A dama selvagem - Capítulo 26


O cômodo estava com a luz acesa.

Havia uma cama que era ocupada pela paciente, outra que servia para a acompanhante e um confortável sofá. Havia também uma mesinha para pequenas refeições.

As luzes estavam acesas, clareando todo o ambiente.

Diana entrou e seu olhar foi atraı́do imediatamente para a jovem que dormia no leito. Levou a mão ao peito, pois temeu que o coração saı́sse a qualquer momento.

Lentamente seguiu até ela e desejou poder abraçá-la bem forte e dizer que tudo ficaria bem e que não a deixaria sozinha jamais.

Estendeu a mão para acariciar sua face, mas não o fez, temendo despertá-la. Temendo ver toda a rejeição e desprezo que semeara em seu peito.

Passou as mãos pelo rosto.

Seria capaz de doar os próprios olhos para que Aimê pudesse voltar a enxergar. Mirou os lábios rosados, o nariz bem feito.

Não conseguiu evitar se sentir culpada por ter dado esperanças a ela... Não bastava ter sido a causadora de tamanha desgraça?

Inclinou-se, depositando um beijo delicado em sua face. Afastou-se e viu os olhos azuis se abrirem lentamente.

A Villa Real piscou vária vezes, sentiu os olhos arderem... Doı́am... Fechou-os...

Sentia-se cansada de tantos exames, cansada de estar naquele lugar... Desejava ir embora o mais rápido possível, voltar a sua vida...

Não queria ter se submetido àquela cirurgia, pois sabia que aquele fracasso feria muito os que a amavam... Quanto a ela, estava acostumada com aquela escuridão... Mesmo que tivesse acalentado por em segredo o enorme desejo de poder ver novamente as estrelas... As flores...

Suspirou e mais uma vez abriu os olhos.

Sentiu algo muito forte em sua direção, como um farol alto de um carro... Cerrou-os e os abriu devagar...

Tudo estava tão embaçado...Desfocado...

Estaria sonhando?

Conseguiu focalizar melhor... e de repente a imagem borrada pareceu mais nı́tida. Viu os cabelos de ébano, emoldurando um rosto forte...

Mirou os olhos negros...

Deus!

O nariz reto e afilado, arrebitado e orgulhoso... A boca grande, de sensuais lábios carnudos... Um anjo vingador com olhar arrogante...

Seria aquilo uma miragem...

Engoliu em seco.

Tantas vezes fora iludida em seus sonhos com imagens que não podia enxergar que agora temia se tratar mais uma vez de um devaneio.

Estreitou os olhos demoradamente.

Abriu a boca para falar, mas só depois de um grande esforço, conseguiu verbalizar.

-- Diana...

A Calligari mirou-a com atenção.

O som quase inaudível não passou despercebido. Era baixo, relutante, tímido...

Observou o mar azul semicerrarem.

Imaginou se seria algo bom confirmar sua presença ou fingir que não estava ali para não a atormentar naquele momento difı́cil.

Encarou-a por um bom tempo e teve a impressão que ela fitava em seus olhos. Estaria imaginando coisas?

A Villa Real notava o olhar surpreso. Deus, como ela era linda!

Suas mãos não conseguiram chegar perto da beleza daquela mulher... Sua descrição fora tão pobre que chegava a se envergonhar...

Mirou o pescoço esguio... A sobrancelha bem feita e arqueada... O maxilar forte... A pele bronzeada... Fechou os olhos mais uma vez, apertando-os, mas logo voltou a abrir...

Não, aquilo não era um sonho... Ela estava ali e conseguia vê-la...

Deus... Estava vendo-a... Depois de tantos anos voltava a ver o colorido...

Apoiando-se nas mãos, conseguiu encostar as costas no espaldar da cama...Sentou-se.

Mirava a expressão confusa da major, via a testa franzida.

A filha de Alexander continuava parada, tentava ao máximo não fazer barulho e buscava controlar a respiração, assim não denunciaria sua presença e causaria mais danos a esposa.

Enquanto isso, Aimê continuava sua inspeção. Tinha a impressão que logo seu coração sairia pela boca...

-- Diana... – Falou novamente. – Não vai me responder? – Questionou baixinho.

A Calligari a fitou e mais uma vez teve a impressão que ela olhava diretamente para si. Mordiscou a lateral do lábio inferior...

-- Sim, mimadinha, sou eu... – Disse por fim, vencida.

-- E por que ficou calada quando te chamei?

Observou a pontinha da lı́ngua aparecer enquanto ela hidratava a bela boca. Sentiu um arrepio na nuca.

Era aquela boca deliciosa que a dominava sem muito esforço... Era por ela que esqueciam até o próprio nome... Tentou espantar esses pensamentos, meneando a cabeça...

Vê-la era uma emoção sem igual... Chegou até mesmo esquecer sua raiva.

-- Não queria que ficasse exaltada com a minha presença... – Engoliu em seco. – A Vanessa não vai demorar para vim ficar contigo. – Cruzou os braços sobre os seios. – Deseja que eu saia?

Aimê mirou os olhos negros e sentiu os próprios lagrimarem.

Deus, ainda não acreditava que a estava vendo!

Então era aquela a mulher que a salvara e destruı́ra seu coração...

Estendeu a mão, fazia-o como se estivesse a participar de um sagrado ritual, lentamente tocava-lhe a face.

A morena parecia surpresa ao sentir os dedos longos lhe acariciar o rosto. Viu as lágrimas...

-- Como pode ser ainda mais bela do que um dia imaginei... Como poderei lidar com isso?

A confusão estava estampada na expressão de Diana... Mas logo um enorme sorriso embelezava mais ainda sua face.

A Villa Real parecia maravilhada, enquanto desenhava os lábios com os dedos... Observando-os com atenção... Um fruto pecaminoso com certeza...

Seguiu pelo queixo... Nariz...

-- Pensei que você só exibisse sorrisos sarcásticos, major... Não sei se estou pronta para ver algo tão maravilhoso...

Os olhos negros se abriram em total espanto.

-- Mas como? – Dizia em um fio de voz. – Está me vendo, Aimê? – Tomou-lhe o rosto nas mãos, aproximando as faces, fitando intensamente o mar azul, inspecionava. – Deus, você está conseguindo me ver... Consegue me ver... Consegue me ver... – Repetia emocionada.

A filha de Otávio fez um gesto afirmativo com a cabeça. Lentamente a Calligari a envolveu em um abraço...

A filha de Otávio se permitiu aquele momento, sentindo-a, ouvindo as palpitações dos corações pulsando acelerado. Sentia-a ali despida das suas grosserias e arrogâncias. Apertou-a mais forte, feliz por muito mais que aquilo que expressava, pois seu contentamento era ainda maior ao vê-la bem, pois sabia como andava se arriscando.

-- Eu consigo vê-la... Eu consigo te ver... – Sussurrava em seu ouvido. – Parece uma princesa como o seu povo diz...

Diana estreitou-a ainda mais...

Sentiu as lágrimas correndo livres e não fez nenhum esforço para contê-las.

Nunca em sua vida sentira uma emoção tão grande... Uma regozijo invadia seu peito.

Sim, aquilo era o amor que Vanessa falava tanto... Aquele sentimento que a deixava tão frágil era o mesmo que Camões proclamava em suas poesias.

Aimê se afastou um pouco, encarando-a.

-- Está chorando... – Tocou o lı́quido com os lábios. – Por quê?

A Calligari sentiu as carı́cias na pele, fechou os olhos por alguns segundos e quando os abriu, a neta de Ricardo a encarava.

O azul celeste brilhava tanto...

Fitou a boca rosada... e mais uma vez usou o polegar para tocá-los, não apenas usando o tato para sentir a maciez, mas também agora os enxergava e isso complementava ainda mais seu encantamento.

Engoliu em seco...

Sentira medo de vê-la, com a mesma intensidade que desejara...

-- Eu não consigo parar de te olhar...

Diana viu os dentes alvos abertos em um sorriso e não conseguiu conter o ı́mpeto que pulsava em seu peito. Inclinou a cabeça, colando os lábios aos dela...

Aimê manteve os olhos abertos no inı́cio, mas logo os fechou, abraçando a pintora pelo pescoço, enquanto se permitia senti-la novamente.

Por que só naquele momento tinha a impressão que o planeta voltava a sua órbita.

As bocas se encontravam com delicadeza, um pouco receosas, mas aos poucos inteiras mais uma vez... O mundo parecia voltar ao normal naquele momento.

A Villa Real foi ousada, seguindo em busca da lı́ngua da Calligari... Logo elas se encontravam...

Diana gemeu quando a garota a prendeu entre os dentes... Chupando-a...

A neta de Ricardo apertou-a mais forte, perdida naqueles lábios que amava tanto... Aimê teve a impressão que a vida voltava a pulsar dentro de si...

Apertou-a...

Choramingou implorando por mais... Precisava de tudo que ela podia lhe dar... Abraçou-a mais forte... Prendendo-a, como se temesse que ela se afastasse de novo. Sentiu os seios doerem...

A pele parecia em brasa...

Gemeu quando a major sugou forte seus lábios... Apertou-a, querendo não a soltar nunca mais...

Escutaram batidas na porta e em frações de segundo se separam ao ouvir a voz de Cláudia.

-- Voltei, filha...

A esposa do general olhava de uma para a outra e parecia assustada.

Nos últimos dias vinha prestando mais atenção nas reações da neta e não era raro dormir ao seu lado e ouvi-la sussurrar o nome da major... Teria a garota também sido enfeitiçada por aquela ı́ndia de olhos tão negros?

Antes de abrir a boca para dizer algo, foi surpreendida.

-- Apesar do tempo, vovó, a senhora continua tão linda quanto eu guardava na minha memória. Cláudia se desmanchou em lágrimas antes de conseguir chegar nos braços estendidos da neta.

Diana observava tudo com atenção.

Ouvia os sussurros de agradecimento da mulher que um dia odiara tanto e percebia como o amor dela era sincero, realmente amava a filha do coronel e a protegia de todos.

Viu os olhos azuis se voltarem novamente para si e precisou se segurar para não ir até ela mais uma vez... Ainda se sentia em chamas depois da carı́cia trocada.

-- Vou avisar ao Romanofe, quero que ele te examine! – Colocou as mãos nos bolsos, enquanto deixava o quarto.

Aimê fechou os olhos, concentrando-se no reconfortante abraço daquela mulher que a cuidou com tanto amor a vida toda.

Voltou a fitar a porta por onde a Calligari tinha saı́do... Ainda conseguia sentir o olhar dela...

Meu Deus!

Viu as lágrimas... Ela chorara por si... Por quê?

Sentia aquela força indomável novamente gritar mais alto agora...

-- Filha, isso é um verdadeiro milagre! – Cláudia a mirava. – Meu Deus, não consigo acreditar que seus olhinhos voltaram a ser como antes.

Aimê viu o rosto avermelhado da vó, percebia como estava emocionada.

A porta se abriu e a Villa Real sentiu o coração bater mais forte, porém apenas o doutor Jú lio entrou. Tentou esconder a cara de decepção.

-- Então era realmente como eu pensei! – Aproximou-se.

A esposa do general se afastou, enquanto via o médico examinar a neta. Usava uma pequena lanterna para isso.

-- O seu psicológico desbloqueou! – Disse com um enorme sorriso. – Quem foi responsável por tamanha proeza?

A Villa Real corou.

Júlio lhe entregou um espelho.

-- Olhe-se, acredito que não lembrava de como era bonita.

Aimê pegou o pequeno retângulo, enquanto observava com atenção o rosto. Estava avermelhado, mas aos poucos voltou a cor normal.

Viu a pequena cicatriz na fronte... Demorou-se nos olhos e percebeu como brilhava em lágrimas.

-- Faz tanto tempo... – Tocava o vidro com os dedos. – Passaram tantos anos... E' como se tudo fosse novo... Como se me mudasse para uma casa diferente... móveis diferentes... – Fitou os dois. – é como se eu nunca tivesse enxergado antes...Obrigada, doutor, obrigada por me devolver a visão.

-- Sim! – Cláudia se intrometeu. – Somos muito gratas ao senhor!

 Romanofe assentiu com a cabeça.

-- Eu fico feliz pelos agradecimentos, mas acho que se tem alguém que mereça eles, essa pessoa, com certeza, é a Alessandra Calligari. Há mais o menos uma hora, ela entrou em total desespero em meu consultório... – O médico encarou Aimê. – é inegável o apresso que tem por ti, vejo isso desde a primeira vez que entramos em contato.

Cláudia observava a reação da neta diante das palavras ditas.

-- Bem, voltarei para o meu consultório e fico muito feliz por sua recuperação, precisamos refazer alguns exames para ver tudo está bem.

-- Quando poderei deixar o hospital? – A garota questionou ansiosa.

-- Amanhã mesmo!

O médico pediu licença, deixando o quarto.

-- O seu avô vai ficar muito feliz quando souber...

-- E como ele está?

-- Melhor e provavelmente vai deixar a quartel e ficará com a gente.

Aimê suspirou.

-- Quero vê-lo, muito, muito mesmo...

-- Vai ver! – Pegou o celular. – Mandarei mensagens para Bianca e o Alex, ele vai ficar louco, querendo te ver... – Começava a digitar. – Você vai ficar encantada quando vê-lo, é um rapaz lindo, parece aqueles atores de Hollywood.

A Villa Real ouvia a avó falar, mas nem mesmo conseguia prestar atenção, pois sua cabeça estava presa naquela porta, desejando inconscientemente que a major retornasse, desejava vê-la novamente, gostaria de ficar apenas olhando-a, admirando-a.

Infelizmente as horas passaram e a Calligari não voltou.

 

 

 

 

Vanessa chegou ao hospital e encontrou a amiga na recepção.

Dormia em uma cadeira.

-- Meu Deus, está com a aparência péssima! – Comentou sentando ao lado dela. – Poderia ter ido para casa ou dormido no quarto com a Aimê.

Diana pareceu assustada, enquanto cobria o rosto com as mãos.

Observava tudo ao redor, parecendo confusa, mas logo reconhecia o espaço. Bocejou, enquanto se esticava.

-- Estava com tanto sono que nem percebi como era desconfortável.

A empresária a encarava.

-- Poderia ter ido pra casa, você disse que Cláudia tinha retornado.

-- Fiquei temerosa de que precisassem de alguma coisa e como você não estava, decidi ficar.

Vanessa sorriu.

-- Aimê pareceu ansiosa...

-- Você a viu?

A empresária lhe entregou uma garrafa com água.

-- Sim, mas a minha beleza não a impressionou tanto quanto a sua! – Relanceou os olhos, imitando-a.

 A Calligari deu de ombros.

-- Então ela já está pronta para retornar? – Levantou-se, enquanto mexia o pescoço de um lado para o outro.

-- O médico já liberou, ela está apenas se arrumando para irmos.

 Diana mirou o relógio de pulso.

-- Leve-a para ver o Ricardo, consegui com o coronel uma permissão.

-- E você? Vai fugir para onde agora?

-- Não fugirei para lugar algum! – Retrucou aborrecida. – Vou para a casa, ficarei lá durante o dia todo... Se precisar, saberá onde me encontrar!

Vanessa se levantou, segurando-a pelo braço.

-- Vá até o quarto dela... Cláudia foi à cafeteria...

A morena mordiscou o lábio inferior demoradamente, enquanto olhava na direção do corredor.

-- Você disse que eu estava com a aparência péssima! – Arrumou os cabelos com as mãos.

 

-- Bem, está um pouco amassada, mas não parece algo tão ruim... Você é linda de qualquer jeito... – Parou de falar abruptamente.

Quando a Calligari se voltou, Aimê seguia até elas.

A major cruzou os braços sobre os seios ao vê-la se aproximar.

A pintora tinha a impressão que cada dia que passava a Villa Real ficava ainda mais bonita, mesmo usando jeans e camiseta.

Observou como os olhos azuis iam direto nos seus... Fazendo-a prisioneira...

-- Estou pronta! – Disse com um sorriso. – Onde está minha avó? – Olhava ao redor.

-- Eu vou chamá-la! – Vanessa disse, enquanto se afastava apressadamente.

 A filha do coronel assentiu, enquanto Diana não parava de olhá-la.

-- Como se sente? – A pintora indagou.

 A jovem a mirou.

-- Eu me sinto muito bem... E você?

-- Estou bem!

A major a viu estender a mão para si como uma forma de cumprimento.

-- Obrigada, Diana, sou muito grata pelo que fez por mim!

A herdeira de Alexander pareceu surpresa com as palavras, mas não descruzou os braços.

 Aimê não pareceu se importar a não receber o cumprimento, tocando-a entre as sobrancelhas.

-- Sempre imaginei assim...

A Calligari umedeceu os lábios com a lı́ngua e não passou despercebido olhar da outra sobre si.

-- Não tem razões para agradecer... Fiz o que deveria ser feito.

-- Você sempre faz o que deve ser feito? – Indagou curiosa, especulando suas reações. – Sabe que eu nunca pensei que a poderosa major ficasse sem jeito como os meros mortais...

Antes que pudesse responder algo, viu as mulheres se aproximarem.

 Tomou-lhe delicadamente a mão, segurando-a entre as suas.

-- Não tem ideia de como estou feliz por você está bem, mimadinha... – Falou baixinho. – Você recuperar a visão foi uma das coisas que mais desejei nos últimos dias...

Antes que pudesse falar alguma coisa, viu a pintora se afastar em direção oposta. Alta, orgulhosa, com passos fortes...

Sempre a imaginou assim... Mas vê-la ultrapassara todas as suas projeções.

-- Vamos! – Vanessa falou. – Diana falou para te levar ao quartel, deseja que veja seu avô.

Aimê pareceu surpresa, porém muito feliz com isso.

 

 

 

 

 

 

 

 

Crocodilo pegou o celular.

Depois de alguns segundos um homem atendeu.

-- Não deve ligar para mim!

O bandido foi repreendido.

-- Não me diga o que devo fazer! – Disse irritado. – Já não aguento mais ficar nesse buraco escondido.

-- E o que quer que eu faça? Não basta já ter plantado as pistas falsas sobre seu paradeiro!

-- Eu quero que se livre da Diana, só quando ela sair do meu caminho poderei viver em paz sem ser caçado!

-- Não posso fazer nada contra ela, faça você! – O outro disse irritado. – Se é tão esperto, ache um jeito para atrair a Calligari.

-- Eu farei sim... E vai ser para um lugar onde ela conhece muito bem, afinal, se ela é uma ı́ndia, o melhor é que seja enterrada na floresta. – Desligou o aparelho, jogando-o longe.

Só havia um jeito agora...

 

 

 

 

 

 

 

 

O general estava na enfermaria. Parecia melhor.

Quando Aimê entrou, encontrou-o sentada em uma cadeira.

Percebia como ele estava abatido, debilitado e como parecia bem mais velho. Ricardo se levantou com lágrimas nos olhos, recebendo o caloroso abraço da neta.

-- Só Deus sabe como pedi para poder viver para ver esse dia! – Beijou-lhe a face. A Villa Real o fitava intensamente.

Ajudou-o a se acomodar e fez o mesmo.

-- Pois o que mais desejo é que o senhor possa sair daqui, estamos fazendo tudo para isso.

O general fez um gesto negativo com a cabeça.

-- Não, meu bem, preciso pagar por tudo o que fiz... a minha omissão fez muito mal a Diana.

-- O senhor fez por temer aqueles bandidos! – retrucou.

O homem deu um sorriso triste, enquanto segurava as mãos nas suas.

-- Eu não fiz porque eu sempre tive muito orgulho... – Suspirou. – Nunca quis admitir que meu filho fora um monstro.

Aimê engoliu em seco.

-- Sou culpado de todas as acusações, menos de saber que Otávio tinha matado o Alexander... Eu juro que não  sabia.

Os olhos azuis se abriram em total espanto.

-- Como assim? Meu pai matou o pai da Diana? – Levantou-se. – Mas... você disse que tinha sido suicı́dio!

 Ricardo percebeu naquele momento que a neta não sabia do ocorrido.

-- Esse foi o motivo da major ter surtado e me denunciado...

Antes que pudesse terminar a frase, Aimê já deixava a enfermaria.

 

 

 

 

A Calligari não demorou muito em casa, pois tivera um pequeno problema com seu cavalo e correu até a fazenda. Dormiu lá e no dia seguinte seguiu até o estábulo.

O veterinário examinava o animal que pareceu eufórico em ver a dona.

 Diana estava apoiada na baia, enquanto observava tudo com atenção. Ainda nem conseguira almoçar e já era quase três da tarde.

Precisara arrumar alguns problemas que ocorreram e só naquele momento parara. Sua cabeça doı́a pela falta de descanso.

-- Sabe, Diana, eu acredito que o Cérbero está muito bem, porém fez manha porque queria sua atenção. – Alisou a crina brilhosa. – Ontem quando o vi estava tão caı́do... Mas agora que está aqui parece pronto para a dona!

O homem de meia idade cuidava dos animais da fazenda desde a época que Alexander era vivo. Baixo, rechonchudo e de escassos cabelos, doutor João era sempre bastante atencioso e prestativo.

-- Leve-o para passear, vai ver como ele vai se mostrar muito bem rapidinho.

A morena esboçou um sorriso e nem mesmo colocou a sela, montando o animal e saindo em velocidade.

 

 

 

 

 

Vanessa dirigia, enquanto vez e outra olhava para a Villa Real de soslaio.

Seguiam até a fazenda.

Esperaram o retorno da Calligari durante o dia anterior, mas isso não aconteceu.

Aimê ficara muito irritada quando ficara sabendo da participação do pai na morte de Alexander e insistiu para falar com a pintora.

Percebia o olhar da jovem sobre a estrada deserta.

-- Não deve ficar irritada com seus avós, tudo o que fizeram foi pensando no seu bem.

A Villa Real não respondeu de imediato.

Tinham deixado Cláudia no apartamento.

-- Sabe, Vanessa, eu tenho a impressão que passei toda a minha vida vivendo uma mentira e eu juro que não aguento mais isso, sabe... – Virou-se para a empresária. – Primeiro, passei mais de vinte anos imaginando que meu pai era um herói que fazia coisas maravilhosas... Agora descubro que além de todas as atrocidades, ainda foi capaz de matar Alexander Calligari.

A empresária assentiu, pois sabia que a jovem estava certa.

-- Mas o que deseja falar com a Diana? – Indagou curiosa.

Aimê não respondeu de imediato, estava pensativa e um pouco relutante. Agora que estavam ali começava a se acovardar.

-- Eu preciso que ela me deixe ir com a minha avó... Acho que já demos tanto trabalho e não deve ser fácil ter a filha do homem que mais odeia sob o mesmo teto... – Fechou os olhos para conter as lágrimas. – Não há futuro para nós...

Sorte que estava de óculos escuros para não demonstrar tanta fraqueza.

-- Aimê! – Vanessa estacionou no acostamento, segurando a mão da Villa Real. – Lute pela mulher que você ama, não permita que tudo o que aconteceu tire esse sentimento de você.

A amiga de Diana sabia dos planos da artista e não conseguira dissuadi-la do seu intuito, agora caberia a bela jovem fazer alguma coisa.

-- Mas, como lutarei? Deus, é  impossível que algo aconteça entre a gente... Eu sei que ela me deseja, sei que ela me quer... Eu sinto, mas isso não é suficiente pra mim... Não quero apenas ir para a cama dela e depois ser tratada com frieza ou grosserias...

A empresária suspirou impaciente.

-- Ela ama você... bote isso na sua cabeça, ela te ama!

A Villa Real parecia confusa com o que ouvia, mas ainda não conseguia deixar de ser incrédula.

-- Não acredito...

-- Ah, sim, então você acha que a poderosa Calligari passaria à noite do lado de fora da porta do seu quarto, dormindo naquela cadeira desconfortável porque quer transar apenas contigo? – Meneou a cabeça negativamente. – Meu anjo, a Diana tem a mulher que desejar... Mas ela quer você!

O rosto bonito demonstrou surpresa.

-- Ela estava lá?

-- Sim, Aimê, do mesmo jeito que esteve lá quando você caiu da escada... Ainda lembro do desespero que ela expressou.

Vanessa voltou a ligar o carro, seguindo novamente pelo asfalto.

A Villa Real permanecia calada, enquanto pensava no que a empresária lhe disse. Seria verdade?

Teria uma chance?

Poderiam realmente ser felizes?

Não desejava se iludir mais, pois já  fizera isso antes e os resultados foram terríveis.

Uma vez já confessara seu amor e não fora uma experiência muito boa, então agora não teria coragem para fazer de novo.

O carro entrou por uma via estreita e logo adentraram a enorme propriedade dos Calligaris. As grandes palmeiras criavam uma trilha até a área central.

Pararam diante da casa grande. Vanessa desceu e Aimê fez o mesmo.

-- Eu lembro do cheiro desse lugar... mas nunca pensei que fosse tão bonito. – Olhava tudo ao redor enamorada das grandes árvores e o verde que imperava.

Vanessa já seguia até os degraus que dava acesso à mansão quando ouviram o som de um cavalo se aproximando.

A Villa Real observou a pintora sobre o enorme garanhão negro.

Os cabelos dela estavam soltos... Usava uma regata branca justa, jeans surrado nos joelhos e colado as pernas longas e torneadas, estava descalça.

Fez Cérbero apear próximo a elas.

-- O que houve? Por que estão aqui? Onde estão os seguranças, Vanessa? – Indagou observando o único carro parado ali.

A empresária olhou para a filha de Otávio.

Aimê não parecia amedrontada.

-- Precisava falar contigo e a pedi que me trouxesse! Eu dispensei os serviços deles por hoje.

A Calligari estreitou os olhos negros.

-- O médico não falou para você descansar ou algo do tipo? – Arqueou a sobrancelha preocupada. – E como dispensou meus seguranças? – Passou a mão pelos cabelos. – Depois nos acertamos! – Apontou para Vanessa.

-- O doutor Júlio passou apenas colı́rio e óculos! – tentava desconversar ao ver o aborrecimento da filha de Alexander.

A pintora fez um gesto de assentimento.

-- Estou passeando com a Cérbero, ele anda muito solitário e precisa se exercitar.

-- Eu vou entrar, estou morta de sede! – A empresária seguiu até as escadas.

Aimê viu a amiga da Calligari se afastar e permaneceu lá, enquanto sentia o olhar da major sobre si.

Olhava-a e percebia como era imponente, como era arrogante e orgulhosa sobre o enorme animal.

-- Quer cavalgar comigo? – Diana convidou estendendo a mão.

A Villa Real olhou o cavalo e teve a impressão que ele não gostara muito da sua presença, mas acabou aceitando o convite.

A Caligari a ajudou a montar atrás de si.

-- Já tinha montado? – A morena questionava enquanto fazia o animal trotar.

-- Não, apenas montei num pônei quando eu ainda era criança. – Segurou na cintura da major, temendo cair. – Ele é muito grande!

-- O Cérbero é árabe, era selvagem, eu que o domei! – Dizia cheia de orgulho. Diana seguia em meio às árvores.

-- Por que o chamou assim? É um nome meio pesado, não?

A Calligari virou a cabeça para ela, estavam tão próximas que podia sentir o hálito refrescante.

-- Adoro mitologia e não vejo o personagem Cérbero com olhos tão ruins, afinal, ele era um protetor, guardião...

-- Ah, sim, por esse lado você está certa...

A morena sorriu, enquanto fazia o animal aumentar o passe e logo já estavam parando em um rio.

Diana esperou que o cavalo bebesse um pouco de água.

-- É muito lindo aqui! – Aimê comentou maravilhada.

O córrego era cercado de árvores e tinha algumas pedras que tornava mais aconchegante. A água era cristalina, deixando à mostra o fundo do rio.

-- Não vai demorar a escurecer! – A pintora olhava para o horizonte. – Acho melhor que durmam aqui hoje, não quero que corram perigos.

-- Mas não trouxe roupa, não pensei que seria tão longe.

-- Deve ter algo para você usar!

-- Está irritada por causa dos seguranças? – Indagou.

Diana virou a cabeça para ela novamente.

-- Não vou falar sobre isso agora, mas depois conversaremos.

-- A Vanessa não tem culpa, major, eu que agi impulsivamente. – Adiantou-se.

 A Calligari mirou os lábios rosados e desejou ver os olhos azuis.

-- Você é muito impetuosa... Por isso perco a paciência...

Aimê passou a lı́ngua pelo lábio superior.

A pintora desejou beijá-la, mas Cérbero pareceu reclamar. A morena sorriu.

-- Vamos embora!

Tocou no franco do animal e não demorou para que seguissem até a casa.

Permaneceram caladas durante o percurso e quando chegaram de frente a mansão, Diana desceu e depois ajudou a fazer o mesmo.

O corpo da Villa Real roçou perigosamente com o da pintora. Ficaram algum tempo paradas, fitando-se.

Aimê respirou fundo sentindo o cheiro dela...

-- Você é uma mulher muito linda, Diana...

A morena fitou os lábios rosados e desejou senti-los naquele momento... Ainda não esquecera o que acontecera no hospital...

Cerrou os dentes.

-- O que veio fazer aqui? – Indagou com voz rouca.

Naquele momento a neta do general recordou do que a levou até ali e de como parecia cada vez mais difı́cil terem alguma coisa.

Relutou por alguns segundos, mas diante do olhar insistente, falou:

-- Eu sei do vı́deo, sei do que meu pai fez com o seu...

 A Villa Real percebeu a mudança.

A major se afastou um pouco.

-- Não quero falar sobre isso! – Falou rispidamente.

-- Mas eu quero... Desejo que falemos sobre isso e sobre muitas outras coisas! – Disse firme, enquanto erguia o queixo. – Afinal, temos muito para conversar, ou esqueceu me prometeu a liberdade se eu me submetesse a cirurgia?

Diana deu as costas para ela, enquanto acariciava o enorme animal que parecia interessado na conversa. O sol já estava a sumir do horizonte e a penumbra já era combatida pela energia artificial.

Passara todos aqueles dias que a esposa ficara no hospital planejando tudo o que faria para poder libertá-la e mesmo assim, mantê-la segura... Não seria uma passo fácil, ainda mais agora...

-- Cumprirei o que disse!

O peão apareceu.

-- Leve o Cérbero, acho que ele já está melhor.

 O homem assentiu, enquanto se afastava.

A Calligari se virou para Aimê.

-- Vamos! – Apontou as escadarias. – Te levarei até seu quarto.

A Villa Real acabou aceitando, pois não desejava começar a brigar, estava cansada de discussões.

Retirou os óculos e ao entrar na casa, lembrou-se do dia que chegara ali, recordou-se de como estava irritada com a ı́ndia selvagem, depois de tudo o que tinham vivido na floresta e no hotel.

Viu-a subir as escadas e sentiu um frio na barriga.

Outra lembrança ainda mais forte veio a sua mente ao seguir pelo corredor dos quartos.

“Aceite meu presente, mimadinha... Depois de hoje não devemos nos ver mais... Aceite-o... – Voltou as carícias, mesmo tendo a mão dela sobre a sua.”

Diana estancou ao perceber que os passos que a seguia tinham cessados. Virou-se e viu a Villa Real parada.

Os olhos intensamente azuis estavam maiores e pele corada.

Então sua mente também foi invadida por cenas de um certo dia que nunca poderá apagar do cérebro.

Agora percebia como fora tola ao imaginar que aquele momento seria o único entre elas. Chegara a pensar que saciaria sua fome e a esqueceria... Mas desde que provara da filha de Otávio pela primeira vez, perdera totalmente o controle de todas as suas ações.

Meneou a cabeça para tentar se livrar daqueles pensamentos.

-- Ficará nesse quarto! – Apontou a porta. – Preciso de um banho, nos falamos depois.

Aimê a viu seguir e adentrar outro aposento, nem mesmo pôde falar nada.

 

 

 

Diana entrou e não pareceu surpresa ao se deparar com Vanessa sentada confortavelmente na poltrona.

-- Pensei que aproveitaria mais seu momento ao lado da sua esposa! – Cruzou as pernas.

A Calligari foi até ela, estreitando os olhos ameaçadoramente.

-- Eu ainda não engoli você ter trazido Aimê aqui e sem os seguranças para protegê-las!

 

-- Ah, sim, como se a neta do general tivesse uma personalidade sempre dócil e angelical. – Cruzou as pernas. – Ela ficou furiosa quando soube a verdade sobre a morte do seu pai.

-- Mas quem disse a ela?

-- Ricardo!

A major praguejou alto.

-- Aimê ficou possessa, discutiu com Cláudia e disse que precisava te ver.

-- Mesmo assim! – Passou a mão pelos cabelos. – Vocês correram riscos! Ela corre perigo!

-- Não se preocupe tanto! Mesmo com a dispensa da menina, o chefe ainda esteve presente, mesmo que a Villa Real pensasse que estávamos sozinhas.

Diana ouviu o bip do celular e logo viu a mensagem do guarda-costas.

-- Você deveria fazer como eu, apenas fingir que a filha de Otávio decide alguma coisa, seria uma boa forma de vocês viverem em paz.

Diana a ignorou, enquanto se livrava da camiseta e da calça, ficando apenas de lingerie.

-- Fez o que eu pedi? – Questionou, enquanto caminha até o banheiro.

A empresária se levantou, seguindo até ela.

-- Não e não farei, pois achei um absurdo!

A pintora ligou a água e ficou sob a ducha durante longos minutos.

-- Quando li seu e-mail tive vontade de apertar seu pescoço, acho que Aimê sentira o mesmo ao saber.

Diana passava sabonete pelo corpo pacientemente.

-- Se ela quer a liberdade, eu darei com essa condição, assim teremos menos chances de ela ser pega por aquele miserável!

-- E por que você mesma não a protege?

A morena se secou, depois vestiu o roupão atoalhado preto. Com passos firmes retornou para o quarto, seguindo até a cama.

-- Faça apenas o que estou dizendo! – Retrucou aborrecida.

-- Ah, sim, já começa a esbravejar... Quero saber quando vai dizer a Aimê sobre sua decisão.

-- Hoje mesmo... Agora saia, vá pro seu quarto, estou cansada e quero dormir um pouco.

Vanessa suspirou impaciente, mas não falou mais nada, deixando os aposentos.

 

 

 

Passava das nove da noite quando Diana despertou.

Nem mesmo se deu o trabalho de vestir uma roupa, usando apenas o roupão, saiu do quarto. A Casa estava em um perfeito silêncio.

Seguiu até os aposentos de Vanessa, bateu, mas não recebeu resposta. Observou a porta fechada do quarto da neta de Ricardo.

Precisavam conversar, mesmo que não desejasse ficar ao lado dela, pois temia perder o controle. Decidida, foi até ele, batendo.

Não demorou a ouvir a voz da jovem, então entrou.

A Villa Real estava sentada na poltrona e tinha um livro nas mãos. Vestia uma camisola de seda preta e os cabelos estavam presos na nuca.

-- Pensamos que dormiria a noite toda! – Aimê falou, deixando a leitura de lado, fitando-a. – A Vanessa já deve estar dormindo, jantamos e ela falou que estava cansada.

A Calligari permaneceu parada de pé, apenas fitando a bonita figura que a encarava.

A filha de Otávio fazia o mesmo.

Inspecionava atenciosamente a linda mulher parada ali... Mesmo que soubesse que aquilo não seria uma boa ideia. Mirou os olhos negros...

Havia um magnetismo tão forte neles... O nariz empinado...

Mordiscou o lábio inferior.

-- Acho que já podemos conversar, Diana!

A morena fez um gesto de assentimento com a cabeça, enquanto seguia até onde ela estava sentada. Acomodou-se, colocando sobre seu colo as pernas da Villa Real.

A menina pareceu surpresa, mas nada disse, permanecendo apenas quieta, tentando controlar a pressão na barriga.

-- Vamos conversar como pessoas civilizadas? – A Calligari exibiu um sorriso de canto de boca.

-- Hun... Então você sabe ser civilizada? – gracejou.

Diana mirou as penas longas se cruzarem sobre seu corpo e não conseguiu disfarçar um olhar mais atrevido para o decote.

-- Eu estudei nas melhores escolas que o dinheiro pode pagar... – Disse cheia de deboche.

-- Ah, sim, mas acredito que elas só conseguiram passar umas pinceladas de verniz.

A morena riu um pouco mais alto, enquanto começava a massagear distraidamente os pés da garota.

-- Eu já disse que ainda não cansei de te olhar e que o seu sorriso é embriagante... A major pareceu incomodada com o elogio, até mesmo desviou o olhar.

-- Aimê, vamos falar sobre o que é preciso! – Voltou a encará-la. – Já sei o que ficou sabendo do que se passou com meu pai, porém isso é algo que me nego a falar contigo.

A filha de Otávio se levantou.

O olhar da morena caiu sobre o corpo bonito.

A camisola se ajustava ao corpo da garota, chegando bem acima do joelho, deixando a vista as pernas longas.

As alças finas delineavam os ombros magros e o decote acentuado deixava a mostra a borda dos seios redondos.

-- Não, você nunca fala, apenas esbraveja e solta tudo de uma vez em mim!

Ao perceber que ela se dirigia para a porta, Diana foi rápida, detendo-a pelo braço.

-- Pensei que fossemos conversar...

Aimê a encarou, livrando-se delicadamente do toque.

-- Ok, vamos conversar. – Cruzou os braços sobre os seios. – Sou toda ouvidos.

A Calligari passou a mão pelos cabelos. Umedeceu os lábios demoradamente, depois apontou com a mão para o sofá.

-- Vamos sentar?

-- Prefiro ficar de pé!

Os olhos negros da major se estreitaram, mas ela pareceu aliviar mais a raiva.

 

-- Eu vou te deixar livre, sei que deseja isso, mas ainda temos que lembrar de que o Crocodilo não foi preso, então pensei em algo que não dará facilidade para que ele se aproxime de ti e você de quebra se livra de mim.

A Villa Real batia a ponta do pé direito no chão lentamente.

-- Continue!

A filha de Alexander observava como a bela esposa estava impaciente.

 Jogou a cabeça para trás.

-- Pois é, então eu já arrumei tudo, vou anunciar seu noivado com o filho do prefeito, seu namoradinho, como é uma figura pública...

Diana explicava tudo e parecia tão empolgada que nem mesmo percebeu a expressão de pesar no rosto da neta do general.

 -- E então? – Indagou depois de algum tempo.

A Villa Real baixou a cabeça durante longos segundos, depois sacudiu a cabeça, fitando-a em total incredulidade.

-- E então, você é a maior idiota que eu já tive o desprazer de conhecer!

A ı́ndia colocou as mãos nos quadris.

-- Ah, como assim? Não é se livrar de mim que você quer? Você mesma me disse que o tal do Alex era maravilhoso! – Falou irritada. – Agora que apoio, você vem com isso?

Aimê meneou a cabeça negativamente.

Diana tentou tocá-la, mas a menina não permitiu.

-- Quero que seu noivado seja anunciado e que várias figuras públicas compareçam... Tem que sair em todos os jornais... Eu tenho um plano para te manter salva.

-- Quer que eu me case com o Alex? – Perguntou perplexa. – É realmente isso que você quer, Diana Calligari?

A major passou a mão pelos cabelos mais uma vez.

-- Eu tenho um plano e já que gosta do rapaz... bem...

-- Ok, faça como quiser, contanto que não tenha que conviver mais contigo!

Antes que a outra pudesse falar algo, Aimê deixou o escritório.

 

 

 

 

 

No dia seguinte, Aimê seguiu com Vanessa nas primeiras horas da manhã. A menina não falara nada durante todo o trajeto e a empresária decidiu ficar quieta, pois sabia que ela deveria estar muito chateada, ainda mais com esse plano da Diana.

Sabia como a filha de Otávio amava a Calligari, mesmo que fosse um sentimento difı́cil, ainda mais quando a ı́ndia agia cada vez mais com teimosia.

Ligou o rádio para ouvir mú sica.

Fitou de soslaio a acompanhante e desejou falar algo.

Diana estava fazendo uma escolha difı́cil, mas ela já se convencera que não havia futuro e por isso buscava se afastar da mulher que amava, só esperava que quando se arrependesse não fosse muito tarde.

 

 

 

 

 

Uma semana depois...

A Calligari organizou uma exposição para o evento ficar ainda mais chamativo.

Uma luxuosa mansão que pertencia a tia fora usada para acolher todos os convidados.

Alex ficara em verdadeiro alvoroço ao receber o e-mail da pintora, apenas seu pai não ficara muito feliz, ainda mais depois do escândalo que os Villas Real tinham se metido, porém ao receber um telefonema da filha de Alexander, suas opiniões foram mudadas imediatamente.

Muitos polı́ticos tinham sido convidados, todos pareciam interessados na presença da ilustre artista. A casa estava repleta de jornalista.

Diana queria que aquele noivado saı́sse em todos os folhetins do paı́s. Ricardo conseguira o habeas corpos e participava do evento.

O grande salão estava cheio de nomes ilustres, todos encantados pelos quadros, pela boa bebida e petiscos finos... A orquestra contratada trazia baladas antigas.

A pintora conversava com um senador, quando Vanessa apareceu, pedindo licença e levando consigo a artista.

-- O que houve? – A morena questionou, enquanto pegava uma taça de champanhe de um garçom que passava.

-- Você tem certeza de que vai levar isso à frente? – Perguntou irritada. – Tem certeza do passo que está dando? – Tentava falar baixo para não chamar atenção. – Vai realmente entregar a mulher que ama para outro?

A morena bebeu um pouco, sentindo o sabor do lı́quido borbulhante.

-- Já te disse que esse é um plano para tornar Aimê uma figura pública e assim quem sabe possamos coibir o Crocodilo.

-- Se você casasse com ela, também ela se tornaria uma figura pública e bem conhecida, ainda mais do que se casasse com esse rapaz.

Antes que Diana pudesse responder, ouviu o som de uma melodia delicada e os olhares se voltaram para a grande escadaria.

Aimê estava ainda mais linda naquele momento.

Foram cinco longos dias tentando não a encontrar, tentando se manter distante, assegurando-se que aquilo era o melhor a ser feito...

Qual futuro teriam diante de tanto ódio?

Bebeu mais um pouco e logo a encarava, sentindo os olhos azuis em sua direção desdenhosamente.

O vestido de alças finas tinha um bonito decote. Por baixo era poliéster e por cima era coberto por renda. Na frente ele era bem menor, chegando ao meio das suas coxas, enquanto atrás, ele chegava perto das suas canelas.

Usava um delicado salto dourado, adornando as torneadas pernas longas. Usava os cabelos soltos.

Seu rosto trazia uma maquiagem discreta, realçando apenas os olhos azuis e os lábios rosados. Ela descia as escadas com a cabeça erguida.

Passara aqueles dias todos remoendo toda a raiva que sentira da ú ltima vez que estivera com a Calligari.

 

Odiou-a tanto que desejara sumir daquele lugar e nunca mais voltar, mas acabou aceitando um plano torpe, pois ficara claro que aquela era a ú nica forma de sair do caminho daquela mulher.

Não voltaram a conversar, na verdade, nem mesmo voltaram a se ver, porém naquele momento seus olhares se encontravam.

Os olhos azuis desviaram dos negros.

Queria sustentar sua raiva e não permitiria que a bela ı́ndia voltasse a tocar em seu coração.

Alex foi até ela, beijando seus lábios.

Aimê foi pega de surpresa e mesmo quando sentia o toque delicado do rapaz, voltava a encarar Diana. A pintora não podia estar mais linda naquela noite!

Usava um vestido longo na cor vinho. Uma abertura frontal, expunha parte de sua coxa forte. O decote sensual era encruzilhado na frente, deixando firme os seios.

Os cabelos negros estavam presos em um coque frouxo, alguns fios tinham se soltados, emoldurando o rosto bonito e forte.

Mas nem toda essa beleza poderia mascarar a raiva presente em sua bela face. Diana viu os flashes sobre o casal.

-- Aı́ está o lindo par que você acabou de formar! – Vanessa a instigou. – Vão ter filhos perfeitos... Já pensou onde vai ser a lua de mel? Como madrinha, deverá proporcionar uma viagem dos sonhos! – Ironizava.

O maxilar forte enrijeceu e antes que pudesse falar algo desagradável, um importante desembargador se aproximou.

A major fora esperta, usando todo o prestı́gio que tinha para colocar todos os holofotes sobre a filha de Otávio.

Sabia que só assim conseguiria criar uma barreira de proteção.

 

 

 

 

Ricardo e Cláudia participava do grande evento, mas a avó da garota percebia que a neta não parecia nada feliz.

Acompanhava o olhar sofrido naquele momento, enquanto vez e outra focava na Calligari. Não havia mais dúvidas sobre o que se passava entre as duas mulheres.

 

 

 

 

 

Bianca aproveitou quando o primo se afastou para conversar com alguns amigos para voltar a se aproximar de Aimê.

Desde que ficara sabendo de tudo, não conseguira falar com a amiga, na verdade, a Villa Real se negara a manter o diálogo sobre o assunto, apenas permanecendo calada.

Viu-a parada diante de um quadro, parecendo concentrada na belı́ssima obra. Pegou duas taças e seguiu até a jovem.

-- Não tinha ponche! – Entregou-lhe o delicado cristal. – Mas eu provei o champanhe e realmente é uma delı́cia.

A garota fez um geste de assentimento com a cabeça, enquanto continuava a fitar o desenho.

Bebeu um pouco.

-- Como alguém consegue criar algo com tamanha sensibilidade quando não é sensível? – Usou os dedos para traçar as linhas perfeitas da pintura. – Isso é muito irônico para mim! – Bebeu mais um pouco, voltando-se para a amiga.

A loira a fitava por intermináveis segundos, observando com atenção todas as suas peculiaridades.

-- Por que aceitou isso? – Indagou baixinho.

Aimê respirou fundo.

-- Para ferir a poderosa major, mas ela não parece ter alma, não parece ter nenhum tipo de sentimento! – Aliviou a pressão no delicado cristal, temendo quebrá-lo. – Pelo menos com esse noivado, não terei que ficar no mesmo lugar que ela.

-- O Alex está bastante entusiasmado! – Mirou o primo que parecia interessado numa conversa com alguns empresários. – Ainda mais quando a Diana prometeu apoiá-lo não na candidatura de vereador, mas de um possível deputado federal.

A Villa Real meneou a cabeça.

-- Eu não me casarei com ele, apenas estou participando dessa palhaçada para poder me livrar dela.

A Alvarenga assentiu.

-- Ela sabe que você a ama?

Aimê virou a cabeça, deparando-se com o olhar da filha de Alexander. Bebeu mais um pouco.

-- Você sabe que a minha vontade é de fazer essa selvagem se arrastar aos meus pés, implorando por mim... – Voltou a fitar a amiga. – Essa arrogante major não merece meus sentimentos, na verdade, eu arrancarei esse amor de dentro do meu peito, nem que isso me faça sangrar até a morte...

-- Ela não parece muito feliz... O olhar dela não te abandona, ainda mais quando você foi beijado por meu primo!

-- Eu quero que ela exploda! – Bebeu o lı́quido de uma vez.

 

 

 

 

 

 

A Calligari seguiu até o escritório. Deu a volta na mesa, sentando.

Começou a massagear as têmporas, inclinou a cabeça, fechando os olhos.

Depois daquela noite, Aimê estaria mais segura e era isso que importava naquele momento. Lembrou do beijo que trocaram no hospital.

A imagem de Alex tomando os lábios da filha de Otávio foi a cena mais difı́cil que viu. Não sabia como conseguira se Observou a porta se abrir e o motivo de todo seu tormento entrar.

A Villa Real fechou a porta atrás de si.

Os olhos negros miraram os azuis em um duelo silencioso. Olhavam-se, mediam-se, presas em suas próprias angustias.

-- Diga-me, major, hoje mesmo poderei ir embora com o Alex? Afinal, ele vai ser meu marido, não vejo motivos de não seguir ao seu lado.

A filha de Alexander cerrou fortemente os dentes.

Depois de todos aqueles dias, a garota lhe dirigia a palavra e o fazia de forma desafiadora.

-- Ainda não estão casados... – Dizia tentando manter a calma. – Vamos fazer as coisas de forma correta. Apenas quando estiverem casados poderão viver juntos. – Levantou a tela do notebook, parecendo interessada nele.

-- Por quê? – A jovem se aproximou mais. – Não tenho mais nada para guardar... Então não precisa de toda essa burocracia.

Diana se levantou irritada.

-- Vamos fazer as coisas do meu jeito! – Falou firme.

-- E por que tem que ser do seu jeito? – Indagou com as mãos nos quadris. – Quem é você para decidir o que deve ser feito e como deve ser feito? Só falta querer se meter na minha noite de núpcias com o Alex.

O maxilar movia-se, a veia pulsava em seu pesco, o rosto avermelhou... Fuzilou-a com o olhar.

Só em pensar que outro iria tocá-la fê-la sentir aquela onda de fúria que fazia parte da sua personalidade.

-- Está me provocando, mimadinha? – Questionou com a sobrancelha arqueada.

-- Eu? – Fez cara de desentendida. – Não acredito que você vá se importar com a forma que farei sexo com o meu marido, afinal, você quem insistiu para eu aceitar esse matrimônio.

Uma expressão indecifrável povoava o rosto bonito da pintora.

Apoiou ambas as mãos no tampo da mesa, parecia colocar toda sua força naquele gesto.

-- Saia daqui! – Disse por entre os dentes.

-- Por que eu iria? Você que deve voltar pra lá, afinal, você é a palhaça principal nesse circo que criou.

A Calligari engoliu em seco.

-- Eu não quero brigar contigo... Não desejo mesmo!

A Villa Real foi até ela, apoiando-se também na madeira, tendo apenas ela para separá-las. Encarou-a durante longos segundos.

Mirava-a e percebia como batalhar com aquela mulher parecia cada vez mais difı́cil, mais dolorido e desgastante...

-- Pois saiba, major, que estou com muita vontade de brigar contigo... Mas você é muito covarde para isso... A poderosa dama selvagem é uma covarde!

Antes que Diana pudesse falar algo, Aimê deixou o escritório.

A herdeira de Alexander esmurrou forte a mesa com o punho fechado.

 

 

 

 

 

A festa seguia animada.

Diana permanecia sempre na presença de algumas pessoas, conversando, ainda mais dos polı́ticos. Estava tentando chamar a atenção para a filha de Otávio, assim, ela se tornaria uma personalidade conhecida.

Discutia com eles os possíveis perigos que ela corria e muitos pareceram prontos para irem ao socorro da jovem se assim fosse necessário.

O futuro sogro de Aimê dizia em plenos pulmões que ninguém tocaria na noiva do filho.

Alguns jornalistas perguntaram sobre tudo o que o coronel tinha feito com a Calligari, mas ela deixou claro que aquele não era um momento para falar sobre o assunto.

As bebidas continuavam sendo servidas em abundância.

A major tentava não perder de vista a Villa Real, mas em determinado momento a garota sumiu do salão e com ela o pretendente.

Vanessa percebeu a agonia estampada no rosto da morena e ficou calada, mesmo sabendo que Alex tinha ido até o escritório fazer um telefonema e Aimê tinha subido para o quarto.

Queria ver até onde iria o autocontrole da artista.

 

 

 

 

Já era madrugada quando o último comensal deixou a mansão.

Ricardo e Cláudia ficariam ali, Aimê também, o noivo e a famı́lia eram convidados especiais. Inicialmente, Diana não pensara em ficar, porém acabou não indo embora com Vanessa.

Seguiu para os aposentos com uma garrafa de vinho e uma taça.

Ao entrar no quarto, seguiu até a varanda que dava para o suntuoso jardim. Uma fina chuva caı́a ali, deixando o céu escurecido.

As luzes artificiais iluminavam as árvores frondosas...

Estreitou os olhos ao ver a sombra conhecida de um homem seguir por entre as flores. Alex?

Encheu o corpo e bebeu lentamente, curiosa ao ver o rapaz passeando por ali. Lembrou-se de Aimê.

Ainda estava furiosa com a filha de Otávio, ainda mais por ela ter aparecido muito tempo depois na festa e quando questionara por sua ausência, a menina fora sucinta: Não acho que isso seja algo que te interesse!

Diana bebeu todo o conteúdo de uma vez e encheu o copo novamente. O álcool não parecia fazer o efeito desejado.

Como uma garotinha estúpida poderia fazer aquele reboliço em sua vida? Aimê estava muito atrevida...

Será que não percebia que tudo que estava fazendo era para o seu bem? A única coisa que desejava era que ela estivesse segura...

Bebeu mais um pouco.

Não conseguia imaginar Aimê nos braços de outro... Aquilo era muito para seu controle. Impetuosa, deixou o quarto com a garrafa.

Parou no enorme corredor.

O último quarto era o aposento que fora aprontado para a neta do general.

 

Mordiscou o lábio inferior, mirando o lugar e para sua surpresa, a Villa Real estava vindo do lado oposto que dava acesso ao jardim e seguiu para os aposentos.

A garota parecia tão distraı́da que não viu a major parada a alguns metros de distância. Diana nem pensou, seguindo imediatamente até ela, fora de si.

Aimê tinha seguido até o banheiro e voltava com uma toalha quando viu a porta sendo aberta de supetão.

Surpreendeu-se ao ver a mulher parada ali com um olhar mortal. Pensara que ela tinha ido embora, pois Vanessa falara que a morena não dormiria na mansão.

Respirou fundo, enquanto secava o rosto. Estava chovendo e acabara se molhando.

Voltou a fitá-la, vendo a garrafa pela metade que ela trazia em uma mão.

Os cabelos de cor de ébano agora estavam soltos, dando aquela aparência perigosa.

-- Onde você estava? – Diana indagou baixo.

A Villa Real sentia o olhar implacável sobre si.

Aimê não respondeu logo, ao contrário disso, seguiu pacientemente até a poltrona, sentando-se.

-- Diga de uma vez onde você estava! – Vociferou.

A neta do general não desejava mais discutir, mas a arrogância da dona da casa a levava por um tortuoso caminho.

-- Eu estava no jardim! – Disse. – Quando cheguei vi que havia lindas flores e só agora tive tempo de ir vê-las melhor! – Colocou a toalha de lado. – Satisfeita?

A ı́ndia a observava minuciosamente, parecia buscar a verdade daquelas palavras.

-- Você não deveria me provocar! – Levou o gargalho aos lábios, bebendo grande quantidade. – Estou fazendo tudo por ti e deveria ser mais grata... – Deu mais um passo, aproximando-se. – O que o seu noivinho estava fazendo lá?

A jovem respirou fundo e o movimento fez os seios chamarem a atenção da artista.

-- Alex desejava me falar, mal tivemos tempo durante a festa.

-- Não quero que fique sozinha com ele até que estejam casados! – Rosnou. – Assim que sair da minha casa ficará com seus avós e não com esse mancebo.

Aimê cruzou as pernas elegantemente.

Observava com atenção as emoções da esposa, percebendo que a camada de gelo parecia estar derretendo.

-- Como disse antes não tenho mais nada a perder... – Parecia ponderar. – Como é mesmo a sua filosofia... Ah, sim, por que fechar a porteira quando os bois já tinham fugido... Acho que é assim... Deve ter esse sentido...

A major tentava manter a passividade, tentava ao máximo controlar a fúria que a incendiava por dentro.

-- Estou tentando fazer o melhor por ti...

-- Eu já disse que não precisa fazer... mas sou grata, Diana! – Levantou-se e foi até a bolsa que estava sobre o aparador.

A Calligari não desviava o olhar, seguindo-a.

Mirava as costas ereta, os cabelos longos que chegavam um pouco abaixo dos ombros... Bebeu um pouco mais.

Aimê tirou algo de dentro da bolsa, seguiu até a filha de Alexander, entregando-lhe um cheque.

-- Minha a conseguiu vender o apartamento e me deu o dinheiro. Acredito que foi mais cara a cirurgia, porém logo conseguirei ter o resto.

Diana encarava os olhos azuis, enquanto tinha a sensação que o papel lhe queimava os dedos.

Amassou-o, jogando fora.

-- Eu não quero seu maldito dinheiro, já disse que o que fiz foi para reparar um erro que eu tinha cometido!

 Aimê suspirou, enquanto seguia até a poltrona.

-- Bem, se já fez o que desejava aqui, que eu nem sei o que era, já pode sair, estou cansada. – Dispensou-a. – Não gosto de conversar contigo, é como se ficássemos em um cı́rculo, onde tudo se repete...

Os olhos negros se estreitaram em uma ameaça silenciosa.

-- Onde esteve quando sumiu da festa? E por que me respondeu daquele jeito?

 Um debochado sorriso se formou no rosto da Villa Real.

Estava com tanta raiva de Diana que só desejava feri-la com a mesma intensidade que fora machucada, ainda mais agora que percebia que a afetava.

-- Estava com meu noivo... Na verdade, se você fosse embora, eu iria para o jardim novamente continuar o que tı́nhamos começado.

A filha de Otávio viu a veia pulsar na lateral do pescoço esguio.

Já abria a boca para dizer que era apenas uma brincadeira quando ouviu o barulho da garrafa quebrando e logo a morena voava sobre si como uma fera.

Segurou-lhe firme pelo pulso, praticamente arrastando até o banheiro. Abriu o box, fazendo-a ficar sob a ducha, enquanto a abria.

Aimê se debatia, empurrava-a, mas não evitou que a água a molhasse.

Sentiu o vestido ser rasgado, enquanto o sabonete a esfregava sobre o tecido.

-- Deixe-me, sua selvagem! – Empurrou-a e daquela vez conseguiu se livrar do toque grosseiro.

-- Lave-se! – Ordenou, livrando-se das próprias roupas molhadas. – Pois não desejo sentir o cheiro daquele miserável em seu corpo!

-- Ele é meu noivo por sua vontade! – A garota esbravejou.

A morena nada disse, apenas seguiu até o armário pegando o roupão preto, vestindo-se e deixando banheiro.

 

 

 

 

Crocodilo não estava muito longe dali. Com seu binóculo observava a mansão.

Escondeu-se por trás de uma árvore ao ver o homem jovem se aproximar.

-- E então? – Disse, entregando-lhe a maleta. – Quando poderei ter a Aimê?

-- Deve esperar o amanhecer! – O rapaz dizia, abrindo a bola e deparando-se com notas bem arrumadas. – Diana está aqui, não devemos nos arriscar.

-- Mas eu pensei que tinha dito que ela não ficaria! – Esbravejou, observando que havia dois quartos com luzes acesas na enorme casa.

-- Ela mudou de ideia.

Crocodilo praguejou alto.

-- Mas não precisa se preocupar, hoje mesmo terá a filha do coronel! O bandido observou o comparsa se afastar.

Tivera sorte em encontrar o jovem em começo de carreira, esses eram fáceis de serem seduzidos por dinheiro.

 

 

 

 

 

Aimê terminou o banho, depois vestiu uma calcinha e a camisola. Estava muito irritada.

Ao voltar para o quarto, lá continuava a major encostada a porta com os braços cruzados sobre os seios. Encararam-se.

-- Saia do meu quarto! – Exigiu. – Não desejo que se aproxime mais de mim! Diana continuava parada, apenas fitando a esposa.

Observou-a sentar no sofá.

-- Quero que conversemos! – A morena pedia de forma mais contida. – Quero que me ouça...

-- E eu quero que vá para o inferno você e sua maldita conversa!

A major seguiu até o sofá com passos largos, segurando-a pelos ombros, fazendo-a levantar.

-- Você é uma selvagem... Nem sei como pude me interessar por ti... Que bom que agora me livrarei de uma vez por todas da sua odiosa presença... – Cuspia as frases. – Se um pudesse voltar no tempo jamais teria sido pega por aqueles bandidos, assim, não teria tido o desprazer de te conhecer!

Os olhos negros pareceram ainda menores naquele momento.

-- Você não passa de uma garota mimada e idiota! – Acusou-a. – Acha que tudo isso está sendo fácil? Como ousa me provocar assim?

Aimê tentou se desvencilhar e suas unhas acabaram arranhando o rosto da ı́ndia.

Diana ficou tão furiosa que arrastou a jovem até o sofá, sentou-se e depois a deitou de bruços sobre seus joelhos. A Villa Real esbravejava, tentando se soltar, mas a major era mais forte.

-- Está louca! – A menina tentava se livrar. – Sua selvagem... Solte-me... Deixe-me...

 Ouvia a respiração acelerada da major.

-- Eu vou fazer algo que há tempos, deveria ter feito... – Segurava-a. – Tem essa carinha de anjo, mas tem um gênio terrível! – Levantou-lhe a camisola. – Vamos ver se depois de umas palmadas você aprende...

Aimê fechou os olhos esperando pelo desfecho daquela cena.

Diana mirou a minúscula lingerie branca que a esposa usava... Parecia enfeitiçada diante da beleza dela. Tocou a renda com os dedos...

Observou as nádegas bem-feitas como se tivessem sido esculpidas por um artista cuidadoso e perfeccionista. Umedeceu os lábios...

Depois começou a acariciar delicadamente...

Inclinou-se até encostar os lábios na pele branca... Depositou beijos...

A Villa Real estreitou os olhos ao perceber o que a outra fazia. Sentiu o sexo latejar.

-- Mesmo que mereça umas boas palmadas... –Mordiscou a lateral. – Não consigo, enlouqueço por você...

Diana puxou um pouco a calcinha, baixando-a... Passou a lı́ngua pela linha de separação... Lambendo... Mirou alguns sinais que enfeitavam a pele clara...

Afastou um pouco... Passando a lı́ngua por toda a junção... Usava a pontinha para seguir pelos caminhos desconhecidos...

Aimê gemeu.

-- Deus, como você pode ser tão deliciosa... – Afastou um pouco as pernas. – Eu quero muito você... – Tocou o sexo e o sentiu molhado. – Você também me quer...

A filha de Otávio tentava se manter quieta, mas ao sentir o toque tão ı́ntimo em seu sexo, enquanto sentia a boca da pintora beijando seus glúteos, lambendo-os...

Cerrou os dentes para não gemer... Queria mais, muito mais...

Buscou forças para resistir e teve a impressão que seu cérebro não funcionava mais... Então buscou num recanto das lembranças todas as vezes que se entregara e acabara sofrendo...

Aimê conseguiu levantar.

O olhar não parecia assustado naquele momento. Viu a Calligari se levantar também.

Engoliu em seco e imaginou se ela deixaria o quarto, mas seus olhos foram atraı́dos para as mãos longas que soltava lentamente as amarras do roupão.

Não demorou muito para que o tecido fosse ao chão.

Os olhos azuis passeavam pelo corpo forte, sensual... Bronzeado... Como poderia ser tão linda?

As pernas longas...

Os seios redondos...

O abdome liso...

O delicioso triângulo liso... Mas não por completo...

Aimê teve a impressão que cairia, pois suas pernas estavam bambas.

Observou a major se aproximar...

Os olhares se encontravam, inspecionavam...

Diana baixou as alças da camisola e o tecido delicado deslizou por seu corpo. Não a tocou de imediato... Viu os dentes alvos pelos lábios entreabertos...

-- Deixe-me ajoelhar aos seus pés... – Dizia, enquanto abaixava-se.

A neta de Ricardo a observava agachar e apenas a olhava cheia de confusão... Sentiu as mãos em sua delicada peça ı́ntima.

Estremeceu...

A morena beijou a delicada calcinha, sentindo-a molhada.

-- Agora é a minha vez de implorar por clemência... – Baixou a lingerie lentamente. – Terá misericórdia de mim, mimadinha? – Levantou a cabeça, fitando-a. – Apiedara-se dessa pagã selvagem?

Aimê teve a impressão que havia um bolo em sua garganta e isso a impedia de falar.

Sentiu o polegar lhe acariciar o sexo e imaginou se demoraria a enlouquecer, pois seu maior desejo era aprofundar ainda mais a carı́cia.

Diana não parecia ter pressa...

-- Eu não mereço clemência? – Usou a lı́ngua para passear pela parte externa da intimidade da esposa. – Não mereço, minha esposa? – Fitou-a, sem cessar as carı́cias. – O que devo fazer para merecer o seu perdão?

A filha de Otávio apoiou as mãos em seus ombros, ao senti-la lhe afastar um pouco as pernas. Sentiu a lı́ngua mais insistente, assaltando-a com mais ı́mpeto...

Viu-a abrir mais seu sexo...

Fechou os olhos ao sentir o toque ousado.

Diana a fitava, enquanto lambia o sexo molhado, enquanto esfregava seu nariz, lambuzando-se nela. Sentiu-a tremer sob seu toque, sentiu-a se perder em sua carı́cia.

-- Perdoe-me... – Pedia. – Dê-me uma chance e prometo me ajoelhar aos seus pés todos os dias...

Os olhos azuis a fitaram e um sorriso apareceu em seus lábios.

Abriu a boca e as palavras dessa vez saı́ram.

-- Todos os dias? – Questionou em um sussurro. – Todos os dias irá se ajoelhar pra mim? – Segurou-lhe as mãos, levantando-a.

Fitou-a.

-- Todos os dias é uma proposta muito tentadora... – Acariciou os cabelos negros. – Como seria isso? – Tocou os seios da amada, usando as palmas das mãos para atiçá-los.

A major mordiscou o lábio inferior.

-- Se me aceitar, farei todo os esforços do mundo para que não se arrependa... – Colou os lábios em seu pescoço, beijando-o... Aspirando o cheiro dela... Aquele delicioso aroma...

Aimê abraçou-a pela cintura.

-- Não deve esquecer que sou filha do homem que destruiu sua vida... – Dizia temerosa. Diana afastou alguns centı́metros para olhá-la e logo as bocas se encontraram.

Fora um toque delicado...

Apenas sentiam-se...

Rapidamente cessou...

-- Sim, você é a filha do miserável que destruiu a minha vida... Ah, meu bem, como ele destruiu... Há dez anos, eu perdi tudo, até o sentido de viver... – Beijou-lhe os olhos, depois encarou-os. – Porém a ironia foi você ter me devolvido tudo...

Abraçou-a, colando-se a ela.

-- Não há sentido em nada... Se não for contigo...

A Villa Real sentia o coração pulsando no mesmo ritmo do seu.

Diana a levou até o leito, deitando-a sobre os travesseiros macios, porém não fez o mesmo. Permaneceu de pé, parada, apenas fitando-a.

Seus olhos passavam como uma verdadeira carı́cia pelo corpo tentador.

-- Se você disser para eu ir embora, prometo que o farei... Mas se me quiser, se me aceitar mais uma vez, serei sua até o ú ltimo dia da minha vida...

Aimê se apoiou no cotovelo, fitando-a embevecida, enquanto sentia os olhos arderem em lágrimas. Estava ouvindo realmente aquilo?

Estaria realmente acordada ou aquilo não passava de uma ilusão. Respirou fundo.

-- Então venha, major, mostre-me em ação o tanto que me quer... Convença-me a aceitá-la novamente... Um sorriso sensual brincou na pele bronzeada.

Aproximou-se do leito, Aimê ajoelhou-se, esperando por ela. Diana a abraçou, mirando-a...

Os lábios se encontram em agonia, perdidas em seu intenso desejo... Devoravam-se, perdidas na paixão que as dominava.

Apertavam-se.

Os seios se uniam, massageavam-se mutuamente...

Diana a fez deitar, enquanto cobria o corpo dela com o seu. A Villa Real lhe segurava os cabelos, mantendo-a junto a si. Abriu-se para ela, acolhendo-a...

A Calligari encaixou-se...

 

-- Não sabe como a quero... – Beijava-lhe o queixo. – Não tem ideia de quantas vezes me toquei pensando que era você a fazê-lo... Não sabe como foi difı́cil me controlar quando a vi descendo aquelas escadas hoje...

A jovem sentiu a lı́ngua sendo presa... Adorava a forma como ela chupava, a forma como se entregava.

Rebolou os quadris sob ela, sentindo a fricção enlouquecê-la, temia que seu corpo não aguentasse tamanha agonia... Estavam molhadas... peguentas...

Esfregaram-se mais...

Diana mexia em uma perfeita sincronia...

-- Mostre-me como se tocou pensando em mim... – Aimê pediu em seu ouvido. – Não sabia que podia fazer essas coisas... Nem lhe dei permissão para isso...

A Calligari mordiscou o lábio inferior, enquanto montava a cintura da esposa.

Aimê tinha a cabeça apoiada nos travesseiros e fitava embevecida o sexo aberto da mulher que amava.

-- Havia dias que eu enlouquecia de tanto desejo... – Tomou-lhe a mão levando ao seu ı́ntimo. – Então, fechava os olhos e te imaginava... Acha que sou uma safada por causa disso? – Mordiscou o lábio inferior. – Eu deveria ter pedido permissão... Ain...

A Villa Real usou o polegar para tocar o clı́toris, massageando de leve.

-- Ah, sim, deveria pedir... – Passou a lı́ngua pelo superior.

Diana fitava o mar azul, via o desejo escurecendo-o.

-- E como eu deveria dizer? – Empertigou mais o quadril para a frente. – Deveria entrar em seu quarto e falar: Posso gozar pensando em ti?

-- Então gozava enquanto chamava meu nome? – Questionou, enquanto, colocava mais pressão.

O sexo estava bastante molhado, a deliciosa baba já descia...

Diana inclinou a cabeça para trás.

-- Sim, eu chamava por ti, ainda mais quando me invadia... Quando fundia forte... Eu chamava por ti...

-- Assim... – Penetrou-a com o indicador.

A Calligari fez um gesto afirmativo...

-- Ain... Ah... – Gemia em total prazer.

-- Ou assim? – Usou um segundo dedo, trazendo-a para mais perto de si. – Ou você imaginou assim? – Puxou-a mais...

Diana se ajoelhou na boca da filha de Otávio, enquanto observava os lábios de perderem em sua carne, enquanto a invadia com mais ı́mpeto...

A Villa Real aliviou... Lambendo o mel que descia... Desejava contê-lo, então usava a lı́ngua mais rapidamente.

-- Aimê... --Rebolou contra ela... Chamou seu nome... – Aimê...

A major se entregou as carı́cias, mas queria prolongar mais o momento, por isso a deteve... Viu a confusão nos olhos azuis...

Puxou-a para si, fazendo-a ajoelhar mais uma vez, posicionando-se por trás.

Aimê apoiou-se na cabeceira da cama, enquanto a morena fazia com que uma das pernas da esposa se dobrasse, ficando toda aberta para si.

Esfregou o sexo em suas nádegas, enquanto levava as mãos até seus seios, apertando-os.

-- Como poderia usar minhas mãos para lhe dar palmadas... Assim é mais gostoso...

A Villa Real conduziu-a até seu sexo... Pousando-a sobre ele...

-- Convença-me a ser sua... – Exigiu. – Ainda tenho receios...

Diana mordiscou a pontinha da orelha dela, enquanto usava seus dedos para incitá-la, massageando o sexo externamente.

Seguia o balançar dos quadris que pareciam mais rápido, ouvia a respiração acelerada da neta do general. Aimê tomou-lhe a mão, fazendo-a entrar dentro de si...

-- Adoro sentir seus dedos... – A menina dizia enquanto se mexia para frente e para trás. – É como se nada mais existisse, além do prazer... Ain... – Gemeu ao receber a estocada mais impetuosa.

A calligari abriu mais o próprio sexo, esfregando-se ao traseiro rı́gido.

-- Ain...

-- Gosta assim? – A pintora aumentava a pressão.

A Villa Real fez um gesto afirmativo com a cabeça, enquanto levava os dedos que a invadiam aos próprios lábios... Lambeu-os, depois chupou-os, levando-os novamente ao centro do seu prazer.

-- Entra mais gostoso agora...

Diana esboçou um sorriso, enquanto a invadia de novo...

-- Assim está gostoso... – Indagou em seu ouvido.

A Calligari colocou mais força... Invadindo-a mais e mais... Perdida nos sons que saiam dos lábios da amada...

-- Ain... Diana...

A filha de Otávio mexia mais rápido para aumentar as investidas, enquanto isso, a major sentia as fricções aumentar em seu sexo pulsante...

Não demorou para que ambas gritassem eu puro prazer.

A morena virou a mulher para si, deitando sobre ela, segurando o rosto querido entre as mãos, encarando os olhos cheio de lágrimas.

-- Deus, eu não sei se isso vai fazer sentido... Mas eu amo você... Amo você... Amo você...


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