A víbora do mar - Capítulo 37 - O exame


 

 Passava das onze quando o carro estacionou diante da cobertura. Samantha estava retornando da cidade costeira. A investigação continuava, porém não da parte da polícia, pois essa parecia não ter muito interesse em elucidar o caso. Percebera que o delegado focara todas as suas atenções em Belinda, como se ela tivesse algo com o ocorrido. Quando fora até lá, também parecera importar-se mais com quem era a Lacassangner que com o possível assassino.

Entrou no elevador.

Viu o próprio reflexo no espelho. Estava um pouco pálida e também com olheiras, pois pouco dormira nos últimos dias.

Massageou as têmporas.

Ainda pensava no telefonema da Ester, de ter comentado sobre o encontro da Mel com o ex-noivo.

Não podia negar que isso a incomodara bastante.

Observou a tela do celular. Tinha ligado várias vezes para a esposa e não fora atendida, então deixara de tentar manter contato.

A porta abriu-se.

Precisava de um banho, talvez dormir um pouco.

           A Sheika não parara nenhum momento durante esses dias. Sabia que as provas apontavam para um dos navios que fora do seu pai.

              Entrou no apartamento e viu o olhar surpreso de Eliah em sua direção.

            O homem sentiu um frio na espinha em ver a filha do Serpente. Naquela manhã tinha falado com Marina, pedira para que convencesse a Santorini a retornar à cobertura, assim se resolveria com a Víbora, porém só recebera respostas negativas.

             – Não tinha avisado que retornaria… – Ele disse relutante. – Aconteceu algo?

            – Sim, não tive tempo, mas aqui estou porque foi preciso. – Olhava tudo ao redor. – Onde está a tenente? – Sentou-se. – Foi ao hospital ou está nos aposentos? – Disse fitando a escada.

             O pirata torcia as mãos. Tinha decidido não contar a história para a filha de Otávio, enquanto ela estava fora, Marina tinha pedido que guardasse segredo por alguns dias, porém agora teria que contar tudo.

            Os olhos azuis estreitaram-se desconfiados.

            -- E então?

            Eliah soltou um longo suspiro, depois cruzou os braços.

            – A senhora não está aqui.

            – Saiu?

            O pirata fez um gesto negativo com a cabeça.

            – Não, ela retornou para casa do avô há alguns dias… -- Disse baixinho.

           A morena estreitou os olhos.

           – Perdão, Sam, por não ter falado, mas você estava tão preocupada com a situação que estava acontecendo que achei melhor não falar nada.

           – O que se passou? – Indagou por entre os dentes, levantando-se. – Por que não me contou? – Perguntou irritada.

           Eliah foi até a escrivaninha e trouxe um envelope entregando à mulher.

           Samantha abriu o invólucro e logo via os papéis do divórcio.

            O que havia acontecido?

            Tentara falar com a jovem várias vezes, até deixar de ligar, apenas esperando para conversar quando retornasse.

            Samantha não falou nada, apenas lia as palavras, deixou a papelada sobre a poltrona e saiu.

             O pirata ficou parado, apenas pensando, temia o que poderia acontecer agora. Sabia que ambas as mulheres se gostavam, porém havia muito mais entre elas para separá-las. 

                

            

            Mel via o cardápio. Estava faminta, pois não comera nada durante o dia.

 Sua perna continuava com a bota. Continuava usando as muletas, mas não precisava de tanto repouso como antes.

A atendente aproximou-se, entregando-lhe o pedido.

-- Deseja mais alguma coisa, doutora?

-- Por enquanto não! – Respondeu com um sorriso.

Ouviu o bip do celular, viu a mensagem de Juan.

Preferiu não responder, não estava interessada em encontra-lo.

Também havia mensagens do advogado sobre o divórcio. Os papéis já tinham sido enviados para a sheika.

            Bebeu um pouco do suco.

             Logo retornaria à mansão, pois já tiveram a conversa com o médico, apenas parara para fazer um lanche. 

               Há dias não sabia da pirata. Decerto, ela não se importara por sua ausência, devia ter ficado feliz por ter se livrado daquela relação forçada. Agora poderia seguir com seus casos, suas amantes...

              Já tinha dado entrada no processo de divórcio. O melhor seria acabar com tudo aquilo o mais rápido possível.

                Lembrou-se da caixinha que ainda não tinha conseguido abrir.

               Usava o celular para discar o número da casa de Sir Arthur quando sentiu um aroma conhecido.

                Ao levantar a cabeça, deparou-se com a Lacassangner parada a lhe fitar.

                Sentiu um arrepio na nuca.

               Quanto tempo demoraria para deixar de ter aquelas sensações quando via aquela mulher?

            Pediu perdão a Deus por seus pensamentos pecaminosos. Precisava deixar de querê-la, era imperativo que deixasse de ansiar por ela.

            Desviou o olhar por alguns segundos, mas depois voltou a fita-la.

            Os cabelos negros estavam soltos. Usava os óculos de grau. Um sobretudo negro cobria seu corpo até o calcanhar. Por baixo usava calça de cintura alta com um cinto e uma camisa de golas e botões na cor branca. "A pirata elegante".

               Samantha tinha retornado há quase uma hora. Mal tinha entrado em casa, Eliah contara que sua esposa tinha retornado para a casa de Sir Arthur. 

             Ficara furiosa diante do ocorrido e seguira imediatamente até a mansão do almirante, então Marina lhe falara onde a militar estava.

          Antes que Mel pudesse dizer algo, a Lacassangner sentou-se.

            – Espero não estar incomodando, tenente.

            A Santorini mirou a face da filha do Serpente. A voz baixa e controlada parecia tranquila.

            Estava mais magra e tinha um semblante cansado como se há tempos não descansasse, mesmo assim, nada disso era capaz de tirar a beleza que a mulher sempre mostrava.

            Soltou um suspiro de frustração.

            Não queria vê-la, não desejava voltar a tê-la tão perto de si.

            -- Fiquei surpresa quando retornei e soube que tinha deixado a cobertura. – Disse, fitando-lhe. – Fugiu enquanto eu não estava...

            A militar parecia surpresa, afinal, achava que ela ficara sabendo no mesmo dia que fora embora.

            -- Poderia ter dito naquela noite, teríamos conversado e entrado em um acordo...

            -- Você viajou e eu não pude falar nada... – Disse simplesmente. – Percebi que nada funcionaria entre a gente, era como se estivéssemos em mundos opostos, por isso decidi facilitar a sua vida e encerrar esse casamento que nunca devia ter acontecido.

            Os olhos azuis pareciam penetrar os dourados com uma força extrema.

            -- Engraçado que antes eu tentei até a anulação e você não aceitou...Mudou tão rápido... – Tocou-lhe a mão.

            A militar observava as carícias que lhe fazia nos dedos... Puxou-a, não queria ser tocada.

            -- Porque eu pensei que poderia funcionar... eu queria que a paz reinasse, desejava isso mais que tudo, porém percebi que há outros meios para conseguir, então resolvi fazer o que você tanto queria... – Mordiscou a lateral do lábio inferior. – Não sei o motivo de ter vindo aqui reclamar quando você sempre ansiou por esse divórcio.

            -- Não vim reclamar, Santorini, apenas queria entender suas razões, mas percebo que não vai falar...Bem, não se preocupe, vou assinar o seu divórcio. – Exibiu um sorriso. – Já tinha dito antes e repito, prefiro tê-la como amante em minha vida.

            -- Nunca seria sua amante!

            -- Você já disse “nunca” algumas vezes e já transou até apanhando na cara.

            O vermelho cobriu a face da tenente.

            -- Como ousa ser tão desavergonhada? – Levantou-se.

            Samantha segurou-lhe a mão, fazendo-a sentar.

            -- Afaste-se de mim, Víbora!

            A morena beijou cada um dos dedos da esposa.

            -- Em breve vamos acertar nossas contas! – Disse, levantando-se. – Assinarei o divórcio, vamos nos separar “no papel”...

            Antes que Mel pudesse falar algo, viu a esposa afastar-se com aquele ar de superioridade, agia como se nada nem ninguém a atingisse, como quando a tinha visto pela primeira vez.

 

 

            Cristina chegou à cobertura ao cair da noite. Tinha se comunicado com a amiga algumas vezes, porém só agora pudera retornar e visitar a jovem. Tivera que viajar com a tia para acompanha-la em alguns exames de rotina, aproveitando a licença, podendo só agora ir à capital.

            Recebeu um afetuoso abraço de Marina e não demorou para ver Mel vir ao seu encontro.

            Estreitou-a em seus braços, depois a encarou:

            -- Acho que não posso ficar muito tempo longe, pois vossa pessoa já começa a fazer besteiras. – A fisioterapeuta acusou-a.

            -- Acredito que essa frase é minha, cara amiga.

            Seguiram para a sala de vídeo.

            A babá tinha arrumado o lugar como quando faziam quando eram adolescentes e passavam as férias ali.

            Havia um colchonete no chão, almofada, e alguns aperitivos tinha sido preparado.

            Mel foi a primeira a acomodar-se, sentando-se com as costas encostadas nos travesseiros.

            Usava pijama composto de blusa de seda com botões e short azuis.

            -- Deixe que eu veja como está essa tua perna...Não confio nos seus cuidados, mesmo sendo uma médica.

            A tenente relanceou os olhos, mesmo assim permitiu que a outra lhe examinasse.

            Retornaria ao hospital dentro de poucos dias, não usaria mais a bota, mas ainda deveria andar com as muletas.

            Antes, aquele detalhe a incomodava, porém depois dos inúmeros acontecimentos, nem mesmo pensava na provisória deficiência.

            -- Teve sorte de não ter sido algo mais grave... – Cris falou ao terminar a tarefa, depois pegou uma fatia de bolo. – Sabe que estou chocada diante de tudo o que me contou... – Soltou um longo suspiro. – Mel, isso é uma loucura!

            A militar acabara por confessar toda a verdade à fisioterapeuta. Não conseguira aguentar a insistência da amiga e tivera que contar tudo sobre a história que fora dita pelo duque.

            -- Não quero falar sobre isso! – Cortou-a. – Se veio até aqui para isso, digo para voltar para a sua casa.

            Cristina colocou as mãos na cintura.

            -- Está brincando né? Você acha mesmo que vai poder guardar essa história durante quantos anos? A Lacassangner merece saber a verdade, você não pode simplesmente excluí-la da sua vida como se fosse a coisa mais comum do mundo sem lhe dar uma explicação.

            A tenente fitou as próprias mãos durante longos segundos, parecia ponderar.

            -- Ela nem se importou... – Disse depois de alguns segundos. – Ela nem ligou, claro que deve ter ficado satisfeita, afinal, livrou-se de um casamento que nunca desejou... Ainda teve a cara de pau de dizer que vai me prefere como amante... Eu a odeio!

            Cris sentou-se ao lado da amiga.

            -- Mel, você sabe o que andou se passando na vida da Samantha?

            Os olhos dourados pareciam confusos.

            -- No dia que você disse que ela deixou a cobertura, foi até uma pequena cidade, uma testemunha muito importante para que ela pudesse elucidar o crime da esposa fora assassinado e sabe o que é o pior: O homem estava acompanhado de uma mulher e o assassino recriou a mesma cena que ocorrera no dia da morte da sheika.

            A militar estava boquiaberta.

            -- Como sabe disso? – Questionou mostrando preocupação e perplexidade.

            -- Eu estive em contato com a Virgínia durante vários dias e me falou o que se passava.

            Mel umedeceu os lábios demoradamente.

            -- Eu nem sei o que dizer... – Passou a mão nos cabelos. – Há alguém que deseja fazer muito mal a Samantha e eu prefiro não acreditar que seja o Fernando...Eu não quero nem imaginar algo assim... Depois do que me confessou, tudo mudou, até mesmo parece o mesmo “pai” de antes...

            -- Por que o duque esperou tanto tempo para confessar “essa verdade” ? – Fez um gesto com os dedos em aspas. – Você andava transando com a víbora muito antes do casamento...Eles te deixaram fazer isso sem mesmo se pronunciar?

            A tenente sentiu a face corar.

            -- Amiga, Fernando Del Santorra pode ser o herói que você quiser, mas veja, se realmente essa história é verdadeira, ele e o almirante deixaram você fazer sexo com sua sobrinha... isso é muito cruel...Todo mundo sabia o que estava acontecendo, seu avô sabia quando descobriu que passou a noite na fazenda... Ninguém imaginaria que vocês ficaram todas aquelas horas conversando...

            A Santorini cerrou os dentes.

            Sim, ela já pensara várias vezes nisso, mas com o tempo, preferira sufocar essa revolta.

            -- Conte para a Lacassangner!

            Mel fez um gesto negativo com a cabeça.

            -- Imagina como isso pode causar ainda mais revolta na pirata? Seria mais um motivo para essa guerra que não acaba mais.

            -- Então faça outro exame de DNA!

            -- Outro exame? Mas eu já vi o exame... – Retrucou impaciente. – Já vi várias vezes...

            -- Vamos fazer outro... Pegue um fio de cabelo do seu avô e vamos levar a um laboratório, isso só vai servir para que tenhamos certeza... Depois disso, não insistirei mais, pode continuar separada da sheika...

            A militar deitou-se. Olhava para o teto e ponderava.

            -- Dentro de dois dias haverá audiência de conciliação...

            -- E você vai se divorciar...

            -- Sim... Vou... É o que a Samantha deseja, ela não se importou por eu ter pedido o divórcio, então esse casamento não vai continuar.

            A fisioterapeuta relanceou os olhos.

            -- Acho que você está mais preocupada por ela não ter reagido ao seu pedido que o fato de ela ser sua sobrinha...

            -- Não quero mais falar sobre isso, estou cansada dessa maldita história. – Jogou um travesseiro longe. – Estou ficando louca com tudo isso!

            -- Sim, eu também estou, então você escolhe: Ou faz um novo exame ou eu mesma conto a Samantha toda essa história.

            -- Pensei que fosse minha amiga, que me apoiaria...

            -- Por isso estou te dando uma escolha.

 

 

 

 

            Naquela manhã, Samantha tinha saído para correr acompanhada de Belinda.

            A pirata se mostrava bastante tranquila diante do abandono da esposa, algo que preocupava Miranda, pois percebia como a filha de Otávio voltava a se fechar dentro de si, deixando mostrar apenas a frieza que exibira quando estava naquela prisão.

            -- Esperei por ambas durante duas horas. – A chefe do departamento disse ao vê-las chegar.

            Observava o moletom cinza que era usado pela filha do Serpente e também não passava despercebido o olhar encantado da agente pela morena.

            Não era algo que lhe preocupava, conhecia bem a loira para saber que ela tinha seus envolvimentos e não seria diferente com uma mulher tão bonita quanto a Samantha.

            A Lacassangner bebeu um pouco de água. Estava com a face toda suada.

            -- Vim para te acompanhar à audiência.

            -- Não haverá audiência, já falei com os advogados, o divórcio será consensual.

            Miranda trocou olhares com Belinda.

            -- Simplesmente vai assinar...

            Samantha acomodou-se na poltrona.

            -- Sim, eu já tinha falado isso antes, deixei claro que não haveria problemas, que eu aceitaria a separação. – Cruzou as pernas.

            -- Lacassangner, deveria pelo menos buscar saber a razão da Mel ter decidido isso de uma hora para a outra. A Santorini estava convicta de levar o casamento em frente e de repente vai embora e pede a separação.

            A pirata bebia um pouco da água, parecia bastante tranquila, enquanto seu olhar estava fixado na chefe do departamento de segurança internacional.

            -- Você quem deveria saber disso, afinal, fora você que arrumara toda essa história, eu nunca concordei com nada disso.

            -- Você a ama! – Miranda afirmou impaciente.

            -- Não quero falar sobre isso! – Cortou-a. – É melhor que ela se mantenha longe, ainda mais depois do que houve, então apenas deixe como estar.

            A Maldonado olhava a mulher parada a sua frente e se sentia frustrada por ela não ter confessado o sentimento, talvez não fosse o melhor momento para essa confissão, mas pelo menos poderia significar que mais adiante pudesse existir uma esperança de que ambas pudessem se unir.

            -- Os meus advogados estarão prontos e só terei que assinar e tudo isso terminará...Já pedi para incluir no processo uma pensão, não quero ser vista como avarenta... – Gracejou.

            Antes que Miranda pudesse retrucar, o celular tocou e ela atendeu.

            Parecia preocupada enquanto ouvia o interlocutor do outro lado da linha, fez poucos questionamentos e logo encerrou a chamada.

            -- Uma fonte me avisou que há uma denúncia contra ti, alguém te aponta como responsável pelo assassinato do Tobias.

            -- Isso é um absurdo! – Belinda intrometeu-se.

            -- Bem, eu já esperava algo assim, quem estar por trás de tudo isso vai jogar com fichas duras e precisamos ser inteligentes para nos livrarmos dessas acusações. – Pegou o celular. – Pedirei que os advogados peçam um habeas corpus preventivo...

            -- Acha que pode existir uma ordem de prisão? – Samantha questionou ponderando.

            -- Eu não sei, mas precisamos nos preparar, não quero que você corra o risco de ir parar em uma prisão, mesmo que seja de forma temporária.

            A Lacassangner fez um gesto afirmativo.

 

 

            Mel estava no escritório do avô. Tinha retornado da audiência que não contara com a presença de Samantha. Não sabia se sentira frustrada ou aliviada por não a ver. Negou-se a receber qualquer valor que fora oferecido pela esposa. Não desejava nada, apenas que tudo isso terminasse o mais rápido possível.

            Há dias não lia jornais, pois sabia que sempre encontraria uma manchete mostrando a sheika e insinuando seus casos amorosos como principal motivo para a separação tão precoce do enlace.

            Não se importava!

            Assim que pudesse retornar ao seu posto na marinha pediria para seguir para longe, afastando-se de tudo o que a cercava. Naquele dia recebera a visita do pai logo cedo na mansão, estranhara o fato, porém o duque dissera que precisara de uns documentos que estava no escritório do almirante. Ele se mostrara gentil, cumprimentando-a pela decisão que tinha tomado sobre o divórcio.

            Tamborilava os dedos sobre o tampo escrivaninha.

            Estava cansada!

            Abriu a gaveta e retirou a caixinha que ainda não tinha conseguido destravar. Tinha guardado em seu quarto e só quando chegara tinha levado até ali.

            Tentou algumas combinações, mas não conseguiu abri-la, frustrando-se.

            Ouviu batidas na porta, rapidamente guardou o objeto. Não demorou para Marina aparecer.

            -- O Juan está aqui, eu disse que não sabia se você tinha chegado...

            Mel umedeceu os lábios.

            Não podia negar que o ex-noivo estava sendo bastante presente em sua vida. Já tinha a acompanhado várias vezes ao hospital. Conversavam sobre inúmeros assuntos, até mesmo dos novos investimentos que estava fazendo no país, esse era o motivo de ele não estar sempre viajando como antes.

            -- Disse o que queria?

            -- Com certeza, o que já sabemos, tentar te reconquistar. – Falou em tom de reprovação.

            -- Não gosta mais dele, babá? – A tenente indagou levantando-se, apoiando as mãos sobre o tampo da mesa. – Antes eu pensei que simpatizasse...

            A mulher apenas deu de ombros.

            -- Eu irei atende-lo, não serei grosseira a ponto de dizer que não estou.

            -- Se a pirata descobrir que anda de amizade com o senhor Juan...

            A militar cruzou os braços sobre os seios.

            Não gostava nem mesmo de ouvir menção à esposa, pois era como se só isso fosse capaz de lhe tirar as forças de manter-se distante.

            -- Estou me divorciando da Víbora, sabe muito bem disso.

            -- E ainda não entendi o motivo...

            -- Não há motivos, apenas não quero mais estar casada com a Lacassangner.

            Marina a viu deixar o escritório. Sabia que ela escondia algo, sabia que tinha se passado alguma coisa no dia que deixara a cobertura, porém ainda não sabia o que ocorrera para fazer a jovem resolver simplesmente abandonar a filha do Serpente. Estava claro que ela continuava apaixonada pela outra, mas lutava contra isso.

 

 

            O fim de semana passava devagar.

            Miranda tinha proibido Samantha de deixar a capital. No dia anterior comparecera à delegacia, tinha prestado depoimento sobre a morte de Tobias. A chefe do departamento não tinha dúvidas de que toda aquela sórdida história tinha o dedo podre de Fernando.

            Tudo estava tão corrido e acontecendo ao mesmo tempo que nem mesmo conseguira falar com a tenente, ainda não tinha engolido a história do divórcio de uma hora para a outra.

            A Lacassangner estava na área da piscina. Estava acomodada em uma das espreguiçadeiras. Tinha uma taça em uma das mãos, parecia distraída ao olhar para a bebida.

            Aos poucos tudo voltava a ser como antes. Não demoraria para sua relação ser encerrada com a filha do duque, logo só precisaria assinar as papeladas. Estivera com os advogados e eles deixaram claro que a Santorini não aceitara nada que fora oferecido. Isso não fora surpresa para si.

            Passou a mão pela borda da taça.

            Fora naquele mesmo lugar que há alguns dias tinha acariciado o corpo da tenente.

            Não podia negar que sentia falta da jovem petulante, porém sabia que seria melhor que se separassem, mas isso não significava que cessaria seu desejo. Não estava brincando quando falara que a teria como amante, isso a ensinaria a ser menos arrogante.

            Sentiu mãos delicadas massageando seus ombros. Aspirou o delicioso aroma de Belinda.

            Inclinou a cabeça para fita-la sob as lentes escuras dos óculos.

            -- Pensei se precisava de companhia. – A loira falou provocante. – Posso?

            A pirata observou o minúsculo biquini que a agente usava. Não podia negar que era uma mulher muito bela...

            Segurou-lhe as mãos, beijando-as.

            -- Sempre é um prazer a sua companhia.

            Belinda esboçou um sorriso, depois deu a volta e sentou-se de frente para a bela Lacassangner. Sabia que mesmo que ela nunca abrisse a linda boca para dizer, não tinha dúvidas de que ela era totalmente apaixonada pela Santorini e que a separação de forma abrupta tinha ferido a bela filha do Serpente. Não se importava com os sentimentos, apenas ansiava por sentir em seu corpo o toque daquela mulher que parecia tão diferente de tantas outras que conhecera.

            -- E o que faz aqui sozinha, sheika? – Usou os dedos longos para acariciar as coxas expostas da morena. – A Maldonado não devia ter te proibido de deixar a cidade, mas de ficar aqui isolada corroendo suas dores.

            -- Dores? – A pirata arqueou a sobrancelha esquerda em indagação.

            -- Sim... – Esboçou um sorriso sensual. – Se deixar, posso fazer com que tudo isso pare de doer, claro que será passageiro, mas garanto que tudo será substituído por prazer...

            Samantha acompanhava os dedos que subiam e pousavam na lateral do seu biquini. Não a deteve.

Estendeu a mão e tocou os seios grandes cobertos pela minúscula peça. Viu o delicado mamilo aparecer...

            Sentiu os lábios cheios sobre os seus, moviam com calma, eram provocantes...

            -- Espero não estar incomodando.

            A voz de Ester soou mais alta que o necessário.

            Belinda levantou-se, tinha um olhar provocante.

            -- Vim à capital e preferi eu mesma trazer os documentos... – A irmã de Juan dizia olhando de uma para a outra.

            -- Preciso dar uns telefonemas, deixarei as duas à vontade para trabalhar. – A agente disse afastando-se.

            Samantha fez um gesto afirmativo com a cabeça, depois foi até a outra, cumprimentando-a.

            -- Não precisava ter tanto trabalho, disse que podia enviar pelo correio eletrônico.

            -- Não é nenhum trabalho extra, também queria te explicar pessoalmente alguns detalhes.

            A Lacassangner assentiu. Pegando o roupão que estava sobre a espreguiçadeira, vestindo-o.

            -- Vamos até o escritório, será melhor para conversarmos.

            -- Sim, está bem!

 

 

             O dia tinha amanhecido nublado. Um vento frio penetrava as janelas dos aposentos que Mel ocupava.

              A jovem despertou do sono com um grito ensurdecedor.

              Os olhos dourados abriam-se em um pavor crescente. 

               Sentia a respiração fraca, como se estivesse sufocada. Apovorou-se, mas aos poucos foi tentando manter a calma. 

                Há quanto tempo não era assombrada por aqueles pesadelos?

                Revivia a cena de estar dentro do mar, afogando-se…

              Fitou a janela.

              Mesmo tendo amanhecido, o sol não tinha voltado a brilhar, começara a chover de madrugada e ainda continuava.

               Suspirou e depois voltou a se acomodar entre os travesseiros.

               Passara horas da noite anterior conversando com Cristina. A amiga insistia para que fizesse o exame de DNA…

Teria sido o duque tão maligno a ponto de ter inventado uma mentira dessas?

             Mordiscou a lateral do lábio inferior.

             Só Deus sabia o que ela vinha passando desde que fora revelado essa história. Sentia um aperto no peito quando revivia as lembranças da sua infância, da sua adolescência como se tudo não tivesse passado de uma grande e suja mentira…

               Sua mãe teria realmente escondido algo tão sórdido de si?

             Segurou o pingente do cordão, depois o abriu e viu a foto de Marie. O sorriso grande, os olhos brilhantes…

               Repensava em sua mente as ocasiões que estivera ao lado de Sir Arthur na companhia da mãe…

                Não, ela o tratava como pai, não havia nenhum tipo de malícia… Nem mesmo o avô demonstrava isso… ou será que estava enganada?

             O duque teria inventado tudo aquilo para conseguir separá-la da Lacassangner? 

             Sentia-se enojada em pensar que isso podia ser real…

           Pegou o celular que estava ao lado da cama e depois de longos dias, acessou para ver as últimas notícias.

             A primeira imagem que estampava um dos jornais que acompanhava era a foto da filha do Serpente em um dos seus elegantes e sensuais vestidos. Uma manchete sensacionalista falava sobre a neta desprezada de um dos homens mais importantes do país. Havia insinuações diversas e muitas invenções sobre a pirata.

              Deu zoom na foto e ficou a admirar a bela mulher que não conseguia tirar dos pensamentos. 

              Ela nem mesmo se importara com o fim do casamento…

              O que ela faria se soubesse de toda a verdade?

             Decerto, ficaria furiosa…

             Pegou a caixa que estava no criado-mudo e voltou a observa-la. Voltou a tentar abri-la, porém nenhuma das combinações que tinha feito funcionou.

              Tinha a impressão que havia algo muito importante ali, principalmente pelo fato de estar escondida em um lugar inusitado…

               Uma das empregadas da casa tinha dito que Fernando tinha ido até ali dois dias depois que o almirante fora para o hospital, ficara horas no escritório e quando saíra deixara tudo desarrumado. Será que a procurava?

             Será que ele sabia a senha?

             Não havia nada de concretizado em toda aquela história, ao contrário, as peças continuavam soltas, não era possível definir nada naquele momento. 

             Ouviu o bip do celular e lá estava uma mensagem de Juan.

               Percebia que o ex-noivo parecia querer uma proximidade, mas ela não desejava, não sentia nada por ele, nem mesmo se imaginava sendo tocada…

              Ouviu batidas à porta e não demorou para Marina aparecer com uma bandeja de várias delícias.

               – Sabia que estava acordada e trouxe seu café da manhã.

                Mel sentou-se na cama para que a comida fosse acomodada sobre seu colo.

               – Acho que se continuar aqui sem fazer nada vou engordar.

               – Sua suspensão está terminando, então vai voltar para sua amada marinha e para seus exercícios físicos.

                Sim, isso era verdade, fora suspensa por trinta dias, e graças ao duque, não fora expulsa.

               – Sim, babá, estou ansiosa para retornar.

             – Mas deve estar recuperada… – Deu uma pausa ao ver a caixinha. – Onde você conseguiu isso? – Indagou surpresa.

               A tenente observou a expressão perplexa da empregada.

                – Sabe o que é?

                Marina a fitou e depois fez um gesto afirmativo com a cabeça.

                Os olhos dourados estreitaram-se.

                – O que é? 

               Marina cruzou os braços sobre os seios.

                – Como conseguiu isso, menina? Faz muitos anos que não a vejo.

                Mel colocou a bandeja de lado.

              – Achei no escritório, estava lá em um compartimento secreto embaixo da escrivaninha.

               A babá comprimiu os lábios.

               – É do meu avô?

               Marina fez um gesto negativo com a cabeça.

           -- Não, filha, havia duas caixinhas dessa, uma pertencia a sua mãe e outra a Iraçabeth… – Olhava maravilhada para a peça. – Elas sumiram… tanto a da Beth quanto a da Marie…

                A Santorini levantou-se e devagar foi até a babá.

                – Sabe a senha?

                – Não, querida, são nove números e duas letras, é a única coisa que sei… a Iraçabeth nunca contara a ninguém como abria, nem mesmo para o pai…

           – De quem é essa? Da Beth ou da mamãe?

                Marina olhava maravilhada para a peça.

            -- Só quando conseguir abrir que descobrirá, há o nome da dona gravado no fundo...

            A militar mais uma vez sentia-se frustrada por não conseguir abrir o objeto. Talvez, pudesse perguntar se Fernando sabia...

            Não!

            Estava cada vez mais confusa diante dos atos contraditórios do duque de Del Santorra.

            Voltou para a cama e tomou um pouco de leite, em seguida comeu uma fatia de bolo.

            -- Irei até o hospital, preciso acompanhar os exames que serão feitos no vovô.

-- Acha que ele vai melhorar logo, filha? – A empregada indagou apreensiva.

-- Espero que sim...

 

Sir Arthur continuava em coma, tentaram tirar o medicamento aos poucos, porém o almirante não reagiu bem, então decidiram continuar o tratamento e esperar que ele conseguisse se recuperar.

Mel todos os dias ia até lá, passava horas ao lado do "avô", ansiava para que ele acordasse.

Estava sentada em uma poltrona no quarto do doente quando uma enfermeira veio colher o sangue para novos exames.

– Doutora Olívia! – A mulher a cumprimentou com um sorriso. – Voltei de férias e estou muito feliz em vê-la.

A enfermeira Mary sempre estava ao seu lado nos plantões. Estudaram juntas na escola militar.

 Mel levantou-se e foi até ela, abraçando-a.

– E como está a pequena Lois?

 – Está bem, aproveitei minha licença para viajar com ela. – Observou o enfermo. – Fiquei muito triste quando fiquei sabendo do ocorrido com o almirante.

 – Infelizmente, aconteceu, mas tenho fé que logo vai se recuperar.

 A tenente observou a mulher começar a tirar o sangue.

 De repente pensou em fazer o exame de DNA.

  Contara todo o ocorrido para Cristina e a amiga insistira para que fizesse. Deixara claro que não acreditava no duque.

Não acreditava que Fernando pudesse ser tão cruel a esse ponto…

Voltara a frequentar a casa do "pai", não podia negar que houve uma grande mudança na forma que ele agia. Até mesmo seu processo na marinha fora concluído e só pegara uma suspensão de vinte dias. O aristocrata até mesmo tinha dado uma entrevista falando sobre o acontecido com Iraçabeth. Ele contara os fatos e assumira que enfrentara grandes problemas e não negava que em alguns momentos tinha passado do limite ao lidar com a filha da esposa.

Não podia negar que ficara orgulhosa, ainda mais pela postura que o Del Santorra tinha assumido. E tudo não parara por ali, até mesmo o duque pedira a todos que não julgassem a Samantha…

Prendeu a respiração só em pensar na pirata.

Há dois dias tinha acontecido a audiência de conciliação e a Lacassangner não comparecera, apenas o advogado tinha aparecido, o homem alegara que a cliente estava fora do país e não poderia participar, também deixou claro que não era seu desejo que houvesse alguma reconciliação, que estava segura do divórcio.

  – Mary, eu preciso de um favor muito grande… -- Disse instintivamente.

 

           

-- Você precisa ir, tem que representar o seu avô ou sei lá como devo chamar o almirante... – Cristina dizia.

Naquela noite haveria o famoso jantar oferecido pelo governador. O evento homenageava as pessoas mais importantes do país e todos os anos o nome de Sir Arthur estava na lista devido a ser filho de um dos fundadores da capital.

Mel tinha saído do banho, estava sobre o leito usando um roupão e bebendo um suco de laranja.

-- Eu não quero ir!

Cris andava de um lado para o outro. Vestia um elegante vestido verde musgo de seda. Estava impecável com sua maquiagem e penteado.

-- Só falta pensar que a pirata vai representar os Santorinis! – Debochou. – Vamos, eu te ajudo a se arrumar, não vamos demorar, vai ser rápido e voltamos para casa.

Mel respirou fundo.

Fora nesse evento que tinha visto a Samantha pela primeira vez depois que retornara ao país. Sabia que ela estaria lá e não desejava vê-la, precisava manter distância, pois perdia as forças só em saber que ela estava por perto.

Mordiscou a lateral do lábio inferior.

Tinha pedido para Mary colher o material para fazer o exame de DNA. Nem mesmo entendia por que tinha feito aquilo, mas fizera e não demoraria para confirmar de uma vez toda aquela história e se assim fosse, pretendia contar a Lacassangner o parentesco que as ligavam.

-- Sabe mais alguma coisa do assassinato do tal Tobias? – Indagou receosa.

A fisioterapeuta parou diante do espelho. Retocava o penteado.

-- Da última vez que fui falar sobre a pirata para ti quase me batesse e agora deseja saber...

Mel relanceou os olhos em irritação.

-- Já que andas se esfregando com a tal da Virgínia, deve saber algo né.

-- Me esfregando? – Olhou sobre os ombros com um sorriso. – Adoro me esfregar...

A tenente lhe jogou um travesseiro.

-- O que eu sei é que acusaram a Víbora de ter feito parte no assassinato do tal homem, parece que ela é considerada suspeita, afinal, odiava o talzinho e teve a questão de imitação da cena...

-- Ela jamais faria isso!

-- Claro que não, mas percebo que estão querendo fazê-la pagar por um crime que não cometeu da mesma forma que fizeram em relação à sheika.     

Mel fez um gesto afirmativo com a cabeça.

-- Arrume-se, dar tempo de pegarmos o prêmio dado a Sir Arthur e depois voltamos, também não desejo ficar nessa recepção.

-- Vai voltar comigo? Pensei que fosse ficar com sua namoradinha...

-- A Miranda a mandou para fora do país, está em uma investigação...   

-- Agora entendi sua insistência em ter a minha presença, sabe que vai morrer de tédio se estiver lá sozinha com sua tia chata.

-- Mel, arrume-se logo e vamos embora.

 

 

 

A imprensa ficou eufórica ao ver Samantha Lacassangner descendo da limusine ao lado de Miranda e Belinda. Os seguranças não permitiram que os jornalistas aproximassem.

-- Vamos marcar uma entrevista qualquer dia desses, não aguento mais essas pessoas enlouquecidas em cima de ti. – A Maldonado comentava irritada. – Não precisa falar muito, apenas diga que realmente é a neta de Sir Arthur e que o resto da história não te pertence, pronto.

Subiam as escadas da mansão.

Os manobristas recebiam as chaves dos luxuosos veículos. Havia inúmeros guardas fazendo a segurança do lugar. O pomposo jardim estava iluminado e era naquele lugar que fora reservado as emissoras da mídia.

Samantha negara-se falar com a imprensa, ainda mais agora diante do acontecido com Tobias e o próprio divórcio que tinha caído na boca de todos.

-- Não tenho por que falar algo com essas pessoas. Quando o almirante despertar do seu sono, ele que resolva tudo, afinal, fora ela quem decidira jogar a sujeira da família dele para todos. – Retrucou friamente com um sorriso. – Quer mesmo que eu dê declarações?

Miranda suspirou.

Viu-a seguir para cumprimentar alguns conhecidos e ficou lá, checando a segurança do lugar.

Viu o governador seguir até a pirata.

-- Parece chateada, chefe! – Belinda lhe entregou uma taça. – Você quem insistiu para que ela comparecesse...

-- Sim, eu sei, porém também já insisti para que ela se pronuncie publicamente e ela continua a se negar.

-- Ela só fará isso quando desejar fazer, conhecemos muito bem a sheika, só faz o que deseja...tirando o casamento, sempre é assim... Falando em casamento, a festa parece que vai ser boa... – Fez um gesto de cabeça para a entrada.

A Maldonado viu Mel seguir acompanhada com a fiel amiga.

 

A militar recebia os cumprimentos de alguns conhecidos quando viu do outro lado do salão a Lacassagner.

Olhava para o amigo do avô, mas vez e outra desviava o olhar para a filha do Serpente.

Ela não podia estar mais bela naquela noite...

Usava um vestido branco e longo. O modelo prendia em seus ombros por finas alças. Um decote expunha parte do colo bonito. Viu a marca do biquini, estava ainda mais bronzeada. Encantou-se com o penteado. Os cabelos longos estavam trançados em nagô, parecia ainda mais pirata...

A sheika parecia muito distraída e animada em uma conversa com alguns empresários. Viu Belinda ao seu lado. Decerto, a loira agora estava aproveitando para ocupar o espaço que sempre desejara.

-- Mel, eu não sabia que viria.

A voz de Juan lhe tirou dos pensamentos irritantes.

O ex-noivo lhe cumprimentou com um beijo na face e ficou surpresa ao ver Ester em sua companhia.

-- Olá, Olívia, não imaginei que estaria aqui, afinal, não é costume ir a eventos, enquanto alguém querido definha em um hospital.

Os olhos dourados estreitaram-se ameaçadoramente.

-- Com certeza que ela tinha que vir, afinal, Sir Arthur será homenageado e não há ninguém para representa-lo. – O empresário intrometeu-se enviando um olhar de advertência para a irmã.

-- Realmente, Ester... – Cristina pegou uma taça. – Você estava com seu marido quase morto há alguns anos e te vi dançando com outros em um evento como esses.

A mulher enviou um olhar odioso para a fisioterapeuta.

-- Está enganado, irmãozinho, há outra pessoa nessa festa que poderia representar muito melhor o almirante, a verdadeira neta, neta de sangue mesmo.

Antes que Mel pudesse responder, a outra se afastou com um sorriso debochado.

-- Não ligue para a minha irmã, sabe que gosta de agir assim.

A tenente deu de ombros e quando voltou a olhar em direção à esposa viu os olhos azuis a encarar-lhe.

Sentiu um arrepio na espinha.

 

 

-- Estamos muito interessados em seu empreendimento, Lacassangner.

Os empresários diziam entusiasmados. Tinham recebido amostras do produto  que a usina estava produzindo e mostravam interesse em fechar parceria.

-- Acredito que a exportação será um sucesso.

Samantha sabia disso. Já fora procurada por algumas multinacionais interessadas, mas ainda não começara a produzir em grande escala, não tinha tido tempo ainda para isso.

Aceitou a taça que Belinda lhe entregou e foi nesse momento que seus olhos viram a jovem Santorini.

Viu quando Juan lhe cumprimentou e sentiu o sangue ferver de ciúmes.

Observou-a e viu os olhos dourados fitarem os seus.

Ainda usava as muletas, sinal que não se recuperara totalmente. Observou o vestido prateado que chegava um pouco abaixo das coxas. Viu a delicada meia que usava e a sandália sem salto. Os cabelos estavam soltos, usava pouca maquiagem. Estava ainda mais maravilhosa.

Bebeu um pouco do líquido e desviou o olhar.

Não podia ficar perto daquela mulher sem ansiar por toma-la para si, por tocá-la, senti-la...Tinha certeza de que ela também lhe desejava, sabia disso, então por que pedira o divórcio? O que tinha acontecido para que tomasse essa decisão?

Viu o olhar de Belinda, a loira parecia perscrutar sua expressão.

-- Não vai cumprimenta-la? – A loira indagou com um sorriso. – Afinal, ainda são casadas...

Samantha apenas deu de ombros, voltando sua atenção para os empresários.

A loira olhava para Mel. Não sentia ciúmes, conformava-se em ter a pirata como uma diversão, sabia que seria um caminho de dor apaixonar-se pela morena, afinal, só um tolo não via que ela estava apaixonada pela filha de Fernando. Achava a Santorini uma tola, pois demonstrava aquela fraqueza de não conseguir caminhar com os próprios passos... O que teria sido inventado por Del Santorra para fazê-la se manter distante? Estava bastante curiosa quanto a isso, pois não havia dúvida que tinha dedo do duque em todo esse enredo.

Viu Ester aproximar-se.

Não gostava da irmã de Juan, não confiava em suas palavras, por isso, assim que a viu, enlaçou o braço da filha do Serpente, viu o olhar de raiva demonstrado pela militar.

Sorriu e piscou em sua direção.

 

 

Uma banda fora contratada para tocar.

Todos seguiam animados. Os presentes também pareciam curiosos diante da ausência do duque que falara sobre uma enxaqueca para não comparecer ao evento. Também pareciam curiosos sobre a curta relação entre as duas mulheres. Todos já sabiam que o divórcio estava em andamento e queriam saber o motivo de isso ter acontecido.

Mel estava sentada em uma mesa onde o almirante Ernesto estava. Cristina pediu licença, deixando o lugar vazio e não demorou para Miranda acomodar-se.

-- Olá, tenente, finalmente consegui te encontrar. – A Maldonado foi logo dizendo.

A Santorini negara-se a atender os telefonemas da chefe do departamento, não quisera vê-la.

-- Ando muito ocupada. – Disse esboçando um sorriso.

-- Imagino que sim! – Miranda bebeu um pouco de vinho. – Ainda mais com os tramites do divórcio... – Passava a o indicador na borda da taça. – Fiquei surpresa com esse divórcio... De uma hora para a outra decidiu que o casamento tinha acabado...

Mel já se preparava para responder, então ouviu o bip do celular. Pedindo licença, acessou o aplicativo de mensagem.

“O resultado do exame foi enviado para o seu e-mail.”

A Santorini suspirou.

Relia a mensagem e relia novamente, apenas olhando para a tela do aparelho.

Não queria ver o exame, nem mesmo sabia o motivo de ter feito, não acreditava que fosse mentira de Fernando. O duque poderia ter cometido muitos erros, mas não faria algo assim.

Guardou o aparelho dentro da bolsa.

-- Preciso ir ao banheiro, com sua licença, Maldonado!

A chefe assentiu. Não passou despercebido a palidez que na face da jovem ao ler a mensagem, ficando mais curiosa diante disso.

 

 

No toalete, Mel foi cumprimentada por duas senhoras que conheceram sua mãe, conversaram durante alguns minutos, depois saíram, deixando a jovem sozinha.

A tenente estava diante do espelho. Parecia ponderar. Colocou a bolsa sobre a bancada e retirou o celular. Leu mais uma vez a mensagem de Mary.

Viu a porta abrir-se e mais uma vez estava lá a irritante ex-cunhada.

-- Decidiu esconder-se aqui...

A Santorini guardou o aparelho.

-- Não tenho do que me esconder, diferente de outras...

Ester esboçou um sorriso cínico.

-- Sabe que seu importante e respeitado nome está passando de boca em boca como de uma vagabunda... Afinal, nem mesmo o divórcio foi assinado e sua esposinha já anda desfilando com a antiga amante.

A militar encostou-se na bancada, cruzando os braços sobre os seios.

-- Imagine que você esteja com ódio por não ter sido a escolhida para consolar a pirata.

Naquele momento fora possível ver o ódio no olhar de Ester.

-- Achou mesmo que a Samantha ficaria contigo por quanto tempo hein? Conheço muito bem a Lacassangner, ela enjoa rápido, ainda mais quando a mulher que tem ao lado é uma frígida como você!

Mel foi bem certeira ao esbofetear com todo o ímpeto a face da irmã de Juan.

Ester não reagiu, apenas continuou a destilar veneno.

-- Acha que isso vai resolver alguma coisa? – Perguntou passando a mão na face. – Quero te dizer que estive na cobertura e sua esposa estava aos beijos com a Belinda... Imaginou que ela sofreria com a separação, coitada!

-- Eu quem quis me divorciar! – Disse por entre os dentes.

-- Claro, porque sabia que seria usada e depois jogada fora... Acho que foi isso que aconteceu, te usou e depois você viu que ela não te queria mais... Você foi mais uma nas mãos da Sam, uma concubina.

Mel a esbofeteou mais uma vez, porém agora a outra reagiu e ambas rolaram pelo chão do banheiro.

A irmã de Juan cravou as unhas nos braços da neta de Sri Arthur, parecia querer rasga-la.

A Santorini conseguiu girar, sentando-se sobre seu abdômen, batendo em sua cara.

-- A Samantha só quis te usar... – A outra provocava em risos. – Transava com outras, enquanto você era a esposa...

A militar continuava esbofeteá-la.

A porta abriu-se e Samantha e Belinda entraram. Ambas ficaram perplexas diante da cena.

A Lacassangner segurou Mel pela cintura, tirando-a de cima da Ester, enquanto a loira segurava a irmã de Juan.

-- Solte-me! – A tenente esbravejava. – Solte-me!

-- Tire a Ester daqui, Belinda! – A Lacassangner ordenou, usando toda a força para deter a jovem. – Leve-a daqui.

A loira assentiu e foi o que fez.

-- Me solta! – Mel voltou a exigir.

-- Fique quieta! – Samantha ordenou. – Quer estampar as manchetes de jornais? Ou deseja receber uma punição da marinha por sua falta de decoro?

Mel sentia o hálito quente contra o seu pescoço. Sentia as mãos ao redor de sua cintura e de repente sentia aquela sensação de desejo por aquela mulher.

Samantha afastou-se, depois pegou as muletas lhe entregando.

-- Arrume-se, não pode voltar à festa toda descabelada.

A militar a fitou, observava a expressão impenetrável da Lacassangner.

-- Enlouqueceu foi? – A pirata indagou cruzando os braços. – O que houve entre vocês duas aqui?

-- Não é da sua conta! – Falou em tom alto. – Saia daqui e me deixe em paz.

A morena foi até ela com passos largos, segurando-a pelo cotovelo.

-- Fale comigo direito, não me venha com essa sua petulância de menina mimada! – Advertiu-a. – Acha que está falando com quem?

-- Não quero saber, me deixe em paz e saia daqui agora mesmo. – Deu-lhe as costas, olhando para o espelho.

Observou a face corada. Os cabelos em desalinho e os arranhões nos braços.

Tinha perdido a paciência com Ester há muito tempo e se não tivesse sido interrompida tinha deixado a ex-cunhada bem marcada. Odiava suas provocações, odiava quando ela falava com propriedades sobre as intimidades com a filha do Serpente.

Observou a sheika atrás de si, os olhos azuis não abandonavam sua face, viu-a cruzar os braços.

Começou a arrumar os cabelos, as mãos estavam trêmulas, mesmo assim fez. Tirou o batom da bolsa, retocando.

Para seu desgosto a filha da Iraçabeth continuava no mesmo lugar, não parecia interessada em sair e para complicar ainda mais, ninguém entrava naquele toalete.

Guardou os objetos na bolsa, pegou as muletas e já estava seguindo até a porta, mas foi detida pelo braço.

Os olhos dourados encararam os azuis.

-- Quero conversar contigo!

-- Mas eu não quero falar contigo, Samantha, não temos nada para falar, então apenas fique no seu canto e me deixe em paz.

-- Vamos conversar.

-- Certo, diga o que quer e fale logo que tenho outras coisas para fazer.

Os olhos azuis estreitaram-se.

-- O que o ardiloso duque Del Santorra te disse para que decidisse rapidamente pelo divórcio?

-- No dia que nos encontramos no hospital você não parecia interessada em saber de nada...

-- Mas agora quero, então abra essa sua boquinha linda e comece a falar.

-- Não falarei nada! – Tentou desvencilhar, mas foi pressionada contra a porta. – Deixe-me! – Exigiu apavorada.

-- Assim que esse divórcio for assinado eu vou te fazer minha amante!

-- Nunca!

Samantha abriu a boca em um enorme sorriso e antes que a outra protestasse, tomou os lábios macios para si.

Mel espalmo as mãos contra os seios da morena para empurrá-la, mas foi surpreendida por um abraço, prendendo-a.

Cerrou os lábios para não permitir acesso, lutando com todas as forças para não ceder a vontade que tinha de senti-la mais uma vez. Sentia as batidas do coração sob seu tato, sentia os seios macios e desejou senti-los mais uma vez...

Como podia continuar querendo aquela mulher?

Para sua surpresa, a Lacassangner afastou-se.

-- Vamos esperar o divórcio, depois consumamos... – Depositou um beijo em sua testa.

Mel a encarou.

-- Não se contenta com a Belinda e com a Ester?

-- Não, interessa-me a mimada e petulante duquesinha metida a tenente que acha que tem o rei na barriga.

-- Nunca mais vai me tocar, então se acostume com isso e satisfaça seus desejos com as vagabundas que estão dispostas a te dar o que você deseja.

-- Eu quero que você me dê... Adoro ver essa sua expressão de militar séria na hora que está sendo acariciada... – Passou as costas da mão no decote da militar. – Sim, você fica corada desse jeitinho... Na piscina sua expressão estava ainda mais sensual...

A Santorini livrou-se do toque com um safanão.

-- É uma tola...tola...

Mel a viu deixar o banheiro. Agradeceu a Deus por isso, pois temia não resistir ao desejo que sentia pela Lacassangner.

Fechou os olhos, enquanto tentava controlar a respiração.

 

 

Passava das duas da madrugada quando Cristina e Mel chegaram à mansão de Sir Arthur.

-- Então você quebrou a cara da Ester?

Mel não respondeu, jogando-se na cama.

-- Ela merecia mesmo, eu estava doida para enfiar a mão na cara daquela vagabunda.

A Santorini cobriu a face com as mãos.

-- Em compensação à pirata parecia querer te devorar com o olhar... Você deveria contar que ela é sua sobrinha... – Deitou-se ao lado dela. – Você não é tia da Víbora, amiga, acredite em mim...

A tenente suspirou.

-- Eu fiz o exame...

Cris sentou-se na cama em um supetão.

-- E então?

-- Não abri, está no e-mail... Não desejo ver, não acredito que papai tenha mentido para mim, não consigo acreditar.

A fisioterapeuta correu e pegou o celular da amiga, acessando o correio eletrônico.

Mel não parecia interessada, até que o aparelho foi jogado contra si.

-- Veja aí a mentira descarada do seu pai!

Os olhos dourados arregalaram-se, enquanto observava os detalhes do exame.

 

 

 

 

                

               

    

 

Comentários

  1. Não, eu tô pasma...
    Geh, não demora tanto, por favor.
    Vooooltaaa logo!!!!!!

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  2. “Veja aí a mentira descarada do seu pai! ” Eu e a Mel assim😱 kkkkkkkk
    Sei não hein! Deduzo que a Sam sabe desse babado, apenas queria ouvir da boca da tenente e como ela não falou vai assinar o divórcio, mas sua pretensão é, sem dúvida alguma, protegê-la.
    A cada capítulo tenho crise de ansiedade pelo próximo.
    Bjs!

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