A condessa bastarda -- Capítulo 8


           A condessa acelerava ainda mais na estrada de terra. Sua cabeça não conseguia parar de pensar no que acabara de acontecer. Seu corpo ainda tremia com a violência do desejo.
       Freou bruscamente quando já tinha se afastado o suficiente. Estacionou sob uma mangueira enorme. Bateu forte no volante, desceu do veı́culo e começou a socá-lo até perceber o sangue sair dos machucados.



          Clarice entrou no quarto da filha.
         A jovem passara o dia todo fora e quando retornara parecia um pouco perturbada. Ouviu o som de água e esperou pacientemente que ela retornasse do banho.
       Marcos ligara, pois não conseguira falar com a namorada pelo celular que apenas chamava e ninguém atendia. Alguns minutos se passaram até a garota surgir.
      Maria Clara assustou-se com a presença da mãe. Não desejava falar com ninguém naquele momento.
          -- Seu namorado estava te procurando, disse que você não atendeu o celular.
          -- Eu não vi. – Pegou o secador.
          Clarice observou a toalha branca presa ao corpo da filha.
          -- Que manchas são essas em seus braços? – Aproximou-se para ver melhor.
          -- Não é nada! – Desvencilhou-se do toque.
       Ela sabia do que a mãe falava. Quando chegara a casa, viu os hematomas no espelho. A condessa o fizera quando a apertou no momento de raiva.
          -- Como não? – Escandalizou-se a mulher.
      -- Ora, mamãe, a senhora sabe que minha pele branca se marca por um sutil toque. – Impacientou-se. – Eu apenas me desequilibrei e bati ao cair.
            Clarice não pareceu acreditar nas palavras da filha, mas apenas assentiu.
           -- Então, tome mais cuidado e não deixe de ligar para o Marcos. – Beijou-lhe o rosto, deixando os aposentos.
         Clara esperou-a sair e caminhou até a porta, trancando-a. Seguiu a passos lentos até o enorme espelho, despindo-se. Observou as marcas em seus braços e percebeu que havia também em seu seio esquerdo. A pele arrepiou-se imediatamente ao recordar do toque grosseiro, mas que a deixara totalmente embevecida...
        Fitou a mulher refletida ali e pareceu não reconhecê-la. Havia um brilho diferente naqueles olhos orientais, sua pele que antes se apresentava tão pálida, apresentava uma coloração intensa...
            Balançou a cabeça agoniada.
    Aquilo era uma loucura... Deveria evitar encontrar aquela mulher... A condessa era verdadeiramente uma feiticeira e sabia que seria impossıv́  el resisti-lhe.




            Alguns dias depois na delegacia...
        -- Eu ordeno que a senhora tome um posicionamento sobre os roubos dos meus animais! – Vitória bateu na escrivaninha da delegada.
          Valentina estava a examinar alguns papéis quando foi surpreendida pela entrada explosiva da condessa. Um dos policiais pareceu tentar detê-la, mas quem conseguiria segurar aquela mulher.
            -- Como ousa entrar assim na minha delegacia? Poderia prendê-la por sua petulância.
            -- Faça-o! – Desafiou-a. – Afinal, o seu trabalho se resume a deter-me.
          A delegada observou os olhos verdes brilharem. A ruiva usava calça jeans, preta, camiseta e botas. Os cabelos estavam soltos, selvagens...
         Se um dia tivesse uma filha, esperava de todo coração que não tivesse aquele temperamento forte...
          -- Sente-se! – Apontou a cadeira para ela. – Diga-me o que se passa dessa vez. – Tentou manter a calma.
         -- Não, não o farei! – Estreitou os olhos ameaçadoramente. – Os Duomont estão roubando meus animais descaradamente e nada está sendo feito. – Apontou-lhe o dedo. – Quando eu agir, não me importarei de passar sobre a sua autoridade.
         Valentina observou-a sair do mesmo jeito que entrou, feito um furacão.
          Respirou fundo e discou para o marido. Depois de chamar algumas infinitas vezes, ele atendeu.
        -- Amor, por favor, tente conversar com a Vitória, ela esteve aqui ainda pouco, mais irascível do que de costume.
         -- Por quê?
         -- Queixa-se de que Frederico está roubando seu gado.
         -- Investigue, então, deve ter fundamentos o que ela diz. Valentina impacientou-se.
        -- Eu não sei se tem ou não fundamento, pois a sua cliente não faz uma denúncia formal, apenas invade minha delegacia e começa falar como se mandasse em mim. Hoje, acontece o noivado de Maria Clara com Marcos, então faça com que a condessa permaneça o mais afastado possível disso. – Irritada, desligou.




           -- A ordem é atirar em qualquer um que invada as minhas terras! – Ela dizia.
           Os empregados estavam reunidos no pátio e a mulher dava ordens como se fosse um general.
        Batista e Julieta trocaram olhares de cumplicidade. Sabiam que algo tinha acontecido com a condessa naqueles últimos dias. Todos conheciam a personalidade forte da herdeira de Vitório, porém havia algo a mais. Ela estava mais arredia do que de costume. Irritava-se com coisas que antes não seriam motivos para isso. Estava mais fechada, ainda mais calada, arisca e mal humorada.
        -- Se não o fizerem, eu atirarei em vocês! – Gritava. – Fiquem de olho no rio, não quero ninguém passeando por lá.
         Os empregados sabiam não poder ir contra as ordens da patroa, porém temiam agir da forma ordenada acabassem os envolvendo em problemas.
        Miguel estacionou o carro em frente à casa grande e observou os empregados se dissiparem. Caminhou até a condessa que o observava com as mãos nos quadris.
        -- Sua mulher não perde tempo mesmo, não é? – Provocou-o. Todos seguiram para seus afazeres, deixando ambos sozinhos.
             O advogado parou bem próximo a ela, retirou os óculos e fitou-a.
             -- Podemos conversar?
            -- Não, não posso e não quero conversar com ninguém. Miguel a observou se afastar, pisando duro.
             -- Ela está assim há alguns dias!
             O homem ouviu a voz da bondosa Julieta, virou-se para ela.
             -- Mas o que aconteceu?
           -- Não sabemos! Simplesmente, ela tinha ido para uma reunião do partido e retornou assim. Nesse dia, ela embriagou- se e quando o Batista e eu a levamos para o quarto ao ouvimos chamar um nome. – Disse em tom confidente.
              -- Que nome?
              -- Maria Clara!
              -- Maria Clara? – Indagou arqueando a sobrancelha.
            -- Sim, ela o chamou até cair no sono profundo.
             O advogado beijou-lhe a face, despedindo-se.
             A velha senhora o observou seguir atrás da patroa.
            Conhecia-o desde que era um menino, da mesma forma que conhecera sua irmã. Ambos eram órfãos e viveram em um abrigo até completarem dezesseis anos. A irmã era dez anos mais velha e cuidara dele como se fosse sua mãe, até conseguir um emprego e cair em total desgraça.


             O advogado foi até o estábulo e lá estava ela cuidando do cavalo.
             -- Por que estás assim?
            -- Pensei que tivesse ido embora, não estou com nenhuma vontade de conversar. – disse sem se voltar. Miguel conseguia sentir a tensão daqueles ombros. Ela estava apoiada na porteira e fitava o Bastardo.
              -- Aconteceu algo?
               -- Sim! – Virou-se. – Os malditos Duomont estão a me roubar e a sua mulher não faz nada!
             Ele observou os olhos verdes que traziam algo diferente. O homem a conhecia bem, aquele olhar lindo só exibia sarcasmo, ironia, raiva e sadismo... Mas havia outra coisa ali, só não conseguia decifrar do que se tratava.
            -- A Valentina irá investigar e se Frederico estiver fazendo isso, ela o irá prender. – Deu alguns passos até ficar bem próxima a ela. – E a Maria Clara?
             O advogado pronunciou o nome pausadamente, observando o lampejo diferente naquele olhar que rapidamente fora substituído por fúria.
                  -- Essa eu odeio ainda mais!
                 Miguel a viu sair pisando duro e algo começou a alarmar em seu cérebro. Decerto era coisa da sua cabeça fantasiosa, aquilo não tinha nenhum fundamento.
                 Decidiu retornar para a cidade, mas prestaria mais atenção às duas mulheres.




                 Maria Clara observava da janela do quarto os empregados arrumando o enorme pátio para a festa de noivado que aconteceria dentro de poucas horas. Tudo estava impecável. Havia mesas e cadeiras. O evento seria aberto ao público. Aquela seria uma forma para angariar mais votos, de acordo com o avô.
                No dia anterior, viu muitos animais indo para o abate, mas não sabia de onde tinham vindos, afinal, a família tinha poucos, decerto havia comprado ou Marcelo tinha cedido algumas cabeças.
                Fitou o vestido estendido sobre a cama. Era um modelo delicado e exclusivo, feito por um grande amigo da sua mãe, um estilista de renome no badalado mundo da moda. A roupa era branca, chegava quase nos joelhos. Sobre o busto havia um decote em renda, o que se repetia na cintura, como uma espécie de cinto. Ele não tinha mangas, deixando os ombros e braços a mostra.
               Em breve casaria com Marcos. Tinha certeza que ele seria um marido maravilhoso, porém não conseguia sentir mais o entusiasmo de antes.
            Observou as terras que se estendia ao longe e sentiu um arrepio na nuca ao lembrar-se de lindos olhos verdes. Há dias não a via e nem sabia nada sobre a poderosa condessa Mattarazi. Melhor que fosse assim, não deveria se aproximar daquela mulher por nenhuma hipótese.




               A noite tinha chegado...
           Havia uma multidão reunida nas terras dos Duomont. Toda a cidade fora convidada. Havia muito churrasco, uma variedade de bebidas e outras iguarias que fora feitas especialmente para celebrar aquele momento.
            O terreno plano e extenso trazia muitas mesas, um palco fora montado e uma banda local se apresentava cantando baladas animadas.
             Os noivos, sorridentes, cumprimentavam todos os que chegavam, Frederico e Marcelo faziam o mesmo.
            Valentina observava tudo um pouco afastada. Não estava ali para se divertir, fora praticamente obrigada pelo prefeito a marcar presença naquele local, a justificativa era que desejava que ela e os policiais cuidassem da segurança de tudo
            Observou o evento. Sabia que era mais uma forma de enganar a população, davam comida ao povo faminto, ao povo que pouco via tanta carne em suas mesas.
            De repente, ouviu o trote de um cavalo e ao olhar em direção à entrada da fazenda, conseguiu ver Vitória montada em seu garanhão preto.
             Não pôde detê-la, pois ela passara como um raio por si.
             Santo Cristo!


             Maria Clara sorria com um elogio que o avô tinha lhe feito, quando viu aquela mulher vestida de preto sobre sua imponente montaria. Ela vinha orgulhosa, exibindo aquela pose de amazona, aquela arrogância que a fazia parecer a verdadeira dona do mundo.
             Encarou-a e viu o sarcasmo brilhar naquela pupila. Sentiu a pele se arrepiar. A banda parou de tocar e todas as atenções se voltaram para a invasora.
               -- Como ousa aparecer aqui? – Frederico gritou. – A presença de uma assassina bastarda não é bem vinda em minhas terras e nem nessa cidade.
               Vitória exibiu aquele largo sorriso, arqueando a sobrancelha ironicamente.
            -- Como não sou convidada? – Indagou ainda mais alto. – Não são os meus bois que estão sendo servidos para os seus convidados?
               O fazendeiro ficou demasiadamente vermelho, então Clara tomou a frente.
              -- Saia daqui! – Fitou-a. – Como já foi dito, sua presença não é bem vinda e suas insinuações são maldosas. O garanhão deu um passo para frente e a garota recuou assustada.
              Ela observou-a. Os cabelos ruivos estavam soltos, dando aquele ar selvagem e poderoso.
              -- Não estou a falar contigo, princesinha falsificada de contos de fadas.
             A jovem sentiu o rosto corar e teve vontade de bater bem forte naquela atrevida até que aquela expressão debochada saísse de sua face.
              -- Vitória, acho melhor você se retirar! -- Valentina tomou a frente de nora do prefeito.
          -- Exijo que você prenda essa mulher agora mesmo! – Marcelo se posicionou.
           A condessa relanceou os olhos tediosamente.
          -- Você fica calado, seu idiota, ladrão e prefeito de meia tigela. As pessoas começaram a rir.
        -- Chega, Vitória! – A delegada a repreendeu. – Saia imediatamente daqui.
           A imponente amazona fitou a noiva.
       -- E você, bonequinha de bolo, não ouse falar assim comigo... Não ouse mesmo...
          A jovem Duomont via o verde brilhar perigosamente.
     -- A senhora não é bem vinda a minha festa de noivado, condessa Mattarazi! – Falou pausadamente cada palavra dita.
           -- Como não? Se eu já provei até do bolo... – Piscou ousada.
            Sem mais, a bela saiu em disparada do mesmo jeito que chegou.
            Clara sentiu o rosto pegar fogo com o comentário maldoso feito por ela.
          -- Prenda essa mulher, delegada! – Clara estava enfurecida. – A condessa não pode agir como se fosse a dona de tudo e pudesse fazer o que desse na telha.
          Valentina encarou-a e percebeu como ela estava transtornada. Algo que não combinava muito com a personalidade tranquila da mesma.
           -- Chamem um médico, Frederico não está bem. – Clarice gritou. Maria Clara correu até onde o avô estava.
      A delegada seguiu para a fazenda Mattarazi, mas os seguranças barraram sua entrada. Infelizmente, não tinha como Valentina e dois policiais enfrentarem todos os seguranças da condessa.
             -- Chamem a Vitória! – Ordenava.
         -- Eu sinto muito, mas as ordens que recebemos foram claras, ninguém tinha permissão de entrar.
             -- Isso é um desacato a minha autoridade! – Apontou-lhe o dedo.
             -- A senhora tem uma ordem judicial?
              A mulher bateu forte no capô do próprio carro.
             -- Não, mas amanhã a terei, então avise a condessa que eu virei pessoalmente prendê-la.




            Maria Clara esperava pelo médico que ainda estava atendendo o avô.
            A festa terminara precocemente. As pessoas foram dispensadas e só ficara a famı́lia. A famı́lia do noivo também esperava.
            Marcos estava sentado no enorme sofá e aconchegava em seus braços a futura esposa.
           -- É um absurdo o que aconteceu. – Marcelo comentava. – Aquela mulherzinha não vale nada. – Encheu um copo com uísque e tomou de uma vez. – Temos que destruı́-la de uma vez por todas.
            -- Um milhão de vezes maldita... Assassina... – Clarice completava.
          A jovem Duomont sentia a revolta crescer ainda mais em seu peito. Sabia que todos estavam certos e se culpava por ter se mantido neutra diante daquela situação. Vitória Mattarazi era um demônio, alguém que não se importava com nada e nem com ninguém, um ser humano que teve coragem de matar o marido e a própria famı́lia para ficar com toda a herança só poderia ser classificada como um monstro.
          -- Bem, o senhor Frederico quase sofreu um AVC. – O médico falou logo. Todos se levantaram.
-- Mas graças ao atendimento rápido, isso pôde ser evitado. Dei-lhe um sedativo forte e com certeza não despertará hoje.
          -- Mas ele vai ficar bem, doutor? – Clara foi até o homem de meia idade.
         -- Sim, senhorita, porém não pode haver mais aborrecimentos ou temo por algo pior.
         Felipe veio até eles.
        -- Obrigada, doutor! – Estendeu a mão. – Agradeço por ter vindo rapidamente quando solicitado.
        -- Fiz minha obrigação! – Aceitou a saudação. – Amanhã retornarei para ver como ele acordara. Boa noite a todos.
      -- Acho melhor também irmos embora! – Marcelo levantou-se. – Já está um pouco tarde e devemos descansar, pois a noite foi muito agitada.
       Os demais concordaram e depois das despedidas seguiram para casa. Clarice beijou a filha e subiu para o quarto.
         Felipe tomou um drinque e ficou a observar a jovem que estava com o olhar perdido. Distante... Não só naquele momento percebera isso, mas também enquanto comemoravam seu noivado. Não havia brilho naqueles lindos olhos e seu sorriso meigo não exibiam a felicidade de outrora.
         Caminhou até ela, agachando-se, segurou-lhe as mãos.
         -- O que há, minha linda princesa?
      Clara mirou os olhos compreensivos do pai. Ele sempre conseguia saber quando algo estava errado consigo.
         -- Estou preocupada com o vovô. – Desviou o olhar.
      -- Ele ficará bem, é um homem forte e ainda tem muito para viver. – Segurou-lhe o queixo, fazendo-a encará-lo.
         -- Mais alguma coisa a incomoda?
         A jovem mordeu o lábio inferior.
         -- Papai, por que a condessa matou toda a famı́lia? Não havia dinheiro, o fez apenas pelo tı́tulo?
         -- Vitória Mattarazi é um mistério e não acho que seja bom você tentar desvendar.
         -- Você teve contato com ela antes?
      -- Não! Nem mesmo quando a Helena começara se relacionar com o Vitor, poucas vezes a encontrei e nas vezes que o fiz sempre a achei orgulhosa e arrogante de mais.
          -- O senhor acredita que ela é uma assassina fria?
        -- Eu não sei. Sempre tive a impressão que ela era uma mulher sem sentimentos, mas não poderia afirmar algo assim. – Beijou-lhe a testa. – Vou dormir e espero que faças o mesmo.
          A garota apenas assentiu.




         Vitória bebeu mais uma dose de cachaça.
       Desde que retornara da fazenda dos Duomont afogava sua raiva na bebida. Estava deitada no estábulo, sobre o feno.
        Dispensara todos os empregados e até mesmo os que faziam a segurança da fazenda. Desejava ficar sozinha com seus pensamentos.
         Bastardo a observava e parecia não aprovar a postura da dona.
         A condessa fechou os olhos e recordou-se de algo que parecia lhe apertar o peito.
        -- Maldita, Maria Clara! – Jogou o copo longe.
       Lembrou-se de como tivera ganas de passar por cima dela com o cavalo. Queria pisoteá-la para que assim pudesse expurgar aquela fúria que queimava em si.
        -- Quem ela pensa que é para falar comigo daquele jeito? – Gritou.
        Que ficasse com aquele idiota do Marcos. Ambos se mereciam.
        Nunca odiara tanto uma pessoa em sua vida, como odiava a neta de Frederico. Seu maior desejo era destruı́-la, fazê-la implorar por misericórdia, rastejar aos seus pés... E quando esse dia chegasse, passaria por cima dela e mostraria que com a condessa não se brinca.
          Como ela poderia estar ainda mais linda... Seu corpo queimava de raiva... e de desejo...


      Maria Clara acelerou ainda mais. Esperara que todos dormissem para sair. Sabia que não aprovariam seus atos, mas quando ligara para a delegada e ficara sabendo que a condessa continuava impune, sentira o sangue queimar nas veias. Seu avô quase morrera por culpa daquela mulher e dessa vez ela mesma acertaria as contas.
          Pensou que seria interceptada pelos capangas armados que Vitória usava para se defender, mas o caminho até a casa grande estava vazio. Não havia uma única alma viva por aquelas terras.
           Estacionou, descendo.
      As luzes estavam acesas, mas o lugar parecia abandonado. Já era tarde, deveriam ter se recolhido... Pensou que não fora uma boa ideia ir até lá naquele momento...


      Vitória ouviu o barulho de automóvel e ficou a imaginar quem poderia estar ali uma hora daquelas. Tentou caminhar, mas sentiu uma dor forte no ombro e percebeu que fora atingida por um projétil.
          Bastardo relinchou.
       Maria Clara ouviu o animal e seguiu até o lugar. Ao chegar ao estábulo viu a bela Mattarazi apoiada na baia. Ela estava de costas para si.
          O que ela estaria a fazer naquele lugar tão tarde da noite?
          -- Precisamos conversar, condessa! – Disse firme.
         Vitória pensou estar sonhando ao ouvir o som daquela voz. Respirou fundo sentindo que perdia as forças.
          -- Vá embora daqui! – Disse pausadamente.
         -- Não irei. Vim aqui para exigir que deixe minha famı́lia em paz, que suma das nossas vidas... – Segurou-a pelo braço, a virando.
         Os olhares se cruzaram...
         A neta de Frederico observou o ombro sangrando.
         Aproximou-se rapidamente, segurando-a, pois temeu que ela caı́sse.
        -- O que houve? – Indagou preocupada. – Quem atirou em ti. – Tentou estancar o sangue com a mão, mas fora uma tentativa em vão.
        Ajudou-a sentar. Tirou a própria blusa e pressionou sobre o ferimento.
        -- Quem fez isso?
        -- Você... – Cerrou os dentes de tanta dor que sentia.
        Clara a fitou confusa.
      -- Preciso te levar ao hospital. Tenho que chamar alguém, pois não terei como te arrastar até o carro. – Falava desesperada.
        -- Não... não há ninguém... Vá embora... – Tentou se desvencilhar do toque. – Deixe-me sozinha.
        -- Fica quieta ou vai ficar pior. Observou a blusa já encharcada.
        -- Se você não for atendida logo, sangrará até a morte.
        -- E isso te importa... ?
        Maria Clara deu de ombros e mesmo contra a vontade dela, deitou-a sobre o feno.
        -- Segure! – Colocou a mão dela sobre a ferida. – Já volto. Vitória a observou se afastar.
        A dor estava ficando ainda mais insuportável. Mordeu forte os lábios para não gritar.
       Chegou a imaginar que a garota tinha ido embora, até ouvir os passos se aproximarem novamente e aquele cheiro doce invadir o ambiente.
        -- Trouxe o kit de primeiros socorros e o carro para mais perto. Tentarei estancar o sangramento, enquanto peço por
ajuda.
       -- Eu achava que você era doutora dos animais... – Gracejou, respirando acelerado. – Será que está a me confundir com uma égua? – Debochou.
         -- Como ousa fazer piada em uma hora dessas? – Repreendeu-a.
        Rasgou-lhe a camiseta com a tesoura, retirou-lhe a mão para observar melhor o ferimento. Não parava de sangrar, preocupou-se.
       Rapidamente pegou gases e depois enfaixou, apertando forte para deter a hemorragia. Tirou o celular do bolso.
       -- Diga-me o número de alguém, precisamos de ajuda urgente. – Observou o aparelho e notou que não havia sinal. – Droga! – Praguejou.
         A condessa tentou levantar, mas a dor parecia ter lhe paralisado os movimentos.
         -- Leve-me... – Gemeu. – Miguel, na casa da delegada.
         -- Melhor seguirmos direto para o hospital.
         -- Não...
         Clara assentiu.
         -- Por favor, me ajude a te levantar... Contarei até três e você impulsiona o corpo...
        A condessa conseguiu sentar... Observou aqueles olhos escuros mostrarem preocupação... ou seria culpa?
         -- Agora precisa ficar de pé! – Segurou-lhe o queixo, fazendo-a encará-la. – Você consegue... Eu sei que consegue...
          Vitória fez o que lhe fora mandado e sentiu que em breve não teria mais forças. Desmaiaria em breve, pois seu corpo não obedecia mais os comandos.
           Maria Clara, com muito esforço, conseguiu levá-la até o veı́culo. Observou a tez pálida e sentiu medo de que algo ruim acontecesse com aquela mulher.
            Deu partida no veı́culo e acelerou, pois sabia que o tempo era seu inimigo naquele momento.
           Enquanto estava a caminho, discou para Valentina e explicou o que tinha ocorrido. A delegada parecera surpresa, mas imediatamente providenciará um médico e avisou ao marido.

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