A fera ferida -- Capítulo 13

                   
                        Júlia despertou lentamente.
                       Sonhava que alguém lhe acariciava os cabelos, fazendo cafuné. Era tão gostoso. Tentou levantar, mas braços fortes lhe prendiam,mantendo-a cativa.
                  Inspirou e sentiu o aroma delicioso lhe invadir as narinas. Conhecia-o bem, sentira-o tantas vezes em suas fantasias, mas agora parecia tão real que se assustou.
                     Aconchegou-se mais ao corpo nu. Sabia que deveria se trata de mais um devaneio, então o melhor era aproveitar até o momento que sua mente despertasse daquele delicioso desatino. Se tivesse o controle, jamais sairia dali, jamais deixaria de senti-la.
                     Arqueou a cabeça e deparou-se com aqueles olhos verdes lindos lhe fitarem.
                  De inı́cio, se sentiu confusa, então pouco a pouco sua mente começou a clarear. Recordou de tudo que tinha acontecido, um arrepio percorreu seu corpo só em lembrar do que tinha feito na noite passada.
                   Deus, transara com Elizabeth Terzak! Transara com sua paciente!
                   Aonde estava com a cabeça para fazer algo tão irresponsável?
             O pânico começou a tomar conta de si, ainda mais diante daquele olhar tão intenso, tão atrevido e cheio de arrogância.
                  Por que ela tinha que ser tão bonita?
                  Mirava a expressão que parecia divertida lhe encarar.
                 Tentou levantar, mas foi detida, ficando totalmente sobre a bela mulher. Não demorou para ouvir a voz baixa e rouca.
                  -- Bom dia, doutora! – Apertou-a mais, encarando-a. – Está confortável?
              A mãe de Anny mirava os dentes alvos, os lábios tão carnudos e desejou beijá-los novamente.
                 -- Deixe-me levantar. – Pediu corada.
                 -- Por quê? Você passou a noite deitadinha sobre mim. É tão gostoso. – Sorriu. 
                 Júlia estava cada vez mais desconsertada.
                Uma coisa era fazer algo quando a bebida lhe inspirava essa coragem, porém agora o álcool já abandonara o seu sangue e lhe tirara a ousadia. Sabia que tinha cometido um grande erro e ele estava martelando em seu cérebro.
                  -- Preciso levantar, tenho que me arrumar para...para trabalhar...—Gaguejou.
                Elizabeth estava se divertindo com tudo aquilo. A Wasten estava constrangida, nem parecia aquela mulher da noite anterior. Seu rosto tingido de vermelho era um verdadeiro charme.
                  Por que se sentia tão atraída por ela?
              -- Está muito cedo, e a sua paciente é uma mulher tão imensamente tolerante, tenho certeza que você não terá problemas com ela. – Brincou.
                Pela primeira vez naquela manhã, a fisioterapeuta esboçou um sorriso.
                A filha de Alex sentiu um aperto no peito ao vê-la ainda mais encantadora.
             -- Tolerante? – Gargalhou. – Acho que você está enganada, senhorita! A minha paciente, a poderosa Terzak, é a mulher mais arrogante, egocêntrica e chata que eu já conheci em toda minha vida.
               -- Ah! – Suspirou. – E eu acho que já tinha algum crédito contigo. – Fez cara de triste.
             Júlia não conseguiu se controlar, ter aqueles lábios tão próximo de si era uma verdadeira tentação.
            Tocou-os delicadamente, passando a lı́ngua por toda extensão. Aos poucos a carı́cia foi se aprofundando ainda mais.
             A empresária apertou-a, era perfeito ter aquele corpo nu colado ao seu. A excitação já se apossava, sentiu-se molhada e percebeu que não era a única. Desceu as mãos e tocou as laterais dos seios, invadindo o espaço e apertando os mamilos entre os dedos.
                 Júlia gemeu!
                 Esfregou-se ao corpo feminino como uma gatinha manhosa. Aproveitava-se do sexo que lhe recebia tão perfeitamente.
               Batidas na porta interromperam aquele momento de paixão. A fisioterapeuta se assustou, Elizabeth apenas riu.
                  -- Volte depois, estou ocupada. – Falou exasperada pela interrupção.
                  -- Está quase na hora de ir para as sessões de fisioterapia, senhorita. 
                   A Terzak ouviu a voz do enfermeiro.
                  Júlia teve que lhe tapar a boca para que a mulher não caı́sse na risada.
              A paciente meneou a cabeça, mostrando que já podia liberá-la. Teve vontade de rir ainda mais quando viu a cara de brava da bela morena.
            -- Não se preocupe! Você sabe como a senhorita Wasten é compreensiva, ela não ficará irritada se eu me atrasar um pouquinho. – Piscou!
                  -- Ok! – O rapaz concordou.
                  A mãe de Anny pulou da cama e começou a procurar as roupas sob o olhar divertido da outra.
                  -- Eu não estou achando nada engraçado! – Falou irritada. – Se ele tivesse entrado teria me encontrado aqui, nua!
                    Elizabeth apenas ria.
                    Em pouco tempo a jovem já estava totalmente vestida.
               -- Ninguém entra em meu quarto sem a minha permissão. – Ironizou. – A não ser uma mulher furiosa, pronta para tirar satisfação comigo.
                    -- Olha, você é... -- Apontou-lhe o indicador em riste. -- é insuportável.
                  -- E gostosa? – Arqueou a sobrancelha em zombaria. – Acho que te ouvi dizer isso ontem.  
                    Júlia lhe jogou um travesseiro e saiu pisando duro.
                   Fazia tempo que a empresária não se divertia tanto.
                  Era estranho se sentir assim depois de tanto tempo, porém uma sensação de culpa não pôde ser evitada, parecia que não tinha o direito de viver novamente, fora a causadora da morte de Marco, essa era frase que martelava o tempo todo em sua cabeça.




                    A fisioterapeuta se entregava a um relaxante banho.
                  Desde que saíra do quarto da paciente se sentia numa excitação constante. Não acreditava no que tinha feito, fora uma louca em se deixar levar pela empolgação do álcool. Como fora capaz de ser tão ousada? Nem mesmo era lésbica. Se relacionara com uma mulher uma única vez, nem mesmo lembrava do que as passara naquele fatı́dico dia naquela festa da faculdade. Porém, agora era diferente, continuava com o desejo queimando em seu corpo, se não tivessem sido interrompidas pelo enfermeiro, tudo teria acontecido novamente. Mas não era só sexo, ela sabia muito bem disso.
                  Ainda se recordava do toque dela, da forma que se movia, da forma que lhe beijava, parecia tão senhora da situação, tão feita para dominar que lhe assustava e atraia ao mesmo tempo.
                   -- Era o que me faltava. – Suspirou desanimada. – Estou apaixonada por Elizabeth Terzak. – Constatou.




                  Antes de ir para a sessão, a empresária recebeu uma ligação do pai. Alex lhe notificara sobre a possível visita da famı́lia de Marco. Eles desejavam encontrar com a ex-nora, tinham um assunto para resolver com Elizabeth.
                      Aquele inferno não tinha fim!
                  Quando pensava que as coisas estavam indo bem, aquela avalanche de retornava e destruı́a tudo, até um simples lampejo de esperança.


                A fisioterapeuta observou a paciente se aproximar. O semblante estava mais uma vez fechado. Lembrou da primeira vez que a viu.
                     -- Pensei que não viria mais.
                      Elizabeth apenas assentiu e começou a se aquecer.
                   Sua rotina sempre envolvia muitos exercı́cios. Suas pernas se fortaleceram através de muito esforço.
                   Júlia percebeu que havia uma fúria naqueles movimentos, ela estava exagerando e aquilo poderia prejudicar o progresso que tiveram até aquele momento.
                    -- Calma! – Posou a mão na coxa da jovem. – Não precisa de tudo isso.
                A empresária estava se exercitando em um Leg Press, aparelho que trabalha as pernas. Sentada, ela empurrava um enorme peso.
                     -- Você não é ninguém para dizer o que eu preciso. – A fitou irritada.
                     -- Só estou prezando pelo meu trabalho. – Retrucou.
                 -- O fato de ter ido para cama comigo não lhe dá nenhum direito sobre mim. – Falou friamente.
                     Aquelas palavras tiveram o mesmo efeito que uma bofetada para a mãe de Anny.
                     Fitaram-se!
                     -- Acredite, eu nunca pensei diferente disso.
                Elizabeth observou Julia se afastar. Uma sensação de dor lhe apertou o peito. Pensou em chamá-la de volta, mas não o fez. Era melhor assim. Não poderia se envolver com aquela mulher, aquilo jamais daria certo. O melhor a fazer era esquecer tudo que se passou e esperar o momento de se despedirem, o que aconteceria muito em breve.
                   A fisioterapeuta percebeu que o celular vibrava. O visor mostrava a foto do namorado. Pensou em deixar tocar infinitamente, não queria falar com ele, ainda mais naquele momento, ainda mais depois de tudo o que aconteceu. 
                    Viu a insistência e por fim o atendeu.
                     -- Alô! – Falou tentando disfarçar o tremor na voz.
                     -- Amor, onde você estava? Ontem te liguei inúmeras vezes e não recebi respostas.
                  Prendeu a respiração, enquanto via Elizabeth continuar os exercícios como se nada tivesse acontecido.
                     -- Estava...estava dormindo. – Mentiu.
                     -- Tão cedo? Por quê? Está doente?
                     -- Cansada apenas.
                    -- Estou morrendo de saudades de você, meu amor. Sei que ficou irritada comigo, mas eu preciso que me perdoe, por favor.
                    Júlia se sentiu péssima. Mordiscou a lateral do lábio inferior.
                    O médico parecia tão arrependido e ela só conseguia pensar na traição que cometera.
                    -- Certo, Henrique. Já passou.
                   Elizabeth tinha trocado de máquina. A fisioterapeuta estava tão distraı́da que nem ao menos percebeu a proximidade da outra.
                    -- Você está com saudades de mim? – O rapaz indagou.
                    -- Sim, estou com saudades e não vejo a hora ficarmos juntos. – Mentiu para si mesma.
                    -- Em breve nos veremos, querida.
                    Alguns segundos mais e eles se despediram.
                    -- Você é mesmo uma dissimulada.
                    A Wasten levantou-se, assustada, e deparou-se com a paciente de pé as suas costas.
                    -- Não sei do que está falando.
                    Tentou sair, mas a empresária a deteve pelo braço.
                 -- Você não vale nada! É uma safada, deita-se com qualquer um ou mesmo uma, uma vadia que nem mesmo deve saber quem é o pai da própria filha.
                Dessa vez, Júlia não se importou com quem estava lidando e nem ao menos lembrou que ela era sua paciente. Esbofeteou-a!
                  A empresária sentiu o rosto queimar, precisou se apoiar no maquinário ou teria caı́do.  Os olhos verdes se abriram em surpresa.
                -- Quantas vezes eu vou ter que repetir para você não falar na minha filha. Ela é um ser inocente e não merece ser usada nos seus ataques. – Disse angustiada.
                  Elizabeth  apenas  a  fitou.  Os  olhos  verdes  exprimiam  uma  raiva  indescritível.  Nunca  ninguém  chegara  a  encostar um único dedo em si, nem mesmo quando cometera tantas barbaridades. Aquela mulher não tinha direito nenhum de puni- la. Não era ninguém para agir assim.
                 -- Hoje mesmo você sairá dessa ilha. Eu não quero te ver nunca mais na minha vida. – Falou pausadamente. – Não irá receber um único centavo, vou processá-la, farei com que se arrependa por ter cruzado meu caminho.
                    -- Já me arrependi. – Meneou a cabeça. – Odeio ter te conhecido. – Lágrimas começaram a descer livremente. – Odeio. – Gritou. -- Odeio você!
                    -- Vagabunda!
               Elizabeth a fitou mais uma vez e afastou-se, dando de cara com o enfermeiro que presenciara toda a discussão.
                    -- Se essa mulher dormir hoje noite nessa ilha eu mando matar você.
                O rapaz assentiu assustado. Não queria contrariar aquela fera. A mulher parecia possuı́da pelo próprio demônio.



                     E a vontade da mulher fora feita!
                  Naquela noite Julia não dormira na linda ilha dos Terzak. Arrumara as coisas e partira com a filha e com Jane. Um helicóptero as levaram para uma cidade vizinha e de lá seguiram para a casa. A pequena Anny não entendera o porquê de não poder se despedir de Elizabeth, a criança chorara, realmente havia uma ligação entre elas.
                   Elizabeth estava sentada no banco do imenso jardim. Olhava a lua. Passava da meia noite, não conseguira dormir.
               Engraçado, sua insônia não tinha nada a ver com Marco. Mais uma vez Julia Wasten assumia um lugar que não era seu em sua vida.

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