A déspota -- Capítulo 11




Eva nem ao menos deixou o carro parar e saiu em disparada quando viu o cavalo parado e a juíza caída.

Os seguranças apenas estavam ao redor observando a cena. Pareciam sem entender o que tinha acabado de acontecer.

Viram quando a filha de Andrello veio correndo e se aproximou da morena.

-- Chamem um médico! – Ordenou a cigana, baixando para ver o que tinha acontecido. Catrina se aproximou assustada.

-- Nós só ouvimos um barulho. – A loira falou assim que se ajoelhou ao lado de Beatrice.

-- Traga uma toalha para eu tentar estancar esse sangue ou ela vai ficar pior. – Ordenou buscando olhar da mulher que estava a ponto de desmaiar em seus braços.

Catrina atendeu prontamente, enquanto um dos guardas saia em busca de socorro. O outro investigava com a arma em punho , parecia assustado com o acontecido.

Eva acariciou os cabelos negros. Mirava a palidez que se apossava da pele branca.

-- Você vai ficar bem! – Apoiou a cabeça da tirana em seu colo. – Foi apenas uma perfuração no ombro. – Viu por onde a bala entrou. – Provável não ter atingido nenhum órgão importante.

-- Você é médica também? – Maria Fernanda abriu os olhos e gemeu de dor. – Ou você leu minha mão para descobrir tudo isso.

A italiana fitou a pele que parecia ainda mais pálida do que de costume. Sentiu uma emoção ao ver aqueles lindos olhos azuis. Quando a viu caı́da temeu o pior, porém rezara tanto para que tivesse sido algo superficial, apesar de ter sido um disparo a arma de fogo, não fora algo grave.

Esboçou um sorriso.

Ainda estava assustada com o acontecido, porém buscava não demonstrar isso.

-- Apenas, assisti alguns episódios do doutor House.

 A juíza sentiu fortes dores ao rir.

-- Nossa! Então você já pode até mesmo retirar o projétil.

Nesse momento, a loira chegou trazendo o que Eva tinha lhe pedido. A moça pressionou o pano contra o ferimento para tentar coibir a perda de sangue.

Fernanda olhava ao redor.

-- Onde está o Hades? – Tentou levantar a cabeça.

-- Calma, ele está bem! Não se mexe. – A cigana advertiu. – melhor ficar quieta.

Catrina observava a cena e percebeu que havia muito mais entre aquelas duas e de certa forma se sentiu incomodada, ela estava apaixonada pela bela tirana, porém também sabia que estava sendo apenas usada como uma forma de diversão, nada mais que isso.

Triste, afastou-se.

A Belluti observava um dos seguranças correr pela mata, parecia disposto a encontrar o culpado pelo ato. E se ainda estivessem por ali? E se tentassem novamente contra ela?

-- Você tem ideia de quem pode ter feito isso? – Colocou a franja da jovem para trás.

-- Não! – Tentou levantar, mas foi detida. – Preciso sair daqui. – Eu tenho que sair daqui.

Me leve para o meu quarto.

-- Não! Não é bom mexer para não complicar.

-- Olhe o doutor House não aconselha deixar os pacientes deitados num sol desses, capaz de morrer de insolação.

Beatrice não conseguiu segurar a outra que já se apoiava e tentava ficar de pé.

-- Oh Dios mio! Você é muito teimosa. – Levantou, ajudando-a.

A déspota parou ao sentir uma tontura, mas em seguida foi caminhando com a ajuda da filha de Belluti. Um policial viu as duas e se aproximou ajudando-as.

 

 

 

 

 

 

Quando Pedro chegou a casa, encontrou a esposa apreensiva.

-- O que houve, mulher?

-- Eu não consegui falar com a Fê! Estou desesperada.

-- Mas você sabe que a nossa filha raramente atende quando ligamos. – Abraçou a mulher.

-- Eu sei, mas eu liguei para o fórum e fiquei sabendo que houve um acidente, não me explicaram direito, por isso estou tão desesperada.

-- Calma, se for preciso iremos para lá hoje mesmo.

 

 

 

 

-- Vocês não deveriam ter mexido nela, vou chamar uma ambulância para levarmos para o hospital. – O médico falava examinando o ferimento.

Com muito esforço conseguiram levar a juíza para o quarto. Agora a jovem jazia deitada, sendo examinada.

-- A bala ainda está ai? – Ela indagou por entre os dentes.

-- Não! Ela atravessou seu ombro.

-- Ótimo! Pode costurar o orifício porque eu não irei a lugar nenhum.

 O rapaz olhou para Eva que observava tudo encostada à porta. Via a teimosia daquela mulher e temia que algo pior se passasse.

Lentamente aproximou-se. Ainda usava apenas o biquíni, nem tivera tempo de colocar uma roupa decente.

-- É melhor seguir as recomendações do doutor. – A cigana tentou interferir.

-- Já disse que não irei a lugar nenhum! – Bateu na cama com o braço que estava bom. – Faça logo o seu trabalho e deixe de irritar. Faça a sua função, não sou uma criança, sei o que é melhor para mim.

O médico meneou a cabeça negativamente.

-- Olhe, meritíssima, mesmo não tendo sido algo grave, precisamos de material para tratar e aqui não encontramos isso.

-- Diga o que precisa e mande um dos policiais ir buscar, mas daqui eu não sairei.

O médico ainda pensou em protestar, mas percebeu que qualquer argumento para usar com aquela mulher seria inútil. Assentiu e saiu do quarto para falar com um dos guardas.

-- Você é muito teimosa! – Beatrice se aproximou, sentando na cama. – Não sabe que corre risco de ter uma infecção ficando aqui.

-- Pelo menos aqui, não serei surpreendida por mais um tiro. – Falou com o semblante preocupado.

-- Você sabe quem fez isso? Achas que podem tentar de novo? – Indagou apreensiva.

-- Bem, não é segredo para ninguém que eu não sou a mulher mais querida da região, então o que não falta são pessoas para desejarem a minha morte. – Gemeu. – Até mesmo você adoraria se livrar de mim, não é?

Eva umedeceu os lábios demoradamente. Não era segredo para ninguém que estava muito irritada com a filha de Pedro, mas nunca quisera algo assim.

-- Acredite, mesmo não te suportando, eu jamais te desejaria isso. – Levantou exasperada.

Fernanda a mirou. Observou o corpo bronzeado, os cabelos soltos, parecia uma uma deusa com tanta beleza.

-- Vista algo, vê-la assim me deixa mais doente.

-- Por quê?

-- Porque me sinto frustrada por não poder te tocar novamente...

Eva foi até o banheiro e pegou um roupão, vestindo-o, depois prendeu os cabelos.

-- Não vai tocar nunca mais em sua vida!

A juízo cerrou os dentes ao vê-la seguir até a porta, imaginou que ficaria sozinha.

                -- Não saia agora, fique comigo.

A cigana a encarou novamente e sentiu que aquele pedido era algo tão difícil de negar, mesmo com toda raiva e mágoa que sentia por aquele ser arrogante não conseguia manter-se  longe, ainda mais a vendo tão frágil e debilitada.

-- Então, me poupe dos seus comentários idiotas.

Maria Fernanda sorriu, mas na verdade o que saiu foi uma careta de dor. Ela sabia que precisava ser forte, mas não desejava mesmo ir ao hospital. Estava preocupada com o que tinha acabado de acontecer. Lembrou que se tivesse trazido a prisioneira junto consigo do rio, talvez ela também pudesse estar ferida uma hora daquelas. Aquele pensamento a assustava bastante. Não desejava que nada de mal acontecesse com aquela jovem desafiadora.

-- Eu já disse que te acho a mulher mais linda de todo o universo. – Comentou olhando para aqueles olhos pretos.

-- Nossa, sua febre deve ter aumentado. Já começou até a delirar. – Debochou.

Fernanda nem pode responder, pois o médico adentrou o recinto.

-- Já pedi tudo que vou precisar, porém preciso de alguém para me auxiliar, uma enfermeira improvisada.

-- Eu o farei, doutor. – Ofereceu-se a cigana.

-- Estou quase me arrependendo de não ter ido ao hospital.

Beatrice lhe lançou um olhar fulminante, mas acabou sorrindo da expressão assustada da juı́za.

                -- Desculpe, Bellutinha, mas da próxima vez assista a Grey's Anatomy, acho que me sentirei mais segura.

                -- Está bem, déspota, farei para a próxima vez que precisar.

 

 

 

Tudo acabou ocorrendo bem. A ferida fora cuidada e os pontos foram dados. Mesmo que não estivessem em um centro de saúde, tudo fora cuidadosamente feito para que não houvesse nenhuma complicação.

 

 

 

 

Andrello estava no telefone, enquanto Pedro tinha a expressão preocupada, parado em sua frente.

-- E então? – O assistente indagou, assim que o outro colocou o aparelho no gancho.

-- Sim! Realmente a Maria Fernanda teve um problema. – Falou levantando-se. – Agora mesmo iremos para lá.

-- Mas o que aconteceu, homem?

Belluti não sabia bem o que tinha se passado. Apenas lhe informaram que a juı́za tinha sofrido uma tentativa de homicídio e que estava na fazenda. Sentiu uma apreensão quando ouviu aquelas palavras, temeu que algo de ruim pudesse ter ocorrido a própria filha.

-- Vou reservar o helicóptero, vou trazer a Eva de volta para casa. – Falou decidido.

 

 

A italiana observava Maria Fernanda dormir.

Ela parecia tão calma, tão diferente daquela mulher terrivelmente irritante e de olhar sarcástico, naquele momento expressava uma serenidade, até́ mesmo uma certa inocência. Passou as mãos em seu rosto, afastando a franja e foi então percebeu que ela estava febril.

O médico avisara que aquilo iria acontecer, mas que o medicamento combateria a infecção rapidamente.

Respirou fundo e se afastou!

Não sabia, mas temia aquela vontade de ficar perto daquela mulher, o desejo de tomá-la em seus braços chegava a ser tão grande que lhe machucava a alma. Mas então lembrava que a tirana era uma safada que não se importava com os sentimentos alheios, chegara mesmo a usar duas mulheres na mesma noite e nem se arrependia por isso, uma sem caráter, isso sim.

Não tivera a oportunidade de falar com a Catarina sobre aquele assunto, porém também estava chateada com a loira, esse tempo todo estava tendo um caso com aquela mulher odiosa e nem mesmo lhe falara.

Estava prestes a sair do quarto, quando ouviu a outra gemer.

 “ Eu não quero voltar para aquele lugar!”

Foram essas palavras que Eva ouviu.

Chegou mais perto e percebeu que Maria Fernanda continuava com os olhos fechados, ela estava delirando, constatou.

“ Não use o chicote, ta ardendo! Me ajuda, mamãe! “

“ Miserável, não a machuque, não a mate, por favor! “

A cigana observou lágrimas molharem a face da moça, o semblante estava tomado por um desespero enorme.

Sem saber o que fazer, deitou na cama e a abraçou. Começou a sussurrar em italiano para ela, até senti-la se acalmar.

Pela janela, observou que a noite já caia e uma pequena chuva molhava aquela terra e lavava o sangue da mulher mais odiada daquela região.

 Acariciou-lhe as madeixas longas.

O que será que aquelas frases tinham de verdade? Conhecia bem os pais de Maria Fernanda e sabia que nenhum dos dois a espancaria a ponto de lhe deixar as costas toda marcada, agora sabia que fora usado um chicote para lhe fazer aquelas chagas horríveis, tudo fora tão confuso, será que ela apenas estava sonhando?

Aspirou aquele cheiro gostoso que se depreendia daquele corpo sexy e sentiu um intenso desejo lhe invadir, vontade de beijá-la, de tocá-la como fizera naquela noite.

Praguejou baixinho.

Fora usada e depois abandonada pela juíza.

Quando se recordava disso, sentia a raiva aumentar.

 Batidas na porta interromperam seus pensamentos, lentamente se afastou, levantando-se para ir ver de quem se tratava.

Mal teve tempo de falar algo quando a senhora Maria entrou no quarto, desesperada, seguida por Pedro e por nada mais e nada menos que seu pai.

-- Como está minha filha? – A mulher indagou chorando.

Eva prendeu a respiração ao ver todos ali. Observou o pai com exasperação, mas naquele momento estava mais preocupada em acalmar a mãe da juíza.

-- Não precisa ficar assim, ela já está bem.

-- Mas como aconteceu isso? – Pedro chegou perto da cama. – Quem fez isso?

A Belluti cruzou os braços sobre os seios.

-- Ninguém sabe! Só os tiros foram ouvidos.

Andrello permanecia quieto, parecia não ter coragem suficiente para encarar a filha.

Estava assustado ao observar a Maria Fernanda. Ficara pensando se o acontecido tivesse sido com a filha não saberia nem o que faria naquele momento, o sentimento de culpa não o abandonava.

-- Que surpresa, papai! – Arqueou a sobrancelha a cigana. – A última pessoa que eu imaginava ver era o senhor, ainda mais depois que armou esse plano sujo para me trancafiar nesse fim de mundo.

O empresário pigarreou.

-- Oh babina! Vamos conversar em outro lugar. – Tentou abraçá-la.

 Eva se afastou do homem.

-- Sim, vamos conversar. – Caminhou para fora do recinto. – Temos muito para conversar.

A italiana caminhava na frente. Estava furiosa, sua vontade era esbravejar diante de todos, gritar o mais alto que podia para que todos soubessem do plano que o pai tinha armado para se livrar dela.

Belluti a seguiu até chegarem a uma porta, onde deveria ser uma espécie de escritório. Viu a filha ficar de costas e teve que se abaixar ao ver um vaso voando por sobre sua cabeça.

-- O senhor é um safado! – Apontou o indicador para ele. – Como foi capaz de inventar toda essa história? Não sabe o que eu passei nesse lugar. Não sabe o que vivi todos esses meses e tudo por causa da sua maldita candidatura de senador.

O empresário levantou as mãos, parecia assustado com a explosão.

-- Figlia bella , il perdono! Juro que não quis lhe causar nenhum dano, apenas precisava que você ficasse um tempo longe de problemas. – Tentou chegar perto. – Juro por Dios que não queria seu mal.

                Eva ameaçou pegar outra coisa para jogar nele.

-- Não se aproxime de mim! – Gritou. – Quero ver o que meu avô vai dizer quando souber do seu plano genial. Não me diga que achou que quando tudo isso terminasse eu iria agira como se nada tivesse acontecido? E essa juíza que o senhor comprou? Espero que saiba que ela também sofrerá as consequências.

-- Fiz tudo isso pensando no seu bem. – Falou baixando os olhos.

-- O seu bem, seu hipócrita!

Andrello lhe enviou um olhar de advertência.

-- Não fala assim comigo, exijo que me respeite.

-- Ah, sim, como se o senhor merecesse isso, ora, ora, Belluti, pense nas coisas que fez, na forma que agiu com sua única filha.

-- Ok! Não vou pedir desculpas mais! – Respirou fundo. – Arrume suas coisas, amanhã mesmo te levo de volta para a cidade.

 

Eva observou o pai sair, deixando-a sozinha. Não sabia o motivo, mas não sentira nenhuma emoção ao saber que iria embora daquele lugar. Como podia ser? Desejara tanto aquilo, fugira, se machucara em busca dessa liberdade, entretanto não tinha nenhum prazer ao receber aquela notı́cia.

Sentou na poltrona e cobriu o rosto com as mãos.

Iria embora daquele lugar, deixaria para trás tudo o que vivera ali, retomaria sua vida, seus amigos, suas festas, seu noivo.


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