A dama selvagem - Capítulo 9
No dia seguinte Aimê fora despertada
por uma ı́ndia que a ajudou a se arrumar e logo Piatã veio buscá-la para
seguirem viagem.
Ela ficou surpresa, mas nada disse e
tampouco questionou sobre a Calligari.
Ainda sentia a raiva pelo que aconteceu
na noite passada, ainda se sentia assustada pelo ataque que sofrera.
Selvagem!
Sim, agora percebia que não havia
traços de civilidade naquele perverso e grosseiro ser.
Diana esperava de forma impaciente.
Não tivera uma noite boa. Na verdade
pouco conseguiu dormir, pois seu cérebro fora assolado por lembranças e por
julgamentos.
Apoiou o pé sobre a pedra. Puxava o
zı́per da bota quando ouviu passos. Então, levantando a cabeça viu quando a
Villa Real saia da oca acompanhada do velho ı́ndio e viu quando o pajé se
aproximou, sussurrando algo para a jovem e em seguida colocando um objeto em
suas mãos.
Observou o sorriso alvo se abrir e os
olhos azuis se estreitarem em alegria.
Suspirou irritada.
Por que aquela garota conseguia lhe
tirar do sério?
-- Não temos todo o tempo do mundo! –
Esbravejou se aproximando. – Isso aqui não é um parque de diversão.
Aimê ouviu a voz aborrecida e
conhecida.
Ainda sentia as batidas do coração
acelerarem.
Abraçou o chefe e segurando a mão de
Piatã seguiu até a morena.
O pajé se aproximou e deu um abraço na
Calligari.
-- Cuide da Aimê! – Sussurrou em seu
ouvido. – Deixe que ela cuide de você também!
Diana relanceou os olhos em sinal de
irritação, mas nada disse.
Ela deu as ordens e não demorou muito
para deixarem a aldeia.
Dois ı́ndios seguiam na frente, Diana no
meio e Piatã caminhava guiando Aimê por meio a grande vegetação.
O percurso estava sendo feito em
silêncio, apenas os sons da natureza podiam ser ouvidos.
Vez e outra a morena olhava sobre os
ombros e percebia o quão compenetrada parecia estar a herdeira de Ricardo.
O velho ı́ndio a conduzia com cuidado,
paciente, buscava todas as formas para que a jovem não tropeçasse ou acabasse
caindo, coisa que a Calligari não se importava muito em fazer.
Na verdade, Diana agia como desejava sem
se importar se isso era ou não prejudicial aos outros.
Com
o passar do
tempo e depois
de tudo o
que viveu se
tornou um ser
humano bastante egoı́sta,
insensível aos problemas alheios,
sempre centrada em um dia ter sua vingança.
Quando o noivo fora morto ela nem esteve
presente no funeral, pois estava presa por aqueles homens. Depois que
conseguira fugir perseguira alguns deles, mas ainda não estava terminado.
Havia outros para acertar contas consigo.
Essa era uma das razões da morena está
sempre viajando, sempre buscando cada um dos membros daquela quadrilha de
bandidos.
Fitou novamente a filha do maldito
Otávio e pensava se a confissão de Ricardo sobre os crimes bárbaros que o
filho cometeu seria suficiente para amenizar sua fúria.
Depois de um bom tempo de caminhada os
ı́ndios que seguiam na frente pararam abruptamente.
Diana fez um sinal para Piatã e seguiu
até onde os dois estavam.
Aimê parecia confusa.
-- A major pediu para que ficássemos aqui!
– Levou para trás de uma árvore, agachando junto com ela. – Temos que
esperar.
-- Mas o que se passa? – A jovem
questionou nervosa. – Onde está a Diana?
-- Seguiu com os outros, acho que viram
alguma coisa.
A Villa Real estava assustada, ainda
mais porque temia que algo de ruim voltasse a acontecer com a Calligari.
Mordiscou o lábio inferior apreensiva.
Tentava apurar os ouvidos, mas o
silêncio era total, até mesmo os animais estavam quietos.
-- Acho melhor você ir até ela, eu
fico aqui, não tenho problemas de ficar sozinha.
Piatã esboçou um sorriso.
Mesmo depois de tudo o que se passou a
filha de um homem tão cruel demonstrava um amor intenso e puro por alguém
tão irascível como Diana.
-- Não, menina, ficarei aqui para te
proteger, essa foi a ordem que recebi.
Aimê ainda pensou em retrucar, mas
sabia que era raro alguém ir contra o que a princesa ı́ndia dizia.
Suspirou de forma impaciente.
Poucos minutos se passavam, mas era como
se já tivesse sido horas.
Ouviram um barulho de tiros e logo tudo
voltava a ficar agitado.
Aimê sentia o coração bater tão
acelerado que temia sofrer um infarto, então ouviram passos.
-- Podem sair!
A garota sentiu um alıvio imenso quando
ouviu aquela voz rouca e forte, mesmo que fosse tão sonoramente arrogante.
Piatã a ajudou e seguiram até a
ı́ndia.
-- Tive que matar a onça, não terı́amos
como passar sem sermos atacados, ela partiu para cima do Buriti!
-- Deus! – A Villa Real exclamou. – Mas
ele está bem? – Indagou preocupada.
-- Está! – Diana respondeu sem dá
muita atenção. – Vamos embora! – Bebeu um pouco de água. – Não desejo me
demorar mais.
Continuaram a caminhada, parando apenas
para um lanche rápido e ao anoitecer já avistaram uma clareira para passar a
noite.
Comeram em silêncio.
Dormiriam sob o céu estrelado e tiveram
sorte de não chover, pois não teriam como se proteger.
-- Eu e Ubirajara montaremos guarda! –
Piatã disse se levantando. – Major descansa e cuida do ferimento que voltou a
sangrar.
A morena nada disse.
Tomava seu café, enquanto fitava a
fogueira.
Tinha as costas apoiada em uma árvore e
as pernas esticadas.
Aimê estava ao seu lado e parecia
concentrada em seus pensamentos, o outro ı́ndio já dormia, enquanto os que
fariam a guarda já tomavam seus postos.
Diana pegou a mochila para pegar o kit
de primeiros socorros e sua mão acidentalmente roçou na da Villa Real.
Os olhos azuis se voltaram para si.
Brilhantes, penetrantes, desafiadores e
assustados.
A Calligari a ignorou, depois se livrou
do colete e da camiseta, ficando apenas com o sutiã.
Fitou o abdome e viu o sangue.
Realmente o curativo estava encharcado.
-- Preciso que me ajude!
Aimê pareceu distraı́da.
-- Está falando comigo?
Diana praguejou baixo.
-- O que quer que eu faça? – Questionou
relutante.
-- Não conseguirei fazer o curativo
sozinha e tampouco cuidar, pode fazer isso para mim?
A jovem fez um gesto afirmativo com a
cabeça, mesmo que não desejasse tocar naquela mulher, sabia que deveria ajuda-la.
-- Apenas guie minha mão até a ferida
e me passe o material.
-- Ok!
A Calligari a tomou pela mão, fazendo-a
se posicionar em meio as suas pernas.
A Villa Real ajoelhou-se.
Diana entregou-lhe o antisséptico e o
algodão, depois lhe tomou a mão macia e delicada levando até o ferimento.
A neta de Ricardo sentiu um arrepio
percorrer a espinha com o toque firme dela, mas tentou ignorar, enquanto
começava os cuidados.
Não tinha como ignorar o corpo firme...
Mordeu o lábio inferior, enquanto
tentava se concentrar.
Diana sentia a delicadeza dos dedos
longos e sua mente imaginava como seria maravilhoso usá-los de outra forma,
senti-los de jeitos diferentes.
Olhou para cima tentando não se
enfeitiçar.
O céu estava claro, cheio de
estrelas...
Voltou a encarar a jovem.
Mirou os lábios rosados entreabertos, o
azul brilhante e perdido, o nariz fino, mas que denotava teimosia.
Lembrou-se de como era gostoso sentir
aquela boca colada a sua... Imaginou-a explorando sua pele...
Inconscientemente soltou um gemido.
-- Desculpe-me, não quis machucá-la!
A voz doce lhe tirou de seus devaneios.
Corou!
-- Continue! – Ordenou.
A Villa Real assentiu, retornando ao
serviço e tentando se concentrar, pois havia algo naquela mulher que lhe
embaraçava os sentidos, havia algo no cheiro dela, na voz que a perturbava
demasiadamente.
Não podia negar que estava bastante
magoada pelo tratamento que recebera na noite passada, mesmo assim era como se
não conseguisse sentir raiva, pelo menos não era algo que durava.
Por que se sentia assim?
Seus dedos tateavam e pareciam em brasas
diante do contato.
Mordiscou o lábio inferior mais uma
vez.
-- Creio que já está limpo!
Diana pegou o esparadrapo e os gases,
entregando-lhe.
Não demorou muito para tudo está
pronto, mas quando Aimê fez menção de se afastar, ela a deteve pelo pulso,
mantendo-a junto a si.
-- Precisa de mais alguma coisa? – A
jovem questionou desconfiada.
-- Sim! – Trouxe-a tão próxima de si
que era possível sentir o hálito refrescante.
-- Diga-me e eu farei! – Falou
prestativa.
-- Fará o que eu pedir...? – Indagou em
voz baixa
-- Sim...
A Calligari delicadamente colou a boca a
dela, segurando-lhe pela nuca para não permitir que ela se afastasse.
Inicialmente a filha de Otávio cerrou
os lábios evitando o contato, porém dessa vez a morena usou um método
diferente. Não foi grosseira, mas provocante, sensual...
Usando a ponta da lı́ngua ela contornou
a pele rosada, em seguida chupou o lábio inferior, depois o superior até que
a jovem acabou cedendo, permitindo a passagem.
As bocas se uniram delicadamente,
explorando-se, encontrando-se...
A primeira vez que Aimê participava da
carı́cia
Ouvia-se o barulho, o estalado, o
sugado, o chupar...
Diana soltou-lhe o pulso e sem deixar de
beijá-la, levou as mãos até os seios redondos, buscando sob a blusa o
contato com a pele.
Ela não usava sutiã e isso deixou a
morena ainda mais excitada.
Os mamilos responderam ao contato
rapidamente, eriçados pareciam implorar por serem acariciados.
Aimê gemeu contra a boca da Calligari e
logo pareceu recordar a consciência, afastando-se, baixando a blusa e
empurrando as mãos atrevidas.
-- Chega! Não basta o que me fez ontem?
Diana passou as mãos pelos cabelos,
pareciam constrangida, mas também ainda mais desejosa.
Pensou em ir até a jovem e trazê-la de
volta para si, mas sabia que a Villa Real lutaria e não demoraria a todos
estarem vendo a discussão.
Observou Aimê se levantar.
-- Ontem eu perdi a cabeça... Estava
brava...
-- Acha que isso justifica seus atos? –
Perguntou calmamente, com as mãos na cintura. – Está sempre agindo como uma
selvagem... É grosseira... Cruel... Não tem modos, pior que os nativos que
sempre se mostram polidos.
A Calligari estreitou os olhos.
-- Tem certeza de que não gostou do que
se passou ontem? – Exibiu um sorriso cı́nico. – Eu tenho certeza de que você
gosta, não sei por que nega tanto! Eu até entendo que deveria ter sido mais
delicada, mas mesmo com toda a brutalidade eu senti sua resposta.
A Villa Real parecia indignada.
-- Eu já te avisei para não voltar a
me tocar. – Dizia gesticulando o indicador. – Não sabe agir de forma
diferente? Primeiro me trata mal, é uma carrasca e depois acha que tem direito
de me beijar e...e... Fazer essas coisas! Você realmente é um ı́ndia
selvagem, uma canibal como costuma propagar a todos...
Diana se levantou, segurando-a pelos ombros.
-- Não deve esquecer que é minha
mulher, que estamos unidas e acredite, meu bem, eu como princesa, posso tomá-
la à força a hora que eu quiser e não terei que dar satisfação para
ninguém, mas prometo que quando chegar o momento serei boazinha...
A jovem afastou-se com um safanão.
-- Estou pouco me importando para essa
sua tribo e tampouco para o fato de você ser princesa para esse povo... Em mim
não tocará! – Falou mais alto.
-- Ah, sim, vou tocar sim e vou fazer
mais do que tocar e você ainda vai implorar para eu te comer bem gostoso e
quem sabe eu não pense em seu caso!
Aimê ficou tão indignada que de forma
cega, partiu para cima da pintora.
A morena foi rápida em se livrar da
investida, mantendo uma distância segura para não acabar se ferindo.
Depois conseguiu detê-la, abraçando-a
por trás.
-- Não vejo a hora de chegar à
civilização e me livrar dessa animosidade, dessa sua selvageria! – A Villa
Real falava sem fôlego. – Pode não ser ı́ndia na cor, nos traços, mas na
forma de agir é ainda pior do que os seres primitivos!
A jovem se debatia nos braços da major, tentando
se livrar das amarras.
Piatã ouviu os brados e se aproximou,
interpondo-se entre as duas mulheres, pois percebia que os ânimos estavam
bastantes exaltados.
-- O que se passa? – Indagou em voz
baixa. – Vão despertar os espı́ritos da floresta. – Repreendeu-as.
Aimê pareceu constrangida e logo voltou
a ocupar o lugar de antes.
Diana ainda a encarava com olhar
ameaçador.
-- Fique aqui, eu ficarei de guarda! – A
morena disse, afastando-se.
Piatã
nada disse, pois
conhecia bem aquela
mulher, sabia como
ela era irredutível
em suas palavras,
como era inflexível em suas
atitudes.
Observou a neta de Ricardo se encolher,
enquanto ela se deitava.
Pegou uma coberta, entregando-lhe.
-- Descanse, menina, pois amanhã o dia
será longo, mas logo chegará a sua casa.
Aimê esboçou um sorriso terno, enquanto
fechava os olhos e buscava acalmar o turbilhão de emoções que se apossara de
si.
Por que Diana Calligari cruzara o seu
caminho?
Jamais em sua vida se sentira tão
afetada, jamais fora tão instigada ao seu limite do controle como desde que
começara a conviver com aquela mulher.
Todos que conheciam a Villa Real sabiam
o quão agradável, educada, doce e paciente ela se mostrava, sempre fora
elogiada por seu jeito meigo de agir e nunca precisara se esforçar para isso,
ao contrário, aquela personalidade era sua desde quando era uma criança.
Assim que chegassem à cidade,
agradeceria por ter sido resgatada e nunca mais voltaria a encontrar aquele ser
terrível.
Enquanto esse momento não chegava,
tentaria manter total distância, nem mesmo lhe dirigiria a palavra e tampouco
ficaria sozinha com ela, pois não confiava...
Mordiscou o lábio inferior tão forte
que só aliviou ao sentir o sabor do sangue.
O que estava acontecendo consigo?
Os seios ao contato com a blusa estavam
doloridos, pareciam agonizantes, desejantes daquele toque grosseiro.
Os mamilos ainda estavam eriçados e por
uma fração de segundos ela se permitiu recordar de quando os lábios cruéis
se apossaram deles, de quando a lı́ngua arisca lhe dominara.
Seria aquela mulher que todos diziam ser
princesa algum tipo de feiticeira?
Diana se embrenhava pela mata escura
observando atenciosamente os sinais da natureza.
Se antes estava cansada, desejando
apenas dormir um pouco, depois do que se passara com a Villa Real, ela estava
elétrica, precisando de algo para gastar as energias.
Estava dividida entre o desejo e a fúria!
Se Piatã não tivesse aparecido ela teria
mostrado para a filha do maldito Otávio todo o seu lado selvagem, teria
mostrado o que era ter em suas veias o sangue daquele povo, talvez primitivo
para os padrões da sociedade, mas também eram os protetores daquela natureza,
vı́timas de pessoas inescrupulosas, vı́timas de suas tradições.
Parou diante de uma árvore e com o
punho fechado, esmurrou-a tão forte que sentiu como se os ossos quebrassem,
mesmo assim sua expressão não demonstrava dor, continuava impassível, fria...
Maldita mimadinha!
Ela era igual ao desgraçado do Otávio,
tinha os mesmos preconceitos e quando a viu falar aquelas coisas tivera a
impressão de estar diante do miserável.
Se Piatã não tivesse chegado teria
adorado torcer aquele pescoço delgado até ver a vida deixar aqueles olhos
azuis tão intensos.
Socou mais uma vez a árvore!
-- Desgraçada! – Murmurou.
Seu corpo ainda implorava pela
concretização do desejo, seu maldito corpo estava em fogos por ela, desejando
tomá-la de forma irascível, impensável, até sentir a consumação daquela
febre que lhe ardia em toda a pele.
Tinha vontade de gritar alto, de xingar
em todas as lı́nguas que conhecia, mas isso não lhe aliviaria o desespero...
Aimê era uma ameaça a sua sanidade...
Antes que o sol nascesse era possível
ouvir a voz rouca ditando as ordens do dia.
Aimê já estava acordada e se sentia
grata por isso, pois percebia que qualquer coisa seria motivo para desencadear
a fúria.
Levantou-se, recolhendo as coisas.
-- Coma! – Diana colocou um pão de
forma brusca nas mãos da Villa Real.
A herdeira de Ricardo nada disse, apenas
comendo o que lhe fora ofertado sem esboçar nenhuma reação, mesmo que sua
vontade fosse jogar o sagrado alimento contra aquela carrasca.
Piatã se aproximou com uma xı́cara de
café, entregando delicadamente a moça.
-- Beba um pouco!
A morena dirigiu um olhar irado ao
ı́ndio.
-- Hoje, Aimê seguirá comigo, não
permitirei que vá contigo, pois por causa disso, ainda nem percorremos a
metade do caminho.
Os olhos azuis pareceram magoados, mas
nada disse, na verdade todos ficaram calados.
Não tardou para deixarem o lugar.
Diana colocou a corda nas mãos da jovem
e saiu com passos largos sem se importar com as dificuldades que a sua acompanhante
de percurso enfrentaria.
Depois de quase uma hora de tropeços,
Aimê foi ao chão.
A morena nem se aproximou para
ajudá-la.
Cruzou os braços na altura do colo,
enquanto observava tudo com semblante impaciente.
Piatã foi até a jovem, ajudando-a.
-- Machucou-se, menina? – Questionou
preocupado.
A Villa Real tirou os cabelos dos olhos,
em seguida esfregou as mãos na calça.
-- Estou bem, não se preocupe! – Disse
de forma constrangida.
-- Ótimo! – A Calligari colocou a corda
novamente em suas mãos. – Vamos embora! Chega de perder tempo!
Os passos da morena continuavam
implacáveis.
Ela andava em velocidade que só alguém
preparado conseguiria fazê-lo.
A vegetação era rasteira, havia
declives, sem falar de vários galhos que pendiam e poderia ferir qualquer
pessoa que não pudesse ver.
A herdeira de Ricardo tentava ao máximo
não se desequilibrar. Levantava ao máximo as pernas, mas a velocidade que a
outra usava não a deixava acompanhar.
Estava sem fôlego, o ar não chegava
aos seus pulmões.
Suava, estava abafado, não conseguia
nem parar para beber um pouco de água.
Sabia que a Calligari fazia tudo para
maltratá-la, sabia que isso lhe dava prazer.
Diana a fitava sobre o ombro.
Viu-a cair novamente e dessa vez foi
até ela, ajudando-a.
Mirou os olhos azuis...
Observou as delicadas mãos que estavam
rosadas e sujas, havia um pequeno corte.
Retirou o cantil da cintura, depois
lavou a pele delicada.
Mantiveram-se agachadas por alguns
segundo sem falarem nada, até que Diana retornou a caminhada.
Vez e outra observava a garota.
Ela não era tão frágil como se
mostrava fisicamente.
Não reclamara em nenhum momento e mesmo
enfrentando tantos obstáculos não desistira.
-- Princesa, precisamos parar para comer
alguma coisa, estamos andando há horas.
A morena parou abruptamente e Aimê
chocou-se em suas costas.
Diana nada disse, apenas dirigiu sua
fúria a Piatã.
-- Desde quando você se cansa? –
Indagou com as mãos nos quadris. – Pararemos apenas quando chegarmos à canoa,
então nos apressemos.
O velho ı́ndio nada disse, sabia que
seria inútil discutir com a filha de Alexander.
Continuaram com o mesmo ritmo.
O sol logo se poria, mas Diana não parecia
se importar com tal fato.
Ela apenas desejava chegar o mais
rápido possível e se livrar da acompanhante.
De repente fez-se um silêncio, a
Calligaria fez sinal para que todos parassem e se escondessem em meio às
árvores.
Aimê estava encostada a uma centenária
e Diana com o corpo colado ao dela.
-- O que se passa? – A Villa Real
sussurrou.
Diana nada respondeu, pois parecia
buscar em todas as direções, tentando ver qual o risco corriam.
Estava com a arma em punho.
Um grito gutural e sofrido foi ouvido.
-- Deus, o que houve?
Naquele momento a Calligari fitou os
olhos azuis que pareciam tão assustados, a expressão de temor era intensa.
-- Com certeza alguém foi devorado... –
Disse bem próximo os lábios rosados.
-- Pelo quê?
-- Não posso dizer com certeza, mas
pelo silêncio da mata e pelo demorado da resposta da presa, acredito que temos
uma anaconda por perto.
-- Meu Deus! – Cobriu a boca com a mão.
– Como no filme?
A morena mesmo não desejando, acabou
esboçando um sorriso da inocência da garota.
-- Talvez do mesmo tamanho, porém
depois que come, ela não volta a caçar, está cheia e precisa de tempo para
digerir a refeição... Se a refeição foi grande...
-- Meu Deus, Diana, não podemos fazer
nada para ajudar?
A pintora sentiu um arrepio na nuca ao
ouvi-la dizer seu nome. Era sempre uma sensação única, como se estivesse
recebendo uma carı́cia ı́ntima, como se estivesse sendo tocada no âmago do seu
ser.
Passou a mão pelas madeixas negras,
afastando-se.
Piatã se aproximou.
-- Com certeza tivemos uma cobra
lanchando. Aquela pele que vimos deveria ser dela. – O velho ı́ndio dizia.
-- Temos que nos apressar para chegar à
canoa! – A Calligari colocou a arma no coldre da coxa. – Chegaremos à vila já
a noite e no dia seguinte poderemos pegar o monomotor.
Todos aceitaram o que fora dito, não
apenas por ser uma ordem, mas também por temerem ficar mais dias em meio
aquela selva tão selvagem.
A Villa Real fazia o possível para
acompanhar os passos.
Estava assustada ao imaginar que havia
animais tão perigosos que não temiam o ser humano.
Desejava retornar à civilização, desejava
retornar para sua casa.
Seguiram por mais algum tempo.
Tomavam água e comiam bananas para
tentar repor as energias.
Quando o sol já deixava o horizonte, chegaram
à pequena embarcação.
Piatã ajudou Aimê subir, despediram-se
dos ı́ndios e os três seguiram para a vila.
Diana remava, parecia concentrada na
tarefa, quando ouviu a voz doce da filha de Ricardo.
-- Sinto cheiro de peixe!
O ı́ndio sorriu.
-- Aqui tem muitos, menina, há uma
riqueza deles.
-- Gostaria de vê-los!
-- Talvez você se assustasse, ainda
mais com as piranhas, são bastante temidas.
-- É verdade que eles comem pessoas em
frações de segundos?
Piatã riu alto, enquanto fitava a filha
de Alexander.
-- Sim, os cardumes são ferozes, não
é, Diana?
A Calligari lhe dirigiu um olhar de
advertência, sentiu dor no ferimento, mas continuou, pois sabia que Piatã
não daria conta sozinho.
-- Não sei! – Respondeu irritada.
-- Ah, major, você poderia contar a sua
experiência. Sabia, Aimê, que a princesa teve que enfrentar esses animais.
-- Foi? – Os olhos azuis pareciam mais
brilhantes. – O que se passou?
-- Chega, Piatã, reme para que possamos
chegar logo!
O ı́ndio piscou travesso.
-- Diana é uma princesa valorosa, ainda
mais quando fazia a união das tribos contraindo laços matrimoniais.
-- Como assim?
Piatã soltou uma gargalhada.
-- Ela teve algumas noivas...e noivos...
Aimê pareceu interessada na conversa.
-- Houve outras antes de mim? – Indagou
incomodada.
-- Sim...
-- Chega disso! – A morena ordenou
irritada. – Preste atenção que a noite já está caindo. – Parou de remar ao
sentir um incômodo no ferimento novamente.
-- Descanse! – O ı́ndio falou ao notar a
expressão de dor. – Já fez esforços de mais...
-- Falta muito para chegarmos? – A Villa
Real questionou.
-- Não, menina, logo estaremos lá.
-- Fico feliz por isso!
Continuaram a viagem e apenas era possível
ouvir a voz do velho ı́ndio contando histórias e o riso doce da herdeira de
Ricardo.
Diana seguia calada, parecia pensativa,
compenetrada, mas vez e outra fitava sobre os ombros e observava a jovem que
resgatara.
Logo sua missão estaria terminada, logo
seu desejo seria concretizado e depois tentaria seguir a sua vida, tentaria
buscar viver com todos aqueles infortú nios.
Como seria quando todos soubessem a
verdade?
Finalmente limparia o nome dos
Calligaris, finalmente honraria a memória do seu pai.
À noite já estava alta quando chegaram
à pequena vila.
Quando deixaram à canoa partiram por
terra, seguindo em silêncio.
Daquela vez a Villa Real foi conduzida
por Piatã.
As pessoas pareceram felizes ao ver o
ı́ndio de volta, saudando-os com entusiasmos.
As luzes dos candeeiros iluminavam as
pequenas choupanas.
As crianças ainda brincavam e era possível
ouvir seus gritos.
Ao entrarem a pequena casa, Diana
colocou a mochila no chão.
-- Preciso do rádio, tenho que falar
com o meu piloto.
-- Leve, Aimê até a cabana para banhar
e depois venha para irmos lá.
Diana assentiu, enquanto pegava algumas
roupas na outra bolsa que tinha deixado ali quando seguiu naquela empreitada.
Pegou duas mudas e algumas peças
ı́ntimas.
Tomou a mão da Villa Real, caminhando
até um pequeno retângulo feito em palhas de cocos.
O espaço era pequeno, mas cabiam as
duas.
-- Dispa-se! – A morena ordenou enquanto
se livrava das próprias roupas.
-- Que lugar é esse? – A jovem parecia
receosa.
-- Um lugar que serve para tomar banho,
a menos que deseje banhar no rio com os jacarés e as piranhas. – Ligou o motor
e a água começou a jorrar do chuveiro improvisado.
-- Tem água encanada? – Indagou
surpresa. – Gelada! – Exclamou se afastando.
-- O que esperava, mimadinha, uma
banheira de hidromassagem? – Ensaboava-se. – Tire logo a roupa, a água não
vai durar muito.
Apenas uma lamparina iluminava o pequeno
espaço.
-- Preferiria banhar sem a sua presença!
A Calligari se irritou.
Rapidamente foi até ela e com gestos
bruscos a livrou das vestes.
-- Você não cansa de ser grosseira? –
A garota cobriu inutilmente as partes ı́ntimas.
Diana nada disse, mas a tomou pelo
pulso, trazendo-a sob a água, prendendo-a em seus braços para que a jovem não
se debatesse e saı́sse correndo.
Os olhos azuis se voltaram para ela,
brilhantes e intensos, os dentes alvos e cerrados demonstravam sua total
insatisfação.
O lı́quido unia os corpos.
-- Está suja, mimadinha, precisa banhar
bem! – Pegou o sabonete e começou esfregar freneticamente no corpo da filha de
Otávio. – Esses dias na selva a deixou mais suja do que aqueles traficantes
fedidos.
Aimê estava encostada a parede de
palha, parecia chocada com a atitude de Diana.
Sentia as mãos ásperas esfregando seu
pescoço, seus braços... Demorando-se mais em seus seios, lavando-os,
apertando-os...
A Villa Real sentiu um arrepio na pele.
Fechou os olhos.
A morena desceu mais, limpando agora o
abdome liso e logo os dedos tocaram os pelos finos que cobriam a feminilidade.
Inicialmente parecia um toque inocente
sem outros fins, mas de repente não era mais o sabonete que estava ali, agora
apenas os dedos executavam a função.
Aimê não protestou, era como se
estivesse paralisada, como se estivesse perdida em meio àquelas sensações.
Diana colou os lábios aos dela.
Tomou-os rudemente e naquele momento a
jovem Villa Real não tivera uma atitude passiva, ao contrário, ela participou
ativamente da carı́cia.
Introduziu a lı́ngua na boca da morena,
abraçou-a pelo pescoço, apoiando-se a ela.
A Calligari desligou a água, enquanto
se deliciava com o corpo da filha do seu inimigo.
Beijavam-se com paixão desesperada.
Furiosas, as lı́nguas eram sugadas,
mordiam-se, chupavam-se.
Diana introduziu a coxa em meios às pernas
torneadas. Usou os nódulos dos dedos para acariciar o sexo que se mostrava
escorregadio e excitado.
Aimê gemeu contra o pescoço dela.
Deus, o que era aquilo?
Sentia-se inebriada, embevecida, fraca,
desejando apenas que aquela febre chegasse ao fim, mesmo temendo que fim seria
aquele.
As sensações para ela eram novas, mas o
desejo começara desde que a morena a tocara pela primeira vez.
A Calligari estava louca de vontade
toma-la para si, sua paixão não conhecia limites, não conhecia o decoro,
apenas aquela selvageria que era tı́pica do seu ser.
Massageou o sexo, sentindo-o inchado,
sentindo-o convidativo.
Ouvia os sons que saiam da garganta de
Aimê e desejava mais do que aquilo, desejava ouvi-la chamar seu nome, queria
aquela voz doce e rouca chamando por si...
Levou os lábios até os seios redondos,
degustando, lambendo os mamilos rosados, mamando, tomando-os com arrogância.
-- Major, o rádio já está pronto, mas
a bateria não vai durar muito!
A voz de Piatã do lado de fora as trouxeram
de volta para a realidade.
A Villa Real foi a primeira a reagir,
empurrando a morena
A Calligari praguejou alto ao sentir o
ferimento latejar.
Tocou o ferimento, trincou os dentes
para não gritar de dor.
-- Estou indo!
Pegou a toalha e começou a se secar e
rapidamente se vestiu, voltou a ligar a água.
Colocou o sabonete na mão da Villa
Real.
-- Agora você está suja novamente.
Só quando Aimê percebeu que estava
sozinha que soltou a respiração lentamente.
O que tinha acontecido ali?
Se o velho ı́ndio não tivesse aparecido
onde teriam chegado?
Ainda sentia as sensações em sua pele,
ainda sentia o poder da boca dela em seus seios, ainda sentia os dedos ousados
lhe perturbando a feminilidade...
Ficou sob a água.
O lı́quido frio pareceu lhe acalmar os
sentidos, adormeceu a agonizante paixão que parecia correr por seu sangue...
Não poderia se render àquele desejo,
pois algo lhe dizia que a tão aclamada princesa indı́gena não era uma pessoa
boa para se ter sentimentos.
No dia seguinte iriam embora, no dia
seguinte retornaria para o seu mundo, para a civilização e tudo o que vivera
naquele lugar ficaria para trás.
Terminou o banho e com um pouco de
dificuldade conseguiu encontrar as roupas, vestindo-se.
Agora estava temerosa, pois não sabia
como retornar para a casa, mas ao abrir a porta, Piatã estava a sua espera.
Seguiram em silêncio.
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