteceu com a sua filha… – Lorena dizia gesticulando. – Sua imagem sairá ilesa, ainda mais quando expor que nos dias atuais sofre temendo uma recaída da herdeira... Podemos narrar as perseguições que foram feitas a todos.

            O senador fazia um gesto afirmativo com a cabeça.

            – Agora temos mais recursos para impedi-la de chegar perto da Clarice. – Sorria. – Foi uma ótima ideia, Trevan, jogar tudo nas redes. – Bebeu um pouco de martini. – Não há riscos de sermos descobertos?

            – Não, senhor, fiz como costumeiramente usamos para espalhar notícias falsas. – O homem falou com pouco entusiasmo.

            Lorena quem tivera a ideia e o irmão cedera como sempre fazia diante dos caprichos da mais jovem, mesmo assim ele temia que isso prejudicasse de alguma forma a filha adotiva.

            – Já orientei os advogados para que voltem a apelar ao juiz pela guarda da Luna, acho que não vai ser difícil depois de tudo isso para Ana Valéria.

            A empregada entrou trazendo champanhe e algumas taças.

            Otávio serviu a todos, depois se sentou.

            – Acho que seria uma boa ideia que o senhor tenha uma conversa com a Bamberg. – Sugeria. – Precisamos colocá-la totalmente contra a baronesa e suas palavras seriam muito bem-vindas para ajudar a garota a tomar a decisão. – Aceitou a taça que fora oferecida. – É uma menina ingênua, mas agora vai descobrir tudo o que se passou e perceber o risco que está correndo junto com a menina.

            O político levantou-se.

            – Hoje estarei na igreja. – Fitou a amante. – Dê um jeito de deixar essa informação vazar, acho que seria interessante que os jornalistas me encontrem em um lugar tão respeitado. – Fitou Trevan. – Converse com Miguel e o convença a vir até mim e trazer junto a namorada.

           

 

Já era noite na casa da baronesa.

            Luna tinha tomado a mamadeira e já estava dormindo. Devia ter se cansado do dia corrido que tivera com a tia.

            Gabi arrumava o quarto, pois havia brinquedos jogados por toda parte.

            Ouviu o som do celular e foi até ele. Viu a mensagem do namorado. Conversaram um pouco e logo ele lhe enviava um link.

            Curiosa, a jovem clicou, quando a página abriu, precisou sentar-se na cama, pois ficara tonta. Lia cada manchete e buscava outras informações.

            Viu uma foto de Ana Valéria na adolescência. Fitou os olhos azuis, a expressão assustada, enquanto era levada por algumas pessoas vestida com uma camisa de força.

            Cobriu a boca com a mão.

            “Herdeira de senador surta e ataca a mãe.”

            “Ana Valéria Del La Cruz foi internada em um hospital psiquiátrico.”

            “Ela é descontrolada e não tem como viver em sociedade.”

            Havia tantas frases terríveis que sentiu uma angústia em seu peito.

            Voltou a olhar a imagem que ela aparecia em sua festa de quinze anos. Havia um vídeo. Começou a assisti-lo. Sentiu lágrimas invadir os olhos ao ver a adolescente descer a escadas tocando o violino, parecia um anjo ruivo.

            Voltou a ler as matérias e a apreensão em seu peito aumentava mais e mais.

            O namorado ligou, mas ela não atendeu, parecia perdida diante de todas aquelas informações.

            Ouviu batidas na porta e logo Lia entrava trazendo uma bandeja. Viu a expressão da empregada, parecia triste.

            Ela levantou-se da cama e mostrou o celular à mulher.

            – Como assim?

            Lia suspirou, depois colocou a comida sobre a mesinha.

            – Acho que nem sei o que dizer…

            – Você sabia disso?

            A empregada fez um gesto afirmativo.

            – É algo muito triste para que possamos sair dizendo. E eu não acredito em nada, sabe, claro que a baronesa não é alguém fácil de lidar, mas não consigo imaginá-la agindo da forma que estão falando.

            A Bamberg seguiu até a janela do quarto, parecia sufocada, tentava respirar, então viu alguns carros parados em frente à casa.

            – A Branca ainda está aqui? – Perguntou fitando a cozinheira.

            A mais velha fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            – Sim, o senhor Rogério também e ainda pouca a médica pessoal da baronesa chegou.

            Gabi umedeceu os lábios.

            – Ela não está bem não é? – Questionou baixinho. – Isso foi jogado nas redes hoje, pois antes estive pesquisando sobre a baronesa e nada aparecia.

            – Sim, alguém muito mal quis feri-la.

            A Bamberg passava a mão nos cabelos presos, enquanto ponderava.

            – Vou lá ver se precisam de ajuda.

            Já seguia para a porta, mas foi detida pelo braço.

            – Não, menina, melhor ficar aqui, não há nada que possa fazer.

            A moça cerrou os dentes.

            Realmente não havia nada para fazer, ainda mais pelo fato de não ter nenhum tipo de relação amigável com a esposa do avô, mesmo assim queria ir até ela, saber se estava bem, ver os olhos azuis brilharem como quando fazia quando era provocada.

            – Por que o pai a internou? – Indagava ansiosa. – Li em uma das matérias que a mãe da Ana está internada e a filha nunca conseguiu autorização para vê-la. – Sentou-se pesadamente na cama. – Meu Deus, essa mulher viveu um pesadelo

            – Nesse momento só podemos pedir a Deus que a ajude, não há mais nada para fazermos. – Apontou a bandeja. – Coma algo e tente descansar, vamos esperar que amanhã seja melhor que hoje.

            Gabi fez um gesto afirmativo com a cabeça, mas não comeu. Quando ficou sozinha nos aposentos, deitou-se na cama e começou a ler tudo o que falavam sobre a esposa do avô.

            Havia inúmeras fotos de quando ela estava internada no hospício.

            Não conseguiu segurar as lágrimas em muitos momentos, pois tinha a impressão de que conseguia sentir a agonia da Del La Cruz em sua própria alma.

 

 

 

 

            Passava do meio-dia quando Branca desceu.

            Tinha passado a noite na mansão acompanhada do marido. Rogério tinha saído mais cedo, pois precisara representar Ana Valéria em uma reunião com a diretoria.

            A administradora ainda vestia o roupão de seda quando entrou na cozinha.

            – Se soubesse que estava acordada teria levado no seu quarto. – Lia adiantou-se.

            A Wasten sentou-se na bancada da mesa americana.

            – Não estou com fome, querida, só quero um pouco de café bem forte.

            A cozinheira adiantou-se para fazer.

            A administradora olha para a mesa, parecia desolada depois de uma noite complicada.

            A baronesa tivera uma violenta crise e mais uma vez só conseguira acalmar-se depois de sedada. A médica deixara a casa de madrugada, pois ainda temia que não tivesse sido suficiente a dose dada.

            Ana tinha ficado totalmente fora de si. Trancara-se na sala de vídeo e deve ter ficado vendo cada uma daquelas matérias que narrava miseravelmente sua vida. A porta do estúdio precisara ser arrombada, pois ela não abrira. Quando entraram, encontraram a jovem desmaiada com a cadela em desespero ao ver sua dona tão mal.

            Mais cedo tinha visto a entrevista de Antônio sobre o que tinha sido noticiado nas redes. O homem fora cínico a ponto de mentir diante da casa de Deus, fingindo sua preocupação com a filha e a neta.

            Não tinha dúvidas de que ele estava por trás de tudo aquilo.

            Miserável! – Pensava.

            Ouviu passos e viu Gabi aproximar-se com Luna. Viu na expressão da neta do barão que ela já sabia de tudo.

            – Como está a senhora Ana Valéria?

            A jovem indagou sem rodeios.

            Não conseguira dormir nada na noite anterior e logo cedo tinha despertado e foi até os aposentos da baronesa, porém as portas estavam fechadas, então teve como saber o que se passava.

            A administradora suspirou.

            – Está dormindo e acho que vai passar o dia assim, a dose de remédio que tomou foi muito forte… – Aceitou a xícara que Lia lhe entregou. – Acho que é melhor que fique assim por enquanto. – bebeu um pouco. – Já pedi apoio de mais seguranças, pois há um verdadeiro exército de jornalistas lá fora.

            Sim, a moça tinha visto da janela. Colocou Luna na cadeirinha e lhe entregou o ursinho.

            – E o que vai acontecer quando ela acordar?

            – Vou tentar convencê-la a viajar para Serra, irei com ela, esperar que tudo isso se acalme.

            – Acha que vai se acalmar?

            Branca umedeceu os lábios.

            – Estamos tentando tirar tudo isso das redes, investigando quem pode ter jogado toda a história e seus detalhes mentirosos. – Respondeu irritada. – Querida, nada daquilo que está sendo jogado na mídia é verdade. – Disse em lágrimas. – Acho que agora você vai entender um pouco o motivo de Ana ser essa pessoa tão insensível. – Baixou os olhos. – Seu pai a internou quando era uma adolescente, fizera-o miseravelmente e ainda hoje continua a tentar destruí-la.

            A ex-noviça segurou a mão da Wasten.

            – Acho melhor que descanse um pouco, a senhora também não está bem.

            – Não posso, preciso vigiar o sono da Ana, não sei como vai reagir quando acordar.

            – Eu posso ficar lá… – Disse corando. – Se permitir, ficarei nos aposentos… Logo Luna vai dormir, então não haverá problemas.

            Branca a olhava curiosa e agradecida. Via sinceridade na expressão da jovem. Ela não sabia a história, mas mesmo assim não foi inconveniente fazendo questionamentos, apenas aceitando que aquele não era o momento certo para explicações. Olhava-a e não conseguia associá-la à figura cruel do avô.

            Fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            – Coloque a Luna para dormir, espero você no quarto da baronesa.

            A Bamberg fez um gesto afirmativo com a cabeça, enquanto via a mulher deixar a cozinha.

 

 

            Nos aposentos de Ana as cortinas estavam cerradas. Pandora jazia ao lado da dona, parecia sempre alerta para que nada acontecesse. Ela jazia deitada entre os lençóis de seda. Seu sono não era tranquilo, mesmo tendo recebido um forte calmante para que lhe fizesse dormir.

            Sempre que ela se mexia, Gabi aproximava-se, preocupada.

            Naquele momento estava parada diante do leito, olhava a mulher que parecia tão perdida em sua existência.

            Fitou a face, estava menos pálida agora, os lábios entreabertos…os cabelos em desalinhos caiam em sua testa.

            Relutante, tocou-lhe a face, estava quente, mas não febril. Parecia tão diferente ali deitada, tão frágil diante de tanta coisa que acontecia ao seu redor.

            Continuava a lhe fazer carinho, então viu a cadela lhe fitar em desconfiança.

            – Não vou machucar sua dona, Pandora, estou aqui para cuidar dela da mesma forma que você. – Sussurrou.

            O animal pareceu entender o que era dito, voltando a baixar a cabeça ao lado da baronesa.

            A Bamberg tinha visto a entrevista do senador. Miguel tinha lhe enviado pelo celular. Não sabia o motivo, mas não sentiu sinceridade naquele homem que parecia querer demonstrar uma tristeza que estava longe de sentir. Fora frio em dizer que não permitiria que a jovem se aproximasse da mãe, pois a considerava uma ameaça.

            Limpou uma lágrima que insistia em descer.

            Perdera a mãe quando ainda era bem pequena, porém lembrava bem da mulher, pois durante muitos anos fora apenas as duas. Via a luta de Serena para conseguir um pouco de comida para que ambas não passassem fome, algumas vezes a garotinha fugira para pedir nas ruas e fora assim que conhecera Trevan. Não conseguia nem pensar na dor que aquela mulher devia sentir por não poder aproximar-se da genitora. Da batalha que enfrentava nos tribunais para ter o direito de se aproximar depois de ter ficado tanto tempo trancafiada em um manicômio.

            Recordou-se de ter falado com o namorado mais cedo, de como ele fora incisivo em dizer que não a queria perto da baronesa, de como a empresária era uma ameaça a sua vida. Desligara o telefone, pois se irritara com essas palavras. Claro que não tinha uma relação boa com a esposa do avô, porém isso era fruto dos enfrentamentos que tinham, de desafiar sempre sua postura, sabia que ela não gostava de si, tudo porque herdara as ações que tanto desejava. Agora entendia o motivo de ela querer tanto sua parte na herança.

            Pensou no pai adotivo e em Lorena. Tinha a impressão que ambos sabiam de tudo aquilo e por essa razão insistiam tanto para que ela se casasse com o namorado e desse fim aquela história que o avô  tinha criado. Se assim o fizesse, suas ações passariam automaticamente para as mãos de Antônio e tudo terminaria.

            Voltou a fitar o rosto bonito da ruiva.

            Usou o dedo indicador para delinear os lábios bem-desenhados. Eram tão macios…

            Sentiu-se corar ao se lembrar de senti-los nos seus.

            Agoniada, levantou-se, afastando-se.

            Não desejava pensar naquilo, agoniava-lhe o espírito quando voltava ao quarto do hotel naquela noite. Até sentia raiva da baronesa pelo que tinha feito consigo.

            Levou o polegar à boca e começou a morder a unha em nervosismo.

            Não devia ter pedido a senhora Branca para ficar ali, não devia ter se aproximado da Del La Cruz, mesmo sentindo pena de toda aquela situação.

            Caminhava para a porta para ir embora quando ouviu a voz baixa e rouca:

            – Br…Branca…

            Gabi pensou em ir chamar a administradora, mas não o fez, seguiu até o leito e viu os olhos azuis abertos, pareciam confusos, desorientados.

            – Ela está descansando, senhora, precisa de algo?

            Ana sentia a vista embaraçada, por isso imaginara que a mulher que estava ali era a Wasten. Mas então ouviu a Bamberg.

            O que ela fazia ali?

            Observou os olhos a lhe perscrutarem, mas não os encarou, virou a cabeça para o outro lado.

            Sua cabeça girava, sentia-se enjoada como sempre acontecia quando precisava ser sedada. Não conseguia lembrar de muita coisa depois que Branca a deixara na sala de vídeo, porém recordava de ter ficado horas lendo as manchetes sobre sua vida até que o desespero começou a tomar conta de si e a partir de ali tudo tinha apagado.

            Acariciou a cabeça da cadela.

            – Saia, freirinha, não quero que fique aqui… – Disse sem mirá-la. – Volte para o seu quarto e me deixe sozinha.

            A Bamberg mordiscou o lábio inferior, demoradamente, enquanto observava a empresária.

            – A senhora Branca estava muito cansada… – Dizia hesitante. – Não dormira cuidando da senhora, então me oferecia para ficar aqui…Precisa de algo? – Voltou a perguntar. – Posso te ajudar...

            A baronesa voltou a cabeça para fitá-la. Gostaria que tivesse mais luz no ambiente para poder ver melhor a face da neta de Bernard.

            Olhou-a por inúmeros segundos, mas não falou nada, só a olhava como se estivesse a ver uma obra de artes que precisava ser admirada.

            A Bamberg sentiu-se inquieta com a forma da outra lhe fitar, então falou:

            – Posso abrir as persianas para que tome um pouco de sol?

            Ana deu de ombros, enquanto voltava a fechar os olhos.

            A ex-noviça seguiu até as portas de vidros que davam acesso à varanda e lentamente abria as cortinas, deixando a iluminação entrar no recinto.

            Passava das quinze horas.

            Caminhou até a jarra que estava sobre a mesinha, colocou um pouco de líquido no copo e voltou para perto da cama.

            Os olhos da ruiva estavam fechados, mas sabia que não dormia, pois via sua mão a acariciar Pandora.

            – A senhora Branca disse que quando acordasse lhe desse um pouco desse chá.

            Gabi pensou que a bela não responderia, pois durante algum tempo permaneceu na mesma posição, até virar a cabeça, voltando a fitá-la.

            Sentiu um arrepio na nuca diante da expressão forte e poderosa, parecia que tinha deixado de lado a fragilidade.

            Devagar, viu-a sentar-se.

            Entregou-lhe o copo, tomando cuidado para não a tocar. Observou o pijama de seda preta que estava vestindo. Decerto, fora a administradora quem lhe trocara a roupa.

            – Quer algo para comer? – Perguntou ao receber o copo de volta. – Se quiser, peço a Lia que prepare algo ou eu posso fazer.

            Ana fez um gesto negativo com a cabeça. Colocando as pernas para fora da cama, manteve-se de olhos fechados, pois sentira muita tontura.

            – Peça a Tereza que venha até aqui, preciso que me ajude a tomar banho.

            – Posso ajudá-la…

            A baronesa a encarou.

            – Não foi muito delicada nas vezes que me ajudou, então prefiro que a Tereza o faça. – Tentou levantar-se, mas não conseguiu fazer sozinha, então apoiou-se na jovem.

            A Bamberg sentia a pressão em seus ombros aliviarem aos poucos. Encarou a bela esposa do seu avô. Ambas tinham quase a mesma altura, sendo apenas uns dois centímetros mais alta a baronesa.

            Ambas se fitavam, pareciam perdidas em seus próprios pensamentos.

            – Ajude-me a tirar o pijama, acho que basta isso…

            Caminharam lentamente até o banheiro. A Bamberg a conduzia devagar, pois sabia que não estava bem ainda. Apoiou-se no armário da penteadeira, enquanto a deixava parada diante de si.

            Segurou as amarras do roupão negro. O nó estava difícil de soltar, com certeza, ela devia ter mexido no sono. Tentava de toda forma, mas não conseguia.

            Observou a mulher que mantinha os olhos fechados, mas era possível ver a expressão de impaciência.

            Devagar, agachou, decidida a usar os dentes para desfazer o nó.

            Ana sentiu-a movimenta-se e ao fitá-la, viu-a abaixada e com a boca no pijama.

            Sentiu-se ainda mais tonta, precisando segurar na pia.

            Observou a cabeleira negra que estava presa em um rabo de cavalo. Viu os olhos lhe fitarem brilhantes.

            – Dessa vez não estraguei seu caro traje. – Disse sorrindo, enquanto levantava. – Só precisei usar a boca para desfazer o nó.

            A baronesa não respondeu.

            Vê-la naquela posição não parecia ser algo confortável para apreciar, pois sua mente imaginara inúmeras cenas sensuais.

            – Saia, acho que posso fazer o resto sozinha.

            – Tem certeza? – Indagou preocupada. – Posso ajudá-la…

            Ana suspirou.

            – Eu estou bem, apenas me deixe sozinha…– Disse aborrecida. – Posso me virar.

            Gabi percebia que a face da mulher estava bem rosada, corada?

            – Quer que eu chame a Tereza? – Indagou tentando esconder o ressentimento.

            – Sim, peça que venha.

            A Bamberg saiu, enquanto a baronesa apoiava-se no balcão. Olhou a própria face. Havia um brilho em seus olhos.

            Como seu corpo podia ter reagido estando tão debilitado?

            Por alguns minutos tinha esquecido de tudo o que tinha se passado.

            Passou a mão nos cabelos, enquanto tentava conter o tremor que se apossara de si.

 

 

 

            – Será que não é melhor que vá e pergunte se quer algo para comer? – Lia insistia.

            A cozinheira tinha achado estranho a expressão de Gabriele quando chegava à cozinha. Parecia chateada. Imaginou se tinha se desentendido com a baronesa, porém ela negara várias vezes.

            – Ela disse que não queria… já avisei a dona Branca que ela tinha despertado. – Abriu a geladeira e pegou uma maçã. – A Tereza está lá, se precisar de algo vai vir aqui pedir.

            – E por que ela não quis sua ajuda e preferiu a governanta? – A cozinheira indagou curiosa. – Brigaram foi? A baronesa já tinha energia para isso?

            A jovem apoiou-se na pia, enquanto mordia a fruta.

            – Ela não gosta de mim, então não me quis lá. – Deu de ombros. – Vou cuidar da Luna.

            Lia a viu deixar a cozinha e achou estranho, pois conseguia ver em sua expressão que estava triste.

 

 

 

            Na manhã seguinte, Ana Valéria parecia bem melhor. A mesa de desjejum tinha sido montada no jardim. Branca e Rogério estavam com a empresária.

            Lia trouxe a bandeja e arrumou tudo para o café da manhã.

            – Pensei que iria para a Serra, já tinha organizado tudo para te acompanhar. – A administradora dizia surpresa.

            – Não vou me esconder, acho que é isso que Antônio espera que eu faça depois de ter jogado tudo nas redes.

            O advogado trocou olhares com a esposa. Percebia que apesar da crise que Ana tivera, não parecia tão frágil como antes. Parecia ainda mais altiva e orgulhosa.

            – No final de semana irei até a fazenda, vai ter o evento da colheita e quero estar presente. – Bebeu um pouco de suco. – Imagino que vocês venham comigo.

            O casal fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            – Paloma veio aqui ontem, mas disse para que esperasse, parecia preocupada contigo.

            – Não quero que ninguém se preocupe comigo! – Falou exasperada. – Diga-me, por que deixou a freira no quarto comigo ontem?

            Branca respirou fundo.

            Não tinha entendido o motivo da empresária ter ficado tão chateada com a presença da garota. Tinha falado com a neta de Bernard e percebeu que ela tinha ficado aborrecida pela forma que Ana se comportara.

            – Não entendi o motivo de você ter ficado irritada… Ela se ofereceu para ficar lá, enquanto eu descansava um pouco.

            Os olhos azuis estreitaram-se.

            – Não preciso da pena dela nem de ninguém.

            – Não acho que ela estava sentindo pena de ti e se estava, deve ter passado assim que você abriu seus lindos olhos e começou a destilar sua raiva. – Branca disse impaciente. – Não pude falar contigo ainda, mas reabri a matrícula de Gabi no curso de gastronomia.

            Rogério prendeu o fôlego ao ouvir a esposa. Pensava que ela esperaria mais uns dias para falar sobre aquele assunto.

            A baronesa cruzou as pernas.

            – E quem vai pagar? Que eu saiba ela não tem nada a não ser as malditas ações congeladas por um ano.

            – Eu o farei, não vai me deixar pobre…Não sou sovina como outras…

            Ana comeu uma torrada, ignorando a indireta.

            – E que horário vai ser essas aulas? Esqueceu que ela tem que cuidar da Luna? – Indagou calmamente. – Ou você vai deixar seu trabalho para fazer esse serviço? – Arqueou a sobrancelha em sarcasmo. – Você não tem muito talento para isso, sempre sobra para mim.

            Branca parecia impaciente.

            – Vejo que já está muito bem, baronesa, afinal, não cansa de provocar. – Levantou-se. – Acho que meu café já foi bem recheado.

            – Sente-se! – Ana pediu, usando um tom menos arrogante. – Sabe que não gosto que tome partido dessa garota. – Falou quando a administradora se sentou. – Não suporto quando faz tudo para ajudá-la, parece que esquece que ela é o empecilho que me separa das ações.

            Rogério apenas ouvia a discussão, enquanto tentava não tomar partido.

            – E você acha que a Gabi deve amar viver aqui contigo né? – Fez um gesto negativo com a cabeça. – Você não consegue entender que ela também é vítima da maldade do avô? Por Deus, Ana, veja como foi humilhante aquele testamento… A menina teve que ser exposta, colocada a ideia de virgindade diante de todos…

            – Ela teve escolha… – Dizia pensativa. – Ela tem vinte anos, não podia ser obrigada a ficar em um convento, exceto se há algo mais que não tomamos conhecimento…

            A Wasten tinha a mesma impressão e buscava ganhar a confiança da Bamberg para conseguir descobrir o que havia escondido.

            – Talvez ela não tenha imaginado que você fosse assim…Deve ter pensado que era melhor que ficar no convento.

            Ana arqueou os olhos em deboche.

            – Se ela soubesse antes, com certeza teríamos uma freira na família. – Branca provocou com um sorriso. – E então? Vai deixar que ela estude?

            –Vou esperar que ela me peça… – Levantou-se. – Vou me arrumar, me espere, vou contigo para a empresa.

            A administradora fez um gesto afirmativo com a cabeça. Quando estava sozinha com o marido lhe atirou uma banana.

            O advogado desviou do ataque.

            – Você apenas escuta e não fala nada… Que bom que não tivemos filhos, já imagino como iria ser conivente.

            – E o que queria que eu fizesse? – Disse rindo. – Conheço muito bem Ana Valéria para saber que não vai ceder tão facilmente…sem falar que ela tem uma verdadeira irritação a tudo que é relacionado à neta do marido.

 

 

 

 

            Tereza bateu nos aposentos da baronesa.

            – Vim assim que Lia me deu seu recado.

            Ana tinha tomado banho, estava de lingerie branca para deleite da governanta que não escondia a admiração diante do corpo feminino. A empresária estava com o roupão, mas ele não estava amarrado.

            – Arrume minha mala, irei para a fazenda.

            A empregada não pareceu gostar de saber disso.

            – Você também irá, vai ter o festival do café no sábado e quero estar presente.

            – Farei como diz. – Disse entusiasmada. – Vou arrumar tudo.

            – Ligue para o piloto e diga que deixe o jatinho pronto para amanhã cedo.

            Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            – Agora vá e diga a freirinha para vir aqui, se tiver ocupada, não importa, quero-a aqui.

            Tereza assentiu e correu para cumprir as ordens da patroa.

            A baronesa parou diante do espelho. Começou a maquiar-se.

            Não podia negar que ainda estava muito abalada com tudo o que tinha ocorrido, mesmo assim, não se entregaria como o pai devia ter imaginado. Seguiria e muito em breve o destruiria sem nenhuma piedade.

            Bateu com a mão fechada contra o móvel.

            Ouviu batidas à porta e não demorou para ver a Bamberg aparecer no reflexo do espelho.

            Ela vestia uma das suas costumeiras camisetas, mas para sua surpresa, agora estava vestindo sutiã. Observou a calça folgada de moletom que se ajustava bem ao seu quadril. Os cabelos estavam trançados na lateral do ombro.

            Gabi estava alimentando Luna quando fora ordenada a ir ao quarto da esposa do avô. Precisara pedir para Lia terminar de cuidar da menina, pois a governanta disse que a patroa não aceitaria esperar.

            Observou a roupa sobre a cama. Terninho feminino na cor cinza. A camiseta branca de gola alta. Os sapatos bem limpos.

            – Por que demorou? – Ana indagou terminando de passar o batom. – Falei que devia vir rápido. – Arrumou o delineador ao redor dos olhos azuis.

            – Estava cuidando da Luna. – Disse simplesmente cruzando os braços sobre os seios.

            A baronesa seguiu até a calma para vestir a camisa. Livrou-se do roupão.

            A Bamberg desviou o olhar por alguns segundos, depois fitou o corpo que parecia ter sido esculpido por um artista.

            Por que a achava tão bonita? Por que se sentia tão incomodada em sua presença?

            Decerto, Tereza estava lá quando ela se exibia quase despida pelo quarto. Isso a perturbava bastante. Achava-a uma desavergonhada.

            – E como vai ser quando tiver que a deixar para ir fazer seu cursinho de gastronomia? – Provocou-a. – Fico pensando como passou por sua cabeça essa ideia estúpida.

            – A senhora Branca falou…

            Ana foi até ela furiosa, segurando-lhe o pulso.

            – Deixe de usar a boba da Branca em seus planos… – Ordenou. – Sempre que quer algo, usa-a, sempre que quer sair com seu namoradinho, é ela quem vem até mim pedir em seu nome…gosta de manipular as pessoas?

            Os olhos azuis escuros estreitaram-se.

            Pelo que percebia, a senhora toda poderosa já tinha voltado a sua forma de ser irritante e arrogante.

            – Não uso a senhora Branca, baronesa, ela quem tomou a responsabilidade de intervir no nosso diálogo já que percebe que fica complicado quando a senhora só usa arrogância para falar comigo.

            Ana ficou furiosa, ficava fora de si quando a outra retrucava, apertou-a mais.

            – Pois dessa vez não vai funcionar, dessa vez não vai conseguir o que deseja, então esqueça seu curso.

            Gabi livrou-se do toque grosseiro.

            – Me chamou aqui só para isso? Poderia ter mandado recado pela sua governanta, teria poupado tanto estresse.

            Virou-se para ir embora, mas Ana a segurou mais uma vez.

            – Não sabe ficar calada não é?

            A neta de Bernard fitou os lábios cheios. Sentia o cheiro feminino, a forma que se encostava em seu corpo. Encarava-a e buscava naqueles campos indecifráveis algo que pudesse lhe explicar sua fúria, então viu um lampejo que tinha visto no hotel, naquela estranha noite.

            Sentia o hálito fresco…

            – Não me desafie, freirinha… – Ana sussurrou. – Sabe que não suporto sua petulância, mas o faz de propósito...Sempre se comporta de forma a me desafiar, agi como uma pirralha birrenta.

            – Não tive a intenção… – Disse por fim, emudecendo os lábios. – Posso sair dos seus aposentos?

            A baronesa observava o rosto bonito, fitou a cicatriz sobre o lábio superior. Sentia-se contraditória quando via a jovem, sentia uma mistura de sentimentos que a assustava, como conhecia bem a raiva, era esse que alimentava, pois já fazia parte da sua vida.

            Soltou-a.

            – Amanhã viajaremos para a fazenda, não tinha interesse em tê-la lá, porém não há outra pessoa para cuidar da Luna, então arrume suas coisas e da menina.

            Ela fez um gesto afirmativo e deixou os aposentos.

 

 

            A fazenda Ouro Verde ficava bem afastada da cidade. Vários hectares de terra faziam parte da propriedade. A principal cultura agrícola lá era a do café. Cultivava o melhor do país, porém agora começava a produzir vinhos e já ganhava o mercado nacional com sua safra.

            O lugar era bastante antigo. Fazia parte da família do barão há mais de dois séculos. Depois da morte de Bernard, Ana ordenara que fosse reformada a casa grande. No lugar havia uma verdadeira comunidade. Inúmeras casas eram ocupadas pelos trabalhadores e por suas famílias que viviam e trabalhavam ali. No dia da colheita  havia um festival aberto ao povo da cidade.

            As barracas já estavam sendo montadas para vender as mais deliciosas iguarias locais.

            Alguns parques começavam a se instalar no pátio da fazenda.

            Os empregados da casa grande estavam em correria, deixando tudo pronto para receber a baronesa e seus convidados.

            Bandeirinhas estavam sendo penduradas no pátio e vez e outra, ouvia-se algumas bombinhas.

            Branca e Rogério foram os primeiros a chegar acompanhados de Lia e Tereza. A administradora insistira para que Gabriele viesse junto, mas Ana não permitira, afirmando que seguiria consigo. Sabendo que nada poderia fazer, acatou as ordens da empresária.

 

 

            O jatinho estava na pista quando o carro estacionou. Todo o percurso até o aeroporto tinha sido feito em total silêncio, apenas se ouvia o som infantil produzido por Luna.

            Ao deixar o carro, Ana pegou a sobrinha nos braços.

            Gabi viu quando Paloma apareceu perto da aeronave. A modelo veio em direção da amante, beijando-lhe os lábios.

            Desviou o olhar para não ver a cena.

            – Pensei que não viria. – A baronesa disse não mostrando interesse.

            – Já que me deu gelo todos esses dias, vim ver se derretia esse seu ice-berg. – Disse sorrindo.

            A Bamberg seguiu mais rápido, nenhum pouco interessada em ouvir a conversa das duas mulheres. Ouviu a voz de Luna e precisou parar na entrada do jatinho. Tentava não prestar atenção em como a baronesa estava bonita com seu jeans surrado, camiseta, jaqueta de couro vermelha, botas de cano alto, os óculos escuros escondiam a beleza dos olhos. Os cabelos estavam presos em um rabo de cavalo.

            A Del La Cruz seguia ouvindo Paloma falar sobre os compromissos que precisara cancelar para estar ali. Sua atenção não estava na mulher que seguia ao seu lado, mas na que estava parada perto da aeronave.

            Não sabia o motivo por não ter deixado que ela seguisse com a Branca, parecia se sentir bem em afrontar a neta do marido. Observou o macacão que ela usava. O jeans moldava em suas pernas, a camiseta se enquadrava em seus ombros...será que estava usando sutiã?

            Sentira o cheiro dela em todo o percurso de carro. Vez e outra sua perna roçava na dela, porém via a expressão séria, chateada.

            Respirou fundo.

            Seguia assombrada pelo beijo que trocara com a Bamberg, com o toque em seus seios…

            – Está me ouvindo? – Paloma questionou quando já chegava no jatinho.

            Entregou Luna à Gabi e seguiu para o interior.

 

            Já era tarde na fazenda. As comemorações iniciavam naquela noite. Todos pareciam se divertir nas barracas e ouvindo o som da banda que tinha sido contratada. Luna estava com Gabi. Trazia uma maçã do amor nas mãos e mordiscava.

            A Bamberg estava feliz por ter podido sair com a menina sem ter que se preocupar em suportar a baronesa.

            Lia estava consigo. Branca tinha liberado a cozinheira para acompanhar a jovem.

            – Tudo está tão lindo! – A ex-noviça dizia entusiasmada. – Me recordei de quando havia festa da padroeira e algumas eram liberadas para ir. Fui em duas ocasiões e fiquei apaixonada com tudo. – Olhava as bandeirinhas. – Vamos andar no carrossel? A Luna vai amar.

            – Menina, eu não tenho mais idade para isso. – Pegou uma pipoca. – Será que a dona Del La Cruz está por aqui? – Indagou olhando as pessoas ao redor.

            – Por que se importa com isso? – Questionou aborrecida. – Prefiro até que não venha.

            – É que quando fui levar o chá que a modelo pediu, ouvi ela dizendo que preferia ficar no quarto com a patroa. – Confidenciou.

            Gabriele franziu o cenho.

            – Não me importo com o que elas fazem, Lia, prefiro que não me fale sobre isso. – Respondeu aborrecida.

            A cozinheira estranhou a forma que a jovem falou.

            – Brigaram de novo?

            A neta de Barnard não respondeu de imediato. Parecia tentar focar nas pessoas que ali estavam. Viu algumas crianças correndo e brincando perto dos parques. Acomodou Luna sobre um banco que vendia frutas, mas que tinha uma parte vazia. Olhou com desgosto as bochechas rosadas sujas do corante de açúcar.

            – Não! – Respondeu por fim. – Graças a Deus me ignorou toda a viagem.  Nem eu lhe chamei a atenção.

            – Já contou a dona Branca que ela te proibiu de estudar?

            – Não, não vou falar, não quero que haja mais problemas por minha culpa. – Pegou Luna nos braços. – Vamos para o carrossel.

            Lia nem teve como se negar, pois a jovem já seguia em direção ao brinquedo.

 

 

 

            Ana sentia o corpo perdendo as forças, enquanto Paloma lhe tocava de forma magistral.

            Cerrou os dentes para não gritar em prazer.

            A amante acomodou-se em seu peito, enquanto lhe fazia carinhos em seus cabelos.

            – Eu disse que você ganharia muito mais ficando aqui. – Beijou-lhe a mão. – Acho que é por isso que não consigo te deixar, ninguém nunca me fez sentir tanto prazer quanto você, baronesa.

            A Del La Cruz não respondia, apenas permanecia quieta. Ouviu fogos de artifício. Por essa razão não tinha trazido Pandora, pois sabia que era comum os empregados fazerem aqueles barulhos desnecessários. Pensou em proibi-los, mas não o fez, achando melhor não estragar a festa.

            Sentia-se inquieta, ansiosa, desejosa…

            – Estou morrendo de sono… – Paloma a beijou. – Posso dormir ou vai precisar de mim ainda?

            Ana sorriu, enquanto deixava o leito. Pegou o roupão que estava sobre a cadeira, vestindo-o.

            – Descanse, vou tomar um pouco de água e volto logo.

            Deixou os aposentos. O corredor estava escuro, era possível ouvir a música e a felicidade das pessoas. Sabia que já era bem tarde. Branca já devia estar no quarto. Desceu as escadas e foi em direção a cozinha, ficou surpresa ao ver a luz acesa e Gabi sentada lá com uma xícara diante dela.

            Os olhos escuros fitaram a baronesa em seu roupão de seda preta. Prendeu a respiração ao ver como aquela mulher parecia ainda mais bonita.

            Por que se sentia tão incomodada por saber que a modelo estava nos braços da esposa do avô?

            Observou a próprio recipiente do chá, buscando não ter um novo confronto.

            Não conseguira dormir quando voltara da festa e por essa razão decidiu ir até a cozinha e beber algo para relaxar.

            Pensou em levantar-se e sair, mas seria uma boa razão para deixar a Del La Cruz irritada, então continuou no mesmo lugar, pensando em manter total silêncio.

            Ana abriu a geladeira e pegou um pouco de água, bebendo todo o conteúdo, mas não foi embora, ficou lá, observando a Bamberg. Viu-a pela janela dos aposentos com a sobrinha nos braços. Estava tão linda que sentiu vontade de ir até lá para vê-la melhor.

            – E a Luna como se saiu em sua primeira festa? – Indagou, fitando-a.

            A voz baixa e rouca era sempre firme…mas era como se houvesse um timbre que produzia uma melodia.

            – Bem, ela gostou de tudo, principalmente da maçã do amor. – Disse com um sorriso. – Lambuzou-se toda.

            – Não se assustou com o barulho dos fogos?

            – Sim, chorou no início, mas depois pareceu não ficar tão assustada.

            A Del La Cruz fez um gesto afirmativo com a cabeça. Ficaram em silêncio durante alguns segundos e logo a voz da baronesa se fazia ouvir novamente.

            – E você? Gostou de participar da festa? Bebeu do vinho?

            – Achei tudo muito bom…não gosto de álcool…então não provei, ainda me recordo da dor de cabeça que senti ao beber no litoral – Levantou-se. – Bem, vou dormir, está tarde e Luna anda acordando mais cedo.

            Gabriele seguia em direção a porta, mas a filha de Antônio posicionou-se na passagem. Cruzou os braços sobre os seios.

            – Não disse que você já podia ir. – Disse com um sorriso cheio de sarcasmo. – Ainda não terminei…Então não tem permissão para sair…

            Ana observou a camisola que a jovem usava. O modelo era rosa claro, alças finas e um decote delicado. Não era grande, ficava no meio das coxas. Não imaginara que a ex-noviça usaria algo tão provocante.

            – Deveria ter vestido um robe sobre sua roupa. – Disse incomodada. – Parece que não sabe como se comportar diante de outras pessoas.

            A Bamberg cerrou os dentes.

            Infelizmente quem arrumara sua mala fora Lia e a cozinheira sempre dizia que devia usar as roupas que Branca tinha lhe comprado, então escolheu as mais sensuais.

            – Não pensei que encontraria a senhora, se soubesse, nem mesmo teria vindo até aqui. – Retrucou irritada. – Preocupa-se sempre com o que visto, parece que estar no seu corpo e não no meu.

            A baronesa não estava acostumada a ser desafiada daquele jeito, ficando furiosa com as palavras que ouvia.

            – Como ousa falar assim comigo?

            – Ousando! – Disse impaciente. – Deixe que eu vá para o meu quarto e pronto, tudo estará em paz novamente… E a senhora retorna para sua…sua…amante? – Indagou com um arquear de sobrancelha mostrando sua total ironia. – Podemos ficar em paz.

            Ana a segurou pelos ombros, mas de forma delicada, depois ajeitou alguns fios que tinham se soltados do penteado.

            – Não me desafie, freirinha, não faça isso… – Sussurrou em seu ouvido. – Apenas aceite o que eu digo…será mais fácil…muito melhor…Não sabe como me inflama sua petulância.

            A Bamberg arrepiou-se com os lábios em sua orelha. Era como se houvesse uma força que a dominava naquele momento.

            – E o que devo fazer? – Indagou baixinho. – Aceita-la como senhora e dona de tudo e de todos?

            Umedeceu os lábios e Ana não resistiu. Aproximou-se mais, passando a língua pela cicatriz que se desenhava lá. Achava-a linda e em seus pensamentos não saia o delicioso sabor que já tinha provado.

            -- Às vezes tenho a impressão que você é um anjo... – Encostou a testa na dela. – Mas em outros momentos penso que seja uma feiticeira...

            Gabi olhava-a embevecida, enquanto ouvia a música que tocava na festa, tentava não perder a calma, enquanto sentia o corpo da Del La Cruz tão próximo do seu.

            -- Volte para seu quarto, senhora...

            -- Minha presença é tão ruim assim? – Perguntou em um sussurro. – Não me suporto?

            A Bamberg baixou os olhos, pois olhá-la tão perto era uma verdadeira tortura.

            Observou o indicador começar a tocar seu lábio superior. Fazia-o com cuidado, delicadamente como não imaginava que ela conseguisse ser.

            Sem conseguir raciocinar, Gabi segurou a baronesa pela nuca e logo unia as bocas de uma forma completa. A Del La Cruz circunda-lhe a cintura, enquanto fechava os olhos e mergulhava no delicioso beijo. Capturou-lhe a língua, sugando-a, desejando devorá-la.    Movia-se contra ela, sentindo o corpo ansiar pela garota.

            Em sua vida toda, nunca sentira aquele descontrole diante de ninguém, mas quando se tratava da neta do marido tudo parecia diferente. Chegava a sentir-se dolorida só em pensar em tocá-la.

            Desceu as mãos por suas costas, acariciando seus ombros, depois foi baixando até chegar aos seios que já pareciam prontos para si. Usou o polegar para incitá-los por sobre o tecido, ouvindo-a gemer contra sua boca. Adorou ouvir o som que ela produzia.

Gabriele segurava-lhe o rosto, parecendo não querer que o momento fosse quebrado. Depois fez carinho em seus braços, cintura e desajeitadamente descia para suas nádegas, acariciando-a, sentindo-a firme, bem desenhada sob seus dedos.

De repente um barulho de fogos.

            Gabriele conseguiu despertar, afastando-se. Os olhos escuros estavam arregalados, parecia ter saído de um transe.

            Limpou os lábios com as costas da mão.

            – Como pode fazer isso? – Indagou furiosa. – Não ouse mais me tocar! – Apontou-lhe o dedo indicador. – Não se contenta com sua amante? É uma doente que não consegue satisfazer sua safadeza com apenas uma – Dizia com a respiração acelerada. – Se voltar a fazer isso, falarei com o meu advogado e vou acusá-la de assédio, sua devassa.

            -- Você quem me beijou, freirinha... – Disse impaciente.

            -- Afaste-se de mim... – Implorou. – Não volte a encostar em mim!

            Ana suspirou, enquanto a jovem deixava a cozinha.

            Sabia que a garotinha boba também sentia desejo, caso fosse diferente, não teria lhe tocado.

            Umedeceu os lábios sentindo o sabor da boca dela...era doce como um pecado...

            Seu corpo queimava de desejo, ainda mais diante do toque desajeitado que recebera. Ansiou por continuar, por tê-la em seus braços totalmente entregue. Beijá-la toda e só parar quando saciasse toda sua fome.

            Ouviu passos e viu a administradora aparecer.

            – Estou morta, cansada…quero dormir por três dias. – Dizia a mulher procurando algo para comer. – Bebi apenas uma taça de vinho e fiquei tonta. – Sentou-se. – Rogério precisou ser carregado para o quarto.

            Ana continuava a beber a água.

            – Deveria ter participado junto com a Paloma… – Relanceou os olhos. – Esqueci que sua amante não gosta de se misturar com o povão.

            A Del La Cruz apenas exibiu um sorriso, sabia que a Wasten não simpatizava com a modelo, mas não se importava com isso.

            – Tínhamos outras coisas para fazer…– Passava o indicador pela borda do copo, enquanto mordiscava a lateral do lábio inferior. – Já organizou tudo para a minha viagem?

            – Sim, porém pensei se não seria melhor seguir em uma aeronave maior, não gosto que vá para longe nessas latas de sardinhas…– Pegou uma banana na fruteira. – Tem certeza de que vai fazer essa viagem agora? – Indagou preocupada.

            Branca sabia que mesmo que ela não falasse, ainda não estava recuperada dos últimos acontecimentos, ainda mais pelo fato do assédio dos jornalistas estarem cada vez maior. Quem divulgara as informações não parara, continuava fazendo e expondo ainda mais conteúdos que fomentava a curiosidade das pessoas.

            – Preciso me encontrar com os empresários, então não vejo motivos para não ir. – Acomodou-se. – E como a freirinha se saiu na festa? – Questionou tentando não mostrar muito entusiasmo. – Não ficou com aquela cara de espanto não?

            – E por que não lhe perguntou? Pensei que estivessem aqui na cozinha juntas…– Fitou-lhe os olhos. – E pelo que vi, você a irritou, estava com o rosto vermelho, parecia uma dessas maçãs…fiquei curiosa…o que você fez agora?

            Ana umedeceu os lábios, mas não disse nada.

            – Vou voltar para o meu quarto. – Levantou-se. – Descanse, pois logo vai amanhecer.

            A administradora fez um gesto afirmativo com a cabeça, enquanto via a filha de Antônio deixar o espaço.

            Tamborilava os dedos na mesa.

            Podiam falar que estava louca, mas nada lhe tirava da cabeça que havia algo estranho entre a baronesa e neta do barão. Sentia quando ambas estavam juntas, via os olhares de Gabi e chegara a flagrar Ana com um brilho diferente nos olhos azuis.

            Será que a freirinha estava interessada na bela Del La Cruz?

            Esboçou um sorriso. Não podia negar que formariam um bonito casal.

            Riu alto e cobriu a boca com a mão.

            Levantou-se. Precisava dormir, pois um pouco de álcool já a estava fazendo delirar.

 

 

 

 

            Os visitantes da fazenda dormiram até tarde. Passava do meio-dia e ainda nenhum tinha sido visto, exceto a baronesa que despertou cedo e estava na piscina. Não conseguira dormir depois de retornar aos aposentos. Em determinado momento, acabara despertando a amante para poder relaxar, sentir o corpo cansar. Quando os raios de sol já começavam a aparecer, vestiu-se e foi passear a cavalo. Fora até as plantações e falou com alguns trabalhadores. Os cafés já seguiam para serem embaladas e levadas para as fábricas. Alguns caminhões já tinham levado algumas caixas.

            Viu Lia aproximar-se com uma bandeja.

            Nadou até a borda, fitando a empregada.

            – Pensei que demoraria mais a acordar.

            A cozinheira esboçou um sorriso.

            – Não era para tanto também, afinal, nem fui dormir tão tarde. – Entregou-lhe um copo com suco. – Eu tenho minhas obrigações com a senhora.

            Ana bebericou um pouco do líquido. Parecia saborear a bebida de laranja.

            – As empregadas da fazenda já estão preparando o almoço e um boi foi morto, então vai ter muito churrasco. – Terminou o suco, entregando-lhe o copo. – Sabe se a Paloma já acordou?

            – Eu estive no quarto da senhorita, fui levar um desjejum, ela estava tomando banho, porém não sei se vai descer, reclamou de enxaqueca.

            Ana levantou a cabeça para fitar as janelas dos quartos.

            – Dona Branca disse que vai passar o dia na cama. Seu Rogério está com uma terrível ressaca.

            – Pelo visto só eu aproveitarei o dia.

            Lia fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            – Ah, a Luna já está acordada. – Riu. – A senhorita Gabriele estava tentando fazê-la comer algo, pois a garotinha parecia querer explorar o novo ambiente.

            A baronesa suspirou, mas não falou nada, apenas atravessou a piscina nadando.

 

 

 

            A Bamberg seguiu para a varanda do quarto com a sobrinha da Del La Cruz. Tentava fazê-la comer a papinha que ela adorava, mas naquele dia não parecia tão fácil assim. Luna estava chorona e irritadiça. Sentou-a na cadeirinha, depois parou em frente a menina e começou a examinar a boca da pequena e logo viu a causa do péssimo humor: um dente despontava, era possível ver apenas a sombra, mas já estava lá.

            Luna não parecia ter gostado da intromissão, mordendo o dedo da Bamberg.

            – Ora, que malvadinha! – Repreendeu-a, enquanto observava o pequeno machucado. – Não precisa ficar assim.

            A criança começou a chorar, gritava a plenos pulmões.

            Gabi a colocou nos braços, tentando confortá-la.

            A porta abriu-se e Lia entrou.

            – O que houve?

            – Está irritada, vi que tem um dente nascendo. – Falava apreensiva. – Vou colocar o remédio para que não seja tão dolorido. – Apontou para o cômodo. – Pode pegar para mim? Está dentro da bolsa rosa.

            A cozinheira apressou-se e logo retornava.

            – Segure-a, enquanto coloco. – Entregou-lhe a garota. – Espero que não me morda novamente.

            A pequena agora chorava, mas o fazia baixo. O rosto estava todo vermelho e os cabelinhos colados à face.

            Devagar, a neta do barão colocou a pomada na gengiva da sobrinha da Del La Cruz.

            Luna voltou a chorar, estendeu os braços e a Bamberg a segurou novamente. A menina deitou a cabeça no ombro da babá, enquanto as lágrimas banhavam-lhe a face.

            – Tadinha, Lia, me parte o coração vê-la assim.

            – Eu imagino, também morro de dó. – Segurou-lhe a mãozinha, beijando-a. – Por que não vai para área da piscina, ela gosta muito de água, talvez a ajude a relaxar.

            – Vou não! – Negou com veemência. – Não tenho nenhum interesse em ver a tal Ana Di Pace.

            – Discutiram? – Questionou curiosa. – Mas como? A tal modelo nem a deixa sair da cama, como podem ter brigado?

            A Bamberg suspirou exasperada.

            – Eu não gosto da baronesa, não a suporto, odeio quando ela está perto…

            A cozinheira achou estranho a explosão, mesmo sabendo que a jovem tinha seus problemas com a empresária.

            – Pensei que já estava de bem… – Arrumou os cabelos de Luna. – Sabe que achei que você não pareceu se importar com o fato da senhora ter sido internada em um hospício.

            – Eu não acho que ela seja louca, mas tenho certeza de que é ruim, isso ela é.

            Lia fez um gesto afirmativo com a cabeça, enquanto já começava a falar em tom mais baixo.

            – Quando seu avô era vivo em algumas das discussões que sempre ocorria com a esposa, eu o ouvia gritar que o pai da senhora tinha internado ela no lugar lá porque descobriu que ela estava tendo um caso com outra garota.

            Os olhos escuros pareceram bem maiores naquele momento.

            Não podia negar que tinha muita curiosidade sobre os fatos relacionados à baronesa, porém tudo o que conseguira descobrir fora as manchetes que continuava a acompanhar nas redes sociais, porém sabia que tudo não passava de invenções e até aquele momento nada concreto fora dito, exceto a entrevista do senador. Mesmo assim não conseguira sentir muita sinceridade nas suas palavras.

Tentava não pensar nesse assunto, ainda mais no fato de Ana ser proibida de ver a própria mãe, não queria penalizar-se, tampouco sentir empatia, pois temia que isso a aproximasse da mulher.

– Acha que isso é verdade? Se for, foi muita crueldade…

– Eu não sei, mas pelo que sei, o tal pai é muito religioso, um desses líderes de igreja…

– Não tive coragem de questionar a senhora Branca sobre isso, mas eu acho que ela poderia esclarecer…Mas não acho que deseje falar…

– Eu fico pensando em como deve ter sido horrível para a minha patroa…era uma menina quando foi jogada naquele lugar. – Suspirou. – Ela se casou com o barão para sair de lá, mas acho que foi pior.

-- Por quê? Ele era ruim com ela?

Lia fez um gesto afirmativo com a cabeça.

-- Era sim, menina, gostava de exibi-la para todos... – Ficou calada de repente como se tivesse percebido que falou mais do que devia. – Acho melhor mudarmos de assunto.

Gabi fitou a área da piscina e viu a bela Del La Cruz lá. Parecia perdida em seus pensamentos, estava sentada na borda e tinha um olhar vazio. Sempre que a via assim, sentia um desejo tão grande de abraçá-la, de apoiar sua cabeça em seus ombros e acariciar as madeixas ruivas. De ouvir o som do riso e ficar contemplando o olhar perdido.

Meneou a cabeça para livrar-se dessas ideias que pareciam querer tomar forma em sua mente.

– Mas eu acho que ela está bem, afinal, está com a tal modelo.

– Eu acho que ela não está bem, Gabi, acho que apenas tenta mostrar que nada a afeta, então usa a arrogância para afastar quem realmente se preocupa com ela. – Suspirou. – Vou para a cozinha, tento algumas coisas para fazer. Se precisar de mim, basta chamar. – Beijou a cabeça de Luna que agora parecia mais calma.

A Bamberg voltou a observar a solitária mulher, sabendo que não podia de forma alguma se permitir sentir o que a perseguia nos últimos dias.

 

 

 

 

 

A noite já chegava e a festa iniciava.

Uma banda tocava no palco que fora montado. Havia pessoas vindas da cidade, fora os moradores locais. Algumas autoridades estavam presentes e ficou para Branca recebê-las.

Ana Valéria estava no quarto, arrumava-se diante do espelho. Usava um vestido vermelho que chegava ao meio das coxas. Calçava botas de couro marrons. Os cabelos estavam trançados em estilo nagô. Terminava a maquiagem.

– Eu não acredito que vai participar dessa festa. – Paloma dizia aborrecida. – Sabe que não gosto de ficar perto desse tipo de gente.

– Por isso não te chamei. – Virou-se para a mulher. – Eu irei e você fica aí me esperando.

– Pelo menos não há ninguém capaz de te chamar a atenção, caso contrário, iria contigo. – Beijou-lhe os lábios. – Não demore. – Arrumou-lhe os cabelos. – Está tão linda que tenho vontade de jogá-la na cama e…

– E nada, querida! – Sorriu. – Nos vemos mais tarde.

Paloma apenas assentiu, vendo-a deixar o quarto.

Ana seguiu pelo corredor, parando no quarto de Gabi. Tinha pedido para Lia avisar que levaria Luna à festa, que a babá arrumasse a garotinha.

Bateu, mas como não recebeu resposta, entrou nos aposentos.

 

 

 

Durante todo o dia, a Bamberg tinha cuidado de Luna. A garotinha dormira muito pouco, parecia bastante impaciente, não aceitando ficar nos braços de ninguém, apenas da sua amada babá. A jovem não tivera tempo de fazer nada. Apenas permanecera lá, cuidando da criança durante todas aquelas horas.

Passava das seis da tarde quando Branca fora até lá, oferecendo para levar a pequena para passear no parque, assim a neta do barão poderia tomar um banho e se arrumar para participar da segunda noite de festa.

Demorou um pouco sob a ducha, pois se sentia cansada, então demorou para relaxar. Só agora deixou o banheiro e caminhava para o quarto quando viu a baronesa parada lá, fitando-a.

Apertou bem a toalha que cobria o próprio corpo, parecia querer ter certeza de que não ficaria despida diante da mulher que lhe fitava.

Olhou-a e sentiu aquele costumeiro arrepio.

Como podia estar ainda mais bela?

Observou o vestido colado ao corpo feminino, o decote que fazia os seios parecerem ainda mais bonitos.

Cruzou os braços em posição defensiva.

– O que faz aqui?

– Vim buscar a Luna, pensei que Lia tinha te avisado. – Respondeu aborrecida pela forma que fora recebida.

Não gostara do jeito que a garota falara consigo, ainda mais por até agora não ter agido de forma arrogante.

– Pensei que a senhora Branca tinha te avisado. – Tentou usar um tom mais brando. – Veio buscar sua sobrinha, faz um tempo que saíram.

Gabi trazia um frasco de hidratante nas mãos e pelo seu nervosismo, deixou-o cair.

Ana Valéria em passos largos chegou perto o suficiente, pegando o objeto.

A Bamberg não moveu um músculo, enquanto a outra lhe entregava o produto.

Observou os olhos azuis…

– Obrigada… – Disse baixinho.

– Está com medo de mim? – Perguntou divertida. – Está tremendo…

A neta do barão deu um passo para trás.

– Deveria estar? – Indagou levantando a cabeça. – Acho que já disse a senhora o que farei se ousar se aproximar mais do que deve.

Um sorriso desenhou-se na bonita boca da baronesa.

– E você acha mesmo que isso me deteria se eu quisesse me aproximar? – indagou arqueando a sobrancelha. – Você é muito inocente, freirinha. – Mordiscou a lateral do lábio inferior. – Talvez devesse pensar em algo para que não cedesse também, afinal, nas duas vezes que aconteceu, você não parecia indiferente...Acho que até gostou...

A baronesa viu as bochechas da jovem corarem.

– Relaxe, não vou fazer nada. – Levantou as mãos. – Vim apenas buscar a Luna, mas se ela não está, nada tenho para fazer aqui. – Esboçou um sorriso. – Não tenho nenhum interesse em ti, aquilo que aconteceu foi algo sem importância, impulso...Então apenas esqueça, pois não vai mais acontecer.

Gabi não sabia o motivo, porém não gostara de ouvir aquilo.

 Viu-a caminhar até a porta, mas não deteve sua curiosidade.

– Espera…

Ana a fitou por sobre os ombros.

– Quero te fazer uma pergunta…posso?

A baronesa voltou, ficando a alguns centímetro da outra.

– Faça!

A ex-noviça fitou-lhe os olhos. Sabia que não devia falar sobre aquele assunto, mas ansiava por saber a verdade.

– A senhora foi internada no manicômio porque estava tendo um caso com uma garota?

Foi possível ver o maxilar da ruiva enrijecer, enquanto o  olhar escurecia. Pensou que não responderia ou que esbravejaria, mas não foi isso que aconteceu.

– O que eu vou ganhar se te responder essa pergunta? – Aproximou-se mais. – Sacio sua curiosidade e você me dá algo em troca…

– E o que quer? – Questionou confusa.

Ana encarou-a.

– Quando eu estava perto de completar quinze anos conheci uma jovem…ela era linda… – Falava como se revivesse a cena. – Me apaixonei…Eu seria capaz de tudo para ficar ao lado dela…Em um dia, fui até a casa dela e me entreguei, deixei que o meu amor dominasse minhas ações…Ela era tudo para mim, tudo o que eu sonhei...parece bobagem, afinal, eu era muito jovem, porém eu a amava...

Gabi conseguia ver os olhos brilharem em lágrimas e desejou consolá-la, mas algo na expressão da baronesa a deteve.

– Foi a primeira vez que me entreguei…queria ficar com ela, estava disposta a tudo…– Umedeceu os lábios. – Mas eu fui tola…minha amada apenas queria ganhar dinheiro comigo…filmou tudo, tirou inúmeras fotos e enviou para o meu pai…Ele me bateu, espancou-me e depois me internou naquele lugar…

A Bamberg viu a lágrima solitária descer…

– Na discussão, eu tentando me defender, minha mãe foi atingida…ficou em coma…

A neta do barão aproximou-se para consolá-la, mas não havia mais a tristeza naquele olhar. Foi empurrada contra a porta fortemente, ficando sem ar.

– Agora eu quero meu pagamento.

Antes que a Bamberg pudesse responder, a boca fora tomada em um beijo. Tentou empurrá-la, cerrando os dentes para não permitir o acesso, então Ana mudou a tática. Foi mais delicada. Usou o polegar para desenhar a boca bonita, enquanto fitava-lhe os olhos escuros. Posou os lábios em seu pescoço, enquanto Gabriele sentia as forças lhe abandonarem. Segurou-lhe o rosto e cedeu ao beijo que também ansiava.

As bocas uniram-se sem pressa daquela vez. Ana parecia buscar algo naquele toque, parecia perseguir algo que ainda não sabia o que era, mas que deseja muito. Gemeu ao senti-la lhe capturar a língua. Foi tão gentil que a deixou mais ansiosa. Abraçou-lhe a cintura, trazendo-a mais para perto.

A jovem acariciou as madeixas ruivas, deixando-se ficar ali, sendo beijada, mesmo que soubesse que isso não era certo. Nunca pensara que houvesse no mundo uma sensação tão poderosa como aquela que sentia quando aquela mulher a tocava. Era como se todas as forças do universo estivessem presas naquelas sensações.

O interlúdio cessou e lentamente, abriu os olhos e viu a Del La Cruz a lhe fitar. Sentiu aquela sensação da pele da face queimando.

– Você paga muito bem, senhorita. – Piscou. – Tenha uma ótima noite.

 A neta do barão umedeceu o lábio inferior. Parecia que de repente eles tinham ficados secos, como se precisassem da boca da baronesa para umedecerem.

O que estava acontecendo consigo? Parecia que tudo tinha mudado em sua vida em poucos dias, como se um feitiço tivesse sido jogado sobre si.

 

 

 

A música parecia ter contagiado os presentes. As pessoas dançavam e riam. O vinho estava sendo dado gratuitamente.

As crianças corriam no pátio, participavam das brincadeiras e corriam para os brinquedos. Havia barracas de tiro ao alvo, pescarias, argolas, fora as deliciosas maçãs do amor que estavam sendo vendidas.

Ana estava com Luna nos braços e a menina parecia menos irritada naquele momento. A tia já tinha ganhado um enorme urso e a garotinha parecia ter ficado muito feliz.

Branca pediu para Lia guardar a pelúcia e logo a pequena Del La Cruz começou a chorar e logo Ana teve que lhe dar um doce para que não continuasse a esbravejar.

– Acho que ela deve ter puxado a você. – A administradora provocou.

– Não me lembro de ter feito esse tipo de escândalo…acho que não verdade é a babazinha que está mimando muito essa menina.

– Falando nela, vejam só quem apareceu…

Ana levantou cabeça e viu a Bamberg do outro lado. Estava distraída vendo um show de mágica que começava agora. A neta do barão era muito bonita. Estava usando um daqueles macacões que devia ter sido comprado por Branca. O tecido não era jeans. Vestia uma camiseta por dentro azul. Calçava sapatos fechados. Os cabelos estavam presos em um rabo de cavalo.

Pensou em aproximar-se, porém não o fez.

Havia algo naquela garota que a perturbava mais do que gostaria de admitir. Tinha a impressão de que aqueles olhos cinzas conseguiam ver até mesmo sua alma…

Nem entendia o motivo de ter lhe contado sobre o motivo de ter sido internada em um manicômio. Nunca falara abertamente isso com ninguém, exceto com Branca que sabia de tudo.

Sentiu os dedos pegajosos da sobrinha na face.

– Acho que você vai ficar mais doce agora. – A administradora riu. – Chocolate e maquiagem.

             – Você só ri, não acho que conseguiria ser uma mãe, por isso não teve filhos.

          – Tive uma já grande, essa me dá muito trabalho. – Falou carinhosa, enquanto dava um beijo na face da Del La Cruz. – Vou chamar a Gabi, a menina está querendo a “mama” por perto.

              Ana não respondeu, apenas continuou passeando com a criança. Levou-a até um carrossel, sentando-se em um cavalinho e ficou segurando a pequena, vendo a menina rir, gargalhava de felicidade.

 

 

 

            A jovem seguiu com Branca em busca da baronesa. Não demorou para vê-la com Luna em um dos parquinhos.

             A Bamberg ficou parada, olhando a cena que se desenrolava a sua frente. Não imaginava que veria algo assim. Ana Del La Cruz parecia uma criança ao lado da sobrinha. Ambas riam, enquanto o carrossel girava e os animais imitavam sons característicos.

             A administradora usou o celular para registrar, parecia bastante emocionada com o que presenciava.

              – Quem não sabe, pensaria que Luna saiu de dentro da baronesa…– Gabi comentou admirada.

              – Você está certa…acho que nunca a vi tão em paz…sempre há tanta dor e arrogância…

            A neta do barão pensou em entrar na conversa que ficara sabendo mais cedo, porém acabou desistindo, pois temia que a mais velha estranhasse ela saber disso. Como explicaria que precisara dar algo em troca pela informação?

              Colocou as mãos no bolso, apenas observando tudo em silêncio.

            – Ora, ora…parece que a modelo decidiu cuidar da propriedade…

              O comentário de Branca fez a jovem virar a cabeça e ver Paloma. Parecia buscar pela amante.

              A neta do barão engoliu em seco.

              Não acreditava que tinha permitido que Ana Valéria lhe beijasse, ainda mais por saber que estava nos braços daquela mulher.

              – Ela deve ter ficado com medo, afinal, está cheio de gente bonita aqui…vi várias vezes a sobrinha do prefeito de olho na Del La Cruz…ela deve ter visto lá do quarto.

              O carrossel parou e Ana teve trabalho em tirar a sobrinha, mas conseguiu distrai-la com o relógio que trazia no pulso. Seguiu e viu Branca e Gabriele lá, observando-as. Fitou a neta do barão e observou como corava.

             – Ora, a freirinha resolveu aparecer na festa… – Comentou quando se aproximou.

              Luna jogou-se nos braços da babá.

             – Vai te sujar todinha como fez comigo. – Mostrou o vestido e o rosto de chocolate.

            – Tome, limpe a face. – Branca lhe entregou um guardanapo. – Mas acho que deveria ficar assim, está tão docinha, não é, Gabi?

               A Bamberg não falou nada, concentrando-se na criança que queria pegar um balão.

             O vendedor entregou uma a menina que parecia muito feliz com o presente.

              – Amor, eu estava te procurando.

              Paloma aproximou-se, segurando o braço da amada.

            – O que houve com sua roupa? Está suja.

            A neta do barão olhou a forma possessiva que a outra chegara agarrando a empresária. Queria sair de lá, mas não podia simplesmente se afastar sem uma desculpa, por essa razão tentava não prestar atenção no que se passava.

              – Não foi nada sério, apenas a Luna estava com as mãos sujas e decidiu passar no meu vestido. – Ana respondeu, enquanto pegava uma maçã do amor da bandeja de uma senhora que passou vendendo. – Mas não vejo problema.

             – Melhor subir e trocar de roupa, como vai ficar perto das pessoas importantes assim?

             – Eu não vejo problema nenhum! – Disse com uma piscada. – Vou ver se o vinho está bom hoje.

             Paloma não parece ter gostado de ficar sozinha e foi atrás da filha de Antônio.

             – Eu jamais me humilharia assim por ninguém. – Branca comentou. – E o pior é que acredita que vai conseguir prender a Ana só pelo sexo. – A administradora falava e prestava atenção nas reações da neta de Bernanrd. – Como se isso funcionasse com ela, conheço-a bem, não se importaria em trocá-la por outra em dois segundos.

             Gabi respirou fundo.

            – E a senhora acha esse comportamento conveniente? Acho que é uma safada, deveria ter é vergonha na cara e não viver se deitando com tantas mulheres.

             A Wasten esboçou um sorriso.

            – Acho que sexo foi o caminho que ela buscou para tentar se livrar das dores…– Observou o marido. – Sexo não é ruim, querida, claro que você não pode pensar nisso agora, mas quando provar, você vai gostar…

          A Bamberg não respondeu, ficando sozinha com a criança, pois a administradora também se afastou.


 

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