Dolo Ferox -- Capítulo 9



               O transatlântico tinha zarpado do porto há algumas horas. O grande navio seguia pelas águas tranquilas do mar do norte. Passava por perto das pequenas embarcações, demonstrando suas formas colossais e luxuosa. Daria uma grande volta durante aquela semana, levando os tripulantes a uma viagem cheia de prazer e divertimento. O sol brilhava alto, mas havia algumas nuvens que tomavam conta da atmosfera, prometendo algumas tempestades. 
                 As pessoas esperaram partir, observando tudo, até os habitantes da cidade desaparecerem. Alguns passageiros seguiram para a ala de diversão, outros foram aproveitar a piscina e as salas de jogos. O riso das crianças podiam ser ouvidos, enchendo de entusiasmo o condomínio flutuante. Alguns enamorados jaziam abraçados, devaneando sobre as inúmeras coisas que desejavam fazer com seus amores naquela viagem tão romântica. 

               Valentina observava irritada a pomposa decoração do quarto do navio que ocuparia durante aquela semana. Fora acompanhada até ali por um jovem com um impecável uniforme branco. Ele pareceu bastante simpático, perguntando se era a primeira vez a estar em um cruzeiro e relembrando que já tivera o prazer de ver a futura duquesa inúmeras vezes naquele grande navio.
                 A morena tentou não parecer antipática, mas torceu o nariz ao ouvir o nome da ruiva.
                Agora estava nos aposentos, mantinha as mãos nos quadris, enquanto olhava com uma ruga entre as sobrancelhas para o ambiente que ficaria durante aqueles intermináveis dias.
               Uma cama enorme ocupava a parte central e ficava de frente para a enorme parede de vidro que tinha vista privilegiada do mar azul. O assoalho parecia madeira e brilhava sob seus passos. Havia uma mesa com duas cadeiras em fibras… Observou estupefata pela porta um piano de cauda ocupar a outra extremidade dos aposentos…
               Irritada, decidiu se concentrar em outras coisas...
           Um sofá de três lugares… Duas poltronas voltadas para a varanda panorâmica… Fitou o teto…Espelhos sobre a cobertura e um lustre de cristal dava mais luxo ao ambiente…
             Seguiu até as enormes portas e fechou as cortinas, pois estava enjoada com a visão das águas e o aroma marítimo.
         Sentou na beirada da cama, enquanto fitava os próprios pés descalços. Talvez devesse ter colocado mais inflexibilidade ao se negar àquela viagem, não deveria ter cedido, pois agora estaria ainda mais próxima da odiosa mulher.
              Teve a impressão que as bochechas pegavam fogo ao recordar pela enésima vez do encontro que tiveram no escritório. Ainda ouvia o sussurrar ousado, rouco e sensual descrevendo a ilustração que viu no curioso livro. A boca bonita parecia metaforizar a Medusa, pois tivera a impressão que por alguns segundos se perdera naquele encantamento.
              Deu um longo suspiro de exasperação!
              Fitou o relógio que descansava em seu pulso.
              Há quantas horas estava naquele lugar?
           Nem mesmo se importou de ver os bonito transatlântico, isso não era algo que lhe interessasse. Odiava futilidades!
        Sua cabeça não parava um único segundo, os pensamentos corriam soltos, imaginando se conseguiria que alguém pudesse lhe ajudar a fugir para bem longe. Mas não poderia se precipitar, deveria tomar cuidado para não colocar os pés pelas mãos. Precisava apenas encontrar um modo de conseguir que alguém a auxiliasse a deixar aquele navio, mas quem faria algo assim? Pelo que pôde ver eram pessoas diferentes de si, riquinhos que viviam a esbanjar o que tinham em viagens.
             Fechou os olhos e fez uma prece silenciosa, pedindo que a mãe lhe desse orientação.
             Não demoraria para a noite chegar…
             Deitou, tendo as pernas para fora, abrindo os braços como se estivesse em uma cruz. Estava cansada, irritada… Perdida. Comera pouco e agora se sentia enjoada. Viu o próprio reflexo no teto espelhado e de certa forma se sentiu exposta. 
             Ouviu a porta abrir, apoiou-se no cotovelo para olhar de quem se tratava e lá estava a ruiva que estava destruindo sua paz… Sentiu uma mistura de raiva e ansiedade.
               Encararam-se por infinitos segundos.
            Natasha usava biquíni preto que contrastava perfeitamente com a pele branca…Vestia uma saída de praia de tricô, presa em sua cintura por um fino cordão… Os seios redondos pareciam maiores sob o minúsculo pano… Viu as sardas...
               Fitou as pernas longas…Viu os cabelos úmidos… Então ela estava ali… Estava no navio durante todo o dia… E por que não apareceu antes?
             -- Onde está o sorriso de felicidade ao me ver? -- Natasha indagou em sarcasmo. -- Precisa ensaiar essa recepção!
               A circense sentou-se, parecia pronta para mais uma interminável batalha. 
              A arquiteta se aproximou mais. Trazia um sorriso de triunfo na boca rosada. Livrou-se da saída, enquanto ia até o closet e pegava um vestido de noite vermelho.
              Naquele momento Valentina a fitou com uma enorme carranca entre as sobrancelhas, depois desviou os olhos das nádegas bem feitas. 
               Mordiscou a lateral do lábio inferior demoradamente, tentando retomar o controle.
               -- Por que suas coisas estão aqui? -- Indagou levantando-se. 
               Natasha a encarou com a sobrancelha esquerda arqueada.
          A trapezista usava uma camiseta branca colada em seu corpo e um short jeans curto. A gravidez ainda não dava para ser notada…
               A Valerie respirou fundo.
           Chegara ao navio alguns segundos antes dele partir e preferira passar o dia distante, pois estava totalmente fora do seu controle devido ao fatídico encontro com a avó, porém não poderia simplesmente ignorar o único motivo de estar naquele lugar, por isso, depois de relaxar na piscina e beber algumas taças de vinho, decidiu ir até o quarto. Sabia que não encontraria a trabalhadora de circo cheia de amores, mas já estava se cansando de lidar com aquele comportamento arisco.
               Passou a mão pelos cabelos, sentindo-os molhados. Voltou a fitar a morena.
          Temia que sua falta de paciência retornasse, ainda mais devido a forma como a jovem trapezista dirigia a si sua arrogância.
               Lembrou das palavras de Leonardo: “ Seduza-a!”  
               Aproximou-se parando bem próximo a ela, olhando-a, sentindo o cheiro delicado do corpo moreno.
             -- O quarto é enorme, não vejo problema em dividirmos. -- Dizia tentando não se alterar. -- Nem vai precisar dormir agarradinha a mim. -- Caçoou. -- O que eu acho um desperdício… Eu sendo você não perderia uma oportunidade dessas… 
            Valentina se afastou, pois temia não se controlar diante das provocações. Tentava olhar apenas para sua face, não desejando observar o corpo praticamente nu.
            -- Então me coloque naqueles dormitórios que ficam a classe baixa, naquelas treliches, não me importo de dividir com o povão os aposentos.
              Natasha não conteve o riso. De repente gargalhava alto.
          O que se passava consigo? Não era dada a esse tipo de reação. Sempre tivera uma postura muito séria, inflexível e não dada às brincadeiras.
             Chegou mais perto, mas agora não ria tanto, apenas trazia o sorriso debochado. Conseguia ver a raiva naqueles olhos tão negros.
            -- Isso aqui não é o titanic não, criança… -- Arrumou-lhe uma mecha rebelde que cobria seus olhos. -- Só falta imaginar que vai encontrar o Jack e vai ser pintada em pelos… -- Olhou-a -- Se quiser eu te pinto… Posso te desenhar de palitos...
            Valentina observava os dentes alvos a mostra, os lábios bem desenhados, afastou-lhe a mão com um safanão.
              -- Não toque em mim! -- Disse por entre os dentes.
              A ruiva levantou as mãos em sinal de rendição. 
          -- Ok, senhorita, ok, não tocarei em ti, porém vai ter que aceitar que ficaremos no mesmo quarto durante essa maravilhosa semana. -- Pegou o roupão e seguiu até o banheiro. -- Arrume-se que iremos jantar no salão… Estou faminta, baby.
             -- Não me arrumarei coisa nenhuma! -- Esbravejou.
            -- Então vai vestida assim mesmo… -- Piscou-lhe. -- Gosto de olhar para suas pernas… E seus seios ficam lindos na camiseta sem sutiã... Está sem calcinha também?
            Antes que pudesse responder, viu-a fechar a porta.
           Sentiu o sangue subir para a cabeça… A face ardia, enquanto cruzava os braços sobre o colo.               Quem era aquela mulher sem nenhuma educação?
           A trapezista observou-a se afastar e desejou com todo o coração poder abalar aquela parede de concreto que parecia ser ela…
           Cerrou os dentes para não gritar alto sua indignação.


           Leonardo estava no escritório.
       Tinha participado de algumas reuniões durante todo o dia e já se preparava para ir embora quando a secretária avisou da presença de Isadora. Pensou em dispensá-la, mas sabia que não seria uma boa estratégia. 
           -- Deixe-a entrar!
        Sentou-se em sua cadeira e ficou esperando a mulher, não demorando muito para a pomposa duquesa aparecer. Sabia que deveria manter a calma.
           Observava o olhar de cobiça dela por toda a sala.
           -- Para quem perdeu a protegida em um trágico acidente você não deveria estar chorando pelos cantos? -- Provocou-o.
           -- Tenho fé, afinal, o corpo ainda não foi encontrado. -- Respondeu com serenidade. 
           Os olhos claros da mulher se estreitaram, enquanto se aproximava, sentando-se.
           -- Preciso de dinheiro, Nathália já deu as ordens. -- Disse arrogante. 
        -- Nathália não manda em nada e os bens da empresa estão apreendidos… -- Retrucou com calma.
            -- Claro que manda! -- Levantou-se. -- Natasha não tinha herdeiros!
         -- Você está enganada… -- Esboçou um sorriso de canto. -- Valentina espera um bebê e nós sabemos bem de quem é essa criança.
            O rosto de Isadora assumiu toda a raiva que sentia.
          -- Valentina é a namorada da minha filha e óbvio que ambas cuidarão deste filho, mesmo que eu condene pelo simples fato de ter o sangue da Valerie.
            Leonardo fez um gesto de assentimento com a cabeça, enquanto a mirava.
           -- E o marido da sua netinha? Onde ele está? -- Tamborilava os dedos sobre o tampo da mesa. -- Diga-me, duquesa, por qual razão a sua amada neta escolheu logo uma simples trapezista para engravidar da irmã?
          Os lábios da duquesa se fecharam em uma linha fina. Era possível ver em seus olhos que ela sabia muito mais do que falava.
         -- Espero que tenha morrido como a desgraçada da sua protegida! -- Seguiu até a porta, mas parou para fitá-lo. -- Não pense que me enganam… Mas em breve vocês terão uma surpresa... O cavalo de Troia...
           Antoniti apenas esboçou um sorriso tranquilo, enquanto a via deixar o escritório.
           Ela era uma raposa velha e não seria enganada tão facilmente, ele sabia disso.
        Ligou o computador e foi observar as fotos que recebera por e-mail do detetive. Ainda não entendia a razão dele ter colocado a imagem da Valentina ao lado da de Verônica.Fitou as duas demoradamente, deu zoom e algo pareceu impressioná-lo.



          Valentina deixou o banheiro e viu o vestido sobre a cama. Observou a porta onde está o piano fechada e não demorou muito para ouvir o som que a outra produzia.
           Viu sobre a penteadeira as maquiagens disponíveis e pensou que a única coisa que desejava era poder deitar e dormir, dormir e dormir até acordar daquele pesadelo. Poderia simplesmente se negar, mas a Hanminton tinha métodos escusos de fazer com que sua vontade prevalecesse, então o melhor seria acompanhá-la e tentar em meio a todas aquelas pessoas encontrar alguém que pudesse ajudá-la.
           O som cessou e a porta se abriu, ao ver a indesejável acompanhante sentiu falta de ar.
          Como um simples ser humano podia ser tão violentamente lindo? Mas não era a beleza sublime de antes, era um charme que chegava a parecer profano, pecador…
          -- Escolhi o seu vestido, se quiser te ajudo a vesti-lo… -- Caminhou até a muleta de braçadeira.
          -- Não preciso da sua ajuda! -- Rejeitou-a, dando-lhe as costas.
          Natasha deu de ombros enquanto seguia até o espelho para retocar a maquiagem.
       Precisaria estar impecável para se passar pela irmã naquela noite. Tinha certeza que em um daqueles jantares, encontraria a tal amante e esperava com todo coração que isso lhe trouxesse alguma luz para tentar resolver aquele crime.
         Onde estaria a Nathália?
         Era como se tivesse sido tragada pela terra… Estaria viva?
         De repente seus pensamentos foram distraídos pela imagem que viu refletir…
        A circense estava com uma minúscula lingerie branca moldando as curvas magras. Observou-a com cuidado e desejou se aproximar, tocando a pele de cor tão bonita…
         Viu os olhos negros encontrar os seus e sorriu ao ver o rosto ser tingido pelo rosa.
         Valentina sentiu o olhar gulosa para si, então pegou a roupa, seguindo para o quarto onde estava o piano, trocaria-se lá, assim evitaria ter que partir para cima da futura duquesa. 



           O enorme salão estava cheio.
       A decoração toda em dourado se equiparava aos trajes luxuosos dos presentes. Os garçons serviam champanhes caros e aperitivos variados. Um grupo de músicos vestindo fraque produzia as mais belas melodias com seus violoncelos, suas flautas, seus violinos. Alguns casais arriscavam passos de danças no salão. Alguns mais apaixonados que outros, rendiam-se aos beijos e carícias discretas. Homens de negócias discutiam sobre a alta da bolsa de valores… As mulheres comentavam sobre as grifes de Paris, sobre as crianças…
          Valentina observava tudo e nada daquilo lhe interessava.
          Futilidades…
        Apenas descera porque sabia que Nathália cumpriria a ameaça de chamar os guardas-costas para arrastá-la até ali.
      Observava a ruiva conversar com outras pessoas naturalmente. Notava como os olhares dos homens e das mulheres recaiam sobre ela…
          Tomou um pouco de suco.
          Estavam sentadas na enorme mesa e tinha a desagradável acompanhante ao seu lado.
         Sentia o perfume dela a destruir sua concentração… Mirava o perfil forte e vez e outra recebia um olhar atrevido.
        Desde que deixaram o quarto, não trocaram uma única palavras, apenas seguiram em silêncio até ali e continuavam até agora.
        Tentava prestar atenção a comida que era servida, mas nem isso parecia funcionar. Vez e outra sentia a perna dela roçar nas suas. De soslaio via o sorriso que ela exibia.Também se via o decote do vestido vermelho sem alças…
        Ainda não conseguia esquecer de como tivera um choque ao vê-la naquela roupa tão sensual e provocante. A peça se moldou ao corpo como uma segunda pele…
        Viu a muleta que ela usava ao lado da cadeira e ficou a imaginar como tinha se machucado tanto? Será que era verdade que tinha passado por coisas terríveis como falara Leonardo?
           Meneou a cabeça.
           Não… Não…
           Aquela mulher lhe enganara…
         Era casada com um homem e deixara claro que só desejara usá-la… O que teria acontecido se tivesse se entregado a ela?
           Fechou os olhos e recordou-se de uma noite…
          O espetáculo tinha terminado… Ela tinha estado na plateia e ao final  encontraram-se atrás das lonas do circo.
          Beijaram-se...  Mas ainda assim não fora despertado em si a vontade de ir mais longe… Seu amor era puro… Tão distinto da raiva que queimava o tempo todo dentro de si agora…
           Tomou um pouco da bebida, mas não tocou na comida.
           Natasha a fitou.
        Mirou o perfil sério… Observou as alças do vestido branco… O decote discreto não passava despercebido…Por que só agora percebia como aquela garota era bonita?
           Não… 
           Valentina não passava de mais uma das partes podres da vida da irmã.
           Mordiscou o lábio demoradamente, enquanto sentia o calor da perna dela unida a sua. E se transassem? Seria apenas sexo… Apenas carne… Aliviaria por fim aquela vontade de tomá-la para si...
           Por sob a mesa lhe tocou a mão, segurando-a. Sentiu-as ásperas, decerto devido ao tipo de trabalho que desempenhava.
              -- A bolsa de valores teve uma queda assustadora... -- O empresário dizia -- Mas não afetou muito a área de construção civil.
               A ruiva assentiu e falou:
               -- Mesmo assim se o povo não tem dinheiro para construir ou comprar, todos entrarão no mesmo barco. Óbvio que será preciso manter os salários dos funcionários e arcar com todas as outras despesas. -- Natasha usou o polegar para acariciar a palma da mão.
              A trapezista a encarou surpresa, olhou para os presentes, sabendo que não podia fazer um escândalo. Ouvia a conversa e tentava a todo custo se concentrar.
           O toque era delicado… Macio… Ela usava os dedos numa espécie de massagem hipnotizadora.
           Viu a ruiva passar a língua sobre o lábio superior, umedecendo-o… Eles eram sensuais e macios como veludos, mesmo quando beijavam com rispidez. Sentiu a mão ser colocada sobre a própria coxa, tendo a dela por baixo. Sentia os movimentos sobre o tecido do vestido que usava...
               Arregalou os olhos diante da ousadia.
               O que ela estava pensando?
            Sentiu-a forçar ainda mais e não demorou para sentir a delicada calcinha de seda em seus dedos...
                Estreitou os olhos!
                Natasha exibiu um sorriso de satisfação, mas ao sentir o beliscão forte, soltou-lhe a mão.
              Valentina colocou ambas as mãos sobre a mesa, depois tomou um pouco do suco, enquanto via a cara de indignação da arquiteta.
                -- Não acredito que a futura duquesa de Hanminton está nesse cruzeiro…
                Uma voz feminina em tom um pouco mais alto interrompeu seus pensamentos.
                Os presentes na mesa fitaram a bela loira de olhos azuis. Valentina sentiu-se incomodada ao ver o sorriso daquela cópia de beldade de Hollywood.
               Natasha se levantou para cumprimentar a mulher, mesmo nunca tendo visto, tinha certeza de que ela achava estar a falar com Nathália.
              Quando lhe beijava a face em cumprimento, teve os lábios capturados rapidamente por uma boca quente.
               Seria ela a tal amante que Rick falou?
               Esboçou um sorriso.
           -- Desde quando me cumprimenta com tanta cerimônia? -- Questionou, observando-a com atenção. -- Estou acompanhada, mas vou adorar te encontrar depois. -- Mordiscou-lhe a orelha. -- Estou no apartamento 302 A.
               Da mesma forma que se aproximou, a loira se afastou.
               Quem seria ela?
               E se ela realmente soubesse algo que pudesse ajudar a provar a inocência?
           Esquecendo da acompanhante, pegou a muleta seguindo na mesma direção que a estranha criatura tinha seguido.
               Valentina observou-a se afastar e viu os olhares dos presentes cair sobre si.
               A música continuava… As danças prosseguiram…
            De repente o cheiro daquele lugar pareceu ser muito forte para os instintos aguçados da futura mamãe.



               Já era quase duas da madrugada quando Natasha encerrou a conversa com Rick.
         Conseguira entrar em contato com o detetive e contou sobre a mulher que encontrou no cruzeiro. Ele conseguira a ficha dela completa e aconselhou que se aproximasse.
               Rebeka Santiago!
               Suspirou!
              Assim que amanhecesse iria em busca dela e agiria como a irmã. Se tivesse sorte, poderia ter uma boa pista.
               Passou as mãos pelo rosto, estava cansada e sonolenta.
             Seguiu pelos corredores. As luzes tinham sensor e a medida que ela passava, seu caminho era iluminado. Entrou no quarto e estranhou as luzes ainda acesas. Olhou para a cama e viu que estava vazia, então a porta do banheiro abriu e lá estava Valentina.
                Ela usava um roupão e os cabelos estavam molhados.
                Fitou-a e viu como se mostrava pálida.
                Aproximou-se.
                -- O que você tem? -- Questionou preocupada.
                A circense a observou por infinitos segundos, desejando esbofetear aquela cara de cínica que ela exibia com tanta perfeição. Senti-a humilhada por ter sido alvo de olhares quando a acompanhante lhe abandonara para ir atrás de outra diante de todos.
                 Desgraçada! 
               -- Não chegue perto de mim! -- Esbravejou, encarando-a.
           A ruiva suspirou impaciente, estava exasperada de mais para seguir com uma interminável discussão, então não insistiu. Seguiu até a poltrona, encostou a muleta. 
            Valentina tinha passado horas com um terrível enjoo.Desde que chegara no quarto seu corpo fora assolado por um terrível mal estar. Deitou no leito e se cobriu.
             Observou de soslaio a ruiva desligar as luzes, tendo os aposentos iluminados apenas pelo luar que pratinava o mar.
          Viu-a se livrar lentamente do vestido…Observou as formas sensuais e ao fitar a minúscula calcinha, fechou os olhos. Ouviu os passos seguindo em direção ao banheiro e desejou que ela não estivesse ali, desejou nunca tê-la conhecido. Tocou a barriga com ambas as mãos e ficou a pensar o que aconteceria quando a criança nascesse. A arquiteta a afastaria dele? Aqueles pensamentos lhe flagelava a alma…
              Precisava fugir… Precisava ir para bem longe… Mas como o faria? Quem a ajudaria? Pensou em Pepi, mas não desejava que tivesse problemas...
              Tinha algum dinheiro guardado na poupança, poderia sacar e ir embora… Com certeza dava para sobreviver durante alguns meses até que conseguisse um trabalho…
               Estava decidida…
               Virou de lado. Esperava que não tivesse mais enjoos. Suspirou cheia de saudades... Como estariam todos no circo? Ainda estariam na cidade? Sentia falta da simplicidade das pessoas… De voar no trapézio ou dançar…
               Ouviu a porta se abrir…
            Não acreditava que teria que dividir o quarto com ela… Tentara não pensar naquilo, ainda mais quando recordava que fora deixada sozinha para que ela fosse ao encontro da amante…
               Odiava-a!
             Sentiu o cheiro… Não, aquele não era o perfume que ela usava antes… Sentiu-a se acomodar e por dentro esbravejou, mas preferiu fingir que estava dormindo. Fechou os olhos fortemente. Ouvia a respiração dela tão perto…
               Natasha fitou-a…
          Sabia que ela não estava dormindo, porém sabia que ela fingiria que sim. Mas o que lhe importava aquilo? Deveria tentar descansar… Sua perna já começava a incomodar.
             Sentiu o aroma doce da jovem deitada ao seu lado e ficou a recordar como aquilo era algo que nunca aconteceu…Desejou chegar mais perto… Desejou abraçá-la e sentir a maciez do corpo feminino…
               Passou a mão pelos cabelos…
               Tinha bebido mais vinho do que deveria…
               Aproximou-se um pouco mais… Estava embriagada pelo cheiro do corpo jovem e sexy…
               Cerrou os dentes… 
               Levantou-se perturbada.
             Seu corpo depois de tantos anos em total inércia reagia à amante da irmã… Não, aquilo era um verdadeiro absurdo…
              Pegou a muleta, seguiu até a porta que dava para a varanda, seguindo para lá. Deitou em uma espreguiçadeira… Fitou o céu estrelado… A lua majestosa…O cheiro do mar acalmou seus instintos… O que mais desejava era que tudo aquilo acabasse de uma vez por todas… Voltar para sua vida… Para seus projetos… Sua música… Sua solidão… Precisava recordar da criança que estava sendo gerada no ventre da trapezista…
                 O que faria com um bebê?
               Isadora estava certa quando dizia que ela era vazia por dentro… Nem mesmo sentia emoção ao saber que teria um filho…
Quando conheceu a esposa imaginou que tudo seria diferente… Respirou fundo! Desde esse episódio não voltou a tocar em outra mulher… Até agora tudo estava muito bem… Inclinou um pouco a cabeça e viu a silhueta da morena sobre o enorme leito…
Mordiscou o lábio inferior…
                Não, aquilo era apenas o resultado da bebida que estava em seu sangue.
                Fechou os olhos…



               O sol penetrava pela fresta da cortina, iluminava o quarto…
             Valentina despertou. Deitou de bruços… Sentia-se ainda cansada…fechou os olhos desejando dormir mais um pouco.  Ouviu batidas na porta… Abriu os olhos e viu que estava sozinha no quarto.
Suspirou e esperou que o incômodo cessassem, mas parecia que a pessoa que estava do outro lado desejava muito ser atendida.
               Levantou-se, vestiu o robe, enquanto seguia até a porta, abrindo-a.
               -- Bom dia! 
               Valentina observou o jovem com um sorriso gentil.
               -- Bom dia! -- respondeu tentando disfarçar a impaciência.
               -- Essa encomenda é para a senhora Nathália Hanminton.
               A morena observou a enorme cesta de café da manhã e as rosas. Cruzou os braços sobre os seios, enquanto batia o pé direito impacientemente no assoalho.
               Observou mais uma vez a delicadeza do presente e ficou ainda mais irritada.
               -- Ela não está!
              -- Mas deixarei, quando ela chegar, diga que tem um cartão no meio das flores. -- Estendeu-lhe.
               Valentina indicou a mesinha para que fosse colocada.
               O rapaz o fez e logo se despediu deixando o quarto.
A jovem observou o arranjo enquanto permanecia na mesma posição de irritação. Fitou a varanda… Lentamente, seguiu até lá e toda sua raiva acabou quando viu a ruiva deitada sobre a cadeira.
               Passara a noite ali?
               Aproximou-se lentamente.
               A ruiva estava encolhida.
               Mirou o robe entreaberto, mostrando a pele alva. Observou as pernas longas… Chegou mais perto. Percebeu que ela tremia. Estendeu a mão, tocou-a…Parecia fogo puro.
                -- Nathália… -- Chamou-a baixinho. -- Nathália…
                Os olhos verdes se abriram lentamente, pareciam confusos.
                Valentina agachou-se. Voltou a lhe tocar a face. Observou a confusão presente na íris.
                -- Deus, você está queimando!
                A ruiva a encarou, parecia perdida, mas logo voltou a si.
                -- Não é nada! -- Levantou-se. -- Ain… -- Gemeu ao colocar o pé no chão. -- Que droga!
                A trapezista viu a careta de dor em seu semblante.
                -- Apoie-se em mim! -- Disse em um suspiro ao ver que a muleta não estava ali.
                Natasha a fitou de esgueira, mas acabou aceitando.
              Sua perna doía muito, mas ao sentir o aroma que se desprendia do corpo feminino, preferiu sentir o desconforto dos músculos.
              Aproximaram-se do leito e a ruiva viu o bonito arranjo de café da manhã que estava sobre a mesinha.
              Encarou a morena com zombaria.
               -- Que mulher romântica…
              A trapezista a fitou com irritação.
               -- Achas que perderia meu tempo fazendo algo assim para ti? -- Desvencilhou-se.
               A ruiva teve que se apoiar na cama para não cair. Miraram-se em total fúria.
               Os olhos verdes pareciam incisivos… Os negros em total em indignação. 
            Natasha observava os seios da trapezista subirem e descerem rapidamente devido à respiração acelerada.
              Cerrou os dentes.
              Sentou-se, tentando controlar a exasperação.
          -- Não vou discutir contigo, garotinha estúpida! -- Falou, fitando-a. -- não há dúvidas da atração que tem por certos tipos de pessoas…
               Valentina a fitou com as mãos nos quadris.
         -- Imagino que esteja a falar do meu péssimo gosto em relação a ti? Porque eu devo concordar… Primeiro eu tenho um dedo podre… Segundo… Você pode ter toda essa beleza por fora, mas por dentro é vazia… Um bicho… Um animal…
            A ruiva fechou os punhos fortemente e mesmo que estivesse se sentindo muito fraca, levantou-se, apoiando-se na perna dolorida, foi até onde a morena estava, segurou-a fortemente pelo braço, puxando-a para si.
              A circense tentou empurrá-la, mas foi surpreendida por braços que a prenderam em um abraço forte…
                   Valentina inclinou a cabeça para trás para evitar o contato…
                   Os dentes alvos da ruiva se abriram em um sorriso cruel…
                   -- Sim, senhorita, eu sou um animal… tão selvagem como uma pantera…
                Antes que a jovem trapezista pudesse falar algo, seus lábios foram esmagados por outros macios… Cerrou-os para evitar o acesso, mas a língua da arquiteta parecia determinada em seu intuito de invadi-la…
                   Os olhos negros estavam em puro ódio… Os verdes em irracionalidade…
                   Talvez cansada… Talvez desejosa… Valentina sentiu os lábios separando-se e logo a boca era bruscamente tomada…
                   Aquilo era um ósculo… Tão frio quanto se apresentava no dicionário…
                Mirou o verde… Apenas esperando que a outra terminasse o castigo, porém de repente a língua pareceu pronta para saborear com mais cuidado…Sentiu-a contornando-a… Sentiu a fúria virar um carinho sensual… De repente seus olhos não tinham forças para se manterem abertos…
                   Hipnotizada pelo toque… Retribuiu-o…
                   As línguas se enlaçaram…
         Aceitou a dela… Chupando-a com vigor… Mexiam-se… Ousavam…Era deliciosa… Suprema… Nunca sentida tamanha vontade…
                Natasha a trouxe mais para perto… Deixou de abraçá-la para agora lhe tomar as mãos nas suas, tirando a barreira entre seus corpos…
                  Sentiu os seios redondos contra os seus…
                  Excitava-se perigosamente… Ouvia a respiração acelerada…
               Colocou uma das pernas entre as dela… Fê-la praticamente montar em sua coxa… Mexia… Roçava…
             Ouviu o gemido sufocado contra seus lábios. Segurou-lhe a nuca para não quebrar o contato. 
Seu corpo estava quente… Em fogo… Queria-a! Ouvia o som da boca dela devorando a sua… Chupando… Estalando… 
              Valentina sabia que estava perdida ao circundar o pescoço da futura duquesa, trazendo ainda mais para perto de si o rosto odiado.

Comentários

  1. Incrível!!!! Uauuuuuu!!!!!!!!! Até q enfim parece q elas vão finalmente se acertar !!!

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    1. Eu não confiaria tanto nisso, pois ainda há muita coisa entre essas duas mulheres, coisas que estarão entre elas e contra elas, mas ainda vamos torcer kkkkkkk
      Beijão.

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  2. Será que essa duas vão começar a se entender de agora em diante ou continua como "tom e jerry" 😁😁😁😁😁

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    1. eu não apostaria em um acerto ainda... mas quem sabe ne... tudo pode acontecer...
      Beijos.

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  3. Oii autora!
    A Natasha é maravilhosa e a Valentina não vai resistir ao charme da ruiva.
    Espero que a arquitetura a faça voar nas nuvens,e que deixe a trapezista com um gosto de quero mais.
    Se a Valentina ficou incomodada com a presença da outra,isso pode ser ciúmes.
    Até mais autora

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    1. Olá, meu bem, eu mesma sou fã do charme da ruiva, acho ela maravilhosa, mesmo com aquela forma difícil de lida... Não acredito que a Valentina resista a isso por muito tempo não.
      beijosssss

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