A condessa bastarda -- Capítulo 6
Vitória aproveitou a companhia, mas não desejava ficar mais naquele lugar. Alguma coisa tirou-lhe todo o humor. Nem mesmo a cara de raiva dos Duomont e dos Ferraz a estava divertindo, como era de costume. Observou Maria Clara ser beijada pelo namoradinho e sentiu tanta raiva que nem mesmo entendeu o porquê.
Tomou todo o conteúdo do copo e sentiu a garganta queimar.
Fitou-a mais uma vez e dessa vez foi encarada. Estreitou os olhos ameaçadoramente, porém a atenção da outra tinha sido tomada pelo namorado que lhe segurou a mão, levando-a para ver o show pirotécnico.
-- Quero ir embora! – Disse levantando-se.
-- Mas ainda é cedo! – Juan falou. – E está tudo tão bonito!
-- Entenda que precisa ser mais vista, é a nossa candidata e precisa se misturar com o povo. – Alex interferiu.
-- Se não me viram é porque estão cegos, quanto a me misturar... Estou sufocada com essa atmosfera. – Saiu apressada.
O empresário mexicano observou-a se afastar, atônito, mas se recuperou rapidamente seguindo-a, tentando alcançá-la em meio à multidão.
Naquela noite a condessa se jogou ardentemente nos braços do amante latino. Desejava mostrar a si mesmo que era ela quem dominava o próprio corpo e o desejo. Sempre fora passional, adorava e não tinha tabus quando se tratava de prazer. Casara ainda muito jovem, mas nunca fora tocada pelo marido, ele a tinha como um enfeite, alguém a se expor, a se admirar e exibir. Então quando ficara precocemente viúva, se entregara aos prazeres da carne. Escolhia a dedo o homem que lhe tocaria, pois gostava de dominar, de estar no controle daquele jogo excitante. Gostava do sexo, porém ele nunca era suficiente, ao final do ato havia aquela sensação de vazio que sempre perdurava...
Ouvia as palavras enamoradas do rapaz, suas carı́cias... Fechou os olhos e se assustou ao ter em seus pensamentos a neta de Frederico...
Ao terminar o ato, percebia que algo parecia ter saı́do errado e sabia que não fora Juan quem o cometara.
Maria Clara ficou durante alguns minutos sob a ducha. Precisava relaxar os músculos e se livrar daquela tensão.
Já era quase três horas quando foi deitar.
Chegara bem tarde da festa. Não que não estivesse divertida, mas algo tirou sua paz e a deixara muito agitada.
Lembrou-se de tudo ter piorado quando viu a condessa deixar o evento, acompanhado com o tal mexicano. Ficou nauseada só em imaginar que ambos naquele momento deveriam estar fazendo amor...
-- Eu devo estar ficando louca! – Cobriu a face com as mãos.
Desde quando se importava com o que aquela mulher fazia ou deixava de fazer? Então, sua mente a levou para aquele dia no estábulo, quando sentiu o toque dela e seu corpo pareceu ganhar vida.
Nunca em sua vida acontecera algo assim.
Ela era virgem. Sempre desejara se mantiver casta até o dia do casamento. Queria pertencer apenas a um homem e essa união duraria para toda a vida. Tivera apenas dois namorados e não se lembrava de ter sentido uma excitação tão poderosa como aquela que ocorrera naquela noite. Na verdade, nunca tivera essa necessidade, essa agonia que parecia queimar a carne e tirava-lhe todo o ar dos pulmões.
Sentiu os seios reagirem ao recordar daqueles lábios.
Como uma mulher podia ser tão linda e tão perigosa? Recordou do sarcasmo sempre estampado naquela face, a boca que se movia sempre com deboche... Os olhos... Esses eram perigosos de mais, ousavam, invadiam como se fosse a senhora de tudo e de todos...
Levou as mãos a cabeça, parecia desesperada.
Necessitava de que aquela sensação passasse. Precisava sufocar aquele desejo que chegava a sufocá-la.
Mordeu o lábio inferior e sentiu as lágrimas rolarem, banhando-lhe o rosto. Soluçou e pediu a Deus que a perdoasse pelos sentimentos que pareciam apossar-se de si.
Vitória Mattarazi treinava incansavelmente.
Bastardo já estava totalmente recuperado e ela desejava participar da competição regional de equitação.
Aquela era a sua maior paixão.
O irmão a ensinara a montar quando ainda era uma menininha. Vitório nunca se importara com a filha, às vezes tinha a impressão que ele a odiava, porém não entendia o motivo de ele ter aceitado cuidá-la. Talvez, ele tivesse um pouco de consciência ou temesse um escândalo, afinal, a amante morrera porque ele se negara a ajudá-la...
Engraçado, nunca pensara na mãe. Sempre a viu apenas como um personagem figurinista, a incubadora... Concentrou-se...
Aproveitaria esse tempo para fazer o que mais gostava, pois no próximo mês começaria a campanha para a prefeitura da cidade e ela precisaria se empenhar, ao menos que quisesse ver o municı́pio nas mãos de Frederico Duomont.
Não tivera mais contato com Maria Clara e isso lhe devolvera a paz de espı́rito. Não gostava dela, odiava as sensações que ela lhe fazia sentir. Era como se fosse um feitiço, uma forma de magia que a deixava frágil.
Pulou mais um obstáculo e mais um.
Sua disciplina e talento já a fizera ganhar muitos campeonatos e o último fora o que mais lhe agradou, pois vencera a garotinha de cara de princesa de conto de fadas.
Sorriu!
Deve ter sido horrıv́el para aquela famı́lia ver sua doce mocinha ser derrotada pela condessa Mattarazi. Acabou o treino, mas não desmontou, saiu em disparada pelas terras que fazia parte de sua propriedade.
-- Esse rio faz parte da cidade. – Maria Clara falava. – Temos que usá-lo para que nosso povo não sofra com a falta de água que já é uma realidade de todo o paı́s.
Os membros do partido pareciam satisfeitos com as palavras da candidata.
-- Mas não devemos esquecer que ele se encontra quase totalmente localizado nas terras de Vitória Mattarazi e que ela nem mesmo permite que os animais passem por lá para tomar água. – Marcelo falou.
-- Deve existir uma solução para isso! – A jovem falou. – Irei dar uma olhada na região para buscarmos uma forma de usá-lo.
A neta de Frederico fora chamada pelo sogro para uma reunião com o secretário do governador. Eles discutiam os problemas da falta de recurso hı́drico e buscavam uma alternativa para contornar aquele problema. A população estava a cobrar, pois aquela fora uma promessa do atual prefeito para se eleger e até agora nada fora feito. E isso era muito ruim para a campanha de Clara e Marcos.
A jovem se despediu e seguiu para o carro. Era quase hora do almoço, mas decidiu não ir para a casa. Seguiu pela estrada e foi até o rio. Desejava encontrar um jeito para usufruir da água e ajudar aquelas pessoas que dela necessitavam.
Estacionou o veı́culo e ficou a observar a correnteza.
Havia cercas no local, e pelo que ficara sabendo, mais para frente havia seguranças armados que não permitia que ninguém se aproximasse.
Retirou o celular da bolsa e fotografou. Era um lugar realmente lindo. Havia um caminho todo arborizado que chegava a margem...
Desceu do veı́culo, encantada, com a paisagem, mas foi tirada do transe quando viu o garanhão preto vir em sua direção tendo sobre si a amazona ruiva.
Sentiu as batidas do coração acelerarem.
Há dias não via e não pensava nela. Conseguira sufocar aquela agonia e a paz voltara a reinar em seu corpo, porém agora, vendo-a se aproximar tão imponente, com os cabelos ao vento, sentiu a pele se arrepiar.
-- O que faz em minhas terras? – A condessa perguntou sem desmontar. – Já disse para você não pisar na minha propriedade.
-- O rio não é sua propriedade, é de todos dessa cidade. – Clara a enfrentou.
A condessa não pareceu gostar das palavras que ouviu e avançou ainda mais com o cavalo. Clara recuou mais, até se encostar no veı́culo.
-- Vai tentar me pisotear de novo? – Desafiou-a novamente.
-- Já mandei você sair das minhas terras. – Falou por entre os dentes.
-- Você é surda? Eu já disse que o rio não é seu, ele pode passar por sua propriedade, mas o rio não é seu, condessa Mattarazi!
Vitória ficou possessa.
Desceu do animal e partiu para cima dela, segurando-lhe pelos ombros, pressionando-a forte contra a porta do carro.
-- Não ouse falar comigo desse jeito! – Apertou-lhe ainda mais. – Eu sou a condessa, a dona de quase toda essa região. – Os olhos verdes faiscavam de raiva.
Maria Clara tentou se desvencilhar, mas a outra era mais forte.
-- Solte-me! Está me machucando!
-- E machucarei ainda mais se não sair do meu caminho de uma vez por todas.
-- Não tenho medo das suas ameaças! – A encarou. – Você não passa de uma bastarda estúpida que acha que pode fazer o que bem entender e as pessoas apenas devem se dobrar diante das suas vontades. – Gritou.
A ruiva sentiu o sangue ferver e a fú ria dominar todos os seus sentidos. Nunca permitiu e jamais permitiria que alguém a tratasse tão desrespeitosamente. Ela era a filha do conde Vitório Mattarazi V. Era descendente e uma das últimas representantes de uma famı́lia nobre.
Observou os olhos negros a fitarem, brilhantes... Viu-a umedecer os lábios e sua cólera pareceu seguir outro rumo...
Instintivamente tomou-lhe a boca, esmagando-a, ferindo-a, desejando vigar-se das noites de insônia, mas ao sentir a receptividade, acabou se rendendo a doçura da neta de Frederico.
Maria Clara não tentou ao menos resistir. Aceitou a investida colérica, pois foi o que ansiara por todos aqueles dias. Deixou-se explorar e quase desfaleceu ao sentir a maciez daqueles lábios. Aceitou a lı́ngua sendo procurada e gemeu quando a condessa a chupou desesperadamente, como se temesse que o tempo terminasse e interrompesse o contato.
Os corpos se colaram, roçando-se perigosamente. Clara Seguiu por baixo da camiseta, sentindo a pele quente e suave.
Vitória buscou o contato com os seios e ao tê-los em suas mãos sentiu como se tivesse tomado todo o vinho da adega.
Embriagadas... A raiva e o desejo se mesclavam...
A condessa introduziu a coxa em meio às pernas da jovem... Sentiu os mamilos intumescidos, apertou-os até ouvi-la gemer...
Bastardo relinchou e ambas se separaram rapidamente.
Encararam-se por alguns segundos. Pareciam desconhecer o que se passara no momento anterior, como se uma força superior as suas vontades as tivessem unido naquele momento passional.
Maria Clara foi a primeira a mover-se. Entrou no carro e saiu cantando pneus.
A condessa deixou-se cair no chão, cobrindo o rosto com as mãos.
Sua mente estava a mil. Não se reconhecia, não reconhecia a mulher que agira há alguns minutos. Passional, descontrolada... Perdida...
Frederico observava as contas.
Sabia que em breve não teria dinheiro para saldar as dıvidas. A justiça lhe tomara quase todos os bens e os que sobraram poucos valiam.
Cometera um erro há alguns anos ao imaginar que os Mattarazis tinham dinheiro. Entregara sua única filha, pensando que poderia usufruir dos milhões de Vitório, porém a famı́lia nobre não tinha nem dinheiro para pagar a festa do casamento. O que não acontecia agora. A maldita Vitória era milionária. Fizera o pouco que herdara se tornar uma exorbitante quantia. Era boa para os negócios, do mesmo jeito que era excelente na arte da sedução.
-- Miserável! – Bateu com o punho fechado na mesa.
Tomaria tudo que era dela e a destruiria.
Observou a foto da filha. Linda! Poderia ter tido um futuro brilhante, mas os erros a levaram aos braços do homem errado...
Fitou a imagem de Maria Clara. A neta não tinha a personalidade da tia, mas sabia que aquele ar de menina doce e meiga se escondia uma personalidade forte. O melhor seria casá-la rapidamente com Marcos, porém temia que assim perdesse o controle sobre ela...
Maria Clara chegou e seguiu diretamente para o quarto. Fechou a porta! Não desejava ver ninguém naquele momento.
Parou em frente ao espelho e ficou a observar o próprio reflexo. Não se reconhecia. A pele parecia em brasa. Tocou a testa e percebeu que estava febril. Queimava...
Mirou os lábios e notou o inchaço e o pequeno corte na parte inferior... Fechou os olhos e sentiu o gosto da boca dela, exigente, dominadora... Ao mesmo tempo suave e apaixonante.
Aquilo fora uma loucura... A condessa era um ser perigoso e poderia destruı́-la muito facilmente... Mas como controlar esse desejo que parecia querer dominá-la?
Bruta!
Falou baixinho ao notar as marcas que ela deixara em si...
Vitória retornou a casa e nem ao menos levou Bastardo para o estábulo. Entregou-o a um peão que estava no pátio.
Subiu as escadas correndo e seguiu direto para os aposentos. Entrou no banheiro, ligou a ducha e ficou sob ela sem ao menos se despir. Sentia a água fria lutar contra o calor que lhe queimava.
Escorregou até se sentar com as pernas estendidas.
Recordou do olhar forte, desafiador que Maria Clara lhe dirigiu. Os olhos negros brilhavam numa fúria cega. Fechou as mãos tão forte que sentiu as unhas enterrarem-se na palma.
-- Maldita seja, Maria Clara Duomont! Mil vezes maldita! – Sussurrou.
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