A víbora do mar -- Miranda -- Capítulo 26

            Os seguranças observavam a Lacassangner passar por eles com a expressão perturbada. Deveriam relatar o ocorrido à Miranda, como todos os passos dados pela filha do Serpente. Percebiam que tudo que se relacionava com a filha de Fernando Del Santorro era perigoso para a mulher que todos condenaram a viver nessa perseguição desenfreada.

            Retirou o celular do bolso, digitando o código que usava para comunicar-se com a chefe do departamento.

 

 

            Samantha seguiu para os aposentos.

            Sentia-se em chamas, queimava por dentro e por fora. Apoiou-se na porta fechada. Cerrou os dentes. Tinha a impressão que seu coração explodiria de tanto que batia descontrolado em seu peito.

            Tinha perdido seu precioso controle, tinha deixado ser dominada pela fúria que gritava em seu peito, pela agonia que sempre tentara afastar de si.

            Cobriu a face com as mãos.

            Não podia ter agido daquela forma com a jovem Santorini.

            Por que a queria tanto? Por que sentia como se o universo desejasse jogá-las naquela guerra desenfreada?

            Escorregou lentamente, sentando no chão, dobrou os joelhos, apoiando o queixo sobre eles.

            Os olhos azuis estavam fixos em um ponto qualquer.

            Em seu interior havia uma confusão de sentimentos naquele momento.

            Fitou a aliança que carregava consigo...

            Sentia como se estivesse traindo a memória da única mulher que a amara verdadeiramente.

            Nunca confessara a ninguém, porém sempre carregara consigo a decepção por não ter amado a sheika da mesma forma que sentia seu amor. Nunca tivera a explosão de sensações, jamais conseguira entregar-se completamente, como se em sua alma não tivesse mais resquício do sentimento tão cantado pelos apaixonados. Lembra-se de ter falado a ela, de ter contado como se sentia, mesmo assim Laura sempre fora compreensiva, aceitando o que tinha a oferecer, mesmo que fosse tão pouco.

            Nunca amara a esposa...Não como ela desejara...

            Lágrimas brilhavam em seus olhos.

            Nas inúmeras ocasiões que se encontrara com o terrível avô, ele sempre lhe falara algo que carregara consigo...Era amaldiçoada... Nunca teria felicidade naquela terra...

            Fora a culpada pela morte da mãe...Depois o pai definhara dia após dia naquele mundo sombrio...E mais uma vez causara sua morte...

            Era a maldita víbora do mar!

            Por que deixara a penitenciária?

            Fechou os olhos e viu a tenente...Não agora, mas há tantos anos, quando ainda era uma adolescente.

            A forma como cuidara da sua ferida...Como fora corajosa em retirar a bala que estava dentro de si...

            Engraçado como antes não tinha claramente aquelas recordações em seu cérebro...Como se tivesse sido apagadas...

            Por que culpava a militar?

            Quando retornara ao país para colocar em prática os planos da Miranda sempre deixara claro que não lhe afetaria a filha do duque, que seus passos e sua sede de vingança não seria algo que lhe incomodasse, pois aprendera a conviver com aqueles sentimentos contra si, porém aos poucos percebera como se enganara, como fora tola...Era da Mel que vinha toda a sua fraqueza, era ela quem conseguia penetrar por sua armadura, eram as acusações feitar por ela que a feriam terrivelmente.

            Sim, esse era o maldito amor que os poetas cantavam!

            Umedeceu os lábios demoradamente. Sentiu o sabor de ferro...Estava ferida da mordida, mas também sentia o gosto delicioso dela...

            Fechou as mãos na lateral do corpo.

            Para que tudo aquilo? Para no final o almirante falar: Achou mesmo que alguém tão bem criado e pertencente ao mundo sofisticado sentiria algo por ti?

            Esboçou um amargo sorriso.

            Aprendera muito cedo que não deveria ter sonhos...Aprendera quando deixara a ilha que sua vida não era um conto de fadas que teria um final feliz...Aprendera da forma mais dura que o avô não a aceitaria quando a conhecesse como pensara durante toda a infância...

            Quem era Samantha Lacassangner?

            A filha do mais temido pirata dos sete mares...A jovem que recebera todas as instruções, estudando com os melhores professores, pois seu pai os sequestravam para que pudessem dar a única herdeira todo o conhecimento que nunca poderia ter em uma escola.

            Falava inúmeras línguas, conhecia sobre leis, sobre economia, lera os clássicos da Literatura mundial, podia tocar Sinfonias de Beethoven, conversar sobre os mais variados assuntos, pois tivera aulas de oratória, manejava a espada como poucos...Fora moldada como tivesse frequentado os melhores centros de aprendizagem, porém isso não mudara nada, continuava sendo uma pirata.

            Uma pirata!

            Uma pirata!

            Levantou-se.

            Não permitiria que depois de tantos anos, depois de tudo que vivera voltasse a ser vítima dos próprios sentimentos. Nada poderia existir em relação a Santorini e não acalentaria essa ânsia como fizera com o sonho de ter o avô.

            No final, mostraria a todos a verdadeira face de Sir Arthur, no final mostraria a todos como o almirante fora cruel com a própria filha, como buscara por todos os meios destruir a neta. Agora entendia o motivo de ele não a ter matado, fora muito melhor mantê-la viva, torturando-a dia após dia.

            Fitou a cama.

            As cenas do seu corpo buscando pela tenente apareciam como estivesse ao assistir a um filme...

            Sabia que a militar também a desejava, porém era mais uma Ester da vida, com um agravante, a filha de Fernando a odiava, era traída pelo corpo que ganhava vida quando estavam juntas, mas trazia o desprezo em seu olhar sofisticado.

            Um drama mexicano...

            Livrou-se dos trajes de banho, seguindo até o banheiro.

            Sentia a água tentar apagar as chamas que ainda queimava em cada célula do seu ser... Sim, fora muito forte em se afastar, pois o que mais desejara fora dar continuidade aos toques, entregar-se inúmeras vezes...

            Não havia futuro para ambas, então esperava que a Santorini seguisse o conselho que lhe tinha dado, pois sabia que não conseguiria controlar a fera que a consumia.

 

 

            – Não irei me casar! – Mel vociferava para o pai. – Não vai me dizer o que vou fazer.

                A tenente deixara a fazenda da Víbora carregando dentro de si a humilhação pela forma que fora tratada. Sentindo-se traída pelo próprio desejo que parecia não ter limites. Ficara por minutos infinitos naquela piscina, sentindo que perdera mais uma batalha par a terrível pirata. Nem sabia como tivera forças para sair da água, vestir as roupas molhadas e retornar para casa. Os seguranças não a detiveram, deixaram-na seguir, afinal, a dona deles já tinha sido cruel o suficiente, o que mais poderiam fazer?

            Viu o olhar de Eliah, era como se ele conseguisse ler sua mente. E onde estava a pirata? Decerto, regozijando-se por tê-la humilhado miseravelmente.

            Ouviu a voz do avô.

            Sir Arthur tentava amenizar os fatos.

            -- Não acho necessário que percamos a calma!

            Ela não se importava com a explosão do duque.

            Mal pisara em casa e fora praticamente arrastada até aquela parte dos cômodos. Via a raiva no olhar do pai, o descontrole que ainda ela não entendera o motivo, não parecia lógico que houvesse toda aquela guerra só por ter decidido que não iria casar-se.

            Cruzou os braços.

            Estava com frio.

            – Você é minha filha, me deve obediência!

           – Eu não sou uma criança! – Disse por entre os dentes. – E não farei nada que o senhor fala. – Levantou o queixo orgulhosamente. – Não vai me obrigar a seguir o que deseja, duque!

           O aristocrata bateu com o punho fechado contra a mesa do escritório. Sentia a raiva invadir todo seu ser.

            Olhava para a única herdeira e a via com ódio só em pensar que realmente se tornara amante da Lacassangner.

            – Por que está toda molhada? onde você estava? – Perguntou em um urro retumbante.

            Ela sentiu a face corar.

            Imaginara que conseguiria livrar-se daquelas roupas antes de ir ao encontro da família, mas não tivera essa sorte.

            – Já sou muito grandinha para te dar explicações! – Respondeu calmamente. – Estou cansada de tentarem controlar meus passos.

            Fernando deu alguns passos em direção a ela, parecia pronto para fazer  filha ter mais respeito consigo, ela não se moveu, não parecia temer.

            – Eu acho que já estão passando dos limites! – O almirante advertiu-os. – Acha que não é necessário tudo isso. – Disse temeroso pela forma que o ex-genro agia.

            – Falarei com o almirante Ernesto – Apontou-lhe o dedo -- vou contar que continua se intrometendo em  assuntos que são proibidos a sua pessoa. – Encarou-a. – Vai perder sua patente.

            O maxilar da jovem enrijeceu.

            – Por que se importa tanto com as minhas investigações? O que há de tão sujo nessa história que não posso descobrir?

            – Mel, você está alterada, não é bom que se comporte assim. – Sir Arthur advertiu-a. – Deve respeito ao seu pai.

            Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            Nunca desafiara ou enfrentara o pai daquela forma, porém ele nunca agira tão radicalmente consigo. Não reconhecia o homem que estava diante de si, parecia um monstro, alguém que desconhecia totalmente.

             – Não vou continuar com essa discussão, arrumarei minhas coisas e seguirei até a capital.

              Fernando a viu deixar o escritório e só não foi atrás dela porque fora detido pelo ex-sogro, segurando-lhe pelo braço.

             – Não entende que desse jeito vai acabar afastando-a ainda mais.

             – Me desafiou! – Rosnou. – Agiu com petulância, foi arrogante comigo!

             – Se não tivesse elevado o tom de voz isso não teria acontecido. Eu te disse para agir com calma, pois ela não aceitaria ser tratada desse jeito.

            Fernando desvencilhou-se da mão que o detinha.

           – Tudo isso é sua culpa! – Apontou-lhe o dedo. – Mimou essa pirralha com ares de militar, deixou-a fazer sempre o que queria e agora ela se tornou uma pedra em nosso caminho... O que pensa essa maldita? Acha mesmo que poderá ir contra minhas ordens? Destruo-a sem pensar duas vezes!

           – Ela é a sua filha! – Sir Arthur dizia horrorizado.

           – Não deixarei que ninguém, nem mesmo a mimada da Mel se intrometer em meus planos. – Exibiu um sorriso doentio. – Somos muito parecidos, meu sogro, o senhor fez o mesmo com a Iraçabeth e nunca vi demonstrar nenhum tipo de arrependimento, então por que o faria?

            O almirante viu-o deixar o escritório pisando duro. Não confiava no duque, ele estava cada vez mais descontrolado com a obsessão de ter para si a maldita pirata. Arrependia-se por não tê-la matado-a quando teve a chance, se tivesse feito, nada disso estaria acontecendo.

            Mas ele não iria deixá-la destruir tudo, seria capaz de qualquer coisa para proteger a neta.





            A tenente estava no banho. Sentia o líquido gelado correr por suas costas, enquanto apoiava as mãos no box. 

            Pegou o sabonete e lentamente deslizava pelo corpo, fazia-o de forma delicada, pois sentia-se dolorida...

            Sentiu o sangue se concentrar em suas bochechas ao se recordar de como fora tomada na piscina. Era como se estivesse vendo os olhos azuis a lhe encararem de forma superior, de um jeito sádico…

            Como pudera gostar da forma que a pirata lhe tomara?

            Desligou a ducha, mas não abandonou o lugar.

            – Maldita Víbora, maldita seja por toda a eternidade! – Praguejava. 

            Sim, nunca seria uma Sheika, nunca seria uma senhora, nunca seria uma dama…era uma pirata desgraçada.

             Ouviu passos, pegou o roupão, vestindo-o.

             Encontrou o avô sentado em sua cama.

             – Não quero ouvir sermões! – Ela adiantou-se sem paciência.

            O almirante olhava para a mulher a lhe fitar e tinha a impressão que não era a mesma gentil Mel.

            – Só vim aqui para que reconsidere a demissão do Matias. – Segurou nas mãos o porta retrato da cabeceira. – A família deve servira aos Santorinis por mais de uma geração… A fazenda é sua, sua mãe te deixara, então essa decisão cabe a você.

             – O senhor disse bem, minha decisão e a minha decisão é que não quero o Matias aqui.

             – Por que ele acusou a Víbora de roubar os gados? – Questionou sem a encarar. – Continua defendendo essa mulher…– Passava os dedos pela figura da filha adotiva. 

              Ela fez um gesto negativo com a cabeça e depois falou:

            – Não estou defendendo ninguém, apenas estou cansada de um empregado da minha propriedade me fazer passar ridículos. Ele forja, inventa, mas nunca teve uma prova das acusações que fazia.

             – O que você sente por Samantha Lacassangner, Mel? 

             A militar fechou as mãos na lateral do corpo. 

             Via o olhar perscrutador do almirante analisando-a.

             – Sabe que quem contou ao seu pai dos seus romances proibidos foi a Ester… E você deve imaginar que a Ester deve ter ficado sabendo pela boca da filha do Serpente…

             Mel Respirou lentamente.

             – A filha do Serpente o fez porque sabia que isso causaria o caos na nossa família.

             – Porque o meu pai deseja a réplica da Iraçabeth? – Indagou com um arquear de sobrancelha. 

             – Porque seu pai foi enfeitiçado igual a você. – Levantou-se. – Já imaginou o que vai acontecer se realmente se envolver com essa mulher? 

             – Eu não me envolverei com ninguém! – Negou veemente. – Não tenho nada com ela!

            – Não acho que vai conseguir resistir…Case-se, vá embora com o Juan, ele te ama, construa sua vida longe de tudo isso.

           – Não o quero, não o amo! – Dizia indignada. – Não vou condená-lo, nem farei isso comigo.

           – O amor vem com o tempo, com a convivência.

           – Foi isso que o senhor falou para sua filha para convencê-la a casar com o duque? – Inquiriu afrontosamente. – Quer que toda a desgraça que se apossou da vida da Iraçabeth se repita? – Sentou-se na poltrona. – O senhor deveria ter deixado que sua filha fosse feliz.

           – Com um bandido? – Rosnou. – Você quer ser feliz com uma bandida?

           – Não tenho nada com a Lacassangner! – Negou convicta. 

           – Então jure que não vai voltar a se aproximar da pirata! – Exigiu. – Prometa que nunca vai ter nada com ela. – Insistia. – Evite uma tragédia…

           Ela engoliu em seco.

           Desviou o olhar e foi como se estivesse vendo a expressão perigosa a lhe advertir para não se aproximar nunca mais.

            – Não haverá nada entre a bruxa do mar e eu! – Disse levantando-se. – Mas também não permitirei que me contem suas histórias, não permitirei suas acusações sem que eu veja as provas, comprove-as. – Segurou as amarras do roupão. – Ficarei longe da sua neta, com a condição de que nem o senhor nem o meu pai façam algo contra ela, vamos buscar as evidências de que ela é culpada e quando houver a certeza, será a justiça que irá puni-la. – Chegou perto do almirante. – Não irei permitir que a machuquem, que tentem contra vida dela. – Levantou mais a cabeça. 

             O velho Santorini via a determinação no olhar da filha de Marie, sempre soube que ela não seria tão fácil manipular como pensara o duque.

             – Faremos como você diz, eu mesmo me certificar disso.

             – Então estamos entendidos…O Matias não trabalha mais aqui, nem eu me casarei com o Juan, nem vocês machucarão a Víbora!

             O almirante fez um gesto afirmativo com a cabeça, depois deixou os aposentos.



  

              Passaram quinze dias do retorno da tenente à capital. Fora enviada em um missão humanitária devido a um furacão que tinha devastado uma cidade no meio do pacífico. O lugar tinha ficado totalmente destruído, envoltos em escombros. Muitas pessoas tinham morridos, outras seguiam desaparecidas.

              – Você precisa descansar um pouco! – Cristina estava em um dos hospitais de campanha ao lado da amiga. – Nem sei qual foi a última vez que te vi dormir.

              A Santorini cuidava de um homem que tinha perdido uma das pernas. Seu estado parecia estável depois de vários dias de agonia.

             – Onde essas pessoas ficarão? – Mel questionou ao seguir para fora da tenda. – Não existe mais nada aqui. – Observou uma criança chorando no colo da mãe.

             Eram treze horas, mesmo assim, o sol mal conseguia aparecer encoberto pela névoa que cobria todo o lugar.

           – Alguns países as receberão… – A fisioterapeuta disse.

           – Sim, como sempre fazem, muitos vão viver nas ruas, porque nossos governos não se importam realmente com a dignidade dessas pessoas…ajuda humanitária serve apenas para que a imprensa veja que não estão de braços cruzados diante dessas tragédias. 

           – O príncipe Ralf está aqui, veio pessoalmente para ver a situação. Disse que irá ajudar a reconstruir tudo.

           – Isso é algo bom não é…

          – Sim, ele está sempre preocupado com tudo o que acontece com as pessoas…-- Hesitou, depois disse: -- Ele está com a Miranda Maldonado.

            Mel sempre ponderava o que ligava aquela poderosa mulher à Lacassangner. Até tentara falar com ela, mas nunca conseguira, parecia sempre ter um compromisso para não atender suas ligações.

           – Miranda? – Indagou curiosa. – Ela está vindo na nossa direção nesse momento.

         A chefe do departamento internacional tinha aceitado o convite do príncipe para observar de perto os estragos que tinha sido provocado pelo furacão. Saído dali seguiria até onde estava Samantha que viajara, mesmo sendo proibida, para ouvir de perto o depoimento do possível suspeito da morte de Laura.

            Sabia que ele não falaria tão rapidamente. Já estivera com ele, mas o homem não abria a boca.

            Viu a Santorini ao lado de Cristina, aproximou-se.

            Ficara interessada nos últimos relatórios que recebera sobre as movimentações das duas mulheres. A filha do duque dormira com a Samantha, isso estava bastante claro, nem precisara investigar o suficiente para constatar o fato. Sentira que havia algo muito maior entre as duas que o ódio que sempre fora plantado.

            O que se passara na piscina?

            Depois do ocorrido cada uma buscara distanciar-se...Mel se oferecera para aquele árduo trabalho em terras distantes, enquanto a pirata seguira em busca da sua verdade, ambas fugiam como o Diabo o fizera da cruz.

             Esboçou um sorriso, depois cumprimentou-as.

            – Já mandei minhas congratulações para o almirante Ernesto, escolhera os melhores para ajudar nessa tragédia. – Observava tudo ao redor. – Já estou trabalhando para angariar donativos para ajudar a reconstruir tudo. – Fitou a tenente. – O príncipe Ralf vai usar o aniversário para fazer isso. Queria pedir que participasse, é muito conhecida por seu uma ótima esgrimista. Poderia até dar uma palhinha, acho que seria muito bom.

            Mel via algo a mais na expressão da Maldonado, parecia analisa-la.

           – Não sei se poderei ir… – Dizia relutante. – Penso que ficarei um pouco mais aqui.

           – Sim, eu sei, mas acredito que até lá já terá retornado.

           Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça.

            -- Você também deve ir, Cristina, acho-a maravilhosa, sei muito bem como de grande apoio para a Olívia para conseguir se recuperar. – Tirou o comunicador do bolso. – Estive muito ocupada, mas acho que em breve vamos poder conversar, tenente, peço perdão por não ter retornado suas chamadas, muita coisa para resolver. – Fitou-a. – A última vez que nos vimos foi quando nos encontramos depois da Lacassangner leva-la para um lugar seguro.

            Os olhos dourados estreitaram-se, via no olhar da outra algo a mais que apenas um comentário inocente.

            -- Naquele último dia tive que contar com a sua bondade, não é qualquer uma que esquece o ódio para cuidar da mulher que era acusada de tantas barbaridades. – A chefe do departamento internacional continuava. – Imagino que não tenham se cruzado mais depois disso.

            -- Infelizmente tive o desprazer de vê-la outras vezes! – Respondeu cruzando os braços sobre os seios. – Por que o interesse?

            Miranda esboçou um sorriso.

            Sempre tivera uma grande admiração pela filha do aristocrata, sabia como ela agia, como não costumava esconder o que sentia, era bastante sincera, por isso confiava na jovem.

-- Preciso falar com o príncipe, nos vemos depois!

           Mel viu a Maldonado se afastar.

           – Por que não quer ir? – A fisioterapeuta indagou curiosa.

           A Santorini deu de ombros, apenas afastando-se.

              



           O carro estacionou em frente a clínica particular.  O segurança abriu a porta para Samantha, mas não se moveu, apenas observava o lugar, ponderava distraída.

            Parecia um lugar tranquilo. Não havia muitas pessoas naquela parte da recepção, apenas as atendentes que cumprimentavam a todos com um sorriso.

            A Víbora não seguira as ordens que recebera de Miranda e tinha seguido até o país para acompanhar de perto as investigações sobre a morte da esposa. Não quisera ficar na fazenda, sentia-se sufocando pouco a pouco depois de tudo o que se passara com a Santorini. Era como se os sentimentos em seu interior ficassem cada vez mais fortes, como se ansiasse por senti-la infinitas vezes.

            Tocou na aliança, circundando-a em seu anelar, brincava com a joia.

            Como pudera se apaixonar pela tenente?

            Não podia estar acontecendo isso consigo, mais uma vez sentia que fora usada em um jogo cruel do destino. Encantar-se pela única mulher em todo o universo que não deveria nem ter olhado.

            Fechou os olhos e reviveu pela enésima vez a cena da entrega de ambas...

            Meneou a cabeça violentamente, depois deixou o veículo.

            Viu Belinda vir ao seu encontro, abraçando-a.

           – Fiquei tão feliz em saber que receberia a visita de Sheika. – Depositou um beijo em sua face. – Parece ainda mais linda que da última vez nos vimos. – Segurou-lhe a face da pirata entre as mãos. – Senti até saudades.

            A Lacassangner esboçou um sorriso, depois segurou-lhe as mãos, beijando-as.

            – E você continua tão provocante como de costume.

            – Pensei que diria que estou mais gostosa! – Piscou ousada.

            Seguiram de mãos dadas até a cafeteria do lugar. Ocuparam uma mesa ao lado de uma janela panorâmica.

            – O que a trouxe a esse lugar gelado? – Questionou depois que se acomodaram.

            – Há um um homem que fora visto perto de onde aconteceu o assassinato da minha esposa, queria poder acompanhar tudo de perto. Ele está preso.

             – E descobriram algo?

            Samantha fez um gesto negativo com a cabeça.

            Tirou as luvas que usava.

            Estava frio no país que tinha um inverno rigoroso, usava um sobretudo na cor preta, blusa de gola longa, calças justas e botas.

            – Às vezes tenho a impressão que nunca vão descobrir nada. 

            A garçonete apareceu, anotando os pedidos.

          – Precisa ter paciência, meu bem, a Miranda sabe o que está fazendo, tudo vai se resolver. – Segurou-lhe as mãos. – Deve se cuidar, manter-se segura.

          – Não sou uma mulher de ficar esperando. – Tamborilava os dedos na mesa. – Não consigo apenas fingir que sou uma sheika, não consigo esperar que outras pessoas façam o trabalho pesado e eu apenas fique olhando... – Suspirou. – É uma tortura toda essa história!

            Belinda a olhava com atenção. Naqueles meses que estiveram juntas aprendera a ler as escassas emoções que aparecia no rosto bonito. Sempre achara estranho o fato de ela pouco demonstrar sentimentos, porém agora havia uma faísca nos olhos azuis, havia muito mais lá.

              – Mas terá que ser, não pode simplesmente agir de qualquer jeito, você não é qualquer uma, é a mulher que muitos queriam morta. – Exibiu um sorriso travesso. – Falando em te querer morta, como vai a tenente birrenta? – Questionou com um arquear de sobrancelha.

              A Lacassangner não respondeu de imediato. Observou atendente se aproximar, servindo uma jarra e alguns biscoitos.

 Bebeu um pouco do suco. Parecia pronta para deliciar a bebida, não se mostrava interessada em responder o questionamento.

            Há mais de quinze dias não tinha notícia da filha de Fernando e achava melhor que continuasse assim. Desde o último encontro deixara claro que não desejava vê-la mais.

            Sentiu-se incomodada ao se recordar do encontro que tiveram na piscina. Perderá todo o controle naquele dia. Não que se arrependesse do que havia feito, não mesmo, talvez, arrepende-se por não ter satisfeito o próprio desejo que ainda gritava por satisfação, afinal, sabia que ela tivera prazer, desejara senti-lo também.

            Mordiscou o lábio inferior.

           – Transaram não é? – Belinda Indagou cobrindo a boca com a mão. – Então a militar com cara de puritana deixou o desejo falar mais alto…Conte-me tudo, diga-me se foi tão bom assim...

           – De onde tirou isso?

           – Desses seus olhos azuis… Fico feliz que tenha saído do celibato… Acho que vou poder experimentar como é ser tocada por uma pirata perigosa. 

            – Você é louca! – Meneou a cabeça. – E como está sua mãe? – Indagou mudando de assunto.

            A loira comeu alguns biscoitos.

            Claro que ela não confessaria, estava claro, e o melhor seria não insistir, mesmo que tivesse certeza do ocorrido.

            Que irônico.

           – Está estável, acho que vai conseguir se recuperar, o médico está muito entusiasmado e eu também.

           – Fico tão feliz por isso…

           A loira a olhava, parecia investigar as emoções da Lacassangner, curiosa, provocou-a:

           – Depois de a tenente ter provado seu sabor não deixou de ser tão petulante ou ela era muito santinha para experimentar do veneno da Víbora? 

            A filha do Serpente remexeu-se desconfortável, cruzando as pernas.

            Claro que era provara de si, ainda a via deslizar os lábios por seu corpo, ainda conseguia ver o sorriso bonito antes de abaixar a cabeça para lhe proporcionar um prazer indescritível.

            Deus, como podia desejar tanto a menina arrogante?

            -- Não parece que surtiu efeito essa entrega...

           Samantha tentava não pensar na filha do duque e ocupava a mente com as investigações e com o projeto da usina. Não perderia seu tempo com frustrações românticas, não era uma adolescente, tampouco deveria cogitar algo a mais com a militar.

             Sentia-se, de certa forma, incomodada com o que fizeram no último encontro. Estava claro que a Mel não tinha experiência sexual, tampouco parecia adepta a sexo selvagem, sádico como fizera, coisa que sempre fora comum em muitas das suas relações sexuais, porém seria capaz de repetir, não se importaria em fazê-lo mais uma vez, entretanto seria com outra, não mais com a arqui-inimiga.

              –  A Santorini não faz parte da minha história. – Disse por fim.

           



            Sir Arthur tinha retornado para a capital. Seguia com seu sobretudo, chapéu e óculos escuros pelas ruas isoladas. Era tarde da noite, quase madrugada, não havia ninguém por ali.

             Ouviu um barulho estranho, pôs a mão sobre a arma que trazia na cintura.

             – Acalme-se, militar, sou apenas eu.

            Ele fez um gesto afirmativo com a cabeça, enquanto olhava de um lado para o outro.

            – Acabe o serviço! – O almirante ordenou.

            – Por que agora deseja que o faça? – O desconhecido questionou enquanto olhava o próprio punhal. – Eu quis fazer há alguns anos, porém o senhor proibiu.

             – Faça ou você será encontrado…imagine, o traidor de toda a história… imaginou o que farão contigo?

             – Acho que antes disso vão querer ouvir o que tenho guardado bem aqui! – Apontou para a cabeça. – Tem um diário…

             – Não seja estúpido, tem tanto a perder quanto eu, então apenas faça o que deve ser feito e terminemos com essa história.

            O homem com aparência sombria fez um gesto afirmativo, sumindo por entre os becos.

             Sir Arthur seguiu com as mãos dentro dos bolsos. 

             Sabia que essa fora a decisão correta, consertaria o erro que cometera há muitos anos e logo haveria um equilíbrio e todos seguiriam duas vidas em paz.



            Uma chuva forte caia sobre a cidade já devastada. Todos buscavam se protegerem, pois a ventania aos poucos ficavam mais fortes.

            Cristina ajudava os pacientes, tentando-os manter em segurança. Viu Mel do outro lado do hospital de campanha. Sabia que ela não estava bem. Ainda pouco ela não conseguira salvar um menino que tinha sido resgatado entre os escombros.

             Caminhou até onde ela estava.

             – Falei com o chefe da meteorologia, os satélites não indicam que teremos uma tempestade tão intensa quanto a anterior.

             A filha do duque estava parada, olhava para a rua escura e deserta. Ouvia ao longe choro de crianças, estava frio e não havia aquecimento, nem mesmo energia elétrica funcionava.

              – Sinto-me frustrada! – Disse por entre os dentes. – Se tivesse sido encontrado antes, ele não teria morrido.

              – Como pode garantir isso? – Cris indagou calmamente. – Ele estava muito ferido, se tivesse sobrevivido ficaria com inúmeras sequelas…

              – Ainda era uma criança…Quantos ainda vão morrer? – Questionou aborrecida. – Sabemos que há pouca ajuda nesse lugar, estamos aqui há dias esperando que outros países se compadeçam, mas até agora somos apenas nós.

              A fisioterapeuta a abraçou. Sentia as lágrimas quentes da amiga lhe molharem os ombros. Sabia como era dedicada, como ela sofria com os pacientes, como não fazia distinção entre eles.

              Ela estava certa nas palavras que dissera em total frustração. Poucos se importavam com o que acontecia naquele lugar pobre, com aquelas pessoas que pareciam invisíveis entre os mais abastados. Se tivesse mais ajuda não teria tantos desaparecidos, sob os destroços daquela terra que fora tão devastada.

               – Às vezes o mais importante não é chegarmos ao resultado, mas tentarmos e continuarmos tentando…e isso que estamos fazendo, tentando ao máximo ajudar a todos...Mesmo sabendo que não terá como fazer o impossível.

              Mel fez um gesto afirmativo com a cabeça.

             – Fiquei feliz que o príncipe Ralf vai usar o aniversário para angariar fundos e ajudar a reconstrução desse lugar. – Afastou-se. – Todos que estão aqui desejam ficar, querem continuar, reconstruir a vida…acho que é importante para eles, faz parte da identidade de cada um. – Tirou o estetoscópio do pescoço. – Pensei que o almirante Ernesto mandaria mais soldados.

            -- Acho que as olímpiadas de inverno acabaram por recrutar mais das forças militares. – Disse desdenhosamente. – Pensa em participar do cruzeiro beneficente?

            A Santorini não respondeu de imediato, seguindo para o interior do hospital de campanha. Observava os pacientes sendo cuidados pelas voluntárias.

             – Não sei ainda, quem sabe o que teremos que fazer quando retornarmos.

            -- Acredito que o príncipe pedirá pessoalmente pela nossa presença.

             – Mas eu pensei que aproveitaria para namorar um pouco com seu amorzinho. – Seguia medicando alguns moribundos.

             A fisioterapeuta ficou em silêncio, depois falou:

            – Estou cansada dessa relação… estou sempre sozinha, ela parece mais preocupada com os estudos que comigo.

            – Acho melhor que conversem, talvez consigam encontrar um ponto em comum em tudo isso.   

            Ouviram burburinhos na rua, seguindo rapidamente até lá.

            Então a Santorini viu Samantha Lacassagner!

            Pensou estar sonhando.

            A morena trazia uma garotinha nos braços e pareceu ainda mais surpresa ao ver a filha do duque parada na entrada do hospital de campanha.

            Miranda observava a cena.

            Agora teria mais tempo para analisar o que havia entre ambas.


 

Comentários

  1. Será que haverá um segundo sequestro? Porque esse tal de Fernando é capaz de tudo, inclusive matar a própria filha. Neste caso, só a Sam para salvá-la, tipo Chaves entendeu? Não estou mais com raiva da jovem Santorini🥰 inclusive já pode trocar uns beijinhos com a Samantha Kkkkkkkkk. Espero que a tenente conceda-lhe um voto de confia, mesmo com tudo contra. Não sei se foi impressão minha, mas achei que a Víbora arrependeu-se pela maneira como tratou a tenente.
    Ansiosa pelo próximo capítulo.
    Bjs!

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  2. Aí, Mel.
    Eu te amo, eu te odeio kkkk
    Entretanto, dessa vez você foi maravilhosa. Cheia de atitude, não baixou a cabeça pro avô. Supremacy Tenente.
    Usou de sua personalidade pra por o velho no lugar.
    Acredito que se ocorrer um atentado contra a Sam, talvez dessa vez a Mel veja que a família é realmente perigosa e possa até se juntar a Sam para chegar ao fundo de tudo isso. Espero que sim
    Outro capítulo impecável, Geh
    Parabéns.

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  3. Sam que se cuide,vem coisas terríveis para ela.
    Só espero que esse velho morra com uma bala na cara.

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  4. As duas fugindo de seus próprios sentimentos, tendo que lhe dar com o amor e o ódio. Mel foi incrível ao confrontar o pai e o avô. também acho que ela só fez piorar a situação da Sam. Sinto que vou sofrer mais um pouco nesse próximo cap rsrs.

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  5. Acho que sou do contra, eu gostaria que a Sam fosse mais enfática em provar a sua inocência para a Mel poder se entregar.

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  6. Geh, aparece...
    Eu não aguento mais entrar no site todo dia kkkkkkkkk

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  7. Gente, desculpem a demora, mas eu estou numa correria porque estou assumindo um concurso público que fiz e tá uma confusão com os horários. O capítulo está quase pronto, apenas preciso de mais uns dias para postar, assim que tudo de resolver, volto a postar a história. Acredito que até semana que vem vai tá tudo resolvido. Abraços.

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  8. Obrigada pelo feedback Geh, parabéns e muito sucesso para você!

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