A condessa bastarda -- Capítulo 11


                   A condessa não conseguia conciliar o sono. Virava de um lado para o outro. 
               Desde que retornara do rio, banhara e seguiu para o quarto. Miguel ligou algumas vezes, mas ela não atendera. Não desejava falar com ninguém, apenas ficar quieta, adormecer... Sua mente não parava de pensar no que acontecera à tarde. Seu corpo ainda reagia ao se lembrar do toque, dos beijos, do cheiro daquela mulher...
               Maria Clara Duomont era uma feiticeira e com aquela carinha de princesa de contos de fadas a seduzira miseravelmente.
                  Levantou e caminhou até a enorme varanda do quarto. Ficou observando a noite, cujo céu estrelado forrava um manto sobre aquelas terras.
               O ventou sacudiu o roupão, preto, de seda, que estava aberto frontalmente. O que estava a acontecer ?
            Mesmo sendo uma mulher ativa sexualmente, jamais sentira atração por mulheres e nem mesmo quando se deitava com seus amantes, perdia o controle como acontecia sempre que estava na presença da Duomont.
                Retornou para a cama... Precisava descansar e esquecer o que havia passado.


             Marcelo chamara o filho ao escritório. Estava irritado, algo não o estava agradando nos últimos dias. Apontou a cadeira para que o rapaz sentasse, em seguida fez o mesmo.
               -- Que o que ocorreu ontem não volte a acontecer! – Disse por entre os dentes. – Maria Clara sumiu e não retornou para o seu lado.
                   -- Ela não estava se sentindo bem, papai... – O jovem tentava justificar.
               -- Isso não importa! – Bateu com o punho fechado sobre o móvel. – Você não pode agir como um idiota apaixonado, deve dominá-la, afinal, quando essa eleição for ganha, você quem assumirá o meu lugar e não a neta de Frederico.
                   -- Não esqueça que será ela a prefeita... – Disse calmamente.
              -- Não, ela é apenas um adorno que está sendo usado para angariar votos. 
                  Marcos se levantou irritado.
                 -- Ela é a mulher que eu amo e não a verei como um enfeite.
                O prefeito observou o filho sair e bater a porta. Esperava retomar o controle da situação, pois não estava em seus planos aceitar que Frederico fosse o único beneficiado com aquela eleição.


                  Clara despertou com as cortinas sendo abertas e a luz invadindo o quarto.
             -- É um absurdo o que fizestes ontem, Maria Clara Duomont! 
              A jovem ouviu a voz estridente da mãe e abriu os olhos.
        -- Sumiu do evento, quando deveria ficar ao lado do seu noivo, quando deveria estar conversando com as pessoas para conquistar os seus votos.
               -- Eu não estava me sentindo bem, mamãe. – Disse calmamente.
              -- Que tomasse remédio e depois retornasse para junto da sua famı́lia e do seu futuro marido.   
               Maria Clara apenas assentiu, sabia que seria impossível vencer uma discussão com Clarice.
              -- Prometo que não voltará a acontecer.
            -- Assim espero! – Seguiu até a porta, mas parou. – Levante-se, pois o Marcos ligou e disse que viria te ver.
               Balançou a cabeça afirmativamente e soltou a respiração ao vê-la sair.
              Massageou as têmporas. A dor de cabeça que tinha passado parecia que agora retornara com força total.
            Observou o relógio e percebeu que já era quase meio dia. A noite anterior não fora nada tranquila. Quase não consegue pegar no sono e quando o fez tivera sonhos sexuais com a condessa.
                Cobriu o rosto com o travesseiro.
            Não queria levantar e tampouco desejava ver o noivo. Como iria encará-lo depois do que passara nos braços de Vitória.
                 Sentiu um arrepio na espinha só em recordar do que tinha ocorrido entre elas.
              Marcos não merecia aquela traição. Ele era um homem ı́ntegro, atencioso, apaixonado, um verdadeiro cavalheiro. Deveria dizer-lhe o que estava a se passar?
                Não!
             Seria horrível se ele chegasse saber que ela estivera com a condessa de forma tão ı́ntima. Deveria continuar seguindo em frente e manter total distância daquela mulher. Aquilo era um desejo passageiro, algo que seria destruı́do com o tempo e com a distância.
                Descobriu o rosto!
                Fechou os olhos e viu a imagem da ruiva a sua frente.
                -- Deus, como uma simples mortal pode ser tão linda... ?!!!!!!!!
            Mesmo depois do longo banho da noite anterior, ainda podia sentir o cheiro dela em seu corpo. Sua boca trazia o sabor dela...
                 Irritada, levantou-se e seguiu para o banheiro.


                 -- Te liguei inúmeras vezes e você não atendeu! – Falou ao ver o marido de Valentina.
            A condessa estava na usina. Acompanhava de perto o processo por qual a cana estava a passar. Dava ordens aos empregados e seu humor parecia estar ainda pior do que de costume.
                 -- Vamos ao escritório!
             O advogado ficou parado, observando-a se afastar a passos longos. Encarou Batista buscando uma resposta para a irritação de Vitória, mas o bom senhor apenas deu de ombros.
                Mattarazi tirou o chapéu, sentou-se.
             -- O que houve? Por que a demora de vir até aqui? – Disse assim que o homem entrou.                         Miguel apenas se acomodou, sabia que sua resposta seria motivo de guerra.
        Observou o local bem arrumado. A condessa fizera aquele espaço para poder tratar dos problemas da usina ali mesmo. O escritório era todo pintado de branco. Havia uma enorme mesa, um computador, cadeiras giratórias de couros e um sofá grande que servia para ela descansar quando o dia era muito corrido. Apenas um porta retrato descansava sobre a madeira, ela ao lado do irmão quando era apenas uma adolescente.
           -- Os animais serão trazidos hoje, apenas a égua foi transportada ainda ontem. 
           Vitória o encarou.
            -- O que podes me dizer sobre as finanças de Frederico?
           O homem ficou surpreso com a mudança de assunto, mas respondeu a indagação.
            -- Fui informado pelo gerente do banco que ele pedira outro empréstimo.
           -- Idiota! Vai perder tudo rapidamente e eu serei a dona de tudo que ele mais ama! – Sorriu. – Diga-me, o que você acha que o Duomont daria para não perder a sua preciosa propriedade?
            O advogado a fitou confuso.
            -- Como assim?
           -- Duomont venderia a alma dele ao demônio para não perder tudo? – Arqueou a sobrancelha de forma sarcástica.
           -- Bem, pelo que conheço de Frederico, sei que o orgulho dele o faria barganhar com qualquer um. – Deu uma pausa. – Por quê?
           -- Nada que precise ser dito agora! – Levantou-se. – Vamos ao curral? Quero ver se essa égua  é tão selvagem como disseram.
             -- Vai montá-la? – Preocupou-se com a possibilidade.
             -- O que você acha? – Sorriu pegando o chicote.


            Clara tinha saı́do para almoçar com o amado, em seguida foram ao clube jogar tênis.
          -- Ah, você só ganhou porque ainda estou convalescendo e não consigo me movimentar tão rápido. 
             O rapaz a abraçou.
             -- Eu sei! – Beijou-lhe os lábios. – Vamos tomar um sorvete?
             A jovem assentiu e eles caminharam de mãos dadas até a lanchonete, sentando-se.
           -- Sabe, eu não vejo a hora de nos casarmos! – Segurou-lhe a mão. – Quero poder chegar a casa e tê-la sempre me esperando.
              Maria Clara desviou o olhar e depois o encarou.
            -- Eu não quero ficar apenas a esperá-lo, quero também trabalhar. Se ganharmos as eleições, serei a prefeita e gostaria de poder exercer a minha profissão de veterinária.
          -- Amor. – Beijou-lhe os dedos. – Não precisará trabalhar, eu a sustentarei, desejo que se dedique apenas a cuidar do nosso lar e dos nossos filhos.
           Aquelas palavras incomodaram a jovem, mas ela preferiu não retrucar, pois não desejava discutir.
              -- Comprou algum animal no leilão? – Perguntou mudando de assunto. 
              A garçonete serviu-os e rapidamente se afastou.
           -- Não! – Provou o gelado. – Estavam todos bem caros e o advogado da condessa parecia querer arrematar todos. 
              Maria Clara sentiu um arrepio na espinha ao ouvir a referência.
             -- Ela sumiu do evento, acho que foi ao encontro de um dos amantes.
             A Duomont levou a colher a boca e não pareceu sentir o sabor do sorvete.
             -- Por que diz isso? – Tentou não mostrar interesse.
          -- Ah, meu anjo, você é muito inocente para imaginar o que se passa na mente perturbada daquela mulher. 
               A jovem apenas assentiu incomodada.



              A égua levantou as patas dianteiras.
           Vitória estava no cercado e tentava se aproximar do animal, mas como fora dito pelo vendedor, o bicho era selvagem ao extremo.
               Passou a mão na testa para limpar o suor.
           Os peões observavam tudo do lado de fora da cerca. Miguel parecia apreensivo ao lado de Julieta. A condessa chegou mais perto, entendeu a mão e lhe acariciou, dando-lhe uma maçã.
            O equino parecia desconfiado, mas não partira para cima da amazonas daquela vez. A ruiva aproveitou a oportunidade e tentou montá-la, segurou-se na crina brilhante, enquanto o animal pulava.
             As pessoas gritavam entusiasmadas.
             A condessa se manteve por alguns segundos, até pular, temendo ser jogada violentamente.
           -- Bem, demos o primeiro passo, meu amor! – Piscou-lhe o olho. 
           Caminhou orgulhosa e com um sorriso estampando na face.
         -- Você é louca, menina, esse bicho quase te matou. – Julieta e repreendeu. – Só pode ter um parafuso a menos. 
             A empregada a olhou mais uma vez com ar irritado e seguiu em direção a casa.
           -- Ela está certa! Você poderia ter se machucado seriamente tentando domar esse animal! – O advogado também pareceu não ter gostado.
             -- Não tenho medo de nada, nem de ninguém! – O fitou. – De nada e nem de ninguém! -- repetiu se afastando.
               Miguel observou-a seguir em direção à mansão e preferiu permanecer no mesmo lugar. A` s vezes ficava a pensar de quem a condessa herdara o gênio tão difı́cil, afinal, a mãe da jovem era um doce de pessoa e o pai era um fraco...
             Viu um carro se aproximando e depois Alex e Otávio seguiram para o interior da casa grande.
Não gostava de nenhum dos dois. Tinha a impressão que eles viviam a armar e não confiava nessa história de eleição.
              Pediria para Valentina ficar de olho, pois acreditava que eles estavam a tramar algo.


            Vitória estava na sala quando Julieta abriu a porta e avisou sobre as visitas. 
             A condessa seguiu para o escritório e os esperou lá.
           Otávio e Alex observava o luxo e ficava a pensar como seria interessante poder ter um pouco do que a anfitriã dispunha.
            -- Não estava esperando pela visita! – Apontou a cadeira para que ambos sentassem.
         -- Eu sei e não é nossa intenção irritá-la. – Adiantou-se o jornalista. -- Mas gostarı́amos que visse os projetos da campanha e combinar para ser feita a foto. – Entregou-lhe uma pasta.
             A condessa respirou lentamente, aceitou a encomenda e sentou.
           Analisava tudo com atenção, mas sabia que tudo aquilo era apenas ilusão. Quando ganhassem, decerto, não se preocuparia em cumprir nada que ali estava escrito.
         -- Não se preocupe que não iremos concretizar a proposta do rio. – Otávio se adiantou. – Sabemos que está fora de cogitação.
           -- Eu já disse que nada disso me interessa. – Devolveu a folha. – Apenas estou participando disso para que Frederico não assuma o controle da cidade.
              -- Entendemos, mas precisamos que participe de algumas coisas.
              -- Certo, Alex.
            Vitória ouvia cada palavra dita e nada daquilo fazia sentido. Não tinha nenhum interesse na vida daquelas pessoas.


               Dias depois...
             -- Se conseguirmos o controle do rio será muito bom para nós. – Frederico falava.
             Estavam reunidos com Marcelo, Clarice, Marcos e Felipe.
            Era final de tarde e a famı́lia discutia as melhores estratégias para conseguirem vencer aquela disputa. Maria Clara parecia incomodada com o rumo da conversa.
           -- Em nenhum momento eu vi vocês se preocuparem com as pessoas que estão necessitadas desse lı́quido. – Levantou- se. – Nós estivemos em distritos onde a situação está cada vez pior. O senhor viu, vovô. – Fitou-o.
              Os presentes se entreolharam.
              -- Querida, polı́tica não foi feita para salvar a vida de ninguém. – O prefeito sorriu.
          -- E é o que? – O fuzilou com o olhar. – Usar as pessoas para conseguir o que se deseja? Enriquecer ainda mais? 
              Marcelo ficou vermelho.
            -- Chega, Maria Clara! – Clarice se adiantou. – Acho desnecessárias suas palavras. 
            A garota fitou a todos.
            -- Eu não sei se desejo participar dessa sujeira!
           Felipe observou a surpresa nos rostos de todos os presentes, afinal, àquela era a primeira vez que via a filha agir contra o interesse da famı́lia e ainda pior, enfrentar a todos tão destemidamente.
             -- Como ousa falar assim? – Frederico foi até ela, rubro de raiva.
           -- Eu entrei nessa história pensando que poderia fazer alguma diferença para essas pessoas que estão a sofrer, mas o que vejo é que serei apenas uma marionete usada por vocês. – Acusou. – Fico a pensar se nós não somos piores do que a condessa Mattarazi...
            A jovem não terminou de completar a sentença, pois fora atingida por uma tapa na face que a jogou ao chão.
              -- Nunca mais ouse nos comparar com aquela perdida!
               Felipe foi até a filha, levantando-a.
               Todos pareciam chocados com o que se passou.
               Marcos observava tudo e não fazia nenhuma menção de interceder pela futura esposa.
              Clara se desvencilhou dos braços do pai e saiu do recinto.
             Frederico viu a neta se afastar e sentiu a necessidade de seguir até ela. Aquela fora a primeira vez que encostara na jovem, apesar de tudo, a amava muito, mas a ouvi-la comparar todos à condessa o deixara fora de si.
              O silêncio incômodo caia sobre a sala. 
              Felipe também se retirou.

Comentários

  1. Parabéns a melhor historia que ja li, fico ansiosa por novas postagens.

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