A dama selvagem - Capítulo 32


Os ı́ndios se mantinham fora da oca.

Pareciam curiosos com a presença da Calligari.

Ansiavam para que a morena saı́sse e revelasse o que a levara até ali mais uma vez. Estavam curiosos, imaginando se haveria um confronto, já que o chefe da tribo da princesa sempre demonstrara claramente desgostar totalmente da mulher de pele bronzeada.

Tupã seguiu pisando duro até Sirena.

A esposa conversava com Piatã. Ambos encararam o guerreiro forte e arrogante.

-- Não quero que se dirija à Diana! – Exigiu irritado. – Não quero nem mesmo que olhe para ela... A protegida de todos já me desonrara mais do que o suficiente, então, não me custaria nada desafiá-la para uma luta até a morte.

A bela ı́ndia não parecia surpresa com as palavras aborrecidas do marido, porém não costumava se manter calada diante delas.

A tribo que pertenciam supervalorizava o poder feminino e mesmo que em hierarquia, ela estivesse abaixo do chefe, tinha o direito de questionar.

Mirou a oca, desejando que a major saı́sse, mas não havia sinal da bela pintora.

-- Piatã me contou sobre o sequestro de Aimê – falava de forma tranquila -- acredito que esse é um momento para ajudar a princesa, não esqueça de que compartilham o mesmo sangue.

O olhar do chefe demonstrava total ira.

-- A Sirena está certa! – O velho se intrometeu. – A mãe dela era irmã do seu pai, Diana é a princesa da tribo, o elo entre os dois mundos... – Pigarreou. – Acredito que está mais do que na hora de esquecer esse rancor.

O rapaz pareceu não gostar do que ouvia, demonstrando toda sua fú ria nas palavras que praticamente cuspiu.

-- Não, ela é uma traidora! — Apontou o dedo em riste. -- Por culpa dela muita gente morreu, por culpa dela, quase nosso povo fora destruı́do... Até quando aceitarão a filha de um branco em nossas terras?

-- Você quis obriga-la a casar com o homem que a destruiu! – Piatã retrucou calmamente. – Queria uma união com um assassino... O que esperava disso?

-- Eu só queria a paz e ela deveria ter obedecido... Quem sabe se assim o fosse, não estaria passando por isso... Sirena viu quando a morena deixava a presença do pajé e mesmo diante do olhar irado do chefe, seguiu até ela.

A noite ainda não tinha chegado, mas não demoraria para que ocorresse.

Os olhares de todos recaı́ram sobre a filha de Alexander.

Não havia danças, conversas, apenas a atenção dirigida à bela morena. A major recebeu o abraço da amiga.

-- Não imaginei que a veria mais! – A esposa de Tupã falou ao se afastar. – Piatã me contou o que se passa... Desejo ajudar.

A Calligari observou os olhares voltados para si, ignorando-os totalmente.

-- Sim, infelizmente a situação não é uma das melhores. – Arrumou as armas na cintura, depois colocou o punhal na bota. – Preciso ir! – Voltou a fitá-la. – Agradeço a sua preocupação, mas não desejo que se fira...

-- Você vai se ferir... – Disse tristemente. – Sabe que esse homem deseja matá-la...

A pintora fez um gesto de assentimento com a cabeça.

Sirena lhe tocou a face.

 

-- Mesmo assim está disposta a se sacrificar desse jeito? – Questionou com um sorriso triste. – Não obterá sucesso se for sozinha.

Diana passou a mão pelos cabelos.

-- Eu não tenho medo!

A ı́ndia sorriu.

-- Você nunca teve... Mas eu consigo ver nos seus olhos o temor em perder a quem tanto ama...

Antes que a Calligari falasse alguma coisa, Tupã se aproximou irritado, pondo-se entre a esposa e a filha de Alexander.

-- Eu deveria proibir sua passagem por nossas tribos!

A pintora levantou a cabeça em pura arrogância, enquanto arqueava a sobrancelha.

-- Não conseguiria me deter, por isso não proı́be... Eu iria contra suas ordens e continuaria o meu caminho.

-- Você é tão petulante quanto foi a sua mãe! – Cuspiu as palavras. – Se meu pai estivesse vivo, com certeza, teria o mesmo fim que ela!

Sirena percebeu a expressão da amiga e pôs-se entre os dois, temendo uma luta fı́sica, isso sim seria algo difı́cil de resolver.

-- Tupã, ajude-a a resgatar Aimê! – Pediu. – Ela precisa de ti. – A esposa apelou.

-- Não moverei uma palha por ela!

A morena cerrou os dentes.

-- Eu não pedi e jamais pediria a sua ajuda! – Virou-se para Sirena, abraçando-a. – Cuide-se, querida, espero poder vê-la novamente.

A Calligari se afastou, seguindo até Piatã.

 O velho ı́ndio a olhava de forma triste.

-- Então, o pajé não a convenceu? – Indagou temeroso.

-- Não, sabe que ninguém faria isso... – Suspirou. – Preciso ir, desejo chegar rápido ao meu destino.

O bom homem segurou sua mão, entregando-lhe um cordão com presas de cobras na ponta.

-- Aceite!

Diana assentiu com um sorriso, enquanto seguia seu caminho sem olhar para trás.

 

 

 

 

Aimê mais uma vez fora amarrada à cadeira. Fechou os olhos, tentando manter a calma.

Sabia que não demoraria para Diana chegar ali. Sentia isso em seu coração, sentia que a morena se aproximava e aquilo ficava cada vez mais assustador.

Ouvira os planos de Crocodilo e mesmo que não desejasse fazer o que fora proposto, não imaginaria algo melhor para que a morena não sofresse tanto. Enquanto fingiria, buscaria uma alternativa para salvá-la, buscaria uma forma de livrá-la daquilo... Apenas não sabia ainda como faria isso...

Ouviu passos e imaginou se seria o loiro de expressão desrespeitadora, mas se tratava de uma das mulheres que viu mais cedo com os bandidos.

Alta, loira e bonita, tinha o rosto ferido.

Ela também estava armada... Na verdade, todos ali estavam com artilharia pesada. A visitante usava calça surrada e camisa de xadrez.

Sentiu o caneco de alumı́nio frio posar em seus lábios e bebeu a água que lhe era oferecida. Não podia negar que estava com muita sede.

Encarou os olhos claros e sentiu certa simpatia por ela.

-- Eu te conheço... – A Villa Real disse quando a outra se afastou um pouco. – Estava aqui da outra vez que me trouxeram? Como é o seu nome?

A loira pareceu hesitar.

Sabia dos planos de Crocodilo para aquela bonita jovem e isso a fazia pensar na própria situação.

Respirou fundo.

-- Alanna...

A moça, apesar de ter feições lindas, trazia uma expressão grande de tristeza.

-- Estava aqui antes? Lembra de mim?

-- Sim... – Confirmou em voz baixa. – Estava aqui quando sob o orgulho desses homens, uma única mulher entrou aqui e te levou embora. – Disse, parecendo admirada. – Deu bobeira em ser pega novamente... Temo que agora seu fim seja pior...

Aimê apenas deu de ombros, pois a última coisa que desejava era pensar em qual ruim seria seu destino.

-- Por que vive aqui? Como pode seguir essas pessoas? Um pio de coruja se fez ouvir alto.

Alanna seguiu até a porta, mas não saiu, apenas ficou a observar a escuridão da noite, em seguida retornou até a prisioneira.

-- Deixei minha filha e meu marido por um homem que me prometeu uma vida melhor e muito amor... – Falou com amargura. – Imaginei que seria feliz, coisa que nunca tinha sido, mas fui trazida para cá e usada por cada um desses bandidos...

A Villa Real viu a dor presente nos olhos verdes.

-- E sua filha?

Alanna exibiu um sorriso triste e saudoso.

-- Espero que esteja bem... Espero que pelo menos ela esteja feliz... – Limpou uma lágrima que lhe molhava a face.

 A Villa Real a fitava intensamente.

-- Por que não tenta fugir?

-- Como? – Indagou horrorizada. – Aqui só tem animais e ı́ndios. Que chance eu teria de sobreviver?

-- Pelo menos tentaria.

-- Está louca! – Desdenhou. – Ninguém sai vivo daqui, esses homens são cruéis de mais... – Meneou a cabeça negativamente. – Espero que a sua amiga não venha ao seu resgate, pois ela irá morrer.

Antes que Aimê pudesse dizer alguma coisa, a mulher deixou a barraca e não demorou para Crocodilo entrar. O bandido a fitava com cuidado, depois puxou uma cadeira, sentando de fronte para ela.

A luz pálida deixava-o ainda mais assustador.

-- Nosso trato está seguro? – Tocou-lhe a face. – Está disposta a fazer o que ordenar?

A Villa Real virou a cabeça para se livrar da carı́cia.

O capanga de Otávio apenas sorriu.

 

-- Se cumprir, serei generoso e não arrancarei cada membro da sua amada... – Suspirou. – O que é uma pena... Acredite, eu acho a Diana uma mulher sem igual... Não há homem ou mulher que não se rende aquela arrogância toda... – Levou a mão ao queixo, parecia ponderar. – Eu gostaria de tê-la ao meu lado... A trataria como uma rainha...

Os olhos azuis se estreitaram em fú ria.

Seria capaz de matá-lo se ousasse tocar na esposa.

-- Não acha que já a feriu o suficiente? – Indagou, encarando-o. – Leve-me para onde quiser, mas deixe-a em paz...

Venda-me, estupre-me... Eu não me importo, mas deixe que a major siga em paz.

A gargalhada do bandido parecia ainda mais cruel.

-- Você não entende! Eu fui feito de bobo pela Calligari, preciso recuperar o respeito dos meus homens ou não terei mais o prestı́gio que sempre tive... – Suspirou alto. – Um dia você vai entender... Mas vamos ao nosso acordo. Fará o que eu mandar? Veja, se você aceitar vai ser melhor, pois suas mãos são mais delicadas...

A filha de Otávio sabia que não seria fácil, mas talvez aquela fosse a ú nica forma de salvar a morena, a ú nica forma de ganhar tempo.

Mas como teria sangue frio para seguir com aquele plano terrıv́  el?

-- Se não aceitar, arrancarei a pele dela na sua frente...

-- Farei como diz... – Confirmou rapidamente. – Farei como me pedir... Contanto que não a mate...

Crocodilo encarava a Villa Real, imaginando como seria gratificante quebrar de uma vez por todas o orgulho da pintora.

-- Eu sei que ela está perto... Sinto o cheiro da arrogância da filha de Alexander... – Cruzou as pernas. – A Diana deve te amar muito... coisa difı́cil, pois imaginei que ela nem coração tinha... Seu pai matou o general e ela ainda te quer... O que tem de tão especial que seduziu a selvagem?

A jovem umedeceu os lábios.

-- Já disse que não temos mais nada... Ela me traiu e não acredito que venha! – Tentava mostrar convicção. – Está perdendo o seu tempo aqui...

O bandido acariciou a face da garota. Aimê prendeu a respiração.

-- Está vendo? Deveria ser grata a mim, estou te salvando, pois se continuar com aquela selvagem vai ser traı́da a cada esquina... Seu pai dizia que ela gostava de brincar com o sentimento dos outros... Gostava de seduzir... Tinha sempre muitas conquistas...

O maxilar da Villa Real enrijeceu.

-- A Diana poderia ter sido uma rainha e sua mamãe... Mas não cedeu ao charme do coronel... E olha que as prostitutas saiam no tapa para servir a ele... – Deu um sorriso. – Não deveria ter se envolvido com ela, assim você não teria uma salvadora e eu nem precisarei matá-la.

-- Não faça isso... Eu imploro... – Pediu em lágrimas.

Crocodilo se levantou.

-- Não seja boba, quando a Calligari aparecer aqui vai selar o destino e se você não cumprir o trato, ela vai sofrer ainda mais.

 

 

 

 

 

 

Diana não dava trégua, mas em algumas ocasiões tivera que trepar em árvores devido ao encontro de algumas onças.

Nem mesmo dormira, apenas bebia água e comia carne e pão. Quando o dia amanheceu já tinha chegado a caverna.

Jogou a mochila sobre o chão.

Sentou-se.

Estava exausta, mas não poderia parar... Inclinou a cabeça para trás, fechando os olhos.

A rocha fria arrepiou sua pele.

Sabia que não seria fácil, mas acreditava que conseguiria, acreditava que poderia sair com vida e ter Aimê consigo.

Conhecia muito bem o Crocodilo, tinha certeza que ele tinha a intenção de matá-la, mas não era costume seu fazer isso rápido. Gostava de se exibir e humilhar a vı́tima, então teria uma chance.

Cerrou os dentes.

Já passara por tantas coisas que nem se assustava com isso. Respirou fundo!

Precisava ter forças para suportar o que estava por vim. Levantou-se.

Começou a se livrar das roupas.

Precisava de um banho para despertar e seguir ao destino que a esperava.

Caminhou em meio as pedras e ao ver a pequena cascata caindo ali, sentiu aquela saudade que a acompanhara por todo o caminho.

Fechou os olhos e a visão da Villa Real ali invadiu sua mente.

Linda, ereta, cabeça inclinada para trás e um sorriso a brilhar nos lábios deliciosos.

Meneou a cabeça para se livrar dos pensamentos, pois sabia que precisava de total frieza naquele momento, precisava agir guiada pela cabeça e não pelas emoções, só assim teriam chances de saı́rem com vida.

Entrou na água, sentindo-a gelada, mas não a incomodou. Mergulhou!

Permitiu-se por alguns minutos que o lı́quido cristalino lhe massageasse a pele. Submergiu.

Se saı́sse com vida de tudo aquilo, mataria um por uma daqueles miseráveis e o Crocodilo, esse teria um fim doloroso de mais.

 

 

 

 

 

O pajé estava em sua oca, quando ouviu os passos de Tupã.

-- O que deseja?

O mais velho fitou o rapaz alto e forte.

Sabia que precisava convencê-lo a tomar partido naquela guerra que Diana travava solitariamente. Não poderia permitir que a abandonassem.

-- Sente! – Apontou o banco rústico. – Preciso que me escute.

Apesar de ele ser lı́der, todos respeitavam o pajé, então mesmo sabendo qual seria o tópico da conversa, acomodou-se.

 

O mais velho sentou-se também.

-- O que contarei vai fazer uma grande diferença em sua vida... Farei isso para que perceba como está errado em sua forma de agir.

-- Sei que deseja me convencer a ajudar a Diana e aviso que nada que me disser vai mudar a minha opinião. – Levantou-se irritado. – Sei do seu amor por ela, sei bem da sua adoração por aquela traidora... Então prefiro que poupe meu tempo.

-- A Diana foi uma traidora por quê? – O pajé indagou calmamente.

O jovem demonstrava um olhar de incredulidade.

-- Como ainda ousa me perguntar o motivo? Primeiro se virou para o lado dos brancos, depois trouxe esse bandido aqui e se negou a selar a paz casando-se com ele... Não esqueça quantas vidas perdemos com isso.

-- Quem ela traiu? – Arqueou a sobrancelha. – Um povo que nunca se importou com ela? Um povo que a jogou na floresta para que morresse ou um povo que a rejeitou por ser filha de branco?

O olhar do jovem guerreiro denotava raiva.

-- E por que ela veio até aqui?

-- Porque seu pai obrigou Alexander a fazer isso... Seu pai queria humilhar a ú nica filha da mulher que um dia seria a rainha de nossas tribos.

-- Ela era fraca!

-- Ela era a sua mãe!

Os olhos do ı́ndio não pareceram surpresos ao ouvir as últimas palavras do pajé.

 

 

 

 

 

Diana estava sobre uma árvore e observava tudo ao redor.

Havia muitos homens e daquela vez não teria como entrar ali sem ser vista, afinal, eles já a esperavam. Pegou o binóculo e mirou na direção da barraca, então para sua surpresa, Aimê apareceu.

Viu o segurança loiro que tanto a perturbou e sentiu vontade de apertar o pescoço do rapaz até que não sobrasse mais oxigênio em seus pulmões.

Mirou o tronco e soube que ele fora feito para si.

Cerrou os dentes, enquanto mirava novamente a mulher que amava.

A Villa Real estava ainda mais linda e ficou feliz ao ver que não estava machucada ou ferida. Sentiu um alívio no peito em saber que ela estava viva, pois mesmo que soubesse que Crocodilo a manteria a salva, por sua mente ainda passava coisas terríveis.

Aquele era o momento.

Não poderia arriscar que a Villa Real pudesse sair ferida, então o plano seria se entregar... Aquilo era a única coisa a fazer...

Desceu da árvore e começou a cavar um buraco para esconder as armas que trouxera.

 

 

 

 

 

Aimê sentia o olhar dos homens sobre si.

Crocodilo a deixou andar sozinha por ali, mesmo assim, sabia que era apenas parte do plano que tinha.

Observava tudo ao redor, o verde, a mata e teve a impressão que sabia o lugar por onde deixara o acampamento quando fora salva a primeira vez.

Recordava-se da corrida cega, de ser puxada...Da voz forte e insensıv́  el da mulher que aprendera a amar... Seguiu até o tronco que fora enfiado no chão. Correntes foram colocadas no topo para prender e ferir... Tudo fora feito com total cuidado para que não houvesse chance de uma possível fuga.

Olhou para o céu e continuou com suas orações para que a Calligari não aparecesse ali, que ela pudesse viver a vida com outra pessoa e a esquecesse... porém, antes que sua reza terminasse, ouviu passos e burburinho. Ao levantar a cabeça, seu coração quase deixou de bater.

Diana...

A morena se aproximava sob as armas que eram apontadas para si. Altiva, cabeça erguida, nariz empinado em puro orgulho.

Aimê sentiu as pernas tremerem.

Observava-a com atenção, sentindo aquele poder que emanava dela...

Os cabelos negros estavam soltos. Usava camiseta preta colada ao corpo, destacando o colo bonito, jeans preto, surrado, ajustando as longas e troneadas pernas e botas de cano longo.

Deus, como podia ser tão corajosa?

Desejou ir até ela... Mas ao fitar o bandido, percebeu que se fizesse algum movimento, colocaria em risco a vida da herdeira de Alexander.

Voltou a mirá-la e sentiu as mãos suarem...

Seria realmente tão selvagem e irracional para não parecer se assustar com o perigo que corria?

-- Pare, major! – Crocodilo ordenou ao se aproximar da filha de Otávio. – Está sozinha? Sabe que não titubearei em atirar na sua namoradinha... – Ameaçou.

A pintora estancou, encarou Aimê, como se desejasse penetrar naquele azul intenso, depois exibiu um sorriso sarcástico para o homem que parecia ter o controle de tudo nas mãos, porém mesmo assim a temia.

-- Mesmo se eu não estivesse, o que não é o caso, quanto tempo eu teria antes dos seus homens transformarem meu lindo corpo em uma tábua de pirulito? – Dirigiu o olhar aos capangas que exibiam artilharia pesada. – Realmente, é uma recepção um pouco exagerada... – Desdenhou. – Estou desarmada... – Levantou as mãos em rendição.

A Villa Real estava assustada, mesmo assim não conseguia não se encantar ainda mais pela coragem da amada. Mirou os lábios desenhado em um belo sorriso.

-- Prendam-na! – O bandido ordenou irritado. – Qualquer movimento que ela fizer, podem atirar...

Os homens se aproximaram, segurando-a bruscamente. Usavam violência demasiada.

-- Não vai mandar que me revistem? – A ı́ndia provocou. – Posso estar cheia de armas aqui e matar a todos!

O bandido ficou rubro diante da incitação, indo até onde estava a princesa, esbofeteando-a forte.

A expressão da major não exibia nenhuma emoção a não ser a arrogância.

-- Prendam essa vagabunda no tronco, esperei muito por esse momento e vou aproveitar bem.

Aimê observava tudo e chorava por dentro, sabendo que nada poderia ser feito, seria o fim para a mulher amava se reagisse ao ocorrido.

Desviou o olhar, focando em uma árvore enorme que sombreava as proximidades.

Ouviu o som dos macacos... pulavam nos galhos, tendo seus olhos pequenos voltado para todos... Curiosos... Voltou a mirar a morena.

Deus, como a filha de Alexander podia ser tão forte e não demonstrar medo algum diante daquelas pessoas perigosas que só desejavam matá-la?

Crocodilo parou atrás de si, colando a boca no ouvido da jovem.

-- Espero que seja convincente a sua atuação ou meto uma bala agora mesmo na cabeça da sua amada... – Murmurou.

A Villa Real nada disse, enquanto mantinha os olhos voltados para a pintora.

Os homes amarraram os pulsos sobre a cabeça, esticando seus braços no limite.

Diana não esboçava nenhuma reação, apenas se mantinha quieta, mas o olhar continuava demonstrando prepotência e orgulho.

-- Que idiota você foi, major, arriscando a vida para salvar uma mulher que nem a menos te ama. – Crocodilo disse ao parar a sua frente. – Achava mesmo que essa princesinha aqui iria aceitar ter algo com uma selvagem como você.

A artista torceu a lateral da boca em desdém.

-- Não acredita? – O bandido desafiou-a. – Aproxime-se, doce Aimê! – Estendeu a mão e não demorou muito para que a jovem segurasse a dele.

O olhar da Calligari era implacável naquele momento. Media os presentes e seguiam com uma minuciosa análise.

-- Eu sei que você não vai acreditar, mas fatos são fatos... – Beijou a mão da garota. – Quer fazer as honras, princesa? – Fitou a neta de Ricardo.

A Villa Real mirou os olhos negros e teve uma vontade incontrolável de ir até ela, abraça-la bem forte e não sair dali por nada nesse mundo. Porém sabia que teria que agir daquele jeito, se desejasse que ela tivesse uma chance de sair com vida.

Um dos bandidos se aproximou com um chicote de couro.

-- Sabemos que a nossa arrogante Calligari não costuma se curvar a nada e a ninguém... Então estamos aqui para fazê-la se ajoelhar diante de nós...

Aimê fitou os olhos do homem e percebeu a ameaça presente neles, então aceitou o que lhe era oferecido.

-- Mostre para a major o seu amor, meu anjo. – Exibiu um sorriso sarcástico. – Acho que ela merece...

Diana fitou os olhos azuis quando ela ficou bem perto de si.

Mirou os lábios rosados, a expressão que parecia mostrar total neutralidade. Encarou-a... Viu os dentes alvos pela boca entreaberta.

Respirou fundo!

Faria tudo para conseguir sair com vida daquela empreitada, pois desejava e muito viver ao lado da bela mimadinha.

-- Não deveria ter vindo aqui, major! – A neta de Ricardo falava por entre os dentes. – Eu já te disse que não temos mais nada e que nunca mais quero ver a sua cara.

A morena a observava com atenção. Parecia surpresa com a raiva expressa nas palavras.

 Crocodilo se aproximou.

-- Não esqueça de que ela te traiu... – O bandido sussurrou em seu ouvido. – Não esqueça...

A Villa Real sabia o que significava aquela frase, sabia que deveria ser convincente em suas ações.

Mirou os olhos estreitos e sem saber de onde conseguiria coragem para aquilo, esbofeteou tão forte o rosto da esposa que lhe cortou o canto da boca.

-- Vagabunda!

Os olhos negros pareceram ainda menores e ameaçadores.

-- Acha que não sei que dormiu com meu pai? – Gritava. -- Acha que não sei que se entregou a ele, enquanto ficava noiva de outro... – Esbravejava. – Acho que não tem nenhuma diferença para a situação que estamos a viver... Transou comigo durante uma noite e no outro dia já estava com a sua amante.

A morena passou a lı́ngua pelos lábios e ao sentir o sabor do sangue, seu maxilar enrijeceu.

 Aimê se virou para Crocodilo.

-- Faça o que quiser com ela... Não desejo nada com essa vadia, não aguento nem olhar para a cara dela.

A filha do coronel e afastava, mas Crocodilo a deteve pelo braço.

-- Espere, porque apenas começamos!

A jovem parou, cruzando os braços sobre os seios, tentando demonstrar pouco caso, quando viraram a pintora de costas.

-- Levantem-na blusa. – O bandido ordenou.

O segurança traidor se aproximou e fez o que fora dito de forma grosseira.

A Villa Real prendeu a respiração ao ver a pele cheia de marcas...

Notou que além de usar o sutiã preto, a morena também tinha uma órtese de modelo encruzilhado para a coluna. Fitou o traficante e viu quando ele tirou a arma da cintura, apontando para a nuca da mulher que amava.

-- E então, Aimê, você quem deve dizer o que deve ser feito.

Ela viu o chicote nas mãos do loiro.

Meneou a cabeça de forma negativa, enquanto fazia um apelo mudo de clemência que foi totalmente ignorado.

A neta de Ricardo sabia que ele atiraria se não fizesse algo, então precisou de toda a coragem para o próximo passo.

Seguiu até o loiro, tomando da sua mão o instrumento que causaria dor à ı́ndia.

Parou diante da pele bronzeada e desejou beijá-la, desejou tocar aquelas cicatrizes... Fazê-la esquecer de tudo o que passou.

 Mordiscou o lábio inferior tão forte que sentiu o sabor de sangue.

Voltou a fitar o Crocodilo e não teve dúvidas que precisaria seguir em frente. Engoliu em seco, antes de falar:

-- Eu mesma continuarei o que meu pai fez tão bem!

Diana ouviu as palavras ditas friamente... Inclinou o pescoço para o lado, vendo os olhos azuis a mirarem. Não demorou para sentir o primeiro golpe e precisou trincar os dentes para não gemer.

Ouvia a respiração acelerada de Aimê, sentia a força que ela colocava sobre as pancadas... Fechou os olhos...

Recordou-se de quando fora feito o mesmo consigo... Relembrava a dor... Era concreta... Feria-a... Virou a cabeça novamente e viu a expressão da esposa...

Os olhos se encontraram e Diana não desviou o olhar...

Um a um os golpes foram dados até que a filha de Otávio pareceu perder as forças, deixando o chicote cair no chão. Aimê via a agonia na expressão da amada...

Engoliu em seco ao ver o sangue cobrir a pele bronzeada... Não conseguiria continuar com isso...

Seguiu até a barraca em prantos, cobrindo a boca com a mão para conter a dor. O soluço sufocado em seu peito...

Levou as mãos à cabeça, caminhava de um lado para o outro. Não acreditava que tivera coragem para fazer aquilo.

Agachou-se até o chão, cobrindo o rosto em lágrimas.

 

 

 

 

Crocodilo guardou a arma quando seguia de frente para a morena.

-- É , major, eu acho que a filha do coronel vai te dar uma boa lição... – Aproximou-se mais.

Os olhos negros estavam apertados, a expressão era de uma fúria incontida.

-- Diga-me, filha de Alexander, a mão da sua amada é bem mais leve do que a do seu apaixonado coronel? – Provocou-a. – As coisas estão se repetindo na sua vida...

O maxilar da Calligari enrijeceu.

-- Se você realmente quiser me matar, faça isso logo, porque se eu conseguir uma única oportunidade, te estriparei rapidinho. – Falou por entre os dentes.

Crocodilo segurou as madeixas, aproximando o rosto dela do seu.

-- Não, querida, te darei uma lição antes de tirar a sua vida... Não posso desperdiçar a oportunidade de te castigar através da mulher que amas... – Soltou-a. – Isso deve ser muito triste...

Virou-se para os presentes que observavam tudo. – Tragam água com sal e banhe as feridas da major, ela vai se sentir muito bem assim.

 

 

 

 

 

 

 

O pajé estava diante da fogueira.

A noite estava alta e era possível ver a lua a reinar no céu.

Tupã  se  mostrava  irredutível  em  suas  negativas  e  mesmo  diante  do  que  tinha  sido  revelado,  negava  totalmente ajuda a irmã.

Piatã se aproximou.

Todos já estavam recolhidos em suas ocas.

Sentou-se ao lado do amigo.

Permaneceram em silêncio durante longos minutos... A ave do Pajé se aproximou, permitindo o toque do ı́ndio...

Não demorou para que alçasse voo novamente.

A noite estava silenciosa, os animais pareciam quietos de mais.

-- O que faremos? – Piatã questionou. – Sabemos que a Diana está se submetendo ao bandido desgraçado... Ele vai matá-la...

O chefe apenas usava os dedos para fazer desenhos próximos ao fogo, parecia concentrado, perdido em seus pensamentos.

Olhou para o céu novamente.

-- Está viva... Alma de guerreira... Forte... – Mirou o companheiro de longas datas. – Mas sofre... sofre muito... Mas é muito além do fı́sico...

-- Tupã irá? – Piatã questionou apreensivo.

-- Não foi novidade para ele o que eu disse... Urucan falara... Envenenou-o contra mãe...

-- Irônico isso... A princesa do sol deixou a filha, abandonou-a para ficar ao lado do filho e ao final de tudo, Diana ainda foi a quem mais perdeu em tudo isso... Sabemos que ela é inocente, sabemos bem que ela fizera tudo para nos proteger e agora se negam a ajudá-la.

O pajé se levantou e ao olhar para o céu novamente, percebeu como nuvens escuras encobria o grande abobado.

-- Precisamos ter fé... Ter fé que tudo vai se resolver...

O ı́ndio nada falou, mas sabia que as coisas não se ajeitariam tão fácil assim.

Viu o chefe se afastar e permaneceu lá, parado, olhando as chamas que queimavam na fogueira.

Sabia ser injusto que a filha de Alexander estivesse passando por tudo aquilo sozinha e não tivesse alguém para ajudá-la.

Gostaria de ir até ela, gostaria de salvá-la... mas como enfrentaria aqueles bandidos sem auxı́lio? Sabia que seria difı́cil, quase impossível, porém iria até a princesa.

 

 

 

 

 

Aimê ouvia o riso dos homens e vez e outra seguia até a porta da barraca e observava Diana no mesmo lugar. Continuava amarrada no tronco.

Respirou fundo, desejando ir até ela, mas não podia arriscar a fú ria do Crocodilo.

Ouviu passos e já se afastava quando viu Alanna que falara consigo mais cedo aparecer com comida. A luz pálida iluminava o pequeno espaço.

-- Trouxe algo para a senhorita! – Colocou a bandeja sobre a mesa improvisada. – Deve comer, precisa de forças para seguir em frente.

A Villa Real mordiscou o lábio inferior, enquanto seguia até a entrada, observando se tinha alguém por perto, mas todos pareciam felizes, dançando e bebendo.

Seguiu novamente até a vigia, tomando-lhe as mãos nas suas.

-- Ajude-me, por favor, se o fizer, prometo tirá-la daqui e ajuda-la a reencontrar seu filho...

A loira pareceu esperançosa com as promessas, mas logo demonstrou receio.

-- Eu não posso, se ele descobrir me mata... – Falou temerosa. – Deve se comportar... Já o vi matar outras e não acho que seria diferente contigo.

-- Não... – Falou baixo. – Ajude-me a libertar a Diana, só ela poderá nos salvar. Alanna agora parecia confusa com o que ouvia.

-- Pensei que a odiasse... Bateu nela, as costas ficaram puro sangue... Pareceu bastante convincente.

Aimê passou a mão pelos cabelos longos, enquanto os olhos azuis se enchiam de lágrimas.

-- Eu precisei fazer isso para que não a matem... Mas não sei até quanto aguentarei... – Limpou os olhos. – Amo-a, preciso ajuda-la a sair daqui... Eu imploro que me ajude... Ele vai matá-la... – Soluçou. – Ajude-me, eu imploro...

A loira se condoeu da dor que via naquele olhar bonito.

-- Calma, precisa se acalmar ou vai ser pior. – Acariciou os cabelos longos. – Não garantirei nada, mas verei o que posso fazer.

A neta de Ricardo a viu se afastar, permanecendo no mesmo lugar. Sentiu uma fagulha de esperança voltar a queimar dentro de si.

Fitou a comida e não teve estômago para aquilo. Ouviu o som do trovão, assustando-se.

Como o pajé permitiu que Diana se arriscasse tanto? Como permitiu que ela fosse até ali sozinha? Bateu o punho fechado contra a palma da mão.

Ouviu o barulho de chuva caindo, o relâmpago a clarear a barraca.

 

 

 

 

 

A Calligari sentiu as primeiras gotas molhar sua pele.

Fitou o céu e viu a nuvem escura que encobria toda aquela área. Ouviu o barulho dos trovões.

Logo a água que pareceu branda, tomou uma proporção gigantesca. Viu quando os homens correram para dentro das barracas.

Sabia que eles temiam bastante aquelas tempestades, pois eram bastantes violentas. Sem falar nos animais que poderiam se aproximar com mais facilidade.

Tentava ver onde estava os capangas. A escuridão era imensa.

Ouvia as ordens de Crocodilo para que todos procurassem abrigo. Sabia que ele não se preocuparia consigo, sabia que não teria ainda como deixar aquele acampamento.

Tentou puxar as correntes, mas foi inú til.

Sentia-se dolorida... O corpo buscava se sustentar.

Levantou a cabeça, abriu a boca para beber um pouco de água... As feridas das costas reclamavam...

Ouvia o silêncio. Seus olhos estavam acostumados com o breu e por isso não foi difı́cil saber que estava sozinha naquele lugar.

Sentiu o lı́quido gelado...

Cerrou os dentes.

Ardiam...

Ainda estava a pensar o que se passara com a Villa Real... Puxou forte as correntes...

Sacudiu a cabeça...

Estaria com tanta raiva de si a ponto de compactuar com aquele bandido contra si?

Não, aquela não era a mimadinha que conhecia, aquela jovem era totalmente diferente de tudo que acreditara. Naquele momento já estava totalmente ensopada e seu corpo já começava a enregelar.

Precisava de um plano, necessitava de se aproveitar do fato do bandido querer prolongar sua vingança para tentar reverter a situação.

A Chuva ficava cada vez mais forte e já se sentia uma forte ventania.

 

 

 

 

Aimê fitou a escuridão no lado de fora...

Ouvia os sons dos bandidos, pareciam assustados, na verdade, ela também estava, afinal, era como se o mundo estivesse sendo devorado pela fúria da natureza.

Sabia que a Calligari continuava lá, sabia disso e mesmo que fosse arriscado, já se preparava para deixar a barraca quando a conhecida mulher retornou.

-- Para onde está indo? É  arriscado ficar fora nessa chuva! – Segurou-lhe o braço. – Crocodilo pediu para não  deixarmos os alojamentos... Estou de guarda. – Advertiu-a.

A pálida lamparina que iluminava apagou com o vento.

--Ajude-me a ir até a Diana, quero vê-la, preciso...

A mulher se assustou com o trovão.

-- é perigoso sair... Se eles nos pegarem, vão matar a gente...

--  Não  vão  pegar...  É   impossível  que  saiam  nessa  chuva,  lá   fora  está   tudo  muito  escuro,  nem  mesmo  estarão vigiando-a...

Alanna ainda não parecia segura, mas acabou fazendo um gesto de assentimento.

-- Não demore e tome cuidado... Ficarei aqui... Pediram para que te fizesse companhia... – Tocou a arma que tinha na cintura. – Se eles a pegarem não pode me comprometer...

-- Não irei... – Meneou a cabeça agitadamente. – Prometo! – Livrou-se do toque, seguindo até a entrada da barraca.

-- Mas como a encontrará  nessa escuridão... Impossível ver algo lá  fora...

– Já vivi durante muito tempo presa em uma escuridão... Acredite, sei lidar com isso. – Disse, seguindo para fora.

 

 

 

 

 

 

 

A Calligari fechou os olhos, enquanto sentia as pancadas fortes em seu corpo. Tentava manter o controle. Estava frio, muito frio...

As rajadas de chuva chicoteavam sua pele.

Sabia que não a tirariam dali... Queriam castigá-la, humilhá-la de todas as formas possíveis. Mexia os pés que já atolavam em total lamaçal.

Sorriu!

O Crocodilo era um idiota, estava dando a chance para matá-lo e se surgisse essa oportunidade não titubearia. Ouviu passos lentos, quase imperceptíveis, sentiu o toque em seu ombro e logo sentiu o cheiro dela mesclado ao

A filha de Otávio mexia não só com seu corpo, mas com sua própria alma. Ouviu a voz firme.

-- Não deveria ter vindo aqui, não deveria ter se arriscado assim! – Repreendeu. – Por que veio? Sabe que ele deseja

O barulho da tempestade abafava o som das falas.

A morena estreitou os olhos e mesmo diante da escuridão, conseguiu ver a mulher que amava a encarando. O rosto molhado, os cabelos colados à nuca.

Não conseguiu não sentir raiva ao vê-la ali.

-- Volte pra dentro, aqui é perigoso, Villa Real. – Ordenou friamente. – Saia daqui!

Aimê estendeu a mão tocando a face da esposa. Sabia que ela estava magoada pelo que fizera...

-- Por favor, fuja, Diana, eu sei que consegue... Não me importo de ficar aqui... Não me importo de ir com esses homens... – Tocou os lábios com seus dedos, sentindo o lı́quido molhá-los. – Sabe que vão te matar... – Tateou todo o rosto querido.

A major se desvencilhou da carı́cia na face.

-- Disse aos seus avós que a levaria de volta e é isso que irei fazer! – Falou firme. – Agora volta para a barraca. – Ordenou irritada. – Vai acabar pegando uma pneumonia levando toda essa chuva.

Aimê começava a sentir frio.

Afastou-se, mas não foi embora, ao contrário... Posicionou-se nas costas da morena. Estendeu a mão, tocando delicadamente as chagas.

Sentiu-a retesar os músculos, enquanto usava os dedos para delinear os cortes. Abraçou-a pela cintura, enquanto a chuva não dava trégua.

Permaneceu ali, quieta, apenas desejando tomar para si todas as cicatrizes que já estavam ali e as que fizera naquele dia.

-- Não conseguiria viver se algo te acontecesse... – Sussurrou em seu ouvido. – Vá embora, preciso que salve sua vida...

Diana sentiu os beijos em suas feridas e só naquele momento seu coração voltou a pulsar descompassadamente. Sentiu lágrimas queimarem seus olhos.

Aimê deu a volta novamente, tomando o rosto querido em suas mãos.

-- Preciso que se salve...

A Villa Real ouviu o som do trovão, pensou em se afastar, mas antes sua boca se uniu faminta ao da amada.

Abraçou-lhe o pescoço.

Apertou-a forte quando sentiu as lı́nguas se encontrarem.

A Calligari chupou-a intensamente... Desejando se perder naquele beijo para sempre... Um raio caiu perto delas, mesmo assim, a carı́cia não foi interrompida.

A neta de Ricardo, abraçava-a forte, sentindo os corpos unidos e colados. Encarou-a...

-- Volte para a barraca. – A morena falou contra a boca bonita. – Volte!

-- Não quero que fique aqui... – Choramingou. – Deus, ele vai feri-la ainda mais e vai me usar para isso... – Soluçou. – Eu não consigo... – Encarou-a. – Perdoe-me... Eu juro que não desejei te ferir...

Diana sorriu, desejando estreitá-la em seus braços.

-- Faça o que ele pedir... Isso vai me dar tempo para agir...

A Villa Real sentiu-se tremer do frio ou era a amada.

-- Eu... não posso... Não posso mais...

-- Pode sim...—Trincou os dentes para não bater. – Eu prometo que tirarei a gente daqui... Agora volte para lá e continue a fazer tudo que é dito...

Aimê meneou a cabeça negativamente.

-- Eu quero ficar contigo, preciso ficar contigo... – Dizia em um pranto descontrolado.

Mais um trovão se fez ouvir e o raio clareou bem perto, deixando que se vissem.

-- Mimadinha, precisa ter calma... Precisa entender que para que eu saia daqui viva, terá que ser forte, terá que agir como ele mandar... – Aproximou a boca da dela. – Você terá muito tempo para ficar ao meu lado...

A jovem pareceu relutante em sair, mas sabia que a pintora estava certa. Abraçou-a forte, sussurrando em seu ouvido.

-- Eu te amo...

-- Eu também te amo...

Aimê ainda olhou para a esposa por uma última vez, antes de deixar o local. Diana olhou para o céu... Puxou forte as correntes, mas foi inútil...


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