A dama selvagem - Capítulo 35
A pista de pouso particular dos
Calligaris era iluminada por luzes.
Estava garoando e alguns funcionários
já faziam sinal para que a aeronave pousasse.
Vanessa estava com o guarda-chuva e
esperava ansiosamente para que o pequeno pássaro aterrissasse. A figura alta e
usando sobretudo parecia pensativa, mirando um ponto invisível a sua frente.
Respirou fundo!
Tentara dissuadir a matriarca da
importante famı́lia a não retornar da Alemanha, porém Antônia deixara claro
que não aceitaria nenhuma negativa, ainda mais agora que a sobrinha corria
tanto perigo.
Desde que tivera o difı́cil papel de
comunicar todo o ocorrido, tivera que lidar com os esbravejamentos de Dinda e
seu temor por não ter notı́cias da amada sobrinha, algo natural...
A empresária apertou forte o cabo da
sombrinha.
Sentia-se culpada por não ter sido mais
enérgica e obrigado Diana pedir ajuda as autoridades competentes... Teria
conseguido algo?
Meneou a cabeça negativamente.
Mas alguém poderia ir contra a pintora?
Conhecia-a a tempo suficiente para saber
que ela não costumava escutar ninguém, nem mesmo se importava com a opinião
dos outros, apenas agia de acordo com o que acreditava e desejava...
Ouviu o som do avião se aproximar.
Não tinham conseguido passagem direto
para capital, por essa razão, Dinda tinha desembarcado em outra cidade e lá
pegara o jatinho.
Ouviu o bip do celular, pegou o aparelho
no bolso do casaco. Havia mensagens da Bianca.
A jovem loira estava em total desespero
por tudo o que aconteceu...
Alex seguia em estado crı́tico e o
prefeito fora detido como cumplice de Crocodilo... O coronel que se
responsabilizara da busca pelo bandido também fora apontado como participante
da quadrilha, junto a mais alguns membros do exército.
Torceu a boca em irritação. Um monte de
bandido!
Ricardo estava em alvoroço.
Diana deixara claro que não desejava que
ninguém se metesse no ocorrido, ainda mais por temer pela vida da jovem,
então todos estavam de mão atadas e sem nenhuma notı́cia.
O clima na mansão estava horrível...
Cláudia rezava o tempo todo e o
interessante de tudo, é que a Calligari agora era vista como uma verdadeira
heroı́na por todos...
Esfregou os olhos.
Há dias não conseguia dormir, há dias
não conseguia descansar...
Tinha um carinho muito grande pela
pintora, tanto que, em muitos casos, aprendera a desempenhar o papel de mãe e
protetora.
Deus, como a major que costumava sair
com tantas mulheres e não levava nenhuma a sério, fora se apaixonar daquela
forma arrebatadora por uma Villa Real?
Aimê tinha batido forte no coração da
morena...
A pequena aeronave aterrissou e depois
de longos minutos a porta abriu e Antônia pareceu na porta. Um jovem elegante
estendeu a mão para auxiliar a matriarca a descer.
A empresária foi ao encontro dela na
pista.
A senhora caminhava ereta e seus olhos
denotavam um choro recorrente. Estava rosada e os lábios finos se comprimiam
em uma linha de irritação.
Ficou parada, esperando pacientemente
pelo encontro.
Deu um pequeno sorriso de boas-vindas
que não fora retribuı́do.
Não recebeu o afetuoso e costumeiro
abraço, apenas uma carranca enorme.
-- Como permitiu que a Alessandra
seguisse atrás desses bandidos sozinha? – Apontou-lhe o dedo em riste. --
Disse para cuidar dela, falei para me manter informada e se visse que ela
estava se arriscando em demasia me ligasse...
O piloto e outro ajudante levaram a mala
da senhora, mas ambas não pareceram interessadas em deixar o lugar. O céu já
escurecia... Estava cinza, não havia estrelas e nem lua...
Vanessa sentiu um arrepio do vento
frio... Seus cabelos foram desarrumados... Cruzou os braços sobre o casaco.
-- Não é fácil lidar com a sua
sobrinha, ainda mais quando ela cisma com algo... – Passou a mão pelas
madeixas, arrumando-as por trás da orelha. – Ela decidiu ir ao encontro da
Aimê... Crocodilo exigiu que fosse até ele... E ela aceitou...
Os olhos de Antônia estavam cheios de
lágrimas.
Todos sabiam como aquela mulher amava a
única sobrinha, todos sabiam que ela quem fora responsável pela educação e
representou a presença materna que a pintora nunca teve da verdadeira geradora.
-- Tenho a impressão que os Villas Real
vieram ao mundo para desgraçar a vida da Diana... Primeiro aquele maldito
Otávio... Aquele demônio que mesmo morto ainda é uma sombra na nossa
existência... Agora a filha dele...
A chuva engrossou e um dos empregados se
aproximou com outro guarda-chuva, protegendo Antônia. Vanessa entendia aquela
dor... Mas pensava diferente dela.
Cerrou os dentes, suspirou e por fim
acabou falando.
-- Eu não acho que Aimê faz isso... Na
verdade, desde que se conheceram, a Diana parece que voltou para a vida... Ela
passou todos esses anos agindo por vingança, desejando apenas destruir aos que
lhe feriram... Agora não... Ela se arrisca pela mulher que ama... Se arrisca
por algo que a deixou maior do que sua arrogância e seu orgulho... Eu sei que
é difı́cil... Mas o amor sempre vale a pena...
Dinda limpou a lágrima que corria na
face. Encarou a empresária.
-- A que preço? – Soluçou. – Não quero
perdê-la...
Vanessa não conseguiu aguentar a
emoção, abraçando-a e compartilhando daquela dor e frustração.
Piatã seguia a passos largos, mesmo
diante da escuridão, conseguia se mover com agilidade. Tomava a mão da Villa
Real firme, enquanto Alanna se guiava pelo som, vez e outra tropeçando.
Tivera que agir de forma que condenava,
ainda mais quando usara em Aimê algo que há tempos fora proibido por sua
tribo, porém sabia que não haveria chances para a filha de Alexander se a
amada ficasse ao seu lado... Também não haveria chances se trouxessem consigo
a major...
Sabia o caminho que deveria seguir...
Conhecia aquele lugar com a palma de sua
mão e não seria problema caminhar no turno ausente de luz, entretanto sabia
que suas acompanhantes teriam dificuldade em seguir seu ritmo.
Acelerou mais o passo e não demorou
para chegar no lugar que sempre servira de abrigo para os ı́ndios. Parou em
frente a parede de trepadeira.
A caverna serviria para que se
mantivessem seguros durante alguns dias, pois sabia que aqueles homens não
desistiriam fácil.
Confiava que Tupã seria convencido e
acabaria indo salvar a irmã... Ouvia o som dos animais noturnos.
O pio da coruja...
Seus olhos se acostumavam... Fitou o
céu... Tão azul... Segurou mais firme Aimê... Sentiu-a recuar.
Voltou a caminhar, pedindo que a loira
se apressasse.
Os passos de todos pareciam profanar a
calmaria da noite.
Sentiu quando a Villa Real tentou se
livrar da sua mão... Sabia que ela tinha despertado... Pelo menos durara tempo
suficiente.
Os olhos azuis estavam abertos em
verdadeiro pavor, mas antes que pudesse falar algo, fora arrastada para o
lugar.
-- Onde está a Diana? – A Villa Real se
desvencilhou do toque. – Como foi capaz de deixá-la lá?
Mesmo no escuro, não era difı́cil notar a voz
alterada da jovem que sempre demonstrava calma. Piatã não respondeu de
imediato.
Agachou-se e começou a acender a
fogueira que tinha deixado montada quando passara por ali mais cedo. Estava
frio, a ponto de enrijecer os ossos.
-- Acomode-se, menina! – Apontou o lugar
para a garota. – Mantenha a calma!
Alanna via a expressão da filha de
Otávio e temia que ela pudesse fazer algo e sair às cegas atrás da major.
Cruzou os braços sobre os seios.
Desejou algo para se cobrir.
Até agora não entendera o que tinha acontecido
com a garota. Parecia ter sido enfeitiçada pelo homem velho que as resgataram.
Deveria confiar nele?
Viu quando a luz do fogo começou a
aparecer, sentou-se, esticando as mãos para esquentar nele. As primeiras
labaredas queimavam, projetando sombras nas paredes.
O crepitar se misturava a respiração
acelerada da filha de Otávio.
Os olhos azuis se voltaram para o ı́ndio
e não havia suavidade naquela face bonita.
-- Como pode deixa-la lá? – Questionou
por entre os dentes. – Irão matá-la! – Disse em desespero. – Pensei que
gostasse da Diana, pensei que tivesse algum tipo de sentimento por ela... –
Passou a mão pelos cabelos. – Exijo que me leve de volta... – Apontou-lhe o
dedo em riste. – E o proı́bo de usar suas magias comigo... Leve-me! – Gritou.
O som se fez eco e pareceu assombrar o
lugar.
Piatã permaneceu algum tempo fitando a
fogueira, parecia estar a ver algo nas chamas alaranjadas e só depois de
longos segundos, encarou-a.
Encarou a filha do covarde coronel.
Entendia o desespero dela...
Sentia a dor...
Mas sempre precisara seguir as ordens
dos que estavam numa hierarquia maior... Fazia parte da natureza da sua
tribo...
--
Não posso ir contra as ordens da major, não quando ela reclama o lugar de
princesa das tribos... Não quando ela usa a autoridade que tem... – Replicou
calmamente. A Villa Real colocou as mãos na cintura.
-- Ao inferno com isso – Falou com os
dentes cerrados -- não me interessa nada que diga, exijo que me leve lá –
Olhou sobre os ombros para a entrada da caverna. – Leve-me de volta ou pelo
menos me diga como chegar... Irei até ela, ficarei ao seu lado... – Fitou-o. –
Leve-me...
Alanna via o desespero na voz da garota.
Condoeu-se por ela...
-- Aimê... – Chamou-a de forma
hesitante – Se ficarmos lá, com certeza, não seremos uma ajuda para a
major... Veja, você mesma foi apenas usada para praticar torturas na sua
esposa... Imagine o que passaria pela cabeça daquele monstro...
Os olhos azuis a miraram rapidamente,
mas nada respondeu. Virou-se de frente para a parede, esmurrando-a tão forte
que sentiu os dedos ferirem, mas não pareceu se importar com tal detalhe.
-- E agora vão matá-la... – Soluçou. –
É isso que farão... – encostou as costas a ela. – É isso que farão e tudo por
minha culpa... Por sua culpa...
O ı́ndio a viu escorregar, sentando-se
no chão frio e tentou manter a calma.
Talvez tenha sido cruel o que fez,
afinal, abandonara sua menina a própria sorte, porém se tivesse insistido em
arrastá-la, todos teriam sido pegos e não conseguiria viver sabendo que a
Calligari o culparia por algo de ruim ter acontecido com a Villa Real...
Quando decidira ir até a herdeira de
Alexander, fê-lo por saber que a ajuda que Tupã daria não chegaria tão
rapidamente, mesmo que não aceitasse a negativa do ı́ndio como sendo algo
definitivo e irrevogável.
Conhecia o guerreiro desde que era uma
criança, da mesma forma que conhecia Diana e sabia como ambos, apesar de
arrogantes e orgulhosos, tinham um senso de justiça inquestionável e era nisso
que estava a acreditar.
Fechou os olhos, rezando em silêncio
para que a Calligari fosse tão forte quanto o general Alexander... Ela já
passara por coisas piores e mesmo assim fora forte para resistir e torceria
para que se repetisse. Mirou novamente a Villa Real...
Aimê apoiara a cabeça nos joelhos e
chorava copiosamente...
Nada poderia ser feito agora... Mas de
uma coisa tinha certeza: Deveria ficar de olho na esposa da princesa, pois
sabia que ela tentaria ir ao encontro da mulher que amava...
Crocodilo esbravejava alto.
Estava escuro.
A fogueira tinha apagado e só depois de
um bom tempo ele descobrira da fuga da filha de Otávio. Procuraram a
Calligari, mas não a encontraram no tronco.
Equipes de buscas saı́ram, mas
retornaram, pois se depararam com uma furiosa onça que caçava bem próximo
dali. Agora, estava reunidos diante do tronco que servirá de cativeiro para a
major.
-- Como isso aconteceu? – Gritava. – Eu
disse que ficassem alertas! – Pegou o revólver e começou a disparar contra a
árvore morta.
Uma verdadeira legião de bandido se
reunira no pátio. Portavam armas potentes, faroletes para clarear a
escuridão. Mostravam apreensão.
O segurança se aproximou.
O traidor só despertara depois de ter
levado um banho de água fria.
-- Deixe que eu lidere as buscas, trarei
as duas antes que o sol nasça. – Prontificou-se.
O
traficante o segurou pela gola da camisa, apertando-o sem dó.
-- Você é tão inútil quanto seu
pai... Se não tivesse deixado o desejo subir à cabeça, agora tudo estaria do
mesmo jeito. – Empurrou-o. – Eu disse para não se aproximar da refém...
Ouviu o som do caminhão sendo ligado.
Não demoraria para que eles deixassem a
área, pois já estavam carregados com a mercadoria.
O fiel seguidor de Otávio seguiu até o
veı́culo, abriu a porta, tirando o homem com toda violência.
--
Ninguém deixará esse lugar, enquanto eu não tiver as duas em minhas mãos.
Crocodilo seguiu até o grupo e começou a gritar ordens.
O segurança voltou a se intrometer.
-- Não acredito que a major consiga ir
longe, ela está muito debilitada e está escuro... – Tentava demonstrar
liderança. – Irei agora mesmo!
-- Você não conhece a Diana! – Bateu o
punho fechado contra a mão aberta. – Além de ela ser ı́ndia, ainda tem o
treinamento militar... Alexander sempre ousou muito na preparação da única
filha...
Um homem veio correndo ao encontro
deles.
-- Os cães não reagem, não estão
mortos, mas parecem dopados!
Crocodilo gritou alto em raiva.
Depositara sua fé nos animais, porém
eles retornaram da caçada cambaleantes e demonstrando estar feridos.
-- Vocês irão revirar essa maldita
floresta em busca delas... E se não chegarem aqui com as minhas fugitivas,
matarei um a um com minhas próprias mãos...
Tupã observava tudo do alto de uma árvore,
enquanto tentava manter a irmã equilibrada.
Não tinha chegado ao acampamento, pois
antes encontrou Diana se arrastando na entrada da mata. Os cães a perseguiam e
se seus guerreiros não tivessem lhe acertados com dardos, a herdeira de
Alexander não teria sobrevivido e nem seus pedaços...
Ainda não sabia o que tinha acontecido
com ela, apenas tinha certeza de que fora judiada em demasia. Dispersou o bando
que estava consigo, pois seria mais fácil de passar despercebido.
Quando ouviu as vozes dos bandidos,
trepou na árvore e mesmo sem forças, a pintora conseguira auxiliar na dupla
escalada difı́cil.
Não tinha como não sentir admiração
pela guerreira que tinha o mesmo sangue que o seu... Mesmo que jamais admitisse
isso!
Os gritos dos homens podiam ser ouvidos.
Buscavam incansavelmente pela fugitiva.
As tochas iluminavam o chão, via as
armas e sabia que aquela não seria uma batalha tão fácil. Diana resmungou
algo incompreensível.
Ajudou-a a se posicionar melhor no galho
grosso, enquanto ficava de frente para ela.
Tirou o cantil que trazia, colocando na
boca da mulher e só naquele momento os olhos azuis se abriram, presos à
escuridão.
Bebeu o lı́quido tão rápido que vazou
pela lateral da sua boca.
-- Para, precisa de calma ou vai
engasgar... – Repreendeu-a irritado.
A
Calligari pareceu desnorteada, confusa...
Seu corpo doı́a muito.
Imaginou se ainda estava amarrada ao
tronco. Seus braços pareciam paralisados, suas pernas estavam dormentes...
Teve a impressão que chicoteavam seu
corpo novamente... Sentiu o ferro queimar sua carne... Os socos em seu
abdome...
Viu os olhos azuis de Aimê... Depois
não era ela... Otávio... Cerrou os dentes.
Fez um movimento brusco e se não fosse
pelo guerreiro, teria despencado do alto.
-- Acorde! – Ordenou, sacudindo-lhe os
ombros. – Se não despertar, não terá chances de se salvar. Mais uma vez os
olhos negros se mostraram perdidos...
O som dos animais noturnos era bastante
intenso naquela parte. Diana segurou o braço do irmão fortemente.
-- Aimê... – Chamou pela esposa. –
Aimê... Eu preciso salvar... Eu preciso...
O
ı́ndio tirou um pedaço de carne, colocando na boca dela.
-- Coma devagar, está sem energia...
Delira... Mais uma vez a morena o fitou...
Os primeiros raios de luz começavam a iluminar
o breu que se instalara.
-- Você não é mais refém do bandido,
está comigo, mas não poderei carregá-la, então se realmente é uma
guerreira e tem no seu sangue o do meu povo, está na hora de reagir...
Ela pareceu adormecer novamente...
As pálpebras tremeram e depois de
alguns segundos se abriram.
-- Tupã... – A major falou baixo. – Tupã...
-- Sim, princesa, sou eu! – Voltou a
fitar o chão, percebendo que homens montavam guarda naquela parte. – Como
conseguiu deixar o acampamento? Onde está a sua namoradinha?
A Calligari tinha a impressão que sua
boca estava cheia de areia, até para falar, precisava fazer um esforço enorme.
Não havia uma única parte de si que não estava moı́da.
O ı́ndio colocou o cantil na boca dela
novamente e a sentiu muito quente, estava muito mal. Precisava levá-la dali o
mais rápido possível ou não teria chance de sobreviver.
-- Precisamos chegar a tribo... –
Tocou-lhe a fronte.
-- Não... – Engoliu em seco. –
Piatã... – Pigarreou. – Ele levou Aimê...
Tupã praguejou.
-- Como aquele velho vai fugir desses
bandidos com essa garotinha que nem sabe andar na selva...
A morena teve dificuldade para falar
novamente.
A respiração dela estava acelerada.
Tremia...
Os dentes começaram a bater um no outro.
-- Precisamos ir atrás deles...
Preciso...
O ı́ndio torceu o nariz.
-- Você não está em condição de ir a
lugar nenhum... E está fedendo a bicho morto... Queria ver se assim alguma
mulher iria te querer agora... – Juntou as mãos, levando à boca, fazendo o
som de um pássaro.
Diana moveu a cabeça lentamente.
Precisava ter forças.
Ouviu a imitação da ave e sabia que o
chefe estava se comunicando com os outros. Um tiro foi ouvido e a morena ficou
preocupada.
-- Calma, devem ter topado com algum
animal selvagem... – Apurou os ouvidos, tentando ouvir a resposta que não
tardou a ser dada. – Tem muitos homens na floresta, precisaremos passar por
eles...
-- Eu preciso ir até a Aimê... –
Insistia debilmente.
-- Não, princesa, você precisa se
recuperar e só assim poderá ir até a sua amada.
A morena tentou se mover, porém lhe
faltou forças e logo fechou os olhos e voltou a dormir.
Tupã voltou a imitar o som do pássaro.
Precisava tirar
a Calligari dali
o mais rápido
possível. Não muito
longe havia uma
tribo que o
receberia com honraria, mas tinha
certeza de que a irmã seria vista com maus olhos. Eles a consideravam também
uma traidora, mesmo assim, essa seria a ú nica opção para aquele momento.
Esperaria anoitecer e se livraria
daqueles imbecis que faziam guarda ali embaixo, assim pediria auxı́lio a outros
ı́ndios para levá-la.
Aimê não parava um segundo dentro da
caverna. Várias vezes já pensara em sair dali e retornar para o acampamento,
ainda tentara duas vezes, porém Piatã frustrou suas tentativas.
Mesmo com muito frio, seguiu até a
pequena cascata. Sua cabeça estava pesada.
A luz do sol já invadia aquela área...
Sentou-se à margem do lago... Tocou a
água fria...
Fechou os olhos e recordou dos primeiros
dias ali... Do cheiro... Do som do lı́quido e de como ficara feliz em contar
com aquele prazer...
Prendeu a respiração ao se recordar da
presença da Calligari... De sua forma cruel de agir... Do ódio que sentira por
estar ao lado da filha do homem que destruı́ra sua vida...
Cerrou os dentes ao mirar a cascata...
Recordava-se de estar sob a ela quando
sentiu aquele olhar poderoso sobre seu corpo... Sentiu um arrepio na espinha...
O ı́ndio a observava de longe.
Sabia o que ela deveria estar a passar
naquele momento. Ficava a imaginar o que poderia ter ocorrido com a princesa...
Deu alguns passos e não demorou ao
ouvir a voz irritada e triste da jovem.
-- Leve-me lá, eu desejo retornar...
Essa é a minha escolha... – Mirou-o sobre os ombros. – Eu imploro... Deve
aceitar a escolha que fiz...
Piatã mirou os olhos brilhantes e sabia
que por trás daquela aparência frágil, havia muita força, coragem e teimosia...
Aproximou-se mais, sentando-se ao lado
dela. Olhava o rio e tinha uma expressão tranquila.
-- Menina, a Diana deseja que fique
comigo, deseja que fique bem... Vou levá-la em segurança para sua famı́lia. A
garota sentou com as pernas cruzadas diante dele.
-- Você não entende... Não entende...
– Dizia com lágrimas nos olhos. – Por que me trouxe? Por que foi tão cruel
comigo?
O velho viu as lágrimas banharem sua
face e mais uma vez se condoeu dela. Tomou-lhe as mãos nas suas...
-- Fiz o que a princesa me ordenou...
Não entende como ela estava a sofrer ao ver como você poderia ser ferida...
A Villa Real desvencilhou-se do toque.
-- Então ela é ainda mais cruel do que
você... – Limpou os olhos com as costas da mão. – A Calligari acha que pode decidir
sobre tudo, acha que pode fazer o que deseja... – Mordiscou o lábio inferior.
– Como eu fico nessa história? O que sinto não é levado em conta? O que dói
aqui dentro... – Apontou o peito. – O amor que sinto não conta? Ela é
egoı́sta... egoı́sta...
Piatã a abraçou, mesmo sendo de inı́cio
empurrado.
Sentiu-a depositar a cabeça em seu
ombro, enquanto chorava copiosamente. O corpo frágil da filha de Otávio
tremeu....
O velho ı́ndio lhe acariciou os cabelos,
enquanto a embalava como se faz com uma criança. Dos lábios da jovem, o nome
da princesa era uma ladainha incansável e repetitiva...
A noite já voltava a cair.
Crocodilo tinha voltado para o
acampamento no final da tarde.
Mais cedo atirara contra um dos capangas
que se negara a seguir por um pântano. Agora, ele e nenhum outro se negaria a
cumprir uma ordem sua.
Seguiu até a barraca.
Tinha certeza de que a major estava por
perto. Tinha certeza de que nenhum ser humano poderia sobreviver a tudo que se
passou e sair tão inteiro a ponto de atravessar aquela região até o rio.
A cercaria.
Sabia que ela não se arriscaria a ir
até os ı́ndios, era odiada por todos e vista como traidora, então só havia
um caminho para ser seguido e ele esperaria pacientemente por sua presa.
Quando estivesse diante dela, não
pouparia esforços e na mesma hora descarregaria todas as balas do seu revólver
na sua cabeça. Não haveria escapatória... Não deixariam aquele inferno sem
terminar sua missão... Um dos dois sairiam sem vida e garantiria que fosse
ela...
Tupã conseguiu chegar a aldeia na
madrugada.
Tivera como aliada uma onça que andava
faminta por aquela região e espantara os capangas. Sendo assim, pudera seguir
com a irmã, improvisando uma maca de cipó. Seus guerreiros seguiram
incansáveis e em passos rápidos, parando no momento apenas que adentraram o
espaço da tribo.
O lugar não era tão grande como a do
pajé, mas tinha uma localização privilegiada quanto ao rio e a caça.
Cercada por árvores, um cı́rculo
perfeito era formado pelas pequenas habitações com uma estrutura de madeira
taquaras e cobertura de palha.
O chão batido e vermelho tinha no
centro uma grande fogueira que sempre era acesa à noite.
Ali, os habitantes eram bastantes
pacı́ficos e composto quase praticamente de idosos... Não se via crianças ou
jovens, apenas pessoas maduras que trabalhavam com curas...
Os visitantes esperaram a permissão
para adentrar o espaço, saudando respeitosamente os anfitriões. A presença dos
não convidados causaram surpresas.
Não demorou muito para que grande parte
das pessoas que viviam ali, seguissem para descobrir de quem se tratava.
Um senhor alto, gordo, vestindo uma túnica
de couro e fumando um cachimbo se aproximou. O dia já amanhecia e ao longe se
ouvia alguns ı́ndios saudando o Deus Sol.
Não demorou a Tupã ser reconhecido e recepcionado
com grande entusiasmo, afinal, o jovem era bastante respeitado por todos e
também sempre requisitado pela força guerreira para conter alguma contenda.
-- O que o traz aqui?
O homem mais novo apontou para a maca
improvisada.
--
Preciso da sua ajuda... Peço pela princesa... Peço em nome da rainha do Sol...
Uma anciã se aproximou, colocando a mão no ombro do idoso.
Cochichos eram ouvidos.
Todos pareciam perplexos com a
moribunda.
Alguns idosos se aproximaram e torceram
a boca em desagrado... Chegaram até mesmo a cuspir em verdadeiro asco.
Olhares
foram trocados durantes longos segundos.
Tupã se agachou até a irmã,
acreditava que aquelas pessoas eram as únicas que poderiam fazer alfo pela
filha de Alexander, mas se eles se negassem, teria que se arriscar e ir até a
própria tribo, mesmo que soubesse que ele poderia não resistir.
Ouviu-a gemer...
O rosto bronzeado estava molhado.
Os dentes batiam do frio causado pela
intensa febre...
Os lábios que antes se mostravam sempre
rosados, agora traziam a palidez da morte...
Segurou-lhe mão, apertando-a.
Naquela manhã quando precisara descer a
major, fora preciso a ajuda de vários ı́ndios, pois a morena já tinha usado
toda a força quando ainda conseguira se acomodar no galho. Fora no momento do
transporte que viu a marca que fora feita em seu abdome e nas suas costas...
Como ela sobrevivera àquilo?
Ouviu a movimentação a suas costas,
virando-se para fita-los.
-- Cuidaremos dela, Tupã... – A anciã
falou.
O homem se sentiu aliviado,
levantando-se.
-- Levem-na para a cabana do curandeiro!
– O chefe mais velho ordenou.
Tupã fez um gesto para que os ı́ndios a
transportassem e seguiu junto com as ı́ndias que cuidariam da Diana.
O chefe guerreiro não parecia
preocupado com os comentários que surgiriam depois de ter ido ao auxı́lio da
irmã...
Talvez como o pajé falara, essa era uma
dıvida que tinha com a própria mãe.
Adentraram o pequeno espaço.
No lugar havia apenas um pote grande de
barro onde se colocava a água. Havia também alguns vasos com ervas variadas e
desconhecidas. Algumas secas, outras verdes...
O cheiro era forte...
Viu quando improvisaram uma espécie da
cama.
Os ı́ndios deixaram a oca, enquanto
Tupã, a anciã e outra senhora permaneciam ali.
A mulher mais velha cortou as roupas
sujas e o chefe ficou ainda mais impressionado com as feridas no corpo da morena.
A marca que fora feita a ferro estava
bastante inflamada, do mesmo jeito que as feridas nas costas.
-- Tragam água, precisamos lavá-la
imediatamente. – Apalpava o corpo da pintora.
– Acho que ela quebrara algumas costelas... Que espécie de pessoas a
torturaram? E o que ela fez para merecer isso?
Tupã se acocorou ao lado da velha.
-- Acha que ela sobreviverá?
A anciã tocou a fronte da morena.
Os lábios da major estavam
entreabertos... Frases desconexas saiam de sua boca...
-- Sim, não há dúvidas quanto a isso,
se tivesse que sucumbir, teria sucumbido há mais tempo... Se aguentou até
agora é porque tem muita força...
Diana começou a se debater e gritar.
-- Segure-a! Está delirando, ainda
pensa que está em tortura...
O guerreiro teve dificuldade para deter
a irmã e foi preciso que outros guerreiros se aproximassem.
A curandeira começou a falar algumas
palavras em uma lı́ngua estranha e logo a filha de Alexander se acalmou e
voltou a dormir.
-- Cuide dela... Terei que me ausentar,
mas logo retornarei. – O chefe se levantou. – Preciso ver como está a
situação na região.
A senhora assentiu, enquanto se ocupava
da jovem, mas virou-se para ele.
-- Quando retornar, traga as roupas da
rainha para ela...
O rapaz pareceu surpreso com o pedido,
mas acabou assentindo.
Cinco dias depois...
Piatã saiu durante alguns minutos do
esconderijo e descobriu que não poderiam seguir ainda, pois os bandidos
acamparam na clareira ao lado.
Aqueles dias não estavam sendo fáceis,
ainda mais quando de tratava da Villa Real. A menina se negava a se alimentar e
inúmeras vezes tentara ir ao encontro da major, mesmo sem saber por onde
seguir.
Parou diante da entrada da caverna.
A comida se resumia a apenas um pedaço
de pão seco, sorte que conseguira caçar um animal pequeno que serviria para
aqueles dias.
Talvez precisasse ficar ali por mais
tempo do que o que imaginara, pois os bandidos não pareciam interessados ou
apressados para deixar a área, na verdade, estavam cercando as possíveis
saı́das.
Já começava a perder a esperança que
Tupã tenha deixado o orgulho e a arrogância de lado e fora salvar a irmã.
Sentiu um aperto no peito ao lembrar da Calligari.
Agora já não acreditava que fora o
melhor a fazer, deixá-la sozinha, entregue à própria sorte.
Entrou e encontrou Alanna aflita parada
no interior da caverna.
-- Aimê não está, quando despertei,
ela tinha deixado o local. – A loira disse apressadamente. – Procurei-a por
todos os cantos aqui...
O ı́ndio ficou em total desespero.
Não deveria ter saı́do, mas pensava que
ela estava a dormir quando deixar o escoderijo.
-- Fique aqui! – Tocou-lhe o braço. --
Irei atrás dela.
A mulher fez um gesto afirmativo com a cabeça.
-- Por favor, não demore!
Piatã assentiu, quando novamente
deixava o local. Deveria ter imaginado que a Villa real tentaria fazer isso.
Os dias que se passaram, ela demonstrava
sua tristeza e indignação por ter sido tirada do lado da major. Sim, falhara
com a princesa e precisava urgentemente resolver esse problema.
Aimê seguia por entre aquelas enormes
árvores.
Tinha a impressão que dava voltas em
cı́rculos, pois os lugares pelos quais passavam pareciam sempre os mesmos. Não
imaginou que seria tão difı́cil se locomover naquele lugar.
Estavam sempre a olhar para o chão,
temendo que houvesse uma cobra camuflada naquelas folhas que forravam o lugar e
fora devido a isso que um galho lhe ferira a face.
Levou a mão ao rosto.
Os macacos brincavam em uma árvore ali
perto... Ouvia seus gritos... Respirou fundo!
Sabia que tinha sido uma idiota por ter
deixado o esconderijo, mas o fizera na esperança de conseguir chegar até onde
estava a sua esposa.
Olhou para o céu, pouco podendo vê-lo
devido à mata fechada. O que faria?
Estava em total desespero, imaginando o
que tinha acontecido com a mulher que amava. Aqueles dias foram um verdadeiro
inferno de ansiedade. Esperara a cada amanhecer e anoitecer pela chegada da
filha de Alexander e aos poucos percebia que precisava retornar, que
necessitava de ir até aquele acampamento e se submeter a qualquer coisa que o
Crocodilo fizesse, contanto que estivesse ao lado da esposa...
Ouviu o som dos pássaros, viu-os...
Notou o tronco caı́do, decidindo sentar
sobre ele. Deveria haver alguém por ali...
Esperaria que a encontrassem, sabia que
estavam por perto, Piatã falara que os viu por ali. Fitava tudo com
atenção...
De repente tudo pareceu ficar em um
silêncio assombroso...
Ouviu um rugido alto e ao se virar, viu
a onça vindo em sua direção. Levantou-se...
Sentiu as pernas tremerem...
Fechou os olhos esperando o inevitável
ataque, mas apenas ouviu o baque alto perto de si.
O animal grande tinha sido acertado
entre os olhos... Várias flechas foram disparadas para detê-la... Aimê ao
abrir os olhos, teve a impressão que estava tendo uma visão.
Piatã estava um pouco atrás e outros
homens fortes... Mas não era aquilo que a deixara paralisada... Engoliu em
seco...
Diana...
A Calligari estava parada bem próxima
dela, mas não era simplesmente a Calligari, era a ı́ndia selvagem. Viu-a
agachar, tirando o animal do caminho e logo estava de pé novamente...
Os cabelos estavam soltos, as madeixas
de ébano ornamentavam a face, havia uma pintura vermelha isolando os olhos,
indo até as orelhas que traziam brincos artesanais e longos de penas que se
misturavam com os fios negros. Uma espécie de trançado era usado na cabeça, no
meio de sua fronte... Uma espécie de coroa...
Sua pele estava ainda mais bronzeada...
Observou as roupas...
Um pequeno tope de couro buscava cobrir
os seios redondos, tendo a sustentação, um cordão que amarrava em seu
pescoço. Os braços traziam pinturas e uma espécie de pulseira amarrada em seus
músculos delineados.
Alta, ereta... Arrogante e orgulhosa...
Como poderia se mostrar ainda mais poderosa? Estaria tendo um devaneio?
Prendeu a respiração ao descer o olhar.
O abdome definido estava à mostra e a
marca a ferro estava ainda mais viva com o V. O traje de baixo se resumia a uma
espécie de minúscula saia de palha... Pouco cobria...
As pernas longas estavam de fora... A ú
nica coisa que restava da civilização eram as botas de camurça marrom... Diana
guardou o arco que usava nas costas.
Fitou a esposa e sentiu o alıvio em seu
peito.
Quando encontrara o velho ı́ndio na
selva, ficara em desespero quando soubera que a Villa Real tinha sumido e
saı́ra em total agonia a sua procura e se tivesse demorado alguns segundos, com
certeza teria sido tarde de mais.
Encarou-a intensamente.
Não sabia se ia até ela e a abraçava
ou se esbravejava por ter sido tão irresponsável.
Os olhos azuis estavam tão abertos, a
boca também, parecia estar diante de uma ilusão da sua cabeça. Viu Piatã
parar ao lado da pintora.
-- Você chegou bem a tempo, princesa!
A morena fitou o homem rapidamente e
logo voltou a encarar a Villa Real. A passos lentos, seguiu até ela, parando
diante do olhar surpreso.
Os olhos negros inspecionavam-na...
Estendeu a mão, tocando-lhe a face... Com o polegar delineou a arranhão que
trazia em sua bochecha...
-- Não deveria ter fugido, mimadinha...
– Repreendeu-a com a voz rouca.
O mar azul se encheu de lágrimas.
Os lábios se abriram em um sorriso de
reconhecimento... Abraçou-a forte, apertando-a junto a si.
Temeu que seu coração explodisse de
tanta felicidade... Ouvia-o pulsar alto... Ouviu o dela... Sim... Estavam na
mesma sintonia... Uma verdadeira sinfonia...
A Calligari cerrou os dentes para não
gemer ao sentir as costelas reclamarem.
Ouvia o som do choro e entendia o que se
passava, pois fora aquela mesma agonia que lhe acometera durante os longos dias
que passara debilitada, porém lutara muito para se recuperar, lutara muito
para poder reencontrar a mulher que tanto amava e por uma estupidez, quase isso
fora impossível.
Os dias que passara na tribo a fizera se
recuperar, mesmo que não estivesse cem por cento, levantara-se e fora atrás
de Piatã e da esposa. Fora contra as ordens de Tupã, pois sabia que não
suportaria ficar à espera de que o Crocodilo os encontrasse.
-- Eu pensei... Eu tive tanto medo...
Medo de não te ver mais... – Disse baixinho. – Meu Deus, amor, eu sofri
tanto... – Encarou-a. – Temi tanto não te ver mais...
Diana se afastou apenas para fitá-la,
tomando-lhe o rosto nas mãos.
Desejou beijá-la, amá-la ali mesmo,
porém não podia agir guiada por aquele desejo primitivo, ainda mais por que
sabia o perigo que todos corriam.
Viu os olhos tão azuis brilharem em
lágrimas... Mirou-o com tanta intensidade, como se desejasse invadi-los...
-- Eu estou bem... Mas não gostei que
tenha fugido dos cuidados do Piatã!
-- Mas, amor...
-- Você agora fará o que eu mandar! –
Interrompeu-a. – Pássaro pardo! – Chamou um dos guerreiros.
Não demorou para o homem alto e muito forte
se aproximar.
Aimê parecia surpresa.
-- Princesa! – Ele falou
respeitosamente.
-- Estará sob a sua guarda a minha
esposa, Piatã e Alanna, leve-os para a aldeia e tome cuidado para que minha
bela mulher não escape e faça mais uma das suas coisas de adolescente.
Os olhos azuis se estreitaram em
confusão.
-- Diana... – A filha de Otávio falou
magoada.
A ı́ndia se afastou.
-- Conversaremos depois e não faça
nenhuma loucura! – Apontou-lhe o dedo em riste. – Se ousar se colocar em perigo
novamente, a trancarei dentro de uma caverna e só saı́ra quando todo esse
problema acabar...
A Calligari seguiu até o velho amigo.
-- Vá com ela e não permita que faça
nada que atente contra a vida... Tupã está do outro lado, me encontrarei com
ele e logo vamos começar o confronto contra o Crocodilo. Não podemos permitir
que ele ameace a tranquilidade das nossas aldeias e do nosso povo.
Aimê parecia perplexa... Observava a
beleza da esposa e sua arrogância...
Piatã fez um gesto afirmativo com a
cabeça, enquanto seu olhar estava direcionado a Villa Real, sabia que a jovem
parecia decepcionada.
Diana encarou a esposa por frações de
segundos, depois seguiu por dentro da mata. O ı́ndio guerreiro fez um gesto
para que a filha de Otávio seguisse para o lado oposto. Piatã foi ao encontro
dela.
-- Vamos, menina, será melhor fazer o
que a princesa disse...
A Villa Real passou a mão pelos
cabelos, arrumando-o.
-- Eu não obedeço a sua princesa e
também não obedeço a arrogante major... – Engoliu em seco. – Custava ela
falar comigo direito? Quem ela pensa ser? Eu passei todos esses dias
preocupadas, desesperada e recebo frieza... – Questionava parada. – O que se
passa?
-- Ela está preocupada... Agora
precisará mostrar que realmente tem o sangue dessas pessoas e expulsar esses invasores...
Precisará agir assim... Não pode se distrair... Mas eu vi o olhar dela para
ti... O amor que sente é imenso, apenas tenha paciência...
Aimê umedeceu os lábios demoradamente
e depois soltou um suspiro profundo. Meneou a cabeça negativamente.
Não acreditava que depois de ter
sofrido durante aqueles longos dias, aquela era a forma que a morena a tratava.
-- Insensível! – Falou baixinho,
enquanto seguia escoltada pelos ı́ndios.
Tupã estava sobre uma enorme árvore.
Ouviu o sinal da Diana e logo foi ao
encontro dela.
-- Pensei que não voltaria ou se
demoraria mais... Sua maior fraqueza são as mulheres. – Provocou-a.
Os olhos negros se estreitaram.
-- Tenho uma missão e a cumprirei... O
guerreiro sorriu.
-- Que bom... Depois terá muito tempo
para aproveitar sua amada... Agora precisamos desarmar esses bandidos. –
Observou-a com atenção. – Tem certeza que conseguirá?
Diana fez um gesto afirmativo.
-- Você não está bem ainda,
Calligari, sabe disso... Precisa de cuidados e fora teimosa em sair da aldeia
assim...
A morena deu de ombros.
-- Preciso das minhas armas... Temos que
ir até o acampamento e pegá-las... Nosso arco e flecha não darão conta
daquele miserável e seu bando!
-- Não, você não vai até lá! –
Tomou-lhe o braço. – Diga-me onde enterrou e eu mesmo irei!
A morena se desvencilhou do toque.
-- Então iremos juntos, pois se
encontrar o desgraçado, acabo logo com a vida dele.
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