Anjo caído -- Capítulo 20
O shopping já estava aberto.
Pessoas andavam de um lado para o outro, mesmo quando muitos deveriam estar em seus trabalhos, escolas e até mesmo em suas casas.
Muitos apenas observavam as vitrines, maravilhados com o requinte de itens caros que pareciam tão fora de seus alcances. Jovens sorriam escandalosamente, sempre em grupos, demonstravam a falta de preocupação tı́picas da idade prematura.
A praça de alimentação já estava bem ocupada. Homens engravatados, mulheres elegantes já saboreavam as iguarias que cada um dos tantos restaurantes buscava a oferecer.
Ester olhou para o relógio que descansava em seu pulso pela enésima vez.
Não conseguira falar com Eduarda pelo celular, não por falta de tentativa, pois se trancara inú meras vezes ao banheiro para realizar tal ação, porém a ligação não completava.
Observou o dono do restaurante sair com uma pequena valise. O senhor de idade já esbravejara em busca da funcionária e deixara claro que se ela não chegasse até seu retorno, demiti-la-ia.
Passou a mão pelos cabelos flamejantes, que naquele momento se encontravam presos em um coque. Sorte que naquele momento não havia muitos clientes.
Olhou mais uma vez para os lados quando viu uma figura conhecida se aproximar. Elegante e austera ocupou uma das mesas.
Não sabia o motivo, mas não gostara nada de ver a doutora Flávia ali.
Fez sinal para outra atendente se aproximar, mas fora totalmente ignorada. Respirando fundo, seguiu até ela.
-- Boa tarde! – Cumprimentou com um enorme sorriso. – O que deseja? Temos uma variedade de sobremesas, sem falar nos pratos principais que o nosso chefe cria como verdadeiras obras de artes.
De inı́cio, a loira permaneceu quieta, fitando a mármore.
Lentamente, retirou os óculos pretos, encarando a mocinha que a observava. Ainda nem passara em casa. Saı́ra do hospital seguindo direto para aquele lugar.
Fora contatada pelo advogado que fora o responsável para fiscalizar o cumprimento de todas as cláusulas do testamente de Antônio Berlusconi. O intratável homem reclama do fato de Maria Eduarda Fercodini não sacar a mesada que lhe cabia na herança do milionário.
Desde que Angelina se isolara do mundo, a Tavares fora nomeada responsável por todos os assuntos relacionados ao patrimônio do médico, coisa que lhe tirava muito tempo e lhe causava muita irritação, ainda mais quando se tratava daquela garota rebelde.
-- Onde está sua amiguinha? – Indagou de forma impaciente. – Desejo falar com ela.
A ruiva observou a irritação brilhar nos bonitos olhos claros.
Os trajes brancos combinavam com a tonalidade da pele da médica. Os cabelos finos lembravam o próprio ouro.
-- Não sei! – Guardou o caderninho dentro do bolso do avental. – Se não deseja nada, irei atender a outros clientes.
Flávia levantou, detendo-a pelo braço.
Ambas se encararam, parecendo surpresas.
Ester segurou a mão de dedos longos, retirando-a da sua pele.
-- Por que não deu o meu recado a ela? Pedi para que a Duda me ligasse e já faz mil anos isso e nada recebi.
A ruiva não estava gostando do tom que a outra usava.
Altiva, levantou a cabeça, encarando-a. Flávia era um pouco maior que a jovem.
-- Sim! Eu dei o seu recadinho e a minha amiga deixou bem claro que não desejava tocar nesse dinheiro e tampouco falar com a sua pessoa ou com a outra doutora.
Ester já se afastava, quando mais uma vez foi detida pelo braço.
-- Sabia que recebi sua ficha... – Mirou os olhos verdes. – Então ousa a desejar fazer parte da equipe de um dos melhores hospitais de todo o mundo.
-- Acredite, doutora, eu sou muito melhor do que sua estrutura de tijolos e concretos, mesmo não sendo uma riquinha mimada como algumas por aı́.
Não costumava ser tão desagradável e chegara um momento que até simpatizara com aquela mulher, coisa que caı́ra por terra, ainda mais quando a senhora Tavares exibia tanta arrogância como naquele momento.
-- Não ouse me desafiar, mocinha! – Flávia sussurrou ao ouvido da garota. – Ainda mais quando eu conheço muito bem a sua ı́ndole. Deveria ser mais grata por não ter ido parar na cadeia por tudo que andou aprontando com a sua querida Duda.
Ester se afastou, encarando-a.
Seriam caracterı́sticas dessas riquinhas se acharem dona do mundo? Sem pronunciar uma ú nica palavra, a garota se afastou.
A loira respirou exasperada.
Não era costume seu agir daquele jeito, mas aquele não era um bom dia, ainda mais por ter ficado sabendo por José onde Angelina fora na noite passada e para piorar seu humor fora desafiada por uma garotinha estúpida e de lı́ngua ferina, desafiando-a.
Seguiu a passos largos.
Deveria confessar que também não gostara de não ter sido procurada pela amiga.
Entrara em sua sala, vendo as cartas e seu maior desejo fora consolar a linda Berlusconi, coisa que não coubera a si, mas garota Fercodini.
O enorme e elegante apartamento fora arrumado, mas a decoração antiga não fora mexida. Aquela enorme cobertura fora presente de Ângela para a filha quando essa se formara.
Os móveis e as pinturas das paredes se mesclavam entre o preto e branco. Elegante, requintado e todos os seus detalhes.
A sala era composta de carpetes felpudos, sofás enormes em forma de L. Um elegante bar jazia na lateral, quadros enfeitavam as paredes. Havia alguns aparadores em vidros que traziam vários portas retratos, todos com fotos de Angelina, Flávia, Ângela e Henri.
A herdeira de Antônio chegara há algum tempo.
Tomara um relaxante banho e agora descansava no sofá, tendo um copo de suco em uma das mãos e a atenção voltada para uma revista sobre Medicina.
O som baixo de uma das sinfonias de Beethoven invadia o ambiente. Tivera uma maravilhosa noite e ainda sentia os sinais pelo corpo.
Sorriu, só em pensar em tê-la mais uma vez em seus braços. Adoraria ter passado toda a manhã fazendo amor e descobrindo as delı́cias daquele corpo gostoso.
O som da porta sendo aberta lhe tirara dos seus pensamentos.
Observou Flávia adentrar o espaço e viu nos olhos azuis a irritação presente.
Quando chegara a casa, encontrara inúmeros recados na secretária eletrônica e imaginara que a amiga apareceria a qualquer momento.
A loira abriu a bolsa, retirando de dentro uma bonita caixa, jogando sobre o colo da morena. A Berlusconi viu a imagem de um celular de última geração.
Arqueou a sobrancelha em questionamento.
-- Assim eu não fico como uma louca sem saber se você está bem ou se fora acometida mais uma vez por um surto.
A herdeira de Antônio entendia a fúria que a outra demonstrava. Deveria ter avisado que estava tudo bem, retornado as chamadas, mas acabara se esquecendo disso.
A loira observava a forma arrogante que aquela mulher exibia.
Usava um roupão preto, tendo as pernas cruzadas de forma elegante.
-- Então o monitoramente vai ser maior?
Flávia colocou as mãos nos quadris.
Via o sorriso sarcástico brincar naqueles lábios bonitos. Os olhos negros brilhavam, os cabelos estavam soltos, emoldurando o rosto forte e de traços marcantes.
-- Tem ideia de como fiquei quando vi aquelas cartas abertas? Imaginas como passou mil coisas por minha cabeça? Por que não me procurou para conversar? Se não fosse o José eu teria saı́do do hospital, deixado o meu plantão para ir atrás de ti. – Aponto-lhe o indicador.
Angelina continuava calada, apenas observando-a.
-- Mais uma vez a sua libido está no comando das suas ações! – Maneou a cabeça.
A morena depositou pacientemente sobre o centro o copo.
A loira observava os movimentos calmos e não se iludia com isso, pois podia ver a batalha refletida nos ébanos que fitavam um ponto qualquer da sala.
-- Passou a noite com a Duda? – Indagou, cruzando os braços sobre os seios. – Aproveite seu romance e faça com que ela receba a mesada que seu pai deixou, pois já estou cansada de ser procurada pelo advogado.
A Berlusconi levantou, caminhando até o aparelho de som, desligando-o.
A neurocirurgiã permaneceu lá, de costas, fitando as fotografias, tentando manter o controle.
-- Vai ficar calada enquanto eu esbravejo?
-- O que quer que eu diga? – Perguntou em tom baixo. – Quer que chore em seu ombro por ter constatado realmente que meu amado pai nunca gostou de mim? Que ele transara com a minha esposa para mostrar a superioridade que tinha sobre a filha que desprezava? – Aumentou o tom de voz. – O quer que fale sobre o ódio que eu sinto por ele? – Virou-se, fitando-a.
-- Eu já te disse um milhão de vezes que ele se arrependera da forma que agiu a vida toda. Vi as lágrimas, vi a dor por ter perdido a única filha. – Aproximou-se. – Não nego que o odiei ao ver todas as sentenças que foram escritas, mas pense que aquilo fora antes da tragédia. – Tocou-lhe a face. – Como pode deixar a Patrı́cia continuar te envenenando desse jeito?
Observou o maxilar forte se enrijecer.
-- Ela apenas me mostrou algo que já sabia. – Empurrou-lhe a mão. – E quanto a minha libido, não acredito que lhe deva satisfação sobre isso.
Um silêncio incômodo imperou sobre ambas, até a loira se pronunciar novamente.
-- O que há entre vocês?
Angelina voltou ao sofá, sentando confortavelmente.
-- Sexo! – Disse por entre os dentes. – O que mais seria?
Flávia exibiu um sorriso incrédulo.
-- Eu te conheço há muito tempo, desde que éramos crianças e posso ver algo a mais do que tesão queimar em seu olhar... Muito mais do que quando se dizia apaixonada pela Patrı́cia... – Maneou a cabeça negativamente. – Quem diria que você se renderia aos pés da garotinha que sempre odiara...
Antes que terminasse a sentença, soltou um grito ao ver a morena praticamente voar sobre si, empurrando-a contra a parede, tomando-lhe os lábios de forma possessiva e exigente.
A loira tentou empurrá-la, virando a cabeça para evitar o contato, até que a morena a soltou.
-- Não ouse dizer que me prenderei a qualquer mulher que seja. – Continuou pressionando-a contra o concreto. – O fato de transar com a Duda não faz nenhuma diferença. É apenas sexo, só isso. – Afastou-se, dando-lhe as costas. – Jamais confiarei novamente. Jamais permitirei que alguém volte a me ferir! – Gritou.
-- Não pensa como será cruel com uma relação dessas? E se a menina se apaixonar por ti? – Virou-a para si.
-- Vai ser uma pena para ela, mas tudo na vida passa...
Flávia parecia decepcionada com o que ouvia.
Não negava que tinha ciúmes de Eduarda, mas ao ouvir aquelas palavras da amiga, penalizara-se com a situação que a jovem enfrentaria. Tinha certeza que a Fercodini estava apaixonada e mesmo que Angelina negasse, sabia que ela também sentia algo, porém a conhecia bem para saber que ela sufocaria esse sentimento e destruiria a menina.
Viu-a pegar novamente o copo, tomando o suco.
-- Sabe onde a Duda trabalha?
A loira assentiu.
-- Um restaurante no shopping central. Sabor divino, creio que é esse o nome. – Pegou a bolsa que estava sobre o bar. – Preciso ir descansar.
Antes que ela chegasse à porta, Angelina foi até ela, abraçando-a forte. Demoraram ali, presas uma a outra.
Flávia sabia que mesmo com toda aquela pose, a amiga sofria muito com tudo o que leu naquelas malditas cartas.
-- Eu sempre estarei aqui... Poderá encontrar consolo em meus braços quando necessitar... Angelina apenas fez um gesto afirmativo, afastando-se para que a loira saı́sse.
Eduarda corria de um lado para o outro no restaurante.
Chegara e explicara ao chefe o que tinha lhe retido. Um acidente atrasara todo o trânsito.
Ainda não tivera tempo de conversar com a Ester, pois estava se empenhando muito mais para compensar o tempo que perdeu.
Nem mesmo poderá ver o celular para ver se havia alguma ligação da Angelina. Sorriu distraı́da, enquanto arrumava os pratos que tinha lavado.
Seu corpo ainda recordava de tudo que viveram na noite passada. Ainda queimava com o desejo que se acendia tão rapidamente ao ver a linda doutora.
Estava apaixonada pela filha do padrinho e o que mais desejava era poder ficar ao lado dela, porém estava receosa, pois não sabia o que a morena sentia em relação a si. Poderia ser apenas sexo, mas por que a sentia tão entregue?
Tentaria não se iludir tanto, o melhor era viver cada momento com cautela, não cedendo tanto aos caprichos da exigente médica.
Mordiscou o lábio inferior.
-- Vai ficar sonhando aı́ até que horas?
A voz da ruiva a tirou de seus devaneios.
-- Estou guardando os pratos. – Voltou ao trabalho. Ester ficou parada, fitando-a.
-- Sabia que a doutora Flávia esteve aqui e não foi nada agradável.
Duda se virou para encará-la.
-- Por quê?
-- Porque você não está pegando a mesada do seu padrinho.
A jovem suspirou exasperada.
-- Por que querem me obrigar a pegar esse dinheiro? Já disse que não quero nada, estou conseguindo me manter com o que ganho aqui.
-- E quando começar o internato? Não vai poder trabalhar.
Eduarda umedeceu o lábio inferior com a lı́ngua.
-- Eu não quero nenhum centavo dos Berlusconis, ainda mais quando sei que a Angelina acredita que minha mãe era amante do pai dela.
-- Desde quando o que aquela mulher pensa te interessa?
Ester observava os olhos claros desviarem dos seus.
-- Então esteve com ela novamente...
Antes que ela pudesse se explicar, outra funcionária entrou, dizendo que o patrão queria ver a Fercodini. Duda seguiu imediatamente até a pequena sala onde o homem costumava ficar.
Encontrou-o sentado diante da escrivaninha.
-- Aproxime-se! – Ele fez um gesto para que ela sentasse.
A jovem o fez.
-- Aconteceu alguma coisa? – Encarou o homem que já deveria ter uns quarenta anos.
Ele assinou um cheque entregando-lhe.
-- Que isso? – Questionou ao ver o valor que se encontrava lá.
-- Suas contas!
Eduarda se levantou.
-- Como assim? Eu já expliquei o que tinha acontecido, veja a hora? – Apontou para o relógio que ficava sobre o móvel. – Ficarei o tempo necessário para pagar o atraso.
O homem suspirou.
-- Eu sinto muito, mas recebi o ultimato bem claro: Ou a demitia ou a pessoa fecharia meu estabelecimento.
Os olhos verdes se estreitaram.
-- Quem fez essa ameaça?
-- A multimilionária Angelina Berlusconi!
Duda não esperou mais nada, deixando a sala soltando fogo pelas ventas.
Angelina não fora ao hospital naquele dia.
Não fora atendida por Duda, nem mesmo quando mandara uma mensagem se identificando. Pacientemente, mandara o endereço para ela.
Acreditava que ela viria, tinha certeza disso.
Vestiu um biquı́ni branco, colocou o roupão, seguindo até a cobertura, onde uma enorme piscina a esperava.
Eduarda arrumou a mochila.
Como não teria que trabalhar mais, aceitara o convite que fora feito por seu professor e em meia hora viajaria. Bateu com o punho fechado contra o tampo da mesa.
Pigmaleão se assustou.
A jovem respirou fundo!
Sua vontade era de ir até a senhora Berlusconi e dizer tudo que estava engasgado, ainda mais por estar ainda mais chateada, devido ao fato da doutora ter agido de forma tão idiota depois da maravilhosa noite que passaram.
Quem ela pensava ser?
Estava cansada!
E o pior de todas aquelas constatações é que não conseguia resistir aos apelos do corpo quando estava perto da médica.
Estava apaixonada por Angelina, mas não era apenas uma paixão, amava-a mesmo que não desejasse sentir. Tomou o pug nos braços, acariciando os pelos ralos do filhote.
-- Você vai comigo, não se preocupe, não ficará sozinho. – Beijou-o.
Ouviu o interfone.
Pegou a mochila e seguiu ao encontro do mestre.
Dia seguinte...
Os passos longos de Angelina chamavam a atenção. Flávia tentava acompanhar a amiga.
Quando recebera a ligação de manhã cedo, fizera questão de estar ao lado da médica, pois conhecia o temperamento explosivo que era caracterı́stico dela nos últimos anos.
Não achou certo o que ela fizera, mas ainda não ousou repreendê-la por ter feito o dono do restaurante demitir a Duda.
Observava o olhar das pessoas recaı́rem sobre a herdeira de Antônio. Teria como ela passar despercebida?
A expressão inflexível, a postura elegante e beleza selvagem impressionavam os que a viam. A morena passara a noite em claro.
Ligara inúmeras vezes e ainda fora até ao apartamento da estudante. Parou diante do pequeno estabelecimento.
-- Calma, Angel! – Segurou-lhe o braço.
A loira afastou alguns centı́metros ao ver os olhos negros se estreitarem.
Ester tinha acabado de atender a um cliente e retornava, quando viu as duas mulheres. Ainda pensou em ignorá-las, mas a morena a interceptou.
-- Onde está a Duda?
A ruiva observou o maxilar da médica, viu os dentes cerrados. Fitou a loira em busca de ajuda, mas percebeu que ela também parecia assustada.
-- Desejam uma mesa? – Indagou. – Estou um pouco ocupada e não posso conversar em horário de expediente. – Tentou se desvencilhar.
Flávia mordeu a lı́ngua para não gargalhar.
“ E não é que a garotinha se mostrava muito corajosa!” – Pensou. Angelina a tomou pelo braço mais uma vez.
-- Se não me falar onde está a sua amiguinha você não terá clientes pelos próximos mil anos.
-- Então a senhora fará o mesmo que fez com a Eduarda? – Arqueou a sobrancelha esquerda. Flávia decidiu se intromete, ficando entre as duas, pois não sabia até onde ia aquela discussão.
-- Ester... – Começou de forma tranquila. – A Angelina está apenas preocupada, pois a Duda não atende o telefone e tampouco está em seu apartamento.
A ruiva fitou os olhos claros e a perdoou pela grosseria do dia anterior.
-- Ela está bem! – Tocou a mão da loira. – Apenas está cansada de algumas atitudes.
Voltou a fitar a Berlusconi. Sem mais palavras, a jovem se afastou.
Angelina caminhou em direção à ruiva, mas foi detida pela amiga.
-- O que vai fazer? Não vai adiantar esbravejar com a Ester, na verdade, você agiu errado e vai ter que ter paciência e esperar.
Viu os olhos negros brilharem intensamente.
Então ela estava realmente apaixonada pela afilhada de Antônio!
A constatação para a Tavares era dolorosa em grande parte, mas também uma fagulha de felicidade se acendia em meio a sua dor.
A amiga retornava para a vida, decididamente tinha deixado seu mundo vazio, infelizmente ela não estava sabendo lidar com isso.
-- Deixe-me! – Saiu a passos largos.
Flávia suspirou, deixando-a seguir. Deveria deixá-la sozinha naquele momento.
Ocupou uma das muitas mesas, deixando-se ficar ali, pensando na batalha árdua que se seguiria.
Quando aprenderia a deixar esse amor para trás?
Sempre esteve claro que nunca teriam nada, a não ser aquela amizade que perdurava por tanto anos, atravessando inúmeras barreiras e diversidades.
Chega!
Precisava viver a própria vida...
Uma voz doce interrompeu suas divagações.
-- Uma cortesia, doutora!
A loira fitou a ruiva depositar uma taça de sorvete sobre a mesa.
-- Não acredito que mereça...—Disse surpresa. -- Mas a aparência está ótima, então irei ignorar a minha consciência. – Levou um pouco aos lábios. – Hunn... Divino!
Ester sorriu meio sem graça.
-- Preciso trabalhar agora.
Mas a loira se antecipou, segurando a mão da jovem gentilmente.
-- Sente-se um pouco! – Pediu.
A ruiva olhou para o restaurante, o chefe não estava, tinha ido ao banco e também não havia fregueses para atender ainda.
Vencida, fez o que fora pedido.
-- Primeiro quero que me desculpe pela cena que fiz ontem aqui. – Disse sincera. – Segundo, peço que desculpe a Angel, ela não está bem.
Ester observou a sinceridade presente nos bonitos olhos claros.
-- Bem, eu achei a senhora demasiadamente estúpida e mimada ontem. – Esboçou um sorriso. – Mas acho que por ter me salvado da fera, merece um crédito.
Flávia fez cara de zanga, mas acabou gargalhando.
-- Quanto à doutora Berlusconi... Essa vai ter que começar a agir de forma mais civilizada se tem realmente algum interessa na Duda.
-- Eu sei que ela não deveria ter provocado a demissão da Eduarda, mas você precisa entender as circunstâncias.
Ester observava-a com atenção.
Já tinha percebido os olhos azuis brilharem quando se referia a filha de Antônio.
-- Está apaixonada por ela também! – Disse em um fio de voz.
A loira corou, ainda abrindo a boca para retrucar, mas acabou ficando em silêncio. A ruiva se levantou.
-- Realmente preciso trabalhar...
Flávia a imitou, estendendo a mão.
A garota hesitou, mas acabou apertando.
-- Adorei a sobremesa! – Sorriu. – Acho que ganhou uma cliente assı́dua. – Mordiscou o lábio inferior. – Será que vou engordar?
Ester ficou encantada com o sorriso aberto e sincero.
-- Bem, a senhora é muito linda e não acredito que uns quilinhos a mais farão alguma diferença.
-- Chame-me de Flávia, estou me sentindo uma idosa.
A ruiva apenas assentiu afirmativamente, sendo surpreendida por um beijo rápido na face.
-- Tenha um bom dia!
A garota permaneceu lá, enquanto via a bonita médica se afastar. Respirou fundo, seguindo para o trabalho.
A convenção de Medicina era em um hotel de luxo, tendo como cenário uma praia paradisı́aca. Duda estava encantada!
Seguia até a sala que fora destinada ao seu professor. Bateu e a porta fora aberta.
Ficou surpresa ao ver Henri Mattarelli.
O homem seguiu até ela, tomando as mãos nas suas.
Os olhos tão idênticos aos seus demonstravam uma forte emoção.
Pensou em abraçá-la, mas ficou receoso com tal ação, ainda mais por não terem nenhuma intimidade.
-- Olá, minha pequena doutora! – Sorriu simpático. – Quando Arthur me disse que tinha aceitado o convite, fiquei imensamente feliz.
Eduarda pareceu confusa, pois não sabia que aquele era o professor que seria a assistente naqueles dias.
-- Entre! – Fez um gesto para que ela adentrasse ao espaço.
Relutou um pouco, pois se lembrou da ligação do homem com Angelina, mas ao fitá-lo acabou sendo convencida. Havia algo naquela expressão dele que lhe transmitia uma sensação inexplicável de bem estar.
Seguiu a passos lentos, ficando maravilhada com a vista.
Sempre adorou a natureza e aquela vista estava fazendo bem para seu interior abalado.
A sala grande contava com uma escrivaninha, algumas cadeiras e uma bela vista para o mar, mostrando-se através das enormes portas de vidro.
-- Acompanhe-me no desjejum?
A jovem foi tirada de sua distração pelo som gentil da voz do médico. Fitou-o, vendo a mesa que fora montada com inúmeras comidas e sucos.
-- Nossa! – Surpreendeu-se com a gentileza.
Henri afastou uma cadeira para que a jovem sentasse.
-- Pedi de tudo, afinal, não sabia quais os gostos da minha assistente.
Duda sorriu maravilhada, acomodando-se.
-- E eu adorei tudo!
Mattarelli sentou, observando-a atenciosamente.
Tivera muita sorte quando falara com Artur sobre ter a bonita garota naquela viagem. Sua filha!
Sua filha!
Sua filha!
Geh, essa história é perfeita.
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