Anjo caído -- Capítulo 10
O sol já reinava alto, cercando as frias paredes da mansão Berlusconi. Os três pavimentos traziam inúmeros aposentos. A fachada frontal era dominada por rebeldes trepadeiras que cresciam desajeitadamente. Havia resquı́cios da pintura antiga, mas agora apenas a degradação imperava.
Grades enferrujadas cercavam toda a propriedade. As dobradiças rangiam ao sacudir do vento. Havia pequenas e grandes janelas por toda a construção, algumas lembravam a segurança de um presı́dio com suas barras protegendo-as.
Desde que Angelina deixara a ala leste, Maria Eduarda jazia de pé, encostada ao concreto gélido. As mãos permaneciam sobre os seios, cobrindo-os. Suas pernas já conseguiam se sustentar, pelo menos não tremiam mais.
O olhar arregalado se direcionava a porta por onde a odiosa mulher saiu.
As velas já estavam ao final e o pouco que restava ainda iluminava o minúsculo cômodo. Havia uma cama estreita, uma abertura que parecia dar para uma espécie de banheiro. Uma pequena abertura retangular era a única ligação com o mundo exterior.
Duda fitou o chão empoeirado, vendo com desgosto suas vestes transformadas em tiras.
Ainda não conseguia acreditar no que tinha acontecido momentos antes. Seu corpo ainda sentia os espasmos, sua pele arrepiada estava em brasa onde fora tocada.
Lentamente seguiu até o leito, sentando-se.
Sua mente estava tão conturbada que nem mesmo o cheiro de mofo a incomodou.
Levou os dedos até o lábio inferior, sentindo-os inchados pela forma violenta e deliciosa da carı́cia. Decerto, havia marcas por toda sua pele branca.
Não deveria ter permitido os toques ousados. Deveria tê-la repelido e se fosse possível, enchido seu rosto de arranhões, rasgando-a até ver o sangue lhe jorrar da carne.
Em sua vida só fora tratada violentamente em duas ocasiões e coincidentemente por uma única pessoa.
Não havia desculpas para forma bruta que fora tomada. Não merecia a fúria da médica, pois andara por vários quilômetros para que Bruno não descobrisse a sua localização. Em nenhum momento desejara causar qualquer tipo de problema, apenas quisera espairecer, descansar dos pensamentos conflitantes que estava sendo perturbada ultimamente.
O namorado fizera tudo para distraı́-la, mas todas as horas que passara com ele foram assombradas pela imagem daqueles olhos negros que sempre a fuzilavam. Até quando fora beijada, seus pensamentos estavam nela. Na sua forma arrogante de agir, na dor infinita do seu olhar, nos gesto contidos, nas explosões que pareciam ter o poder de destruir tudo e a todos que estivessem ao seu redor.
Agora tinha completa certeza da insanidade da anfitriã. A poderosa Berlusconi agia como um animal, um ser irracional... Um demônio dominado por uma ira cega.
Fechou os olhos, desejando esquecer tudo o que se passara desde o momento que viu pela primeira vez a doutora
Angel.
As roupas pretas estavam depositadas sobre o chão do aposento principal. Era possıv́ el ouvir o som da água caindo.
Angelina estava sob a ducha. O lı́quido gelado percorria sua pele, mesmo assim não era possível relaxar seus músculos.
Nunca em sua vida refreara um desejo. Seu autocontrole não funcionava quando sua libido era acionada. Toda vida fora uma mulher dominadora, passional, alguém que não se importava em ousar quando seus instintos sexuais reinavam.
Mas em todo esse tempo nunca sentira o fogo a queimando de dentro para fora. Jamais ficara em chamas como naquela madrugada e resistira.
Estava segura que Maria Eduarda Fercodini não era apenas uma pirralha irresponsável, era também uma mulher deliciosamente linda e sensual.
Desligou a água, permanecendo lá.
Fechou os olhos e a imagem de Patrı́cia se confundiu com o rosto doce da intrigante hóspede e isso fora a razão de ter parado. Viu a traição, viu nela tudo que já vivera, mas o que foi a pior constatação de todas fora o ciúmes.
Imaginá-la nos braços de outro, sendo tocada, acariciada... Bateu com o punho fechado contra a parede, ferindo-se.
Levou as mãos aos cabelos, pondo-os para trás. Ela não deveria ter voltado...
Tocou a face onde fora esbofeteada.
Desejara feri-la, machucá-la... Fazê-la sentir um pouco da agonia, da afobação que lhe dominava.
Não... Não se deixaria enganar mais uma vez. Jamais acreditaria em alguém novamente, jamais se entregaria como fizera em outrora.
Escorregou até o piso.
O banheiro era minúsculo, não possuı́a luxo, apenas o chuveiro e na porta seguinte ficava o local onde fazia suas necessidades.
Apoiou o queixo sobre os joelhos, permanecendo ali, perdida em suas memórias e remoendo suas dores.
Flávia andava de um lado para o outro.
Estava a ponto de comprar uma passagem e retornar ao paı́s.
Tinha vários encontros daquele dia, porém sua mente não parecia funcionar bem, não enquanto não tivesse notı́cia sobre a Fercodini.
Ouviu o som do celular, prontamente atendeu.
-- E então, José?
-- Falei com o rapaz e ele disse que ela tinha retornado de madrugada. Disse que a deixou em uma estrada meio deserta e que de acordo com ela, a senhora mandaria um motorista ir buscá-la.
A médica apertou o aparelho.
-- Vá até a Angelina e veja se ela apareceu. Já liguei um milhão de vezes e ninguém atende o celular da Duda.
-- Certo... – Falou relutante.
-- O que houve? – Indagou impaciente. – Qual é a nova desgraça?
-- Fui ao apartamento da senhorita Eduarda e o porteiro falou que um homem esteve procurando-a.
-- Que homem? – Perguntou sentindo a preocupação aumentar.
-- No cartão que ele deixou, tinha um nome: Fernando Valle, detetive particular.
O motorista a ouviu praguejar e esperou até que ela se acalmasse.
Alguns segundos se passaram.
-- Faça o que eu mandei e quando chegar lá e a encontrá-la, espero que viva, ligue-me e deixe-me falar com ela.
-- Está bem, agora mesmo estarei partindo.
-- Ok! Até mais!
Flávia deixou o aparelho de lado, sentando na poltrona. Sua cabeça já doı́a só em antecipar o que estava por vir.
Depois de todos os fatos que ocorreram, estava certa que o melhor era que a Angelina enfrentasse a Patrı́cia, pois sabia que não demoraria muito para que ambas ficassem frente a frente.
Pigmaleão já arranhava a porta quando Angelina chegou à ala norte.
O pequeno animal pareceu se alegrar com a presença, enroscando-se nas pernas dela. A médica o fitou, deveria estar com fome.
Hesitante, tomou-o nos braços.
-- Bem, pulguento, acho que você precisa se alimentar.
Levou-o até a mesa, em seguida foi até a cozinha ver o que preparar para o pug.
Observou que havia ração para filhote, uma pequena mamadeira e um tipo de leite especial. Colocou um pouco da comida em um prato, levando para o pequeno.
Pig pareceu feliz, degustando todo o conteúdo rapidamente.
A Berlusconi seguiu até a poltrona onde estava o aparelho celular. Havia inúmeras ligações, desde Flávia até o namorado de Duda.
Inclinou a cabeça para trás, fechando os olhos. Tentava controlar a respiração, acalmar-se.
O cachorro chorou e ela viu que ele desejava subir, mas que não conseguia. Pegou-o, pondo sobre o colo. Observou os olhos vivos olhar para todas as direções.
-- Ah, está procurando a sua intragável dona? – Acariciou-lhe os pelos ralos. – Prendi-a. Quem sabe assim ela não aprende uma lição.
Pigmaleão se sacudiu, parecia protestar pelo fim de sua dona.
-- Você deveria estar bravo com ela, afinal, a irresponsável te deixou aqui sozinho e saiu com o namoradinho.
Voltou a pegar o aparelho celular, clicando na galeria, viu algumas fotos, principalmente uma que Duda estava com Bruno. Observou-a bem e teve a impressão que conhecia o rapaz, mas de onde?
O enorme carro estacionou diante da mansão Berlusconi.
O motorista ainda permaneceu por alguns segundo com a cabeça apoiada a direção. Sabia que não seria fácil.
Angelina ouviu o som, sabia de quem se tratava, já esperava.
Deixou o cachorro sobre a poltrona, seguindo até a porta principal.
-- Bom dia! – José a cumprimentou meio relutante.
Era possível perceber a expressão assustada do homem.
-- O que quer aqui? – Indagou, ignorando o cumprimento.
-- Vim ver a menina Fercodini.
-- Como sabe que ela voltou? – Arqueou a sobrancelha esquerda.
O idoso pigarreou antes de responder.
A médica o encarava e percebia como o tempo passara para o bom José. Ele sempre fora uma pessoa atenciosa, mantendo total discrição, mesmo quando sabia da maioria das coisas que a patroa e ela aprontavam. Observou os cabelos brancos e a enorme barba que lhe dava a aparência do papai Noel.
-- O namorado dela avisou que ela tinha retornado.
Angelina segurou no corrimão da escada tão forte que seus dedos já perdiam a cor.
-- Diga-me uma coisa: Por que a sua adorável Flávia omitiu de mim sobre o tal mancebo da protegida do meu pai? – Caminhou até ficar bem próxima a ele.
José pareceu perder um pouco da coloração da pele.
-- Deve... Deve perguntar a ela. – Baixou a cabeça.
-- Sabe, eu fiquei observando algumas imagens do talzinho e algo me pareceu muito familiar. – Falava contidamente. – Quem é ele?
Mais uma vez o motorista permaneceu em silêncio, mas depois de alguns segundo levantou a cabeça.
-- É o namorado da Maria Eduarda. – Disse simplesmente.
A Berlusconi estreitou os olhos ameaçadoramente.
-- Licença, irei até a ala Norte, quero ver se está tudo bem com a Duda. – Caminhou, mas o som rouco a deteve.
-- Ela não está lá.
-- Onde ela está? – Perguntou preocupado.
Os lábios dela se moveram, abrindo um sádico sorriso.
-- Ala leste!
O queixo de José pareceu cair, ficando com a boca entreaberta.
-- A ala leste faz parte da masmorra...
-- Sim! Masmorra!
-- Preciso vê-la.
-- Ainda não é horário de visitas! – Caminhou até a porta, abrindo-a. – Volte amanhã.
-- Mas... A dona Flávia não vai gostar disso.
-- Problema dela!
José ainda balbuciou algo, mas acabou saindo da mansão, porém não partiu, entrou no veı́culo, discando o número da patroa.
Eduarda andava de um lado para o outro. Já começava a se desesperar, ainda mais porque imaginou o Pigmaleão sozinho na ala norte.
Começou a bater na porta, sem nem ao menos lembrar de que estava nua da cintura para cima.
Quando tocou a maçaneta, percebeu que estava aberta, abriu-a, deparando-se com uma grade e a odiosa mulher parada lá.
Angelina fitou-a por infinitos segundos. Mergulhou no mar verde que exibia reprovação, mas também atrevimento; os lábios entreabertos denotava a surpresa em vê-la.
Baixou os olhos, observando os seios nus, redondos e macios. Recordou do sabor deles em sua boca. Sentiu a garganta seca, de repente salivava, desejava seu gosto.
Duda viu o fogo nos olhos negros e imediatamente se cobriu com as mãos. Empinou o nariz, enfrentando-a.
-- Deixe-me sair daqui! – Exigiu. – Abra agora.
A Berlusconi segurou nas barras, não parecia abalada com a pequena explosão.
-- Baixe o tom, pirralha, não sou um dos seus amiguinhos marginais ou seu namoradinho ridı́culo. A Fercodine respirou fundo, tentando não demonstrar seu desespero.
Caminhava de um lado para o outro, tentando manter a calma, mas tal ato não parecia estar funcionando.
Observava médica parada ali e sentia um desejo enorme de voar sobre ela.
Ela parecia ainda mais assustadora com seus trajes sombrios e olhar penetrante.
-- Onde está o Pigmaleão?
-- Ah... Agora você lembrou-se dele.
-- Onde ele está? – Repetiu a pergunta, ignorando o tom irônico.
-- Provavelmente os ratos devem ter se deliciado com o pedigree dele.
Angelina percebeu os olhos verdes se arregalarem, sem seguida via lágrimas se formarem.
-- Não... – Meneou a cabeça. – Por favor, não fale isso. – Pediu baixinho. – Ele não tem culpa de nada.
-- Lembra-se do aviso que lhe dei quando o trouxe para cá? Se não cuidasse o jogaria para os ratos?
Eduarda veio impetuosamente para cima dela e se não fosse as grades teria começado uma agressão fı́sica. A médica nem piscou, parecia impenetrável.
-- Abra aqui! – Esmurrou as barras. – Deixe-me sair. – Esbravejou, cobrindo os seios novamente. – Você não tem o direito de me manter presa nesse lugar.
-- Não!
Respirou fundo.
-- Onde está o Pigmaleão? – Indagou mais uma vez. – Diga-me! – Pediu.
A Berlusconi fitou os lábios rosados. Sua mente não parecia manter o foco quando a via. Afastou-se um pouco.
-- Responda-me uma coisa!
-- Você me tranca aqui, fala que matou meu cachorro e ainda exige que te responda algo... – Dizia entre lágrimas. – É um demônio...
A médica não pareceu se ofender com as palavras.
-- É sua chance de salvar o pulguento. Ele é gordinho, vai demorar a os ratos comerem, ainda tem uma chance de ser salvo.
Eduarda a encarava em busca de que aquelas palavras se tratassem apenas de um blefe, mas a expressão impassável não lhe dava nenhuma pista.
-- Fale o que deseja saber. – Disse por fim.
-- Ótimo! – Voltou a se aproximar. – O seu mancebo é filho de quem? – Questionou.
A jovem pareceu confusa, mas depois entendeu de quem ela falava.
-- Meu namorado. – Corrigiu-a. – Acho que você quis dizer isso.
-- Responda a minha pergunta! – Exigiu impaciente.
-- O que te importa isso? – Questionou desconfiada.
Angelina já girava nos calcanhares quando a garota respondeu rapidamente.
-- Ele é filho do doutor Augusto Montano.
A médica não se voltou para fitá-la, mas era possível ver a tensão nos ombros cobertos pelo tecido preto.
Duda ouvia a respiração acelerada e já se preocupava quando a Berlusconi se virou para ela.
-- Só ficará com esse miserável sobre o meu cadáver! – Bateu forte contra a barra. – Está ouvindo? – Gritou. – E se você ousar sair daqui mais uma vez ou trazer esse moleque em minha casa vai se arrepender de ter cruzado meu caminho.
Eduarda observava um perigoso brilho nos olhos negros. Estavam mais irracionais do que de costume.
-- A senhora se esquece de um detalhe: Não sou obrigada a obedecer as suas regras. – Rebelou-se.
-- Enquanto o dinheiro da minha famı́lia bancar a sua vida fará o que eu mandar. – Sussurrou.
-- Eu não desejo o seu maldito dinheiro, já disse a senhorita Tavares e parece não ter entendido, pois o que fez foi me jogar aqui quando eu buscava meu próprio sustento.
-- Ah não diga! – Debochou. – Deixe-me ver suas últimas atividades empregatı́cias: Corridas ilegais, entorpecentes...
-- Deixe-me sair daqui! – Gritou. – Não tem o direito de me prender nesse lugar.
-- Engana-se, querida. – Afastou-se. – Eu tenho todos os direitos que eu quiser ter.
Duda a observava afastar e nem seus gritos a detiveram, nem mesmo falara o que se passara com o cachorro.
José continuava dentro do carro, então viu a porta da mansão se abrir e foi imediatamente até a médica.
Ele tentara ligar para a patroa, mas não conseguira obter sinal e já entrava em desespero quando viu Angelina.
-- A minha vontade é apertar o pescoço da sua patroa e ver a vida se extinguir daqueles olhos claros.
O motorista recuou assustado.
-- Imagino que não conseguiu falar com ela. – Dizia caminhando de um lado para o outro no enorme e empoeirado hall. – O que passou na cabeça daquela louca em mandar essa menina para cá e pior. – Parou apontando o dedo indicado ameaçadoramente. – Como não me disse que o mancebo dessa fedelha tagarela é Bruno Montano.
José não parecia surpreso com a informação, mas se surpreendia em saber que a médica já tomara conhecimento desse fato.
-- Tudo o que a Dona Flávia faz é para lhe proteger. – Pronunciava as palavras com calma e convicção.
-- E quem pediu para ela fazer? – Esbravejou. – Eu nunca pedi nada para ela! – Passou a mão pelos cabelos.
O motorista nada disse, apenas permaneceu parado, olhando para os próprios pés. Sabia que nada que pudesse dizer iria diminuir a fúria da morena. Aprendeu a conhecê-la naqueles quatro anos e descobriu que o pensamento dela não seguia a lógica, agindo apenas por instinto e atacando como um animal que se sentia ameaçado.
Angelina sentou no último degrau da enorme escadaria, baixando a cabeça entre os joelhos.
Ela chorava baixinho como quando era criança e se machucava. Apenas permitia que as lágrimas aliviassem suas angustias, suas agonias que pareciam apenas aumentar nos ú ltimos dias.
José sabia do pranto dela e sentiu uma vontade enorme de se aproximar. Sempre achara aquela mulher muito forte por ainda estar de pé depois de tudo o que passara.
Sentiu o celular vibrar e viu que se tratava da Tavares. Seguiu para o lado de fora para atender.
-- E então? – A médica indagou. – Como está a Duda?
O motorista respirou fundo, nem sabia por onde começar. Talvez não devesse contar para a Flávia.
-- A Doutora Angelina já sabe quem é o namorado da Maria Eduarda. Era possıv́ el ouvir a respiração ofegante da loira.
-- E?
-- E agora ela está sentada no último degrau da escada, chorando como uma criança.
A médica estava no hospital internacional. Tinha ido ver algumas parcerias que desejava fazer. Naquele momento estava em uma sala que lhe fora disponibilizada para examinar alguns papéis. A loira fechou os olhos e também se permitiu chorar por saber da enorme dor da amiga.
-- Hoje mesmo retorno para casa. – Disse em um fio de voz.
-- Não pode fazer isso! – José a repreendeu. – Sua viagem não foi para diversão, mas principalmente para ajudar a Angelina.
-- Eu sei. – Soluçou. – Mas você não entende... Não posso ficar aqui sabendo como a Angel está.
-- Senhorita, por favor, termine o que foi fazer e depois retorne, eu prometo que ficarei mais presente para que nada ocorra.
-- Mas... – Insistia.
-- Doutora, nós sabemos que mesmo que retorne sua presença não será aceita por ela, então é mais viável que faça o que deve ser feito aı́ e depois volte, afinal, não falta muito tempo para isso.
Flávia sabia que ele estava certo e dentro de uma semana se encontraria com outro médico que parecia disposto a se empenhar no caso da Berlusconi.
-- Está certo... Mas por favor, me mantenha informada sobre tudo.
-- Com certeza o farei.
-- Agora me diga como está a Duda.
José fitou a paisagem deserta, pensando o que deveria dizer a patroa. Caminhou até o carro, olhou para cima onde ficava a janela que provavelmente a jovem estava presa.
-- Ela está bem... – Disse por fim.
-- Pelo menos isso me deixa mais tranquila. Depois ligo para falar com ela, peça pra ela fazer o celular pegar, desejo lhe falar.
-- Certo...
-- Bem, preciso desligar, estou em reunião com alguns diretores.
-- Está certo. Até logo!
Ouviu o som de encerramento da chamada e ficou ali, fitando o aparelho.
Bem, esperava não ter mentido, desejava de todo o coração que a menina Duda estivesse bem. Retornou para o interior da casa.
A Berlusconi continuava lá, mas a cabeça não estava mais abaixada, agora suas lágrimas já pareciam terem cessado e só restava o olhar vazio.
O motorista se aproximou, sentando ao lado da jovem.
Permaneceram em silêncio até ouvirem o latido do pequeno animal que corria para Angelina.
-- Você não deveria estar dormindo, pulguento? – Perguntou, fitando-o.
José sorriu ao ver o filhote querendo subir o degrau, mas não tendo sucesso, caindo de barriga para cima. A médica surpreendeu o motorista ao pegá-lo nos braços.
-- Nossa, como você está fedendo, parece que não toma banho há anos.
A morena encarou o homem que a mirava.
-- Pegue roupas na ala norte e leve para a “sua menina”.
-- Não vai soltá-la?
-- Ainda não!
José suspirou, levantando-se para fazer o que fora dito.
-- Ah, prepare algo para ela comer e leva água, leve tudo o que precisar.
-- E não vai me dar as chaves para eu abrir?
-- Passe pelas barras, ah, não fale que o cachorro está bem ou jogo ela na verdadeira masmorra.
O motorista assentiu, resignado, pois sabia que não tinha como ser diferente.
Eduarda caminhava de um lado para o outro na pequena cela.
Já inspecionar todo o lugar e pelo menos havia como tomar banho e fazer outras necessidades, mas precisava de roupas, comida. Estava morta de fome.
Sentou sobre a cama.
O que Angelina pensava estar fazendo? Quem ela pensava ser para agir daquele jeito? Não acreditava que ela tinha sido tão cruel e machucado o cachorro.
Inquieta, seguiu até as barras e começou a gritar o nome da médica.
Ouviu passos, cobriu os seios que continuavam desnudos, mas não era a doutora que aparecia, mas sim José.
O motorista pareceu chocado por ela estar sem a parte de cima das vestes. Observou que havia resquı́cios de roupas no chão.
Duda engoliu em seco.
-- O que houve? – Começou a passar as roupas pelas fendas. Eduarda cobriu-se imediatamente.
-- O que houve? O que houve? Houve que essa mulher está louca e está me mantendo presa nesse lugar. – Dizia corada.
-- Menina, precisa manter a calma, a doutora só está fazendo isso porque você fugiu. – Entregou-lhe uma garrafa com água e uma marmita com comida. – Não deveria ter feito isso.
-- Está dizendo que ela está certa? – Esbravejou. – Ela deveria estar internada, pois simplesmente de uma hora para outra ela surtou. – Colocou as coisas sobre a cama. – Tire-me daqui, por favor.
-- Tirarei sim, apenas dê-me um tempo.
A jovem apenas assentiu.
-- Preciso de outro favor, o Pigmaleão está sozinho, tenho medo que ela tenha feito algo com ele.
José baixou os olhos.
Não desejava ver o desespero naquele semblante.
-- Coma, eu não posso ficar mais tempo, e fico muito feliz que esteja bem, feliz mesmo.
Duda o viu se afastar, percebendo um pouco de nervosismo no motorista, mas imaginou que ele deveria também estar assustado com o comportamento da médica.
Observou as coisas que tinham sido trazidas.
Pegou a toalha, seguindo para o banheiro, sentia-se suja, pesada.
Patrı́cia já decidiu que retornaria ao paı́s, mesmo com o insucesso nas ações de investigação pelos detetives. Sentou no luxuoso sofá, fez algumas ligações, pois no dia seguinte viajaria. Estava disposta a tudo para chegar até a esposa.
-- Vamos ver se você vai resistir quando voltar a me ver...
A noite já seguia alta.
Era possível ouvir os sons dos animais noturnos que se aventuravam por aquelas paisagens desertas. Angelina estava deitada em sua cama.
Cansada de não conseguir conciliar o sono, sentou-se. Sua mente fervilhava mais do que de costume. Na verdade, estava ansiosa, preocupada e o pior de tudo, seu corpo travava uma batalha por satisfação.
Fechou os olhos e viu as cenas de seu arroubo de paixão naquela manhã. Sentia-se em chamas... Levantou-se, caminhando de um lado para o outro.
Por que teve que desejar logo aquela garota? Ansiava pelo toque, pelo gosto, pelo cheiro dela... Bem, ela não parecera indiferente...
Mas como podia ser? Ela tinha o namorado...
Engraçado, precisara de uma traição tão grande para descobrir que quando se tratava de sexo, deve-se apenas o fazer sem compromisso, aproveitando, tirando tudo o que pudesse tirar, sem cobranças, sem promessas... Apenas em nome do prazer...
Vestiu o roupão preto, em seguida colocou as luvas, deixando os aposentos apressadamente.
Eduarda observava as velas queimando.
Não era possível que a doutora tomasse todas aquelas decisões e ninguém fosse contra ela, nem mesmo recebera a ajuda de Flávia.
Por quanto tempo ficaria naquele lugar?
Fechou os olhos tentando dormir, mas ficou alerta ao ouvir passos.
Sentou-se, respirou fundo e sentiu o cheiro dela, aquele aroma que perturbava seu olfato, que aguçava e entorpecia seus sentidos.
Ouviu o clique da fechadura abrir e fechar, levantou a cabeça, encarando Angelina Berlusconi.
Observou-a, percebendo os olhos negros refletirem as chamas das velas.
-- O que quer, doutora?
A morena deu um passo longo até ela, tomando-a pelos ombros, levantando-a do leito. Duda abria a boca para protestar quando a sentiu se apossar dela.
Surpresa, permaneceu estática, sentindo os lábios fortes e ousados dominarem o ato.
A lı́ngua da médica contornava toda a sua parte exterior, mas de repente, invadiu-a. Ela chupava tão deliciosamente, mordiscava... Fazia-o como se fosse a dona de tudo.
Eduarda a abraçou, desejando aprofundar o contato. Puxou-a mais para perto de si pela cintura. Caminharam até ficar pressionada contra o concreto. Levantou a perna, apoiando-a no quadril.
Gemeu alto quando sentiu dedos lhe acariciarem sobre a calcinha... Mas quase desfaleceu quando os teve em sua carne... Molhada... Estava tão úmida que parecia estar derretendo.
Meneou lentamente as cadeiras se deliciando com a carı́cia que jamais recebera antes, mas sentiu uma dor tão forte ao senti-la tentando invadir que gritou.
Duda abriu os olhos, ofegante...
Examinou o quarto e não havia ninguém lá. Passou a mão no colo, estava molhada de suor...
Fora apenas um sonho... Um pesadelo na verdade.
Apaixonada pela história!
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