A víbora do mar - Capítulo 17 - O resgate
As gaivotas voavam em círculos,
mostravam a felicidade pelo sol que já se mostrava no horizonte. O astro-rei
mostrava-se tímido ainda, mas já conseguia pratear a água do amanhecer. Fazia-o
como se também estivesse despertando, como se ainda não tivesse forças
suficientes para acordar de uma noite turbulenta.
O vento batia contra as velas, sacudindo-as, mas não tão
violentamente como quando a tempestade buscava destruir a embarcação. Ele fazia-o
com espasmos, esfriando a manhã que logo apareceria com mais brilho.
A resumida tripulação passara toda a madrugada em uma
reversão para que ficassem em prontidão e não fossem pegos desprevenidos.
Porém, Samantha não descansara, parecia sempre alerta, mesmo que não houvesse
certeza de que era a preocupar-se com os possíveis bandidos ou se sua apreensão
tinha a ver com os rebeldes olhos dourados que sempre estavam a lhe desafiar.
Os passos fortes e destemidos da sheika passeavam por
toda a embarcação. As botas de ponta fina demonstravam a frieza dos movimentos
que apenas se desequilibravam quando tinha ao seu lado a filha do maior
inimigo.
Eliah
observava os contornos da ilha aparecer diante seus olhos.
Há muitos anos não a via.
Recordou-se
do grande amigo, o grande pirata que assim se tornara devido às circunstâncias.
Fora naquelas águas que a filha de Sir Arthur trouxera ao mundo o bebê de olhos
tão azuis que hoje era Samantha Lacassangner. Amava-a como se fosse seu próprio
sangue e sempre estivera disposto a fazer de tudo para protegê-la.
Sempre pensava que tudo poderia ter sido
diferente se naquela terrível noite o almirante tivesse se compadecido da neta.
Iraçabeth acalentara esse sonho durante toda a gravidez, dizia que quando o
militar visse o milagre que tinha gerado tudo seria diferente. Ainda conseguia ver
a filha do Santorini a lhe pedir que cuidasse do recém-nascido e depois partir
para nunca mais voltar...
Um
dia ela acreditara que tudo mudaria...
Quanta
ingenuidade!
Fez
uma prece silenciosa para os seus deuses.
Assustava-se
com o desenrolar da situação, preocupava-se com o que estava acontecendo. Mesmo
que ficasse em silêncio, via tudo com crescente medo. Sabia que algo maior e
mais perigoso ameaçava as vidas das duas mulheres.
--
A ilha da serpente…
O
homem olhou sobre os ombros, viu a pirata exibindo um sorriso grande e vendo os
olhos cintilarem como estrelas numa noite iluminada.
Sabia que ela
deveria ter boas lembranças daquele mundo particular, pois enquanto estivera
ali, não conhecera a maldade humana. Era apenas uma menininha com um pedaço de
madeira que forjava batalhas imaginárias e corria de pés descalços pelas areias
brancas.
Sempre fora contra que o Serpente levasse a garotinha,
pensava que se tivesse ficado ali muita coisa teria sido evitada.
--
Quanto tempo vamos ficar aqui? -- O homem questionou voltando-se para ela.
A morena inspirou o ar marítimo.
Olhava tudo com grande entusiasmo. Depois de tantos anos
sentia uma fagulha de saudosas lembranças. Observava tudo e se via ali, via o
pai quando estivera lá para busca-la.
--
Não sei, o navio vai seguir por alguns dias até que Miranda diga que chegou o
momento de retornar...
Ele parecia
ponderar, depois falou:
--
A tenente vai conhecer seu esconderijo…
Samantha arrumava
os cabelos que o vento insistia em emaranhar.
Nunca em sua vida
sentira-se tão desafiada, nem mesmo quando fora levada pelos inimigos do pai
ficara tão amedrontada. Não era o temor pelos perseguidores, tampouco pelo Sir
ou pelo duque, mas temia as sensações que seu corpo parecia não ter forças para
repelir.
Observou o olhar
perscrutador do velho lobo do mar.
Sabia que ele estava preocupado. Fitou as
próprias botas durante longos segundos e só depois respondeu:
--
Ela nunca saberia chegar…
Viu
um dos homens trazendo a filha de Fernando. Viu-a com o pequeno animal nos
braços, exibindo o olhar desafiador nos olhos dourados. Não mostrava a rebeldia
costumeira, mas estava claro que faria tudo para tornar a situação sempre mais
difícil. Não podia negar que ela fora de grande ajuda no momento da tempestade,
não teria conseguido estabilizar o navio sem a ajuda da experiente marinheira,
mesmo assim a guerra particular da Santorini continuava.
Ainda sentia o
sabor dos lábios rosados.
Viu
o minúsculo short que ela usava e a camiseta preta sem sutiã, sentiu o desejo
voltar a atacar. Era muito bonita e em seu olhar queimava um fogo de
sentimentos perigosos. Viu os cabelos com reflexos dourados entre os fios
pretos. Conseguia ver os seios redondos delineados por uma das suas blusas.
Observou-a encará-la em grande petulância.
Os
anos que passara sem tocar e sem ser tocada por uma mulher pareciam condená-lo
a ansiar pelo corpo do ser que jamais poderia ter...
-- Coloquem os barcos na água e os suprimentos. – Ordenou tentando
distrair os pensamentos. – Tudo o que iremos precisar nessa estadia.
Mel
olhava tudo com atenção. Viu a praia e os grande coqueiros que circundavam o
monte de terra. Mesmo longe podia perceber que não havia habitantes
naquela área ou será que havia? Não ficaria surpresa se encontrasse mais
bandidos no covil.
Cruzou
os braços incomodada diante do olhar feminino sobre seu corpo.
Sentia
a face corar.
Odiava
a maldita pirata. Se pudesse, matá-la-ia, destruiria sua vida, humilhá-la-ia da
mesma forma que se sentira humilhada em todas as ocasiões que fora tocada.
Engoliu
em seco ao se recordar do último encontro.
O
que teria acontecido se Eliah não tivesse aparecido assustado com o felino.
Acariciou
os pelos sedosos do animal que trazia consigo.
Eram
tão macios...
Levá-lo-ia
consigo...
Ouviu
a voz feminina falando com todos.
Observava-a
dar ordens aos subordinados. Percebeu que ela trocara de roupa novamente e os
cabelos estavam úmidos. Voltara a banhar? Então decidira seguir até outro
aposento.
Acariciou a
barriga do felino que parecia cheia. Descobrira que era uma fêmea e que era bastante
travessa. Dormira consigo durante algumas poucas horas. Parecia sentir frio e
se aconchegara em seu abdômen, ronronando durante o cochilo.
Sua atenção
voltou-se para a captora. Ela usava uma luneta para examinar o lugar. Depois
ordenou que trouxessem um mapa e começou a passar informações para um dos
tripulantes. Ela usava o idioma italiano e fazia-o tão rápido que a deixava
confusa no entendimento.
Viu o olhar de
reprovação de Eliah em direção ao animal e lhe enviou um olhar de advertência.
Soltou um suspiro que chamara a atenção de
Samantha.
Observou os olhos
azuis misteriosos. Eles fitavam os seus, fazendo-o friamente.
Desviou o olhar
para as roupas que ela usava. Era uma pirata muito moderna com suas calças
coladas, jaquetas e botas de couro. Usava os óculos delicados.
--
Onde estamos, Víbora? -- Indagou impaciente.
Eliah
olhou de forma desaprovadora para o gato e depois seguiu para ajudar os outros
a organizarem tudo para desembarcassem.
Mel
não recebeu respostas, então seguiu para a proa do grande navio, enquanto
olhava tudo ao redor. Levantando a cabeça observou o sol, assim conseguiu
descobrir que estavam além do Norte, mas ainda não conseguia identificar o
lugar. Navegara por aquela terra, mas não se recordava de ter uma ilha. Seria
verdade que aquele era o famoso esconderijo do maior pirata dos sete mares?
Achara que estavam brincando consigo, não pensara que poderia realmente existir
a tal fortaleza.
--
Seja bem-vinda a ilha da serpente.
A
tenente sentiu um arrepio na nuca ao ouvir a voz falar tão perto da sua orelha.
Respirou
fundo e seus sentidos foram invadidos pelo aroma delicioso que se desprendia do
corpo feminino.
Não conseguira ouvir os passos, por isso não
imaginara que a inimiga posicionara-se tão atrás de si. Viu os olhos verdes da
gatinha fitar a bandida com atenção e curiosidade.
Durante longos segundos permaneceu imóvel. Apenas
lá, parada, ouvindo a respiração da captora.
O que fazia a Lacassangner
ser uma inimiga tão assustadora?
Quase não
conseguira parar de pensar nela...
Seu corpo nunca se
sentira tão frágil diante de um toque. Nunca sentira que desfaleceria de tanto
prazer ao ser tocada por alguém...
Como podia
sentir-se atraída sexualmente por aquela mulher?
Não... Não e não!
Devia existir uma
explicação científica para tudo isso. Algo que ainda não entendera, mas que
logo o faria. Não havia lógica em todas as sensações que experimentara, não
podia existir.
-- É a primeira
vez que trago uma... amiga – enfatizou a última palavra – para casa.
--
Então ela existia mesmo? -- Questionou sobre o ombro e se arrependeu do que
fez, pois os lábios da morena estavam entreabertos e tão convidativos como um
morango pronto para ser devorado.
--
Sim, óbvio. -- Estendeu o braço e começou a acariciar o animal. -- Você e sua
amada marinha jamais acreditavam que existisse, pois nunca tiveram capacidade
de encontrar.
A
tenente sentiu o roçar acidental nos seios e logo os mamilos reagiram. Voltou a
olhar o lugar.
--
E o que vamos fazer aqui?
--
Descansar… Preciso dormir…
Um silêncio
voltou a reinar entre elas, mas a voz desafiante soou baixa.
--
E se eu tentar fugir?
--
Não chegaria a lugar nenhum, meu bem, morreria bem antes disso, então o melhor
é que você e seu gatinho se comportem… porque se você tentar algo, a gente vai
comer ensopado de felino.
Os
olhos dourados voltaram a encarar a pirata.
-- Vai pagar caro por tudo isso, Lacassangner, vai se arrepender por tudo o que
está fazendo.
A
morena apenas sorriu, enquanto seguia até onde estavam os homens preparando os
barcos.
Sir
Arthur andava de um lado para o outro no escritório, enquanto encarava o duque
que estava sentado em sua escrivaninha e parecia procurar alguns papéis.
Ainda nada conseguira ser resolvido, mesmo que estivessem
tomando todas as providências para que isso acontecesse. Estivera várias vezes
com o almirante Ernesto. A própria polícia já seguia para os mares em busca dos
possíveis raptores.
--
O que quer que eu faça? -- O pai de Mel, Fernando, esbravejou. -- me proibiram
de seguir junto nas buscas, mas já aluguei barcos para seguir e um helicóptero
também vai participar. -- Levantou-se. -- Se tivesse se livrado da sua maldita
neta quando teve a chance nada disso estaria acontecendo.
Arthur não acreditava na culpa de Samantha, mesmo que
odiasse tudo o que ela representasse, estava certa de que não faria algo assim,
não se exporia daquele jeito, não quando seu único desejo ainda se mostrava
obscuro.
Por qual motivo a filha de Iraçabeth tinha retornado?
Não agiria assim...
Temia que algo pior estivesse por vir, temia que a única
ameaça naquele momento não fosse apenas a maldita que tinha seu sangue.
Fernando abria as gavetas do criado-mudo, parecia
procurar algo muito importante para si.
--
Não vou discutir sobre isso, esse não é o momento e também não acredito que a
Lacassangner tenha feito isso, por qual razão ela teria levado a Olívia?
--
Vingar-se, afinal, a minha filha ocupa o lugar que ela nunca teve… -- Esmurrou
a madeira da escrivaninha. -- Maldita pirata!
O bote seguia pela praia. Samantha
remava de um lado e Eliah do outro. Levavam alguns mantimentos, enquanto a
tenente olhava tudo com a perplexidade pairando em seu olhar.
Mais
a frente se via coqueiros enormes e vegetações rasas nas areias.
O
trajeto todo foi feito em silêncio. A Lacassangner parecia mergulhada em
lembranças de outrora, nos olhos azuis havia um brilho saudoso.
Seguiram
por mais alguns minutos até pararem na areia branca.
A
tenente seguiu empertigada com o gatinho, enquanto Eliah levava alguns
mantimentos e a pirata duas mochilas.
--
Acha que o castelo de pedras ainda existe? -- O velho questionou, enquanto
seguiam.
Samantha não respondeu de imediato. Pegaram uma trilha por grandes coqueiros e
algumas palmeiras imperiais, passando por uma trilha estreita, havia algumas
ervas daninhas, uma mata fechada. Eliah cortava caminho entre a vegetação.
Caminharam por mais de dois quilômetros e logo chegavam diante de uma caverna
com passagem estreita.
A
tenente observava tudo com atenção e quando penetraram no lugar, assustou-se
com os morcegos, o que provocou risos na Lacassangner.
Mel
lhe dirigiu um olhar de irritação.
Continuaram
a caminhada e logo seguiam por outra abertura e alguns segundos depois saiam do
outro lado e lá estava a construção de pedra, lembrava os castelos
medievais.
A
filha do duque parecia tão distraída com o que via que não notou a pequena
felina pulando dos seus braços e correndo para a entrada da construção.
A
marinheira viu o símbolo da serpente desenhado no grande portão. Lentamente,
aproximou-se, tocou-a. Estava entalhada na madeira e mesmo com o tempo ainda
parecia glorificar o pirata que ostentava seu poder nos mares.
Crescera ouvindo histórias sobre o maior mito que
contavam sobre a ilha, em como o Serpente usava o esconderijo para fugir das
perseguições...
Ninguém a encontraria agora...
Eliah
já adentrava o espaço, carregando as mochilas.
Samantha
não seguiu de imediato, parando bem atrás da jovem mulher.
Sentiu
o aroma delicioso que se desprendia dos cabelos e mais uma vez se sentiu em
chamas.
--
Seja bem-vinda a minha humilde residência.
A
Santorini se voltou tão abruptamente que quase caiu, só não aconteceu porque a
pirata conseguiu lhe segurar pelos ombros.
--
Então existe mesmo… -- Sussurrou.
-- Sim… esse foi meu lar durante dez anos da minha vida…
Mel
mirou os olhos tão azuis, sentia os dedos longos lhe tocarem a pele, parecia
brasa.
--
Seu lar?
A
Lacassangner esboçou um misterioso sorriso. Os dentes alvos pareciam brilhar.
--
Sim, tenente, eu vivia aqui, escondida de todos, essa era a forma que meu pai
tinha encontrado para me proteger de pessoas como você. -- Baixou os olhos. --
Seus lindos seios parecem botões de flores prontos para serem colhidos…-- Usou
o polegar para tocar nos mamilos. -- Acho melhor que use sutiã.
As
bochechas da tenente ficaram vermelhas diante das ousadas palavras.
--
Não tenho culpa da sua fraqueza, pirata. -- Retrucou com desdém, enquanto lhe
repelia o toque. -- Então foi aqui que o maior pirata da pós-modernidade
escondia sua cria! -- Falou com sarcasmo. -- Mais alguma utilidade?-- Indagou
desdenhosamente. – ou só servia para os bandidos se esconderem? – Provocou-a.
-- Também servia para fazer orgias… -- Piscou debochada.
Mel
a observou seguir pela ponte de madeira gasta, caminhando até o arco que dava
para a entrada.
A
tenente examinava tudo com atenção e parecia cada vez mais perplexa diante da
descoberta.
Era
uma antiga construção da idade média, havia torres de defesas, um fosso e
apesar do tempo, parecia bastante conservado.
Viu
a gatinha correndo e só naquele momento percebeu que ela tinha fugido. Agachou,
segurando-a.
--
Cuidado... se você fugir é capaz do Eliah te jogar no mar.
O
pirata organizava tudo.
Desde
que chegaram não parara nenhum momento. Samantha também se ocupava do lugar,
mesmo que passassem poucos dias, precisavam de um mínimo de conforto. Fora
buscar lenha para poder aquecer o frio ambiente. Tudo ficara como da última vez
que estivera ali, nada mudara, apenas os que ali viveram não eram os mesmos.
O
aposento que ocupava ainda dava para se aproveitar, conseguia tirar grande
quantidade da poeira, usou o colchonete para colocar sobre a construção de
tijolo que serviria como cama.
Seguiu até a janela em arco.
Algumas trepadeiras projetavam-se para o interior do
ambiente. Olhava o mar, o céu tão azul que se projetava para um dia ensolarado.
Tocou nos trincos...
Respirou fundo!
Voltou a se ocupar, tentando preencher a mente com
pensamentos menos dolorosos, menos preocupantes.
Terminava
de limpar a tina de madeira quando sentiu a presença de alguém atrás de si. Não
precisava se voltar para saber de quem se tratava.
A proximidade da herdeira do poderoso duque era bastante
perturbadora. Sempre perdia a calma e o controle do desejo quando estava diante
da militar arrogante. Ela fazia questão de provocar, de enfrentar e isso a
preocupava.
A
garotinha do papai, a herdeira do duque de Santorini.
--
Eliah me pediu para trazer esses baldes com água. -- Disse olhando tudo ao
redor. -- Teve um trabalhão para cuidar de tudo aqui, hein! – Exclamou em
admiração. – Quando for presa vai conseguir trabalhar na prisão.
-- Trabalhei quando estive na prisão... – Respondeu dando
de ombros.
A jovem tenente examinava o quarto.
Tinha aproveitado para procurar conhecer a construção e
ficara encantada. Imaginara como seria viver ali quando criança. Quantos
lugares para brincar...porém solitário.
-- Vai arrumar tudo?
Samantha
levantou-se, enquanto limpava a testa que escorria suor. Arrumou os cabelos no
rabo de cavalo e só depois respondeu.
--
Apenas essa parte e onde o velho pirata vai ficar foram cuidadas, o resto não é
do nosso interesse, afinal, não vamos permanecer mais de dois a três dias aqui.
Mel
olhava o ambiente. Não tinha nada de extraordinário, apenas o lugar para
dormir, uma cadeira gasta pelo tempo e recipiente usado para o banho. Havia a
porta na lateral que era o banheiro.
-- E onde eu ficarei?
A
Lacassangner aproximou-se pegando os baldes e jogando o conteúdo na tina.
--
Vamos dormir aqui, você e eu, não esqueça que é minha prisioneira, não vou te
deixar sozinha.
--
Não tem algo pior? -- Desdenhou com os braços cruzados. – Poderia ser uma
masmorra... até o fosso...
Samantha riu.
--
Tem sim, sinhazinha, o estômago de um tubarão parece interessante para sua pessoa?
--
Melhor que acompanhada de uma pirata…
A
Lacassagner viu-a dar a volta para sair, mas soltou o balde, segurando-a pelo
pulso, levando-a até a cama, fazendo-a sentar. O ato foi feito de maneira
delicada, não usou da força, talvez por isso a jovem Santorini não tivesse
reagido.
--
Comportar-se, Mel, não estamos em um dos parquinhos de treinamento da marinha,
há pessoas em nosso encalço e acredite, eles não são os heróis da sua história.
A
filha de Fernando apenas ouviu o nome ser pronunciado e a forma aveludada da
voz baixa e controlada. Era a primeira vez que a ouvia lhe chamar pelo nome de
Mel e teve a impressão que foi acariciada de forma tão íntima que sentia
calafrios percorrendo seu corpo.
Fitou
os olhos azuis.
Eram
tão lindos, tão penetrantes que pareciam querer invadir a sua alma. Ainda se
recordava de quando a encontrou pela primeira vez, na casa do avô, de quando a
tratou da ferida. Ainda sentia calafrios ao se recordar daquela noite.
--
Logo isso vai passar, vai ter seu casamento e tudo será custeado, só precisará
aparecer linda no altar e aceitar seu futuro marido.
A
tenente soltou um longo suspiro.
-- Acredito que as únicas pessoas que estão nos
perseguindo é você mesma...
-- Não... Não sou sua inimiga... – Acariciou-lhe a face.
– Tente se comportar só por mais uns dias...
A Santorini observava a expressão preocupada. Observava
os dedos longos lhe fazerem carinhos. Viu-a com atenção... Era tão linda... Os
lábios cheios... Havia um pouco de fuligem em sua testa...
O que realmente se passava?
-- Comporte-se...e no final, quem sabe, não te dou um
prêmio...
Mel arqueou a sobrancelha esquerda em indagação, mas só
recebeu um sorriso como resposta.
--
Vou tentar esperar pelo momento certo para agir, enquanto isso farei segundo a
minha vontade e não a sua.
A
Lacassangner mordiscou a lateral do lábio inferior demoradamente, enquanto
observava a jovem herdeira Del Santorro.
--
Eu sei que você gosta de desafios… porém te aviso que eu sou um desafio
perigoso, comandante suprema... não acho que deveria querer se queimar nesse
fogo...
Olívia
a viu se afastar, colocando a água na tina, depois a viu começar se livrar das
roupas. Deveria desviar a vista, sair daquele quarto, mas a cena parecia tão
hipnotizante que continuou onde estava, apenas admirando o corpo feminino.
Viu
a marca que carregava perto do bumbum, tinha um formato de serpente. Sabia que
ela tinha sido marcada a ferro quando era ainda uma criança, fizeram-no para
que todos soubessem que era a garotinha de olhos da cor do céu.
Observou
os seios redondos…Não eram grandes, eram médios...bronzeados...as coxas eram
torneadas...
Soltou
um longo suspiro.
Samantha submergiu, sentindo o corpo relaxar ao contato com o líquido.
Às
vezes tinha a impressão que passaram meses naquela situação, sua paciência já
escassa parecia não mais existir. Todos os dias era uma batalha que tinha que enfrentar
com a filha de Fernando, uma guerra externa e uma ainda mais poderosa interna,
pois seu desejo só aumentava.
Inclinou
a cabeça para trás e fechou os olhos.
Quando
retornasse para a cidade talvez se entregasse aos prazeres da carne, precisava
disso como o próprio oxigênio nos últimos dias.
Seu
sexo doía, seus seios imploravam por um toque, pareciam desesperados por
carícias...
Pegou
a esponja e passou pelo pescoço e se demorou mais no colo…Sentia-os...
--
Quem fez a marca em você?
A
voz da tenente a despertou. Abrindo os olhos a viu agachada bem perto,
assustou-se.
--
Pensava que já tivesse saído.
--
Quero saber quem fez a marca? – Insistia. – Quem fez?
A
Lacassangner fitou os olhos dourados, os lábios entreabertos, os dentes alvos.
--
Por que não entra aqui? Aproveita e toma um banho, está com cheiro de peixe,
então eu te conto o que deseja saber.
Mel
sabia que ela estava provocando, mas decidiu entrar no jogo.
Levantando-se,
tirou a roupa diante do olhar estupefato da bela morena, depois fez o que a
outra sugerira.
Encostou-se
na outra ponta, ficando de frente, buscando não encostar no corpo da
sequestradora.
--
Pronto, pirata, conte-me enquanto retiro o cheiro de peixe.
Samantha
riu alto tentando dispersar a vontade que sentia de toma-la.
--
Então, tenente, essa marca eu ganhei quando tinha doze anos. -- Segurou-lhe o
pé. -- Vou te lavar.
Mel
apenas deu de ombros, porém o toque em sua pele era torturante.
--
Meu pai me levou em uma das viagens, o navio foi atacado e fui levada nesse dia…
-- Falava de forma distraída, parecia estar revivendo a cena. -- Fui chicoteada
e passei vários dias presa em uma masmorra, em um desses dias decidiram me
marcar, assim eles saberiam quem era a filha do serpente do mar.
--
Meu Deus! -- Exclamou horrorizada. -- Como fizeram isso com uma criança?
A
Lacassangner não pareceu se importar com o olhar de pena que a outra
apresentava, apenas continuou a lhe lavar os pés e logo chegava até a
panturrilha.
--
E como conseguiu fugir? -- Mel questionou já sentindo um arrepio diante do
toque.
--
Meu pai me salvou e matou todos os piratas em um dia de tempestade…-- Disse
orgulhosamente.
--
Seu pai era um bandido, deveria ter entregue essas pessoas para a lei.
--
Engraçado, você mesma já deixou bem claro que gostaria de me pendurar em uma
corda em praça pública. Já me feriu várias vezes e se eu não me protejo é capaz
de me matar com a sua espada.
--
Porque você é uma pirata, uma maldita assassina igual ao bandido do seu pai.
Samantha
foi tão rápida ao segurá-la pelos pulsos, puxando-a bruscamente para sobre seu
corpo, segurando-lhe os pulsos.
Mel
cerrou os dentes de raiva, enquanto observava de perto a face feminina que
exibia um sorriso arrogante. Queria cobrir-se, mas também desejava lhe rasgar o
rosto delicado.
--
Fique quietinha, nada de usar suas garras, tampouco tentar me matar.
-- Solte-me! -- Exigiu em voz alta.
-- Não, tenente, agora você vai ficar quieta e parar de falar essas besteiras,
não fale coisas que não sabe, não entende o que se passou, não conhece toda a
história, então fique calada.
--
Não me calarei, falarei quantos vezes eu quiser, seu pai era um bandido, você é
uma pirata desgraçada que agora posa de mulher importante… -- Vociferava. – É
uma vagabunda... Uma sem valor que vive nos braços de qualquer uma...
Samantha
apertou-a mais.
--
Minha vontade é cortar essa sua língua de víbora…
--
A víbora aqui é você, filha da serpente…
A
Lacassangner a trouxe mais para perto de si.
--
Deixa eu ver se essa língua sabe fazer outra coisa além de preguejar…
Mel
já se preparava para protestar, mas logo seus lábios foram esmagados por outro
ainda mais macios.
Trincou
os dentes para não permitir o acesso, mas logo a língua da morena lhe contornava
buscando romper as defesas.
--
Deixe-me… -- Mel pediu.
--
Daqui a pouco… Primeiro vamos nos entender… -- Falava contra a boca.
--
Não tenho diálogos com piratas! -- Retrucou, encarando os olhos azuis.
--
Então vamos passar a noite toda aqui… -- Mordiscou a lateral do lábio inferior.
-- Eu não vejo problemas, porém acho que essa posição é um pouco perigosa…
Mel
tentava não pensar naquela informação, pois tinha a impressão que seu corpo
estava em fogo, queimava como se estivesse febril. As brasas ficavam mais
perigosas...
Sentia
os seios redondos contra os seus, as pernas longas lhe acolher entre as suas…
Meneou
a cabeça para se livrar das imagens, voltando a fitar a mulher.
--
Deixe-me, Lacassangner, não gosto dos seus joguinhos, odeio as suas
brincadeiras arrogantes…
--
Não estou brincando, estou falando sério, preciso que converse comigo para que
consigamos chegar a um acordo.
--
Acordo? -- Indagou com um arquear de sobrancelha. -- Você me sequestrou,
manteve-me presa em um quarto, trouxe-me para essa ilha perdida, me roubou no
dia do meu casamento e agora quer fazer acordo? Vou fazer acordo sim, um acordo
de te ver presa e pagando pelo que fez.
--
Pelo menos não quer mais que me enforquem… Já estamos evoluindo…-- Sorriu. --
Eu te dou minha palavra de pirata que no máximo em uma semana você vai voltar
para sua casa… Sã vai depender de ti, mas vai voltar salva…
--
Uma semana?
A
morena fez um gesto afirmativo com a cabeça.
--
A gente só precisa viver em paz durante esses dias e logo retornamos e pode me
jogar na prisão.
A
tenente sabia que seria uma guerra inútil e cansativa, porém não era tão fácil
suportar a presença daquela mulher.
Se
ela cumprisse a palavra e em sete dias pudesse retornar, talvez o sacrifício
valesse a pena.
--
Ok, vou tentar fazer como sugere, óbvio que a condição é que me deixe em paz,
sem provocações… Ignore a minha pessoa e tudo ficará bem.
--
De acordo, vou ignorar sua pessoa, vou viver como se não estivesse aqui.
--
Ótimo! Agora me solte!
--
Antes vamos selar o nosso acordo…
Antes
que Mel pudesse questionar sobre o que fora dito, sentiu a boca se apossar da
sua em um beijo brusco, agressivo, mas que aos poucos foi ficando delicado.
Sentiu quando as línguas se encontraram e daquela vez permitiu que a outra
fizesse o que desejasse, apenas queria saber se algo podia ficar ainda mais
delicioso.
Samantha
soltou-lhe os pulsos, segurando o rosto delicado entre as mais, ansiando por
aprofundar ainda mais o contato.
Mesmo
que não devesse, balançou os quadris contra os da jovem, ansiou por algo que há
anos não tinha, mas logo buscou seu autocontrole.
Afastou-a.
--
Isso não vai mais acontecer, do mesmo jeito que sua forma de me desafiar não
vai mais acontecer. -- Levantou-se. -- Logo vamos retornar e tudo será
resolvido.
Mel
soltou um longo suspiro. Estava envergonhada por ter deixado que a tocasse tão
intimamente.
Manteria
distância daquela mulher enquanto estivesse naquela ilha, isso era o melhor a
fazer, até que retornasse à cidade e pudesse fazer aquela mulher pagar por tudo
o que tinha feito.
Após passarem quase cinco dias no esconderijo da
serpente, um navio aparecera no horizonte, não era o mesmo de antes, esse
trazia as marcas da marinha. Mel seguia ao lado de Eliah, enquanto Samantha
tinha ido antes para a embarcação. A tenente não tinha tido mais nenhum contato
com a Lacassangner, nem mesmo tinham dividido o quarto. Ambas mantiveram
distância e não tinha ocorrido nenhuma provocação entre elas. A filha do pirata
tinha cumprido com o prometido. Deixara-a em paz e não houve mais discussões. A
Santorini aproveitara para explorar o misterioso lugar. Parecia querer encontrar
naquelas terras os passos do curioso pirata.
Soltou
um longo suspiro que chamou a atenção do velho pirata que remava.
--
Tudo bem, senhorita?
O idoso percebera a movimentação que ocorrera nas últimas
quarenta e oito horas e percebera que tanto a sheika quanto a militar
mantiveram-se separadas durantes todo o tempo. Samantha passara maior parte dos
dois dias ocupando-se com leitura. Examinara várias vezes o mesmo mapa,
enquanto ficava na torre e examinava todas as movimentações que ocorriam no
oceano. Sabia que não podia baixar a guarda, pois o perigo ainda existia.
Voltou a fitar a prisioneira e seu gato que dormia.
A
jovem não respondeu, apenas acariciava os pelos do felino que seguia em seus
braços. Via ao longe a embarcação e seu coração vibrou ao perceber que se
tratava da sua tão respeitada marinha.
Mexeu-se inquieta.
Teria chegado o momento da Lacassagner pagar o que devia?
Como tinham chegado ali?
--
Estou ansiosa para voltar para a minha casa e poder fazer essa víbora pagar por
tudo o que fez. –Respondeu exasperada. – E parece que esse momento já chegou...
– Exibiu um sorriso vitorioso. – Sinto muito por ti, Eliah...
O
pirata sorriu.
--
Sua raiva pela minha senhora é muito visível... Veja, não vai demorar para
voltar salva para sua casa... Seja boa...
--
Odeio-a! – Disse por entre os dentes – Odeio-a!
--
Tenha calma, não precisa de tudo isso…
--
Calma!? -- Respirou fundo. -- Como pode seguir essa mulher? Como pode aceitar o
que ela está fazendo? Uma pirata que precisa ser punida e ainda não aconteceu,
mas eu o farei... Vou contar tudo o que houve... Vai ser punida...
--
A Samantha passou quase dez anos em uma cela fria de prisão, ela não tem mais
nada a pagar, na verdade nunca teve.
--
Foi acusada de matar a própria esposa…
--
Mas ela não o fez... Ela nunca faria algo assim...
-- Não me importa!
– Cortou furiosa – Ela pode até ser inocente da morte da mulher, porém não é
inocente do que fez a mim e a minha família.
-- Um dia toda a
verdade aparecerá...
A
tenente soltou um longo suspiro de irritação. Não iria discutir com aquele
homem, sabia que ele estava cego diante da fidelidade que tinha com a pirata.
O
bote seguiu lentamente e logo chegavam ao navio.
A
Santorini viu Samantha de braços cruzados e sentiu uma imensa vontade de
começar a discussão que nunca terminava. Por que não estava algemada? Deveria
ter sido presa!
O navio tomou
a direção contrária, seguia para longe da ilha.
Mel
permanecia na polpa, apenas se deixava levar, parecia mapear toda a região para
que quando tivesse que retornar um dia.
Miranda observava tudo ao redor e ficará feliz
em ver Samantha e a Santorini. A força-tarefa que fora mantada conseguira
capturar os bandidos que invadiram o cruzeiro. Nenhum abrira a boca, mas pelo
menos fora retirado da Lacassangner a possível culpa pelo que tinha ocorrido.
Sentia-se feliz por tudo estar acabando bem, mesmo diante do ocorrido.
Viu a filha do
duque que se encontrava a olhar o mar.
--
Seja bem-vinda, tenente!
Mel
ficou perplexa ao ver a chefe da organização internacional de segurança. O
almirante Ernesto aproximando-se.
Observava
todos com atenção e não demorou para Eliah aparecer e em seguida Samantha.
A Santorini exibiu um olhar de superioridade, parecia pronta para receber sua
tão sonhada vitória e ver aquela mulher a pagar por tudo naquele momento. Não
haveria mais desculpas, nem desenganos, só teria que ver a pirata ser punida
por tudo o que fez.
--
Estamos eternamente gratos a você, Samantha, se não fosse por sua inteligência
e experiência no mar, nesse momento a senhorita Olívia estaria nas mãos de
bandidos perigosos.
Os
olhos dourados se estreitaram de forma ameaçadora diante do sorriso cheio de
sarcasmo que a Lacassagner exibiu.

Aah posta mais um, por favor. Estava tão bom.
ResponderExcluirTenho quase certeza que por trás desses bandidos esta o noivinho da chata tenente e sua irmã,afinal, ele fez questão do casamento no navio ,pois esta ele falido. O Duque é outro demônio,e Mel vai ter que pedir muitas desculpas de joelhos para a Sam. Beijos autora que amo.
ResponderExcluirAinda acho que a Sam tem muita paciência com a Mel, o tanto de palavras pesadas que ela joga haha, mas não a culpo, ela não sabe da verdade. Delícia de ler tudo isso.
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