Dolo Ferox -- Capítulo 6
Os passos de Isadora eram tão pesados que não conseguiriam ser abafados pelo carpete felpudo.
Nathália devolvera a propriedade a avó assim que assumira o lugar da irmã.
Os homens que a esperavam na sala se vestiam de maneira informal.
Os dois sentavam no luxuoso sofá como se estivessem no banco da praça.
O olhar irado da duquesa caiu sobre eles que imediatamente se recompuseram.
-- Bom dia, madame! -- Fizeram um gesto atrapalhado com a cabeça.
-- Quem deu permissão para que viessem até aqui? -- Indagou furiosa. -- A presença de vocês sujam a honra da minha família… Dos meus nobres antepassados. -- Dizia cheia de pompa.
Os capangas se entreolharam tentando esconder o riso. Sabiam que a ela nada restara, nem mesmo havia empregados para servi-la naquele casarão.
-- Bem, madame, o chefe não conseguiu falar com a senhora e nos mandou avisar que sua neta está na cobertura com a moça do circo.
A pele bem tratada por cremes caros e uma perfeita maquiagem se retorceram de raiva.
Não, tinha certeza de que não se tratava da neta querida, isso estava óbvio para si.
-- Ela não é a Nathália! -- Fechou a mão direita, gesticulando-a no ar. -- Provarei que se trata da Natasha e quando o fizer, a mandarei para a cadeia e ficarei com tudo que ela tem.
Os homens se entreolharam por longos segundos.
-- O chefe não está certo disso… Então ainda preferiu se manter distante, pois pelo que ficou sabendo ela saiu ferida no acidente -- Pigarreou. -- Também não parece acreditar na senhora, afinal, ele mesmo falou que há muito tempo Nathália não a procura…
A mulher se mostrou ainda mais nervosa.
Arrumou o penteado.
Infelizmente a amada filha de Elizabeth sempre estava ocupada com suas coisas e raramente se encontravam. Na verdade, era o maldito marido dela que a proibia que se aproximasse.
Recompôs-se!
-- Pois diga a ele que espere e logo provo que estou certa.
Os homens apenas fizeram um gesto com a cabeça, enquanto Isadora lhe entregava um pacote grande.
-- Diga a ele que precisa me dá mais tempo para conseguir e pagarei tudo…
Os bandidos nada falaram, deixando a mansão imediatamente.
A duquesa caminhou até a porta e viu pela janela de vidro eles se afastarem.
Seguiu lentamente até o aparador, pegando um quadro onde estava a foto de Nathália. Segurou-a, enquanto os dedos faziam traços no vidro.
Não acreditava que estivesse morta e faria tudo para encontrá-la. Tinha certeza de que fora Natasha a responsável por tudo que ocorreu.
-- Desgraçada! -- Falou cheia de ódio. -- Deveria ter morrido… Eu sempre soube que seria a vergonha da minha família… Sangue ruim do pai…
Valentina andava de um lado para o outro no enorme quarto.
Havia uma cama de casal ao centro. Armários embutidos que tinham roupas para serem usadas em várias ocasiões. Havia também perfumes, hidratantes…
Tudo parecia que fora muito bem pensado.
Seguiu até a enorme janela, observou que não havia nada ao redor. Nem lanchonetes, nem lojas, apenas prédios de muros enormes.
Mais um dia trancafiada naquele maldito lugar.
Fitou mais uma vez o móvel em que evitava deitar e sentiu náuseas.
Ouviu batidas na porta logo ela se postou em posição de defesa, pensando que poderia ser a futura duquesa.
Não demorou muito para o homem idoso que estivera consigo em outros momentos entrar.
Leonardo observava cada detalhe da jovem. Via em sua expressão que nada daquilo a agradava, notava o quão irritada estava com a situação.
O homem suspirou!
Não imaginou que Natasha resolveria as coisas daquela forma, afinal, aquele fora o jeito mais difícil, pois contava ainda mais com a antipatia da circense. No dia que estivera ali, tentara inúmeras vezes dialogar com a moça, porém suas tentativas foram vãs pelo que sabia.
-- Senhorita… -- Começou relutante.
A morena o encarou com os olhos estreitados, desconfiada.
Ele pigarreou.
-- Eu sei que está brava… Entendo e como entendo… -- Fez um gesto com as mãos como se pedisse calma. -- Porém precisa ter paciência… A Nath não está bem, passou por coisas terríveis nos últimos meses e acabou agindo por impulso.
A jovem deu alguns passos até ele. Seu semblante estava carregado de raiva.
-- E o que tenho a ver com isso? -- Perguntou com as mãos na cintura. -- Achas realmente que a mim importa o que se passa com ela? -- Meneou a cabeça negativamente. -- A única coisa que desejo, que me interessa é ir embora desse lugar, retornar para junto das pessoas que amo… Quanto tempo vão me manter aqui?
Leonardo fez um gesto afirmativo com a cabeça.
Tentava conciliar as partes, mas tudo parecia ficar ainda mais complicado.
-- Não poderá fazê-lo agora… Infelizmente… Há coisas que impedem que retornem ao circo...
Valentina chegou mais perto e era possível ver em seus olhos a fúria.
-- Irei embora daqui de qualquer jeito! -- Apontou-lhe o dedo em riste. -- Eu odeio essa mulher que age como se fosse a dona do mundo e que não tem respeito pela opinião dos outros… Odeio… -- Repetia por entre os dentes. -- Não desejo vê-la, não quero ouvi-la, diga que se mantenha afastada, pois não segurarei meu ódio dessa vez! -- Ameaçou.
O assistente sabia que não deveria falar, entendia que não deveria ser fácil lidar de uma hora para outra com uma mudança dessas, ele conhecia bem as duas irmãs e sabia como Nathália era dissimulada e isso fazia com que todos simpatizassem com ela, diferente da ruiva, mas não resistiu e falou:
-- Você a amou… Eu sei disso… Ninguém aceitaria uma gravidez simplesmente sem desejar construir algo com essa pessoa!
Por alguns segundos a senhorita Rodrigues lembrou dos sentimentos que a uniram àquela ruiva, do amor que a fazia ver tudo diferente. Do sorriso doce e fácil que tornava seus dias mais felizes.
Engoliu em seco!
-- Eu a odeio! -- Vociferou cheia de exasperação. -- Acredite, senhor, nem mesmo quando soube das barbaridades que essa mulher me fez, odiei-a tanto como agora por suas ações… Pelo menos antes fingia ser um ser cordato, meigo, doce… Agora mostra sem nenhum problemas a face do demônio que é…
Os olhos de Leonardo ficaram marejados de lágrimas ao ouvir o tom usado, a raiva tão concreta que pesava no ar.
Aquelas palavras sempre foram usadas por Isadora para descrever a gêmea e agora não era diferente.
-- Acalme-se… -- Pediu. -- Tome um banho… Pedirei que tragam algo para que coma… No closet há roupas para você, deve usá-las, precisa se alimentar.
-- Não desejo nada!
O homem fez um gesto afirmativo com a cabeça.
-- Mas você vai precisar… então é melhor ser inteligente quanto a isso...
Valentina o viu deixar o quarto e teve vontade de esbravejar, queria gritar sua indignação, queria quebrar todas aquelas coisas chiques que enfeitavam aquele lugar tão frio, mas nada daquilo seria suficiente para extravasar sua revolta.
A enorme sala de exercícios estava vazia.
Natasha estava dentro da banheira cheia de gelo.
Mantinha a cabeça inclinada para trás, os braços apoiados na borda e uma toalha lhe cobria os olhos.
Um suave som invadia o ambiente. Acordes de um piano trazia o imagine do John Lennon tão vivo quanto à atmosfera.
Teria que conviver com as terríveis dores até que conseguisse resolver o problema que a irmã lhe colocara.
Não imaginara em momento algum que o ódio de Nathália chegaria tão longe…
Substimou a avó e a sua gêmea. Imaginara que estava inalcançável com todo seu poder, sua fortuna, porém não contava com a estratagema do destino.
Primeiro a morte da esposa e as acusações sobre o assassinato… Nada fora provado ainda e sabia que precisava descobrir o que realmente aconteceu naquela noite…
Agora tudo aquilo…
Onde estaria a Nathália? Que fim teria tomado? Com certeza sabia que ela tinha escapado e deveria estar armando um novo plano...
Cerrou os dentes.
Não baixaria a guarda… Não mesmo… Estaria pronta para fazê-la pagar por todos os crimes que cometeu…
Mexeu a perna e gemeu beixinho.
Precisava seguir em frente, resolver tudo aquilo o mais rápido possível e poder recuperar sua identidade sem correr o risco de ser presa.
Às vezes acreditava nas palavras de Isadora.
Fora amaldiçoada…
Nascera depois da futura duquesa em uma noite de terrível tempestade…
O parto de Nathália fora tranquilo… No início da tarde deixara o abrigo materno, enquanto a ruiva maltratara tanto a genitora que a matara…
Mordiscou o lábio inferior.
Seria mesmo o demônio de toda aquela história?
Seus relacionamentos seguiam o mesmo caminho tortuoso e por essa razão há tempos desistira de se relacionar com alguém.
Teve vontade de gargalhar ao pensar naquilo…
Jamais se envolveria novamente… Não daria a nenhuma mulher o prazer de rejeitá-la como a própria esposa fez.
Ouviu passos e não foi necessário abrir os olhos para saber de quem se tratava.
Estranhava ele não ter aparecido antes, porém sempre ficava sabendo pela empregada das suas ligações.
Leonardo parou em meio ao enorme espaço, fitando a arquiteta.
Para ela está mergulhada naquela banheira de gelo as dores deveriam estar insuportáveis. Mirou a blusa preta colada a pele . Os cabelos ruivos estavam presos em um coque.
Viu a aliança que jazia sobre a banqueta…
Ela levava sempre consigo aquela joia, parecia uma forma de não esquecer o que tinha acontecido há tanto tempo.
Voltou a fitá-la.
O rosto estava coberto e os lábios entreabertos.
Ouvia o som baixo e relaxante do piano...
Suspirou!
-- Precisa conversar com a Valentina… -- Disse de supetão. -- Nath, se não conseguir convencê-la de que você é a mulher por quem ela se apaixonou teremos problemas sérios, ainda mais porque Isadora não vai demorar a aparecer aqui.
O assistente ouviu a respiração pesada da ruiva.
Impaciência!
Sabia que precisava de tato…
Aproximou-se mais, ficando ao lado da banheira, segurou-lhe a mão.
Fria…
-- Talvez estejamos pedindo muito de você, mas só desejamos salvá-la… Só desejo protegê-la como sempre fiz.
Passaram-se longos segundos…
Apenas se ouvia a melodia e a respiração de ambos.
Natasha mordiscou a lateral do lábio inferior.
-- Eu acho que será mais fácil me entregar a polícia e esperar uma condenação, pois não acredito que consiga fazer Valentina agir diferente…
-- Ela já teve sentimentos por você…
A ruiva se livrou do contato em sua mão, retirou a toalha da face.
Os olhos verdes não traziam emoções.
-- Não esqueça que não sou a minha irmã… Se ela estivesse aqui já teria conseguido há tempos contornar a situação e feito essa garota comer em sua mão. -- Segurou na borda da banheira, levantando-se lentamente. -- Não entendes que não tenho paciência para lidar com isso? não percebes que meus interesses passam muito distante dessa trapezista?
Leonardo a observava pegar as muletas e deixar o recipiente.
Como podia convencê-la? Como poderia lidar com ela? Tudo se mostrava cada vez mais complicado.
-- Então vai ser assim? Se dará por vencida? -- Questionou, enquanto levantava. -- Não acredito que aquela menininha corajosa se tornou esse ser covarde e vencido… -- Provocou-a.
A arquiteta seguiu até a cadeira e pegou o roupão branco atoalhado, vestindo-o.
Seus gestos eram lentos ao amarrá-lo em sua cintura. Parecia ponderar, enquanto fazia algo tão trivial.
Olhava para Antoniti e sabia bem que ele buscava uma reação, a determinação que nunca lhe abandonava.
-- Faz três dias que essa menina está aqui… Não quer comer, não quer usar as roupas, não deixa aquele quarto… -- Encarou-o. -- Vou deixá-la morrer… É isso que farei. Vai morrer lá, pois não estarei disposta a cair em seus dramas! -- Falava calmamente.
-- Vá até ela, tente mais uma vez conversar… Você parece que esquece que ela está esperando um bebê que é seu… Meu bem, você vai ter um filho… Isso não lhe traz emoção? -- Esboçou um sorriso emocionado. -- Imagine se nascer com esses seus cabelos vermelhos e os olhinhos verdes...
Uma criança!
Natasha não parou para pensar nisso de forma tão profunda, na verdade nem mesmo nutria alguma emoção diante desse fato.
Tinha a impressão que estava a assistir a um daqueles filmes cheio de clichês e que não lhe tocava nenhum pouco, apenas a aborrecia.
A ruiva deu um sorriso desprovido de sentimentos.
-- Você realmente acredita nas coisas que fala! -- Meneou a cabeça. -- Como pode acreditar que poderei conquistar essa moça de circo? -- Soltou os cabelos. -- Ela não me interessa de forma alguma… E esse filho… Realmente nem sei o que penso a esse respeito…
Antoniti parecia chocado com aquelas palavras.
Tinha a impressão que estava a remar e não saia do lugar.
-- E alguém já te interessou?
Leonardo se arrependeu na mesma hora ao pronunciar a frase.
Sabia como ela se culpava por não ter sido suficiente para a única mulher que a amou. Sabia como se martirizava dia após dia por não ter conseguido corresponder aos sentimentos…
-- Desculpe…
Natasha mordiscou o lábio inferior demoradamente, mas antes que pudesse responder algo, uma mulher com seus quarenta anos, aproximou-se.
-- A senhorita Valentina continua se negando a comer… -- Disse preocupada e temerosa. -- A comida está intacta...
Natasha nada respondeu, enquanto deixava a sala.
Valentina sabia que estava muito fraca.
Desde que chegara naquele lugar, pouco comera, na verdade, praticamente nada e só tomava água.
Estava indo ao banheiro quando sentiu uma forte tontura, sentou-se na cama.
Fechou os olhos tentando conter a desagradável sensação.
Ouviu a porta ser aberta bruscamente e ao levantar a cabeça se deparou com aquela mulher que só a torturava.
Quem mais poderia ser com aqueles gestos delicados?
Não a tinha visto desde a fatídica manhã e rezara para nunca mais vê-la.
Encarou-a desafiadoramente.
Não baixaria a cabeça, mesmo se sentindo tão sem forças.
Mirou o maxilar firme se contrair.
Fitou os cabelos presos, o roupão aberto…
Usava uma blusa de tecido colante ao corpo bonito… Uma calcinha preta que combinava com a parte de cima… O corpo sensual estava praticamente a mostra, a pele branca da barriga lisa...
As coxas longas e bem feitas…
Viu uma cicatriz longa em sua panturrilha…
Aquilo não estava lá antes…
-- O que foi isso na sua perna? -- Indagou surpresa. -- o que se passou? -- Aproximou-se com a testa franzida.
Natasha recordou de que não havia lembrado desse detalhe… Ultimamente vinha usando uma aperfeiçoada maquiagem para que a marca não fosse notada…
Respirou fundo tentando manter uma calma que não tinha.
A vontade que teve foi de falar tudo de uma vez e deixar bem claro que não era a irmã, mas acabou freando a língua.
Passou a mão pelos cabelos, livrou-os do coque, arrumando-os.
-- Já disse que passei por um monte de coisas quando nos separamos e isso faz parte… Sofri um acidente...
A trapezista encarou os olhos tão verdes, parecia desconfiada, refletindo sobre o que ela tinha dito… Depois deu de ombros, adotando a postura defensiva de sempre. Arqueou a cabeça em desafio.
-- O que quer aqui?
A ruiva se aproximou, ficando a alguns centímetros de distância.
Tinha deixado as muletas e já sentia o desconforto de estar sem elas.
Cerrou os dentes para não gemer.
Observou a amante da irmã com curiosidade.
Pelo menos tinha tomado banho e trocado a roupa…
Usava uma camiseta preta de alças finas que moldavam os seios redondos, ajustando-se a cintura fina… Estava com a calça folgada de algodão que fazia parte do pijama.
Encarou-a e viu o olhar impaciente, enquanto a ponta do pé batia no assoalho incansavelmente.
-- Vou pegar aquela bandeja e vou deixar sobre a cama e você vai comer tudo o que está ali. -- Apontou para a mesinha onde estava a comida intacta. -- Se não fizer, te amarro e te faço se alimentar na base da força.
O tom usado era baixo, mas tinha uma ameaça em cada sílaba.
-- Você acha mesmo que pode me obrigar a fazer tudo o que deseja? -- Incitou-a. -- Acha mesmo que vai me conduzir sempre com ameaças? Chantagens? -- Esboçou um sorriso de canto. -- Você não é ninguém para me dizer o que devo ou não fazer! -- Fungou. -- Na verdade é sim, é um demônio que a única coisa que deseja é destruir a minha vida.
A arquiteta fitava o rosto bonito da circense e pensava se não já estava na hora de levar umas palmadas no bumbum por fazer tanta birra.
Lembrou-se das palavras de Leonardo, do maldito plano que precisava seguir, mas que só o fato de envolver aquela garota parecia praticamente impossível.
Será que a Nathália gostara dela ou fora apenas mais um objeto para ser usado?
Meneou a cabeça, pois algo a incomodava quando pensava que houve um relacionamento entre as duas.
Tentando manter a calma, falou:
-- Estou pensando no seu bem e no bem do bebê que espera. -- Tentava manter um tom ameno. -- Se não quer comer por ti, faça isso por esse ser que cresce em seu ventre que não tem culpa de nada.
Valentina a fitava e observava os traços aristocráticos… Porém tão diferentes…
Por que tinha a impressão que não se tratava da mulher que se apaixonara? Pareciam seres tão opostos...
-- A ti o que interessa de verdade? -- Indagou. -- Não creio que o meu filho seja alvo dessa sua benevolência… Algo me diz que você tem muita coisa a esconder.
Natasha passou a mão pelas madeixas vermelhas.
Observou a jovem ali parada…
Recordou de que se não conseguisse provar a inocência, inúmeras pessoas perderiam seus empregos, sem falar que Leonardo poderia pagar por aquela culpa também.
-- Desejo que esteja bem… -- Disse em um fio de voz. -- Sei que me odeia mais que tudo! -- Aproximou-se, tocando-lhe os ombros delicadamente. -- Mas pense, desejo apenas que tudo entre a gente se resolva… Quero que tudo seja como antes… -- Usou o indicador para tocar a alça da blusa. -- Vamos ter um bebê… -- Mirava os olhos negros. -- Vamos fazer de outra forma…
A morena sentiu aquela sensação estranha que a acometera no dia que fora beijada. Fitou os verdes tão intensos… A boca rosada e carnuda que falava como uma serpente a seduzir sua presa.
Sentiu a tontura ainda mais forte e só não caiu porque Natasha a abraçou, prendendo-a em seus braços.
Arrepiou ao contato com o corpo feminino...
O cheiro amadeirado...
Tentou se afastar, mas a ruiva se colou ainda mais a ela, abraçando-a pela cintura, pressionando-a contra si.
Os rostos próximos…
Era possível sentir os hálito fresco…
Fitou a boca bem feita que antes trazia sorrisos sinceros, mas que agora só exibia sarcasmo e cinismo…
Sentiu-se estremecer...
A voz rouca e baixa lhe tirou dos seus devaneios.
-- Está vendo… Está fraca… Deixe de ser teimosa, moça… Deve ceder...
A circense tentou se livrar das amarras que a prendia mais uma vez, porém não tinha forças para aquilo.
Mirou a boca se aproximando e parecia que tudo acontecia em câmera lenta.
A mão da arquiteta lhe segurou pela nuca, trazendo-a para perto de si.
Sentiu o contato quente…E daquela vez suave…
Fechou os lábios, negando o acesso… Mas sentiu a língua contornar como se estivesse tracejando um desenho…
Com os olhos abertos, fitava o verde que não lhe abandonava a face.
Tentou reagir, mas parecia não ter como fazê-lo…
Lembrou-se da melodia que a ouviu tocar e de repente seus olhos se fecharam…
-- Idiota teimosa! -- A ruiva resmungou ao vê-la desfalecer em seus braços.
Leonardo e Natasha estavam no quarto e observava enquanto o médico examinava Valentina.
A moça desmaiou nos braços da arquiteta.
A ruiva a observava e sentia um lampejo de culpa… E fúria...
Quando a teve desacordada ficara bastante assustada, temendo que algo pior pudesse acontecer, mas a culpava por sua obstinação ridícula em lhe desafiar.
Será que aquela situação não estava indo longe de mais? Não seria melhor esclarecer tudo aquilo de uma vez e exigir que ela falasse o que sabia de toda aquela história sórdida? Aquela proximidade não era algo benéfico a nenhuma das duas. Ainda mais por que não saberia conter a raiva diante da amante da irmã.
Cruzou os braços sobre os seios.
-- E então, doutor? -- A ruiva indagou, fitando a trapezista que já tinha recordado os sentidos. -- O que se passa?
Valentina desviou o olhar dela.
Sentia-se incomodada com a forma que a fitava. Os olhos verdes pareciam desejar penetrar sua alma.
O homem começou guardar o material dentro da maleta.
-- Tenho plena certeza de que o desmaio se deu pela falta de alimentação. -- Encarou os presentes. -- Vou deixar essas vitaminas aqui e precisarei que a senhorita se alimente direitinho.
Doutor Antônio era amigo de Leonardo.
Um homem calvo, baixo, gordinho e de sorriso simpático.
-- Por hora apenas isso que podemos fazer, mas se insistir em agir assim, terei que levá-la ao hospital e obrigá-la a se alimentar. -- Advertiu-a.
A trapezista nada respondeu, pois se o fizesse falaria a verdadeira causa de estar agindo daquele jeito.
Natasha sentou-se na cadeira diante da mesinha, cruzou elegantemente as longas pernas.
-- Eu te acompanho! -- Leonardo se ofereceu, seguindo junto com o médico para fora do quarto.
Valentina evitou olhar para a mulher que ali estava…
Recordava-se dos lábios colados aos seus… Da forma que fora segurada… Subjugada… Se não estivesse tão debilitada, teria acertado aquele rosto cínico.
Selvagem!
-- Bem, você ouviu bem… -- A ruiva se levantou, enquanto levava a bandeja até a cama. -- Coma ou faremos como o doutor sugeriu.
A trapezista observou a sopa na tigela de cerâmica, viu o pão caseiro ao lado e sentiu fome.
Fitou a irritante dona do apartamento.
-- Deixe-me sozinha… Pois a sua presença me tira o apetite. -- Falou baixo.
A arquiteta cruzou os braços sobre os seios. Umedeceu os lábios demoradamente, pareciam demasiadamente secos.
-- Você faz muito drama… Impressão que tenho é que estamos em novela mexicana.
-- Saia! -- Valentina apontou para a porta.
A ruiva fez um gesto negativo com a cabeça, enquanto sentava na beirada do leito. Colocou a bandeja em seu colo, pegou a colher, encheu de sopa e levou à boca da morena.
Os olhos negros se abriram em surpresa.
-- Não precisa disso! -- Protestou.
-- Se você deseja que eu saia daqui, coma... -- Ordenou.
Valentina sustentou o olhar forte por longos segundos…
A proximidade dela lhe fazia mal... Sabia que ela não iria embora…
Mirou os dentes tão alvos entreabertos…
Dando-se por vencida, abriu a boca…
O sabor estava delicioso…
Alimentou-se em silêncio e tentava ao máximo não encarar aquela mulher que não deixava de mirá-la.
Depois de longos minutos tudo tinha sido consumido.
-- Pronto! -- Natasha colocou a bandeja vazia ao lado. -- A partir de agora você faz todas as refeições… -- Levantou-se. -- Pois se for o contrário, terei que repetir a dose… -- Encarou-lhe. -- É isso que você quer? -- Indagou com um arquear de sobrancelha.
A trapezista teve a impressão que ela se referia a cena de antes do desmaio. Desviou o olhar.
-- Saia!
A Valerie a fitou por alguns segundos… Viu as bochechas adquirir um tom rosado e aquilo lhe provocou uma vontade enorme de sorrir, mas não o fez, deixando o quarto.
A circense observou sair dos aposentos e sentiu a respiração voltar ao normal. Não podia permitir que ela se aproximasse tanto… Se não tivesse desmaiado, teria cedido ao desejo de sentir aqueles lábios novamente.
Passou as mãos pelas madeixas…
Não…
Deveria lembrar-se de todas as mentiras que ela contara, de todas as coisas que fingira sentir…
Deveria continuar odiá-la… Não acreditaria em nada que falasse, pois sabia que tudo não passava de suas manipulações…
Quem será o chefe? Qual ligação que ele tem com isadora e Natália. Onde está Natália!? São tantas perguntas sem resposta. Quando começaremos a ter algumas respostas ou já tem e eu não prestei atenção 😞😞😞. Capítulo maravilhoso como sempre
ResponderExcluirAh sim, há muitas indagações para serem respondidas... mistérios que rondam as duas mulheres e que no decorrer da história será desvendados...
ExcluirUm beijo grande e boa noite.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá autora!
ResponderExcluirMuito misterioso essa aparição desses caras na casa da demônia velha que com certeza está também por trás do que aconteceu com Natasha.
Tenho a impressão de que esse chefe deve ser alguém no qual o marido da Nathalia deve muito dinheiro.
A Valentia também não deve saber de nada dos planos da Nathalia,apenas foi usada por alguma razão que depois saberemos.
Natasha vai com calma ou a menina nunca vai falar o que sabe.
Forte abraço autora e até o próximo capítulo.
Não precisa dizer o quanto estou apaixonada por esse enredo.
Val Castro
Olá, Meu bem, realmente Isadora e sua ilustre família nobre parece quer amizades duvidosas... as crueldades contra Natasha parecem que ainda nao cessaram, sem falar o fato misterioso da Valentina...
ExcluirA ruiva precisa ser mais cordata ou vai ter problemas sérios com a trapezista...
Beijo grande e boa noite.
Olá, Geh
ResponderExcluirAdorei o capítulo.
Você escreve muito bem, Chuchu.
Parabéns!
Vanvan^^