A dama selvagem - Capítulo 8
O dia fora de muita chuva.
Durante todo o dia a aldeia fora assolada
por uma forte tempestade.
Não havia pessoas ao redor de
fogueiras, apenas em suas ocas, protegendo-se da fúria da natureza.
Era possível ouvir o som das árvores
sendo balançadas pelo vento, era possível ouvir seu gemido. Os trovões pareciam
as vozes dos deuses a esbravejar com a humanidade
À noite já tomava conta e o aguaceiro
não parecia desejar dar trégua.
A oca estava na penumbra.
O pajé observava a o ferimento de Diana
com atenção.
A major voltou a ter febre naquele dia
logo depois de ter sido banhada por Aimê.
A Villa Real se mantinha de pé, ainda
trazia no rosto o corado da hora do banho.
Ficara grata por sua salvadora ter
passado o dia dormindo, despertando apenas para comer, porém nesse momento
Aimê não estava presente. Tinha saı́do com Piatã, o ı́ndio a levou para
presenciar um ritual próprio daquele povo. Sendo assim, só o pajé ficara com
a Calligari.
Agora estava lá, de pé, tendo os braços
cruzados sobre os seios.
Quando retornou ficara sabendo que a morena
tinha tido uma recaı́da.
Estava preocupada e se sentindo culpada
por não ter ficado ali para cuidar dela.
Um forte trovão foi ouvido e a jovem
teve um sobressalto.
Ubiratã a fitou por sobre os ombros e
percebeu que algo não estava bem com a filha de Otávio.
Voltou sua atenção para a princesa.
Ela estava irascível!
O mau humor pareceu ter voltado.
Ela estava de olhos fechados, mas os
abriu ao ouvir o barulho no céu.
Os olhos negros se acostumaram com a
penumbra e não demorou muito para ver a neta de Ricardo parada a alguns
metros.
Não voltou a vê-la desde cedo.
Sentira falta dela, ainda mais nas vezes
que despertou e a procurou ao seu lado como era de costume.
-- Ainda está quente! A febre retornou!
A voz do pajé a tirou dos seus
pensamentos.
-- Está doendo muito?
Diana desviou os olhos de sua esposa e
encarou o homem que a fitava de forma impaciente.
Fez um gesto afirmativo com a cabeça.
-- Sim, incomoda muito... – Apressou-se
em dizer.
O pajé estreitou os olhos de forma
desconfiada.
-- Espero que não tenha andado fazendo
esforços desnecessários... Deve ficar em repouso. – Repreendeu-a.
Aimê ouvia tudo e o rosto ficava mais
rosado.
-- Eu não aguento mais ficar deitada,
isso sim está me deixando doente...
O pajé levantou, aprumando as costas.
Seu olhar demonstrava total desagrado.
-- Fique em repouso até que esteja
bem... Quanto a você, Aimê, tente fazer a sua mulher ser menos teimosa.
O velho deixou a oca pisando duro,
enquanto a Villa Real permanecia no mesmo lugar. Seu olhar denotava susto,
medo, receio, mas também havia desafio.
Permaneceram em silêncio durante alguns
segundos.
Diana estava pensativa, seu olhar
recaı́a sobre suas mãos. Não estava totalmente deitada, mantinha-se sentada,
tendo o corpo coberto.
Levou a mão ao lugar onde recebera o
disparo, mais uma cicatriz para as inúmeras que possuı́a... não só em seu
corpo, mas em sua alma.
Suas costas tinham muitas... afinal,
fora chicoteada por Otávio, enquanto ficava presa em um tronco fincado em meio
ao pátio de treinamento.
Ainda conseguia ver o maldito homem a se
regozijar com sua dor, a mostrar a todos que detinha o poder.
Um trovão a tirou dos seus devaneios, o
relâmpago iluminou o rosto da Villa Real e por um momento Diana teve a
impressão que não era os olhos da jovem, mas sim os do pai dela.
Respirou fundo!
Passou a mão pelos cabelos, gostava de
tê-los a altura dos ombros.
Estavam longos...
Voltou a encarar a neta de Ricardo.
Ela jazia parada, mantinha os braços
cruzados sobre o colo. Mesmo na penumbra conseguia ver a carranca que estava
entre as sobrancelhas finas.
-- Vai passar a noite toda aı́ como uma
estátua? – Questionou-a impaciente.
Aimê nada disse durante algum tempo.
Estendeu a mão em busca da rede, mas
não encontrou.
Parecia confusa, pois sabia exatamente
onde estava antes.
Continuou tateando, mas percebia que
algo estava errado.
-- Hoje terá que dormir comigo! – Diana
disse quando percebeu que a jovem já parecia desesperada.
-- Por quê?
-- Porque somos casadas e como não
posso ficar na rede, você deve deitar aqui.
Aimê suspirou alto, deixava claro seu
descontentamento.
Lentamente foi até a o lugar onde se
acomodaria, tentando manter total distância.
-- Sua tribo não se importa por uma
mulher casar com outra? – A Villa Real indagou aborrecida. – Esse tipo de coisa
é normal para vocês?
Diana não disse nada inicialmente.
Aquela pergunta a fez se lembrar de algo
que sempre a perseguia.
Lentamente, mexeu-se, ficando de lado,
observando as sombras que faziam no rosto bonito.
-- Eu não sei... – Respondeu
simplesmente, fechando os olhos. – Se tem tanta curiosidade, pergunte você
mesma a eles.
Aimê mordiscou o lábio inferior
demoradamente.
Aquela mulher não cansava de ser
grosseira?
Desejava falar sobre o que aconteceu de
manhã, pois alguma coisa sucedera consigo naquele momento, porém temia que a
Calligari agisse com seu costumeiro sarcasmo.
Levou as mãos às têmporas e começou
uma massagem.
A major tinha um gênio muito forte, agia
como se fosse a dona de toda a razão. Ainda se recordava dos momentos que
passaram juntas naquela floresta, de como ela agia como se tivesse todas as
resposta do mundo e como só a sua opinião importasse.
-- Diana... – Chamou de forma relutante
depois de alguns segundos.
Não obteve respostas, imaginou que a
outra estivesse a dormir, porém depois de algum tempo ouviu uma pequena
movimentação.
A Calligari abriu os olhos, encarando a
jovem esposa.
Estendeu a mão para lhe tocar a face,
mas desistiu, fechando-a, recolhendo-a.
-- Durma, Aimê! – Ordenou rispidamente.
– Não estou muito sociável para conversar.
-- Desde que nos conhecemos nunca
percebi você sociável comigo... Tenho certeza de que não gosta de mim... –
Deu um sorriso nervoso. – Bem, eu não sei o que te fiz e quando penso no seu
desagrado com a minha pessoa, fico imaginando que não gosta de mim porque sou
cega... Eu até entendo, afinal, se fosse alguém sem deficiência, você não
teria tido tantos problemas para salvar...
A major parecia pensativa e surpresa com
o que ouvia.
Suspirou!
Quando toda a verdade fosse desvendada
Aimê entenderia sua raiva, descobriria o motivo de odiá-la, perceberia como o
homem que via como santo não passava de um desgraçado miserável.
Sim, seria esse o dia mais feliz de sua
vida, seria esse o momento que esperara durante anos quando fora acusada das
piores coisas, enquanto um maldito assassino recebia homenagens de todos, honrarias
que não acabavam mais...
Quando todos soubessem quem fora Otávio
Villa Real, sua missão teria chegado ao fim e buscaria um pouco de paz para
sua vida.
Fechou os olhos e nada mais fora dito.
Algum tempo depois dormia, enquanto a
neta de Ricardo permanecia quieta, sentindo em seu peito aquelas descompassadas
batidas.
Rezava
para que tudo
aquilo terminasse o mais rápido
possível, rezava para
que pudesse retornar
para casa. Deixaria para trás
todas aquelas estranhas lembranças, deixaria para trás todos aqueles
conflitantes sentimentos que aos poucos a deixava cada vez mais confusa.
Depois da forte tempestade, o sol surgia
esplendido de manhã cedo.
O pajé fazia suas orações matinais em
sua oca quando dois ı́ndios se aproximaram respeitosamente.
Ele os reconheceu, pertenciam a tribo da
mãe de Diana.
Levantando-se, fez um gesto para que
eles adentrassem a oca e foi quando viu quem os acompanhava.
Yana!
A bela jovem de cabelos intensamente
negros e olhos castanhos não era uma ı́ndia qualquer. Aquela bela mulher,
quando adolescente, deixara a tribo com a Calligari. Na época tinham quinze
anos quando foram contra as leis da tribo, aquele fora a primeira vez que a
filha de Alexander sofrera castigos terríveis.
Começaram a falar em dialeto local.
Os três precisavam de alento, pois se
perderam devido à chuva e por esse motivo pediam abrigos por uns dias.
Ubiratã sabia que não era uma boa
ideia, mas não podia negar hospitalidade, isso seria uma ofensa a Tupã.
Assentiu, mas deteve Yana.
-- Não esqueça de que é casada e Diana
agora também é.
A jovem esboçou um sorriso misterioso,
enquanto se afastava.
Diana despertou cedo e ficou observando
Aimê deitada ao seu lado.
Estendeu a mão, tocou-lhe a face e logo
a jovem abriu os olhos, parecia assustada.
A garota sentou-se, levando a mão ao
peito, parecia sem fôlego.
-- Eu estava sonhando com meu pai...
-- Então foi um pesadelo... Um
monstro... Decerto estava no inferno...
A Villa Real se levantou de supetão e
acabou se desequilibrando, mas conseguiu levantar.
-- Por favor, Diana, como ousa falar
isso do meu pai, o que ele te fez? – Questionou horrorizada.
A Calligari conseguia ver a mágoa
naquele olhar.
-- Você não tem ideia de quem é
Otávio Villa Real!
-- Ele é meu pai, major... – Disse com
os olhos em lágrimas. – O homem que me protegeu de tudo e de todos...
Naquele momento a major desejou dizer
tudo que aquele “herói” fizera contra si, porém ainda não era o momento.
-- Eu não gosto que fale meu nome,
tenho algo que me incomoda no seu timbre quando pronuncia.
Aimê pareceu confusa com o rumo da
conversa.
-- Como devo chamá-la então? – Indagou
com as mãos nos quadris. – Princesa canibal? – Provocou-a.
A Calligari desviou o olhar.
Por que se sentia tão angustiada quando
se tratava da filha dele?
Por que ela era filha dele?
-- Precisamos ir embora...
-- Não pode ainda, o pajé disse que
seria perigoso...Deve ter paciência...
Antes que pudessem falar mais alguma
coisa, uma bela ı́ndia se aproximou.
Aimê permanecia em silêncio até que
uma voz feminina foi ouvida.
Diana ficou surpresa ao ver Yana.
A bela ı́ndia fazia parte do povo da sua
mãe e fora por conta dela que a Calligari fora banida pela primeira vez da
tribo.
Foram amantes na adolescência,
perdera-se nos encantos da bela nativa, não se apaixonando, pois nunca sentira
essa sensação, mas por sexo puro, selvagem, sem preconceitos e bastante ousado.
Recebeu o abraço da jovem e nem ao menos
protestou quando teve a boca tomada em um beijo.
Ficou sem reação durante longos
segundos.
Aimê quase não entendia o que era
dito, pois a maioria das palavras era falada no dialeto local, porém era percebível
o carinho que elas trocavam.
Estava se sentindo um pouco deslocada
ali, então se afastou e não pareceu ser notada sua ausência.
Nos dias que se seguiram o chefe parecia
muito incomodado com a proximidade de Yana, até mesmo chegara a repreender a
presença dela ao lado da Calligari, pois a visitante praticamente assumiu toda
a responsabilidade de cuidar da morena e não a deixava sozinha por um único
segundo.
Os comentários já surgiam e ele sabia
que isso não era algo bom.
Diana desonrava sua tribo e pior, desonrava
o casamento com Aimê.
Não demoraria muito para Tupã aparecer
naquele lugar e armaria uma verdadeira guerra e o chefe não estava disposto a
arriscar seu povo mais uma vez por caprichos da filha de Alexander.
Era noite de lua cheia...
Mais alguns dias se passaram...
Aimê estava sentada em um banco
enquanto ouvia o som dos tambores, sabia que os ı́ndios estavam a dançar ao
redor da fogueira, Piatã descrevera para ela como eles faziam.
O bom ı́ndio estava ao seu lado, ele se
tornara uma boa companhia.
Ouvia os risos das crianças e imaginavam
se continuavam a observá-la com aquela expressão curiosa.
Ubiratã se aproximou e fez um gesto
para que Piatã os deixasse.
O homem se afastou.
-- A menina Aimê parece perdida em seus
pensamentos!
A voz do pajé a tirou de sua
distração.
Naqueles dias que estavam ali, ele não
costumava se aproximar, trocaram poucas palavras.
-- Estava apenas ouvindo... Gosto de
sentir a alegria das pessoas.
O chefe observava os olhos que brilhavam
muito, mesmo não tendo luz.
Ela estava sentada sobre uma pedra e o
chefe se acomodou ao seu lado.
Tomou-lhe as mãos nas suas.
-- Desde que a vi percebi algumas coisas
em você...
O rosto da Villa Real denotou surpresa.
-- Você não foi sequestrada por
aqueles homens, você estava buscando resposta para o que se passou com seu
pai.
-- Como sabe disso? – Indagou perplexa.
-- Eu apenas sei... – Tocou-lhe a face.
– Escute o que te direi: Esse passado que você está buscando não lhe fará
bem. Viva a sua vida e deixe as coisas como estão.
-- Como posso deixar as coisas como
estão? – Indagou irritada. -- Meu pai era um homem digno, honrado que vivia
por seu paı́s, vivia por mim... Eu estava com ele quando sofreu o atentado, eu
fiquei cega naquele dia. – Disse emocionada.
Ela não conseguia se esquecer desse
momento, vivia perturbada com tudo o que ouviu dos sequestradores.
O pajé levantou-se.
-- Vá até a Diana, fique ao lado dela!
– Ordenou demonstrando impaciência.
-- Eu não quero ficar perto da Diana!
A filha de Otávio estava chateada,
mesmo que não ousasse admitir isso. Desde que a ı́ndia chegara, não voltou a
se aproximar da esposa e tinha quase certeza de que a Calligari tinha algum
tipo de relacionamento amoroso com a tal de Yana.
Sentia-se grata a Piatã, pois ele a
aceitou em sua oca quando fora expulsa pela amiguinha da major.
-- Não esqueça que pelas nossas leis
vocês estão unidas.
-- Não tenho vı́nculos nenhum com ela!
-- Desrespeita nossos costumes! – O
chefe pareceu aborrecido. – As duas desrespeitam!
Aimê pareceu ponderar durante alguns
segundos.
-- Jamais tive essa intenção, apenas
não posso ter nenhum tipo de amizade com alguém que me trata mal, que é
sempre arrogante e cruel...
O pajé nada disse, apenas se afastou,
seguindo até a oca onde a morena ocupava.
Ao entrar encontrou Diana deitada e a
ı́ndia lhe beijando os lábios de forma ousada.
-- Yana!
A voz firme assustou a ı́ndia.
-- Então foi para isso que você veio?
Para trazer uma guerra novamente para o meu povo? – Acusou-a.
A Calligari apoiou-se nos cotovelos.
Sentia-se bem melhor, seu corpo parecia
recuperar a força dia após dia.
-- Não houve nada! – Ela disse de forma
calma. – Não estávamos fazendo nada de errado.
O pajé lhe enviou um olhar mortal.
-- Saia daqui Yana e amanhã mesmo
desejo que deixe a minha tribo, volte para seu povo, para o seu homem!
A ı́ndia olhava para a Calligari, porém
acabou deixando o lugar.
Diana não pareceu se importar muito com
a explosão, sentando-se.
-- Às vezes eu penso quantas vidas
teriam sido poupadas se eu não tivesse te recebido em minha tribo. – Disse
quando ficaram sozinhas.
O maxilar da pintura enrijeceu.
-- Não pedi para que me aceitasse e
jamais desejei fazer parte dos costumes que vocês seguem. – Retrucou irritada.
– Gostaria de nunca ter vindo aqui... Gostaria de nunca ter passado por essa
terra.
O chefe estreitou os olhos de forma
ameaçadora.
-- Duas vezes você causou a morte do
meu povo e eu não permitirei que se repita.
-- Em menos de dois dias deixarei a
aldeia e prometo nunca mais retornar.
O pajé chegou mais perto e lhe apontou
o dedo em riste.
-- Sim, princesa, você deixará a
aldeia, porém antes vai se redimir diante da sua mulher! Ela está humilhada
diante de todos... Você a tirou de sua oca para dar lugar a outra, outra que
tem homem, outra que pertence a tribo de Tupã.
O que ele queria que ela fizesse?
Aimê não retornou e se ela fez assim
é porque não desejava ficar perto.
Aquilo a deixara muito chateada, mesmo
não admitindo.
A Calligari tentou levantar, mas o fez
de forma tão brusca que sentiu tonta, voltou a sentar.
-- Tupã quase me obrigou a casar com
Otávio e para pagar uma dıvida que nunca tive, fizeram-me desposar a filha do
homem que mais odeio em todo o universo para retratar a minha negativa!
Ubiratã sempre fora contra aquilo, mas
não pôde fazer nada na época.
-- Palavras precisam ser cumpridas!
Então você cumprirá! – Retrucou calmamente.
-- Está louco? Não basta ter me prestado
a esse circo ridı́culo?
-- Você não tem mesmo respeito por seu
sangue! – Bateu com o cajado no chão. -- Você acha que tratar mal e
desrespeitar a Aimê diante de todos é algo bom? Você é uma princesa,
deveria honrar a sua tribo, deve respeito a eles!
-- Respeito? A minha mãe foi morta pela
tribo que a proclamou uma espécie de rainha, eu fui jogada por eles no meio da
selva para morrer...
-- E eu a protegi, cuidei de ti e o que
você me deu de volta? – Suspirou. – Se deseja sair dessa tribo e voltar para o
seu mundo una-se a sua mulher.
-- E se eu não o fizer? –Levantou a
cabeça em forma de desafio. – Enoja-me só em pensar em tocá-la, tenho
náuseas quando me lembro de quem ela tem o sangue dele. – Mordiscou o lábio
inferior demoradamente. – Não terei nada com ela!
-- Então vai ter que matar todo mundo
para deixar esse lugar.
Diana observou o chefe se afastar e ficou
a pensar o que faria agora.
Praguejou alto em seu legível
português.
Jamais aceitara os costumes daqueles
povos primitivos, jamais viveria em um lugar onde se tem regras tão
inflexíveis.
Quando fora levada para a tribo da sua
mãe, fora rejeitada e banida para viver em meio ao mato.
Na época era apenas uma criança, mas
aos poucos fora descobrindo como aquelas pessoas podiam ser cruéis.
Sua mãe passara anos da sua vida sendo
julgada por ter se envolvido com Alexander e morrera por esse motivo.
Irritada, levantou-se.
Maldita mimadinha!
Naquele momento desejava matá-la!
Ela não tinha nada que ter reclamado,
era uma maldita miserável igual ao pai. Usava aquela cara dissimulada, aquele
jeito de garota boazinha, mas plantava discórdia quando podia.
Sentiu-se tonta, mas era normal devido
passar muito tempo deitada.
Vestiu-se!
Caminhou a passos lentos parando para
observar as danças que estavam ocorrendo naquele momento.
Seu olhar foi atraı́do por lindos e
penetrantes olhos azuis.
Aimê estava sentada a uns quinze
metros, tinha o olhar voltado em sua direção.
Não tivera mais contato com ela e
vendo-a agora era como se algo estivesse preso dentro do seu peito, uma raiva
ameaçava explodir.
Era igual ao maldito Otávio, fazia-se
de vı́tima para que tivessem pena dela.
Lentamente caminhou até onde ela
estava, parado de pé diante da jovem, observando-a de forma arrogante.
Tomou-a pelos ombros, levantando-a.
A Villa Real pareceu assustada.
Sabia que era ela, sentia-a com uma
intensidade destruidora.
-- Diana... – O nome saiu como um sussurro.
A princesa esboçou um perigoso sorriso
desdenhoso.
-- Você tem certeza de que é uma
maldita cega?
A neta de Ricardo tentou se desvencilhar
das mãos que a prendia, mas foi em vão sua tentativa.
-- Ah, não, você agora vem comigo,
mimadinha!
Aimê não teve tempo de protestar, pois
foi arrastada, diante dos olhares curiosos de todos.
Não foram longe.
Diana seguiu caminhando por entre as
árvores, pressionando-a contra uma.
-- Está louca!? – A Villa Real falou ao
sentir as costas pressionadas violentamente contra a madeira.
Há dias não se falavam e de repente
aquela mulher vinha com toda aquela fúria.
Louca!
-- Foi reclamar para o pajé da forma
que te trato? – Apertou-a mais forte. – Pensa que é quem para desejar um
tratamento melhor? Acha que só porque fizemos parte daquela palhaçada, você
realmente tem algum significado para mim? – Gargalhou de forma sarcástica. –
Você acha que realmente é a minha esposa? – Debochou.
Aimê tentou empurrá-la, mas a morena
era uma mulher bastante forte e sua posição era mais favorável.
-- Eu não falei nada e também não me
importa a forma que o faz, pois logo que sairmos desse lugar, nunca mais irei
cruzar contigo... Quanto a ser sua esposa... Não gosto de mulheres e se
gostasse, jamais gostaria de uma como você.
Diana estreitou os olhos de um jeito
tão ameaçador que qualquer um se afastaria assustado.
-- Pela maldita lei da tribo você é
minha mulher! – Mirou o desafio nos olhos azuis. – Lógico que se fosse para eu
ter escolhido, você jamais seria alguém com quem eu me casaria. – Observou
que agora havia indignação. – Não me interesso por menininhas mimadas, por criancinhas
idiotas e iludidas.
Mais uma vez Aimê tentou se livrar do
contato, outro fracasso.
-- Esse casamento não tem nenhuma
importância para mim... Jamais teria algo com um ser desprezível como você. –
Tentou empurrá-la novamente, mas foi contida. – Solte-me, sua detestável! –
Falou um pouco mais alto.
Diana estava ainda mais furiosa pela forma
que a jovem falava consigo.
Ninguém falava com ela daquele jeito.
Ninguém lhe desafiava com toda aquela petulância.
Aproximou os lábios do ouvido da Villa
Real.
-- Pois mesmo que para ti nosso
casamento não tenha importância, para essas pessoas estamos unidas para
sempre... – Baixou mais o tom de voz. – Então, mimadinha, prepare-se, pois
antes que o sol nasça, nosso enlace será consumado... Antes que o sol nasça eu
a tomarei como se o faz com uma prostituta!
A Calligari mirou a face iluminada pelo
luar e viu a palidez tomar conta daquele rosto bonito.
Conseguiu segurar a mão que tentou
desferir um golpe contra si.
-- Eu prefiro morrer antes... Preferiria
me deitar com um demônio que contigo.
A pintora estava tão brava que parecia
que um gênio do mal tomara conta do seu corpo.
Os olhos negros exibiam um humor cruel.
Rasgou-lhe a blusa, deixando o sutiã à
mostra.
A Villa Real tentou empurrá-la, mas
teve os lábios tomados violentamente.
Aimê cerrou os dentes.
Diana a pressionou contra a árvore,
colando os corpos.
Sentiu quando as unhas cravaram em seu
ombro, então afastou a boca.
A Calligari pousou as mãos sobre os
seios pequenos, buscando-os através do tecido e quando seus dedos
encostaram-se a eles sentiu uma corrente elétrica passando por sua espinha.
Aproveitou que a jovem abria a boca para
protestar e dessa vez conseguiu acesso aos seus lábios.
A boca dela era inigualável... macia,
mesmo quando mordia... Deliciosa, mesmo quando lhe repelia.
Afastou os lábios...
Observou os olhos azuis cheios de
raiva...
Diana colou-se mais a ela...
Estava excitada, louca para satisfazer o
corpo que a queria... A combinação de raiva com paixão a estava deixando
totalmente descontrolada, coisa que há tempos não acontecia, na verdade jamais
aconteceu daquele jeito.
Colocou a coxa em meio as dela, roçando
em seu sexo de forma grosseira... Ousada... Deliciosamente dominadora.
Sim, queria-a, isso estava claro, mesmo
que a odiasse, mesmo que sentisse toda aquela raiva, também sentia desejo desde
que a viu pela primeira vez, desde que sentiu seu corpo junto ao seu.
A jovem Villa Real parecia presa em um
encanamento...
Gemeu quando os seios foram instigados.
A pintora rudemente soltou os botões da
calça, tocando o tecido macio da calcinha.
Aimê pareceu ter um lapso de
consciência, tentando afastar a princesa, mas Diana não costumava parar
naqueles momentos.
-- Solte-me!
-- Não, mimadinha! – Sussurrou em seu
ouvido. – Você reclamou ao pajé pelo tratamento que te dava... – dizia sem
fôlego – agora não terá mais do que reclamar... – Segurou-lhe os braços que
começava se debater.
Aimê se sentia fraca...
Mordiscou o lábio inferior quando
recebeu os beijos no pescoço.
Havia algo de errado... Algo estava
terrivelmente errado...
-- Eu vou gritar...
Diana pareceu não se importar, enquanto
contornava o biquinho dos seios rosados com a lı́ngua.
Desde que a viu nua, sentiu uma desejo
incontrolável de prová-la, de sentir o sabor e agora seu corpo queimava de
paixão.
--
Grita... Acho que isso vai me fazer parar? – Mirou os olhos azuis. – Deixe-me
beijar seus lábios...
-- Não...
A noite estava escura, mas as fogueiras
faziam sombras, deixando a face da Villa Real iluminada.
-- Não entende que quanto mais se
debate, mas eu quero... – Agora a boca toda tomou o colo. – E eu sei que você
me quer...
Aimê fechou os olhos...
Nunca em sua vida seu corpo fora
assolado por um desejo tão intenso, um prazer tão destruidor a ponto de
rendê-la àquela odiosa mulher.
Ouvia a respiração acelerada e não
sabia de quem era...
Havia um misto de dor e prazer que
aquela boca proporcionava.
A Calligari invadiu a calcinha e cerrou
os dentes ao sentir como sua jovem esposa estava úmida e quente.
Ela estava excitada! – Surpreendeu-se.
Aimê aproveitou a distração da pintora
para empurrá-la forte, jogando-a-a ao chão.
Diana gemeu como impacto que afetou o abdômen.
-- Eu jamais teria algo com alguém como
você, jamais permitirei que me toque e se tentar novamente, eu a matarei. –
Tentava cobrir o busto. – Que espécie de ser humano é você? Um monstro, é
isso que você é...
A morena não respondeu, pois massageava
o ferimento que latejava.
A Villa Real arrumou a calça e ficou
algum tempo parada, tentando se guiar pelo som.
Logo, entre tropeços, se afastava.
Sentia o sangue correr mais rápido por
suas veias, sentia uma vontade enorme de partir para cima daquela mulher e
arranhá-la até feri-la o suficiente para vingar sua raiva.
A Calligari observou-a partir e nada
fez.
Permaneceu onde estava, parecendo buscar
acalmar o próprio ı́ntimo.
Ficara tão irritada com a discussão
que teve com o pajé que precisou descontar nela, mas jamais imaginou que seu
corpo reagiria daquele jeito, não pensou que acabaria se descontrolando
daquele jeito, agindo como uma verdadeira selvagem.
O que tinha Aimê Villa Real que a
fascinava tanto?
Não era segredo que a odiava como a
todos daquela maldita famı́lia, porém não era só isso...
Massageou o machucado, levantando-se.
Gemeu ao sentir o ferimento reclamar.
Precisava se cuidar se desejava deixar
aquele lugar.
Seu foco era ir embora o mais rápido
possível, entregar a maldita mimadinha e fazer Ricardo confessar diante de
todos as atrocidades feitas pelo maldito Otávio. Só assim recuperaria a honra
que lhe fora manchada, só assim recuperaria um pouco de tudo que lhe fora
tomado.
Passou a mão pelos cabelos em
desalinhos.
Mordiscou o lábio inferior e ficou irritada
ao sentir o sabor dela...
Praguejou alto.
Ouviu passos e ao levantar a cabeça se
deparou com o pajé.
-- Acha que se comportando assim você
vai conquistar a mulher que ama? – Questionou calmamente.
A morena sorriu de forma sarcástica.
-- Realmente os anos estão tirando a
sua sabedoria! – Disse com as mãos nos quadris. – Eu odeio todos os Villa
Real! – Cuspiu. – Eu odeio Aimê!
-- Não, princesa, e logo perceberá
isso e vai sofrer muito por sua forma arrogante de agir...
-- Não se preocupe, isso não vai
acontecer! – Já se afastava, quando a voz do chefe a deteve.
-- Amanhã mesmo você pode seguir seu
caminho... A união de vocês já foi consumada!
Os olhos negros denotavam confusão, mas
ela preferiu não falar mais nada.
Seguiu em direção à oca e percebeu que
os ı́ndios já tinham parado os batuques e já seguiam para o descanso da
noite.
Procurou Aimê e não viu sinal dela,
decerto tinha se recolhido também.
Encontrou Piatã.
-- Algum problema? – Indagou vendo a
expressão pesarosa do velho.
-- Não, estava com a menina e precisei
dar um chá para fazê-la se acalmar!
A Calligari nada disse.
-- Ela é uma jovem muito boa, tem uma áurea
de paz...
Diana suspirou impaciente.
-- Vou deitar, pois amanhã mesmo iremos
embora para a vila. – Tocou-lhe no ombro. – Descanse!
A Calligari seguiu seu caminho e ficou
surpresa ao ver quem dormia encolhida em sua cama improvisada.
Pensou em ir embora, mas acabou ficando
ali, observando-a, sentindo a presença daquela garota que a perturbava tanto.
Lágrimas a traı́ram...
Seus olhos choraram... Copiosamente seu
rosto foi lavado...
Cobriu a boca para conter o soluço...
Por que havia uma nova dor dentro de si?
Tirou o colete, em seguida se deitou ao
lado dela.
Gente 😕😕😕💔
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