A déspota -- Capítulo 7


Maria Fernanda fez um lanche e seguiu para o pequeno escritório.

Ficou surpresa com a organização do lugar. Realmente, a tal Catrina fez um bom trabalho.

Sentou na cadeira e ficou girando de um lado para o outro. Fechou os olhos e lembrou-se do que tinha acontecido a pouco no quarto.

 Sorriu!

Sabia como o sexo poderia ser usado para controlar alguém, já usara aquilo algumas vezes e não seria diferente com a princesinha italiana.

O importante era mantê-la presa de alguma forma a si. Fosse como fosse, estava disposta a usar todas as armas que estavam ao seu alcance para controlar a cigana. Em nove meses tudo estaria acabado e cada uma seguiria para o seu lado. Concluindo, aquela estadia seria bem prazerosa para ambas. Porém para a Juı́za, seria apenas um jogo, já para Beatrice muito mais estaria em risco.

 

 

 

Mesmo com dificuldade, Eva seguiu para o banheiro, jogou o roupão no chão e não se importou em molhar o pé que estava imobilizado. A única coisa que desejava era tirar aquela sensação de sujeira que sentia em seu corpo.

Pegou a esponja e se esfregou veemente.

Fechou os olhos e encostou a cabeça no vidro, enquanto a água corria por suas costas.

Precisava sair daquele lugar o mais rápido possível. Percebera que era um risco está perto daquela mulher.

Desligou a ducha e parou no batente.

Precisava tirar a faixa que cobria o pé. Pegou a toalha e seguiu até a cama.

Iniciou a difı́cil tarefa de se livrar das ataduras.

Não fora fácil, mas conseguiu se livrar das amarras. O pé  não estava mais com aquela aparência horrível. Os remédios que vinha tomando estavam fazendo um bom trabalho. O inchaço já havia passado também. Mas não podia abusar.

Nem onde dormir tinha.

Primeiro, o carpete era muito desconfortável, segundo na cama teria que dividir o espaço com aquela vı́bora. Vencida, deitou e buscou ficar bem no cantinho para não ter que encostar-se à juı́za.

Aquilo só podia ser brincadeira! – Suspirou impaciente.

Como podia estar queimando de desejo por aquela déspota? Alguém deveria ter lhe rogado uma boa praga.

Como fugir daquela excitação toda que aquela tirana estava despertando em si? Ardia só em recordar aquelas sensações que nunca sentiu ao ser tocada por ninguém. Se fosse em outro momento, não teria problema em curtir o sexo, porém tinha certeza que Maria Fernanda estava com outros interesses por trás de toda aquela libido e não estava disposta a servir de bonequinha para ela.

Ouviu o som da porta abrindo.

-- Trouxe um lanche! – Fernanda entrou com uma bandeja, colocando ao seu lado na cama. – O que houve com seu pé?

-- Não é da sua conta e saiba que não quero nada que venha das suas mãos.

-- O médico disse para você manter o tornozelo imobilizado. – Ignorou o mau humor e sentou, colocando o membro machucado sobre as coxas.

 Eva precisou aceitar o ato, pois poderia se machucar ainda mais.

-- Por que tirou as ataduras?

-- Porque eu tive vontade! – Respondeu com grosseria.

Maria Fernanda cinicamente iniciou uma espécie de massagem nos dedos, tocando-os com muita delicadeza.

-- Chega de me tocar! – Eva livrou-se das mãos dela.

-- Por que você está tão irritada, hein? – Arqueou a sobrancelha em sinal de sarcasmo. – Que bicho te mordeu?

 

-- Olha, você está se complicando ainda mais, sabia? – Apontou o indicador em riste. – Quero saber o que o meu pai vai dizer quando eu falar sobre seus atos libidinosos, pior, se o judiciário chegar saber dessas suas práticas, adeus cargo de juı́za.

                A filha de Pedro observava os olhos negros brilharem em fúria.

-- Quais são as provas que você vai usar para me acusar? – Sorriu. – Não me diga que guardou um pouco daquele mel para mostrar? Bem, eu pensei que tinha chupado tudo, da próxima vez vou ter fazer o trabalho direito, não posso deixar rastros, não é? – Piscou provocante.

-- Ora, sua... sua... mignotta! – Exclamou corada.

A déspota levantou, tirando a bandeja da cama, colocou-a sobre o móvel.

-- Vou comprar um dicionário italiano, porque cada dia tenho mais certeza de que essas palavrinhas que você adora dirigir a mim, não são nenhum elogios. – Falou deitando-se. –  Ou vou pedir ao meu pai para traduzir, afinal, ele conviveu muito com os Bellutis e deve saber as merdas que costumar sair da boca deles.

Naquele momento Eva pareceu se interessar pela conversa. Não queria dar confiança, mas estava bastante curiosa com a última frase e sabia que se não questionasse ela não falaria.

Suspirou alto.

-- Quem é seu pai?

Fernanda a olhava com mais atenção.

Recordava-se do pai comentando sobre os inúmeros noivos que a princesinha de Andrello teve. Ela parecia sempre interessava nesses compromissos, devia colecionar as alianças.

-- Não vai falar? – A morena questionou exasperada.

A juíza esboçou um sorriso de lado, havia deboche nele.

-- Não prestou atenção ao meu sobrenome?

-- Bem, não! – Ficou de lado. – Mas agora, eu quero saber.

-- Ok! Eu te falo sim, mas antes eu quero saber do que você me chamou ainda pouco. – Apoiou-se no cotovelo, fitando-a.

Eva exibiu aquele ar matreiro e brilhante.

-- Puta! – Praticamente cuspiu aquelas palavras com o carregado sotaque.

Maria Fernanda estreitou os olhos azuis de forma ameaçadora, enquanto Beatrice exibia aquele ar sapeca.

-- Eu já te avisei para parar desses xingamentos comigo.

-- Você quem quis que eu traduzisse... Se eu não fizesse feito você ainda estaria mergulhada em sua imensa ignorância e seu ego não sofreria.

-- Eu posso até não conhecer o seu idioma, mas tinha certeza que tudo você falava era alguma espécie de palavrão.

A cigana deu de ombros, cruzando as mãos por trás da cabeça, observando o teto.

-- Diga quem é seu pai... Cumpra a sua palavra!

Fernanda ponderou por alguns segundos e de alguma forma essa informação poderia lhe comprometer no futuro. Analisava tudo com precisão, mas por fim falou:

-- Pedro Lacerda!

Eva virou novamente para olhá-la.

-- Não acredito! – Falou perplexa. – Saiba que ele é o maior responsável por eu ser arrastada como o saco de batatas para a minha casa. – Sorriu, dando uma pausa. – Você não  parece com meu tio e nem com a minha tia.

A juı́za desviou o olhar, irritada.

Passara a adolescência toda ouvindo isso e fora por esse motivo que não gostava que eles fossem até a escola, pois sempre comentavam como ela não tinha nenhuma aparência com eles.

-- Não quero falar sobre isso! Estou cansada! – Respondeu aborrecida. – Ah, e cuidado com essa lı́ngua ou vou ter que te dar uma lição.


-- Não tenho medo de ti! – Virou para o lado oposto.

Fernanda a viu deitar-se de forma que seus pés dessem para sua cabeça. Preferiu ignorar a provocação. Não passava de uma garotinha mimada que não entendia a vida. Achava que tudo se resumia aquele mundinho artificial que estava acostumada a ver pelas janelas dos carros luxuosos do papaizinho.

Apagou a luz, colocou o braço sobre os olhos e ficou pensando.

Não era nem dez horas, cedo para quem estava acostumada a virar a noite maquinando e imaginando seus próximos passos.

Inquieta, levantou e caminhou até a janela, abriu as cortinas e mirou o céu. Nem parecia que chovera tanto, o espaço estava estrelado e uma linda, cheia, lua iluminava a escuridão. Aspirou o cheiro de mato, mas havia outro aroma que não abandonava suas narinas.

Virou e viu Eva toda encolhida, coberta apenas por uma toalha. Precisava lhe arrumar roupas com urgência ou acabaria pirando.

Apreciou as belas curvas, o emaranhado de cabelos espalhados pela cama. Seus dedos formigavam com vontade de tocar aquela pele bronzeada.

 Não! – Balançou a cabeça vigorosamente tentando espantar aquela fraqueza.

Sim, usaria-a, lhe daria tanto prazer que ela jamais poderia desejar partir, porém não se deixaria tocar, teria que usar toda sua frieza para lidar com aquela situação, sabia bem  como fazer, mas não imaginara que seu corpo reagiria com tamanha fome. Nas duas vezes que explorara aquela deliciosa fonte de pecado, sentira uma necessidade imediata de poder satisfazer a si mesma, porém conseguira resistir e esperava continuar obtendo sucesso.

Decidiu dar uma volta. Só Hades seria a companhia ideal para si.

 

 

A italiana abriu os olhos assim que viu a porta bater.

Soltou a respiração!

Mais uma vez estava sozinha naquele lugar, aonde teria ido a arrogante mulher? Ela era tão estranha!

Mais estranho fora saber que ela era a filha do assessor do seu pai. Não recordava de ter ouvido algo sobre Pedro e Maria ter filhos. Bem, agora tudo ficava mais claro. Seu pai agira de forma calculada a envolver a filha do empregado em toda aquela armação.

O que será que tinha prometido em troca de todo esse plano?

Não passava por sua cabeça que alguém tão prepotente quanto a Maria Fernanda Lacerda pudesse se vender por alguns zeros a mais em sua conta bancária. Ouviu um barulho no pátio e correu para ver de quem se tratava.

Olhou pela janela e viu a juı́za montando seu garanhão preto.

Escondeu-se por trás da cortina quando viu o olhar da outra se voltar para si por alguns segundos, em seguida a viu sair em disparada com seu pomposo cavalo. Aquela mulher deveria ter algum problema sério!

 

 

 

 

 

Catrina chegou cedinho no novo trabalho.

Encontrou um policial sentado no batente. Assim que a viu se aproximar, ele levantou.

-- Tenho ordens da juı́za para revistá-la.

A moça ficou surpresa com aquilo, mas não retrucou. O bom é que não estava levando nada comprometedor, nem mesmo trouxera o celular.

-- Ok! – O guarda falou quando terminou. – Vá para a biblioteca, a senhorita Lacerda deseja falar contigo.

A loira apenas assentiu e seguiu.

 

Maria Fernanda chegara de madrugada em casa. Tomara banho e seguira para o pequeno escritório improvisado. Antes de ir para a cidade, desejava deixar umas coisas claras com a mocinha que fora contratada para cuidar da casa. Olhou para o relógio no pulso.

Era cedo, porém para quem não pregara o olho, aquele detalhe não fazia muita diferença. Sentou na cadeira e ligou o computador.

Colocou a senha e iniciou a navegação quando ouviu batidas na porta.

-- Entre! – Falou firme.

A garota ali parada era realmente muito linda. Não prestara muita atenção naquele detalhe antes, mas agora a fitando de cima a baixo notou.

-- Deseja falar comigo, senhora?

A mulher lhe apontou a cadeira em frente a sua.

A moça sentou.

-- Eu não sei o que o delegado falou para ti, porém vou deixar bem claro umas coisinhas. – Colocou os óculos. – Seu trabalho não inclui ficar de papinho com a prisioneira.

Catrina se sentiu desconfortável diante daquele olhar. Nunca chegara tão perto daquele odioso ser, porém agora conseguia ver bem todas as caracterı́sticas presentes no seu exterior. Os olhos eram tão azuis e mostravam uma superioridade e frieza nunca vistas antes. Não tinha como alguém dizer que a juı́za era feia, ao contrário, tinha uma beleza perigosa e até mesmo tentadora.

-- Eu sei! – Baixou os olhos.

A filha de Pedro examinava com atenção a empregada. Poderia ter um futuro melhor e não ficar naquele lugar servido aos outros, parecia inteligente.

-- Você é lésbica! – Falou em tom de constatação.

A empregada corou diante das palavras da outra.

-- Não precisas responder, eu já percebi que sim. Porém, cuidado em quem você coloca os olhos. – Estreitou o olhar ameaçadoramente. – Tenha um bom dia, moça! – A dispensou com um gesto de cabeça.

Viu Catrina levantar e se afastar com cara de assustada. O recado já tinha sido dado!

 

 

 

 

A cigana despertou já tarde.

Ficara quase toda noite acordada ansiosa pela volta da tirana, algo que se chegara a acontecer, pelo menos na cama, não havia vestı́gios. Mexeu o pé e o sentiu melhor.

Percebeu que a toalha tinha se soltado do seu corpo. Precisava de roupas.

Levantou-se e seguiu para o closet da juı́za. Deveria ter algo ali que pudesse usar.

Abriu e viu inúmeros terninhos sociais, saias e blusas. Nada que lhe servisse naquele momento.

Abriu uma gaveta e deparou-se com lingeries. Pegou uma vermelha e sentiu o aroma delicado. Lembrou quando a viu vestida com uma e sentiu um arrepio no corpo.

Irritada, fechou.

A porta foi aberta e lá estava a loira do dia anterior.

-- Bom dia, senhorita!

-- Bom dia! – cumprimentou-a com um sorriso.

-- Eu trouxe o seu café. – Colocou a bandeja sobre a cama e virou-se para sair.

-- Espera! – Eva tocou-lhe o ombro. – Por que a pressa, linda?

-- Tenho muita coisa para fazer. – Desvencilhou-se do toque.

Beatrice percebeu que a menina estava estranha, relutante.

-- Aconteceu alguma coisa? – Indagou preocupada.

-- Apenas não tenho permissão para falar contigo. – Baixou os olhos tristes e saiu apressadamente do quarto.

-- Caspeta!

 

 

 

 

 

Andrello tivera um dia cheio.

Passara o dia na empresa e depois participara da reunião do partido. A` noite, se reuniriam em sua mansão. Sentou!

Recebera um telefonema que não gostara nenhum pouco.

Lutho, noivo da filha, ligara mais cedo e exigira saber da amada. Estava sendo difı́cil convencer ao rapaz que precisava manter Eva afastada de problemas. O jovem insistia que desejava saber onde a mesma estava.

Precisava pensar em algo, talvez se o ameaçasse em desfazer o compromisso que ele tinha com Beatrice o italiano sossegasse. Fechou os olhos!

Naquele mesmo dia mandara as roupas de sua menina travessa.

Sorriu!

Não podia negar que já estava com saudades das presepadas da garota. Apesar de tudo, ela era seu bem mais precioso. Fruto de um amor verdadeiro que acabara tão precocemente. Quem sabe se a esposa não tivesse morrido naquele terrıv́  el acidente, as coisas pudessem ser diferentes. Porém, na maioria das vezes, o destino era cruel demais para levar em conta os sentimentos dos envolvidos em sua teia.

Precisava ser forte e conseguir segurar as pontas naqueles meses que viriam, só assim sairia vencedor naquela eleição.

 

 

 

 

 Maria Fernanda precisara se ausentar da cidade por uma semana. Surgiram uns problemas que envolvia sua jurisdição. Enquanto, a cigana estava recuperada da torção e cada vez mais se aproximava de Catrina.

Naqueles dias sem a juı́za, a vigilância sobre a moça fora redobrada. Eles sabiam que não podiam confiar na astúcia da jovem. Era noite.

Eva estava radiante porque chegaram suas roupas.

Naquele dia, pediu a Catrina que fosse ao quarto que tinha lhe preparado uma surpresa.

Mesmo com o aviso que recebera da patroa, a empregada não deixara de se aproximar ainda mais da italiana. Tinha acabado de arrumar tudo e antes de ir, subiu para o quarto da prisioneira.

Ficou boquiaberta quando entrou.

Beatrice estava vestida maravilhosamente com suas roupas de cigana, inúmeras joias adornavam seus pescoços e seus pulsos, uma linda corrente de ouro lhe enfeitava a cabeça. Usava uma saia grande e verde que lhe chegava aos calcanhares e uma blusa justa, tomara que caia e florida.

-- Então, bela dama, posso lhe mostrar as minhas origens? – Gracejou fazendo reverência.

A moça sorriu e entrou na brincadeira.

Então, viu a bela mulher a sua frente iniciar um ritmo sensual, seguindo um som que só existia em sua mente.

 

 

Maria Fernanda chegou naquela noite.

Sentia-se muito cansada. Passara quase três horas na estrada. Precisava de um banho urgente.

Nem mesmo parou para falar com os guardas. Sabia que tudo estava bem, pois monitorava tudo pelo telefone. A porta do quarto estava entreaberta.

Viu Catrina praticamente babando, então viu qual era a causa daquilo. A bela Belluti se exibia maravilhosamente para a outra.

Sentiu o corpo enrijecer diante daquela imagem, mas uma raiva insana se apossou de si quando viu a mulher que contratara para cuidar da casa, agarrar a cigana e beijá-la.

 


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